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Stomatos
versão impressa ISSN 1519-4442
Stomatos vol.17 no.32 Canoas Jan./Jun. 2011
ARTIGOS CIENTÍFICOS
Movimentação ortodôntica com mini-implantes: relato de caso clínico
Orthodontic movement with mini-implants: Case report
Jean Cleiton Buchmann Machado1; Luciano Copat1; Humberto Thomazi Gassen2; Ivana Ardenghi Vargas2; Pedro Antônio Gonzalez Hernandez2; Marcelo Frejman3
1Especialista em Ortodontia (ULBRA Canoas/RS).
2Professor do Curso de Odontologia (ULBRA Canoas/RS).
3Mestrando em Ortodontia (ULBRA Canoas/RS).
RESUMO
A ancoragem ortodôntica através de mini-implantes tornou-se uma alternativa ímpar no tratamento de pacientes adultos com más posições dentárias, bem como para edêntulos parciais, em que a ancoragem convencional traria limitações no tratamento. Neste artigo, será relatado um caso clínico de paciente do gênero feminino, classe II, com desvio de linha média superior para a esquerda, próteses fixas dos dentes 24 ao 27 e ausência dos dentes 14 e 15. O tratamento de escolha foi a instalação de mini-implante como ancoragem absoluta para utilização de mola de níquel-titânio para mecânica ortodôntica de distalização. Dessa forma, este artigo tem a finalidade de mostrar a importância da associação e planejamento dos mini-implantes como coadjuvantes para ancoragem no tratamento ortodôntico fixo.
Palavras-chave: implantes, ancoragem, ortodontia.
ABSTRACT
The use of implants as orthodontic anchorage has became an important alternative when treating adult patients with unfavorable tooth position or partially edentulous area when the conventional anchorage would produce limitations in the treatment. The purpose of this paper is to describe a case report of a adult female, with skeletal Class II, an upper dental midline deviation to the left, with fixed bridge from 23 to 26 and the absence of the 14 and the 15. For the current treatment a mini screw was used as absolute anchorage and a niquel titanium closed coil for distalizing mechanics. The objective of this article is to show the importance of mini screws for anchorage associated with fixed appliances.
Keywords: implants, anchorage, orthodontics.
INTRODUÇÃO
Em Ortodontia, a movimentação ocorre a partir da aplicação de força a um elemento dentário por meio de dispositivos, como elásticos, molas e dobras nos fios. Entretanto, de acordo com a terceira Lei de Newton, a toda ação corresponde a uma reação de igual magnitude e, em sentido oposto. Assim, quando uma força ortodôntica é aplicada a um dente com o objetivo de movimentá-lo em um determinado sentido, os elementos dentários, que servem de apoio para aplicação desta força, sofrem uma reação de movimentação com a mesma intensidade, porém, em sentido oposto, o que em muitos casos representa um efeito colateral potencial na mecanoterapia ortodôntica (Roberts-Harry, Sandy, 2004).
Esse princípio de biomecânica faz com que um dos fatores mais importantes do planejamento do tratamento ortodôntico seja aplicar meios de evitar a movimentação indevida de dentes (Gray et al., 1983; Miyawaki et al., 2003; Tondelli, 2003; Marassi et al., 2004; Roberts-Harry, Sandy, 2004), o que se denomina ancoragem, ou seja, a resistência ao movimento dentário indesejado (Geron et al., 2003).
A utilização de implantes ósseo-integrados tornou-se uma realidade na Ortodontia. A osseointegração é análoga à situação de um dente anquilosado que pode ser submetido a forças ortodônticas sem sofrer movimentação, ou seja, pode servir como unidade de ancoragem estável, já que a ausência de ligamento periodontal não permite as alterações celulares que resultariam na movimentação (Roberts-Harry, Sandy, 2004).
Dessa forma, para minimizar a perda de ancoragem dentária, a utilização de miniimplantes é uma alternativa viável como ancoragem absoluta em Ortodontia, facilitando o tratamento ortodôntico e reduzindo a necessidade da cooperação do paciente (Roberts-Harry, Sandy, 2004).
A proposta de utilização de implantes como método de ancoragem não é recente, já em 1945, Gainsforth, Higley sugeriram a utilização de parafusos metálicos e fios no ramo mandibular de cães para obtenção de ancoragem ortopédica, mas seus resultados não tiveram sucesso (Roberts et al., 1984). Somente após a introdução do conceito de osseointegração por Branemark et al. (1964), provando que, sob condições controladas, haveria a união rígida entre o osso e a superfície do titânio e esta poderia ser mantida indefinidamente, mesmo na presença de forças funcionais associadas com a mastigação (Roberts et al., 1984), a possibilidade do uso de implantes osseointegrados tornou-se uma realidade na Ortodontia.
Dessa forma, a partir da década de 80, muitos experimentos em animais (Gray et al., 1983; Roberts et al.,1984) e estudos clínicos (Roberts et al., 1994) foram direcionados ao estudo do uso de implantes dentários osseointegrados como unidade de ancoragem durante o tratamento ortodôntico (Keles et al., 2003).
Inúmeros autores (Gray et al., 1983; Ohmae et al., 2001; Roberts et al., 1984; 1994), publicaram relatos comprovando a eficiência desse procedimento. Contudo, apesar dos implantes dentários permanecerem estáveis, quando submetidos a forças ortodônticas (Block, Hoffman, 1995; Melsen, Lang, 2001; Wehrbein, 1997), tais implantes só poderiam ser instalados em áreas, como espaços edêntulos ou região retromolar, o que limitava muito a sua indicação de uso (Kanomi, 1997; Ohmae et al., 2001; Park et al., 2001; Wehrbein, 1997), além de apresentarem maior desconforto para o paciente devido a amplitude da cirurgia (Kanomi, 1997).
Em função dessas limitações, Kanomi (1997) desenvolveu um miniparafuso confeccionado em titânio, com dimensões bem reduzidas (1,2mm de diâmetro e 6,0mm de comprimento) para ser usado, especificamente, com fins de ancoragem ortodôntica. A partir daí, vários sistemas de mini-implantes foram propostos na literatura, apresentando pequenas diferenças em relação ao comprimento, diâmetro e desenho. Uma das vantagens de utilizar mini-implantes, segundo Shapiro, Kokich (1988), é na falta de dentes posteriores onde é difícil uma retração com um controle de uma posição correta dos dentes anteriores. Outras vantagens são a simplicidade da técnica de instalação e remoção, custo reduzido, além de menor desconforto pósoperatório para o paciente (Liou et al., 2004; Cope, 2005).
Os mini-implantes surgiram na ortodontia como uma possibilidade de resolver uma grande dificuldade, a manutenção da ancoragem, enquanto se obtém uma resposta adequada de movimentação dentária. Desde então, vários casos clínicos mostrando sucesso, e revisões de literatura, foram relatados (Konomi, 1997; Kyung, 2003; Marassi et al., 2004; Park et al., 2001; Park et al., 2002; Park et al., 2003) assim, com estudos experimentais em modelos animais (Deguchi et al., 2003; Ohmae et al., 2001) e, mais recentemente, ensaios clínicos em humanos (Cheng et al., 2004; Liou et al., 2004; Melsen, 2005; Herman, 2005).
A decisão sobre a região exata onde será instalado o mini-implante depende de um planejamento cuidadoso, associando radiografias periapicais de ótima qualidade confeccionadas com a ajuda de posicionadores (Bae et al., 2003). Kanomi (1997) acrescentaram que, em função do tamanho reduzido dos mini-implantes, eles exibem um grande número de possibilidades de instalação (Kanomi, 1997).
Segundo Park et al. (2001), o ideal é posicionar o mini-implante é em gengiva inserida, devendo ser evitada a área de mucosa por ser mais propensa a problemas devido ao maior risco de inflamação peri-implantar. Isso pode ser explicado pela característica de mobilidade e elasticidade do tecido na região de mucosa permitir que ocorra a facilidade a penetração de bactérias pela dificuldade de higienização da região.
Levando em consideração a importância da instalação de mini-implantes como coadjuvantes para a ancoragem ortodôntica, bem como a ampla aplicabilidade dessa técnica, os autores desse artigo propuseram-se a fazer um relato de caso mostrando a importância do planejamento e técnica dessa associação.
RELATO DO CASO
Paciente C.M.C., 57 anos e 2 meses, gênero feminino, compareceu à Universidade Luterana do Brasil (Canoas) para a realização de tratamento ortodôntico. A mesma apresentava bom estado de saúde geral e relatava como queixa principal a ausência dentária e dentes desalinhados.
Durante o diagnóstico ortodôntico, na foto extrabucal frontal, foi constatada assimetria da face, terços faciais proporcionais e presença de selamento labial em repouso (Figura 1). Na foto de perfil (Figura 2), observou-se um perfil levemente convexo, ângulo nasolabial e mentolabial normais e linha mento cervical pouco definida. Na foto de frente sorrindo (Figura 3), não foram detectadas alterações, diferente das fotos laterais que revelaram classe II dentária.
Cefalometricamente, a paciente apresentava Classe II esquelética, com ANB de 8°, ângulo interincisivos de 120° e biprotrusão dentária dos incisivos, estando os incisivos superiores bem posicionados e os inferiores proclinados e protruídos. A linha média superior mostrava-se desviada 3mm para esquerda e, a inferior, coincidente com a face. Padrão horizontal de crescimento e padrão facial braquicefálico.
No diagnóstico clínico e radiográfico, foi constatada a presença do dente 23, impactado em posição mésio-angulada, com rizogênese completa, sem visualizações de dilacerações radiculares. Apresentava ausência dos dentes 14, 15, 18, 25, 26, 28, 38 e 46, a presença de uma prótese fixa do elemento 24 ao 27 , como mostra a radiografia panorâmica (Figura 4).
A discrepância de modelos da arcada superior e inferior era de +7mm e –9 mm, respectivamente.
Diante das características apresentadas, foi planejado para o caso:
- montagem de aparatologia fixa nos arcos superior e inferior;
- exodontia do dente 31;
- remoção cirúrgica do dente 23 (canino superior esquerdo) impactado;
- na região dos dentes 14 e 15, que apresentava reabsorção óssea devido à perda dos mesmos, seria necessária a colocação de um enxerto ósseo na região para futuro implante dentário. Além disso, planejou-se a instalação cirúrgica de um mini-implante na mesma região para auxiliar como ancoragem absoluta na movimentação ortodôntica dos dentes.
Inicialmente, foi feita colagem de aparelhagem ortodôntica fixa e, de acordo com o planejado, o procedimento para instalação do mini-implante foi realizado após antissepsia e anestesia infiltrativa (Figura 5). A seguir, procedeu-se à perfuração transmucosa da cortical óssea, sem interferir em tecido ósseo medular, com o auxílio de uma broca em baixa rotação (800 rpm) e constante irrigação, utilizando soro fisiológico a 0,9% (Figura 6). Por fim, realizou-se a colocação do mini-implante com medidas de 1,8 x 10 mm, da marca Sin ® (Figura 7), self-driller (autorrosqueável) com auxílio de uma chave de mão (Figura 8).
Comprovada a estabilidade primária do mini-implante (Figura 9), foi prescrita para a paciente a administração, via oral, de analgésico Paracetamol 750mg, de 8/8 horas, por um dia e higiene com Digluconato de Clorexidine a 0,12%, bochechos, duas vezes ao dia, por um minuto, durante uma semana.
Com os arcos alinhados e nivelados, o fio redondo de aço inoxidável .020” e o mini-implante instalados, o dispositivo ortodôntico utilizado para movimento distal do canino (13) foi, a mola de níquel-titânio, acoplada a um jig na mesial deste com força de 150 g (Figura 10). Na radiografia periapical, pode constatar a presença dos mesmos (Figura 11).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Devido ao alto grau de dificuldade na utilização da mecânica ortodôntica convencional em pacientes edêntulos, o uso de mini-implantes tornou-se uma alternativa com excelentes resultados, em um menor período de tempo, além de produzir menores efeitos colaterais.
Como qualquer outra terapia, deve-se informar e orientar o paciente referente às opções de tratamento, para que, uma vez devidamente conscientizado, o paciente tenha seus desejos respeitados, e possa ser incluído nas tomadas de decisões da equipe multidisciplinar, tanto no planejamento quanto na execução do caso.
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Corresponding Author:
Jean Cleiton Buchmann Machado
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