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Revista da Associacao Paulista de Cirurgioes Dentistas

versão impressa ISSN 0004-5276

Rev. Assoc. Paul. Cir. Dent. vol.66 no.2 Sao Paulo Abr./Jun. 2012

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Características físicas e bucais em pacientes portadores da Síndrome do X-Frágil

 

Physical and oral characteristics in patients with fragile X syndrome

 

 

Cristhiane Olívia Ferreira do AmaralI; Karolina Cabral SollittoII; Thuany M. Delfino dos SantosIII; Arlete Gomes Santos PariziIV; Adilson de OliveiraV; Fabiana Gouveia StraiotoVI

IMestre - Professora - Disciplina de Pacientes com Necessidades Especiais e Odontopediatria, Faculdade de Odontologia, Universidade do Oeste Paulista, Presidente Prudente/SP, Brasil
IIGraduanda - Bolsista do Programa Especial de Iniciação Científica, Faculdade de Odontologia, Universidade do Oeste Paulista, Presidente Prudente/SP, Brasil
IIIGraduanda - Bolsista do Programa Especial de Iniciação Científica, Faculdade de Odontologia, Universidade do Oeste Paulista, Presidente Prudente/SP, Brasil
IVProfessora - Disciplina de Pacientes com Necessidades Especiais e Patologia Geral e Bucal, Faculdade de Odontologia, Universidade do Oeste Paulista, Presidente Prudente/SP, Brasil
VMestre - Professor - Disciplina de Pacientes com Necessidades Especiais e Odontopediatria, Faculdade de Odontologia, Universidade do Oeste Paulista, Presidente Prudente/SP, Brasil
VIDoutora - Professora - Disciplina de Prótese Dentária, Faculdade de Odontologia, Universidade do Oeste Paulista, Presidente Prudente/SP, Brasil

Autor para correspondência

 

 


 

RESUMO

A Síndrome do X-Frágil é um distúrbio genético, identificado microscopicamente por uma constrição denominada sítio frágil no braço longo do cromossomo X; é considerada como principal causa hereditária de deficiência mental associada a diversas alterações neurológicas. O objetivo deste estudo foi verificar características físicas e bucais, presença de alterações sistêmicas e características comportamentais presentes em pacientes portadores da Síndrome do X-Frágil, além de divulgar esta síndrome aos Cirurgiões-Dentistas. Foram analisados 31 voluntários portadores da Síndrome do X-Frágil por meio da aplicação de questionário estruturado, exame físico geral, bucodental e análise de prontuário multidisciplinar. Os dados obtidos foram tabulados e submetidos ao teste Qui-Quadrado (p<0,05). O uso de medicamentos foi relatado por 68% (p<0,05), sendo os anticonvulsivantes os mais usados (61%). A presença de biofilme (93%) e gengivite (81%) foi estatisticamente significante quando comparado a quantidade de casos positivos e negativos. Maloclusão e palato atrésico estiveram presentes em 93% dos voluntários (p<0,05). Todos os voluntários relataram a presença de histórico familiar de deficiência mental. Dentre as características faciais: face alongada, orelhas e fronte proeminentes e os aspectos comportamentais de hiperatividade e ansiedade apresentaram diferenças estatisticamente significantes. Dessa forma, conclui-se que existe uma grande variabilidade entre as características manifestadas por indivíduos portadores da Síndrome do X-Frágil, sendo frequente entre esses indivíduos a presença de face alongada, orelhas e fronte proeminentes e deficiência mental associados a alterações bucais como: maloclusão, palato atrésico e hipoplasia de esmalte. Adicionalmente é possível verificar higiene bucal deficiente e o uso contínuo de medicamentos.

Descritores: síndrome do Cromossomo X-Frágil; saúde bucal; face; comportamento; características humanas


ABSTRACT

The fragile X syndrome is a genetic disorder, identified microscopically by a constriction called fragile site on the long arm of chromosome X, considered the main inherited cause of mental disability associated with several neurological disorders. The aim of this study were analyzed physical and oral characteristics, medical problems and behavioral characteristics in patients with fragile X syndrome, and diffuse this syndrome among dentists. Volunteers (n=31) with fragile X syndrome were submitted a structured form, physical and oral exam and the multidisciplinary form was analyzed. The data were submitted to statistical analyses (Chi-square; P<.05). Regular use of medicine was reported by 68% (P<.05), the most commonly used was the anticonvulsants (61%). The presence of biofilm (93%) and gingivitis (81%) was statistically significant when the amount of positive and negative cases were compared. Malocclusion and atresic palate were present in 93% of the volunteers (P<.05). All subjects reported the presence of family history of mental retardation. Among the facial features elongated face, ears and forehead prominent and behavioral aspects of hyperactivity and anxiety were statically significant differences. Thus, we conclude that there are large variability among the characteristics expressed by individuals with the Fragile X syndrome, frequently these individuals have elongated face, prominent ears and mental retardation associated with oral problems such as malocclusion, atresic palate and enamel hypoplasia. In addition poor oral hygiene and regular medicine is common in this patients.

Descriptors: fragile X syndrome; oral health; face; behavior; human characteristics


 

 

RELEVÂNCIA CLÍNICA

O Cirurgião-Dentista deve ser capacitado para reconhecer o paciente portador da Síndrome do X-Frágil, pois comumente manifestam doenças sistêmicas que podem influenciar no plano de tratamento, como cardiopatias e convulsões, associado à dificuldade durante o atendimento clínico devido comportamento autista e hiperativo.

 

INTRODUÇÃO

A Síndrome do X-Frágil é a causa hereditária mais frequente de deficiência mental, sendo a segunda de etiologia genética de deficiência mental. Os portadores da síndrome podem manifestar problemas comportamentais ou emocionais, dificuldades no aprendizado e deficiência mental em todos os níveis1. Esta síndrome está relacionada com a mutação no cromossomo X no gene FMR-1 (Fragile Mental Retardation 1)2, identificada microscopicamente por uma constrição denominada sítio frágil no braço longo do cromossomo X, associada a determinados mecanismos de herança e geralmente, não associada a anormalidades fenotípicas específicas3.

Anormalidades físicas e cognitivas que estão associados à síndrome são: alterações comportamentais, dismorfismos faciais, anormalidades no tecido conjuntivo, prolapso da válvula mitral, pés planos, hipotonia muscular, aumento do volume testicular em homens em idade pós-puberal e falha prematura ovariana em mulheres. Dentre os dismorfismos faciais é comum a presença de face alongada, palato alto, orelhas proeminentes, hiperextensibilidade das articulações, estrabismo, fronte proeminente2.

Alterações comportamentais podem manifestar em graus variáveis, como problemas de atenção associadosà hiperatividade, dificuldade de aprendizagem, contato ocular pobre, transtornos de linguagem, hábito de morder as mãos, ansiedade social e comportamento autista4.

As características bucais frequentemente encontradas em pacientes portadores da Síndrome do X-Frágil são: palato estreito e profundo, prognatismo mandibular, macroglossia, má higiene, hipoplasia de esmalte, má oclusão, presença de biofilme e/ou cárie, cálculo e gengivite. A deficiência mental é um fator que dificulta a abordagem odontológica desses pacientes, pois existem características comportamentais, como autismo e hiperatividade, que exigem atenção multidisciplinar5. As manifestações são consistentes, mas não exclusivas, e a existência de portadores de alteração no gene FMR-1 sem manifestações clínicas aparentes impossibilitam o diagnóstico da Síndrome do X-Frágil baseado apenas na avaliação clínica6.

Atualmente, o teste de escolha para o diagnóstico da Síndrome do X-Frágil conforme as diretrizes do American College of Medical Genetics são os testes moleculares do DNA, o teste de Southern blot e a reação em cadeia da polimerase, ou ainda pela técnica citogenética7.

Para orientar o diagnóstico da Síndrome do X-Frágil existe na literatura uma lista de seis itens para verificar em indivíduos a necessidade de serem submetidos a testes mais específicos para diagnóstico da síndrome, atribuindo-se escores de 0 a 2 a cada um dos seguintes itens: deficiência mental, história familiar de déficit de inteligência, face alongada, orelhas proeminentes, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade e comportamento autista. Pacientes que somam um escore maior ou igual a 5 são orientados a serem submetidos ao exame citogenético8,9.

Pacientes com história familiar de deficiência intelectual e diagnóstico de baixo QI e de etiologia desconhecida, combinado com algumas das características de comportamento, também podem ser considerados como suspeita de um indivíduo portador da Síndrome do X-Frágil9.

As estatísticas indicam que uma em 250 mulheres e um em 700 homens são portadores da pré-mutação. Em função da grande variabilidade fenotípica dos pacientes com a Síndrome do X-Frágil, estima-se que 65% dos casos, especialmente na população pediátrica não têm sido diagnosticados, inclusive em centros especializados de genética de países desenvolvidos10. As características das mulheres portadoras de mutação completa se apresentam de uma forma mais branda11, sendo frequente encontrar meninas com a síndrome, porém, clinicamente normais ou quase normais, sendo a causa da maior parte das consultas, as dificuldades de aprendizagem e/ou de conduta, visto que o prognóstico intelectual depende da porcentagem de células afetadas12.

A identificação das famílias nas quais os alelos estão se segregando na forma de pré-mutação é importante para melhor orientação no aconselhamento genético13; pois a pré-mutação pode passar por várias gerações até que se transforme numa mutação completa e apareça uma criança afetada14. A falta de informação dessa síndrome e o alto custo para diagnosticá-la tornam difícil o conhecimento da prevalência da Síndrome do X-Frágil no Brasil. O país dispõe de poucos estudos, nos quais existe uma frequência estimada em 8% dos homens e 4% das mulheres com deficiência mental sejam portadores da síndrome15.

Ainda não há cura para a Síndrome do X-Frágil, mas existe tratamento para grande parte dos sintomas, entretanto, o uso de medicamentos pode atenuar ou eliminar certos sintomas da doença. Algumas pessoas com a síndrome precisam de medicamentos16, mas nem todos os indivíduos com a síndrome manifestam as mesmas características ou respondem de maneira semelhante a determinados medicamentos, ressaltando a necessidade de uma equipe de profissionais, multi e interdisciplinar capacitada, podendo combinar atendimentos terapêuticos, educação especial e uso de medicamentos de acordo com a demanda específica de cada indivíduo17.

Dessa forma, gera a necessidade de divulgar informações sobre a Síndrome do X-Frágil não só para as famílias, mas principalmente para os profissionais da área de saúde. A importância no diagnóstico da Síndrome do X-Frágil em mulheres está mais relacionada ao planejamento genético e transtornos de conduta do que à intelectualidade18. O diagnóstico pelo teste genético molecular é preciso e quando combinado com o aconselhamento familiar sobre a hereditariedade da síndrome é a melhor maneira de prevenir novas gerações de pessoas afetadas, lembrando que o diagnóstico da Síndrome do X-Frágil não deverá ser realizado apenas pela presença de características físicas, pois podem variar muito e estão relacionados aos diferentes tipos de síndromes19.

Assim, o presente trabalho tem por objetivo verificar características físicas e bucais, presença de alterações sistêmicas e características comportamentais presentes em pacientes portadores da Síndrome do X-Frágil, além de divulgar esta Síndrome aos Cirurgiões-Dentistas.

 

MATERIAL E MÉTODO

Seleção de Voluntários

Após a aprovação do comitê de ética em pesquisa da Universidade do Oeste Paulista (nº 297/2010), os voluntários foram convidados a participar da pesquisa, sendo que o termo de consentimento livre e esclarecido foi assinado pela mãe ou responsável pelo participante do estudo. Os critérios de inclusão usados foram: ser paciente da Clínica de Pacientes Especiais da Faculdade de Odontologia Universidade do Oeste Paulista ou da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) e portador diagnosticado por meio de exame citogenético da Síndrome do X-Frágil. Foram estudados ambos os gêneros, sem distinção de etnia e nível social. O estudo não foi conduzido sob o efeito de sedação, mas com o paciente acordado e colaborando com a pesquisa, a avaliação dos pacientes foi executada pelas graduandas devidamente calibradas para a pesquisa. A amostra avaliada foi composta por 31 voluntários, sendo quatro do gênero feminino e 27 do gênero masculino, com idade de cinco a 42 anos.

Avaliação Clínica

A avaliação clínica foi realizada por meio do preenchimento de um formulário quantitativo estruturado, o qual foi validado em um projeto piloto realizado com 25% da amostra. O formulário aplicado é composto por uma parte de história médica, no qual foi possível obter informações com os pais ou responsáveis sobre: causa da enfermidade, medicamentos de uso contínuo prescritos ao paciente, cardiopatias, história de convulsões, presença de deficiência mental ou história de indivíduos com a síndrome na família.

O exame físico bucodentário foi executado por meio de exame clínico visual que investigou a presença de manifestações bucais como: dentes cariados, perdidos e restaurados, macroglossia, palato profundo, má higiene (classificada em ausência e presença de biofilme, cálculo e gengivite), hipoplasia de esmalte e má oclusão. As características gerais avaliadas foram: testa (fronte) proeminente, face alongada, orelhas proeminentes, estrabismo e miopia.

As informações sobre as características comportamentais foram obtidas por meio da análise do prontuário de todos os voluntários onde foram armazenadas informações das análises da equipe multidisciplinar (fonoaudiólogos, psicólogos e fisioterapeutas) sobre a existência de comportamento autista, hiperatividade, ansiedade, transtornos de linguagem, controle de esfíncteres, marcha diferenciada, agressividade e automutilação.

As medidas da face foram obtidas por meio da técnica de faciometria que é uma técnica para análise de tecido mole da face realizada por meio da avaliação visual da face do paciente20.(Figura 1)

O diagnóstico clínico das orelhas proeminentes foi baseado na avaliação das proporções entre a orelha e as estruturas faciais. Este quadro é caracterizado por orelhas alinhadas à cabeça num ângulo de 30 à 45º, e aumento do ângulo auriculomastoide (Figura 2), orelhas proeminentes são projetadas para fora e para frente21.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Análise Estatística


Os dados obtidos foram tabulados e submetidos à análise estatística usando o teste Qui-Quadrado com nível de significância de 5% (Bioestat - Belém, Pará, Brasil).

 

RESULTADOS

Foram avaliados nesta pesquisa 31 pacientes: 27 do gênero masculino e quatro do feminino, com faixa etária de cinco a 42 anos (média 16 ± 8 anos). Os voluntários quando questionados sobre episódios de convulsão observou que não houve diferença estatisticamente significante entre os indivíduos que relataram ter vivido episódios compulsivos (48%; p>0,05), a presença de cardiopatia foi relatada por apenas 13% (p<0,05) dos voluntários (Tabela 1). Quando questionados sobre o uso contínuo de medicamentos, 68% dos voluntários (p<0,05) relataram ser usuários sendo os anticonvulsivantes (Carbamazepina e Fenobarbital; 61%) os mais citados seguidos dos antipsicóticos neurolépticos (52%), metilfenidato (Ritalina; 22%) e menor porcentagem de voluntários relataram ser usuários de antidepressivos (10%) (Tabela 2).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Os resultados da avaliação da saúde bucal dos voluntários apresentaram dados que indicam ineficiente controle do biofilme, em 29 voluntários avaliados (93%; p<0,05) foiverificado presença de biofilme e inflamação gengival (25; 81%; p<0,05) (Tabela 3), entretanto o índice de CPO-D encontrado nos voluntários foi de 4,2.

Dentre as alterações bucais investigadas a presença de maloclusão e palato atrésico (29 voluntários para cada característica; 93%; p<0,05) foram as duas características mais frequemente encontradas nos voluntários, seguidas pela presença de hipoplasia de esmalte (20; 64%; p<0,05) (Tabela 4).

Na Tabela 5 encontram-se os resultados da presença de hábitos nocivos, entretanto não foi encontrada diferença estatisticamente significante entre os voluntários avaliados (p>0,05). Os 17 voluntários que relataram praticar hábitos nocivos, 47% relataram possuir o hábito de morder as mãos (Figura 3).

As características faciais avaliadas nos voluntários estão descritas na Tabela 6, 23 voluntários apresentaram face alongada (74%; p< 0,05), 28 orelhas proeminentes (90%; p< 0,05) (Figura 4) e a presença de fronte proeminente foi encontrada em 24 voluntários (77%; p<0.05) (Figura 5 e 6).

Quando avaliado o histórico familiar, 100% dos voluntários relataram presença de indivíduos com deficiência mental (p<0,05), entretanto, o relato de presença da Síndrome do X-Frágil na família não houve diferença estatisticamente significante entre os que possuem histórico familiar (16; 51%; p>0.05) e os que não possuem (15; 49%; p>0.05) (Tabela 7).

As características comportamentais avaliadas nos voluntários estão descritas na Tabela 8, o comportamento hiperativo foi encontrado em 29 (94%; p<0.05) dos voluntários assim como relatado a presença de ansiedade (26; 84%; p<0.05), as demais características como: transtorno de linguagem, controle de esfíncteres, marcha diferenciada, autismo, agressividade e automutilação não foram diferentes estatisticamente entre os voluntários que apresentam e os que não manifestaram a característica avaliada (p>0.05).

 

DISCUSSÃO

Os resultados do estudo reforçam a diversidade fenotípica e os diferentes níveis de manifestação das características dos pacientes portadores da Síndrome do X-Frágil. Portanto, exige conhecimento e atenção do Cirurgião-Dentista na detecção principalmente de características bucais que conjuntamente com dados da equipe multidisciplinar (alterações sistêmicas e comportamentais) indiquem uma investigação genética para confirmação do diagnóstico da síndrome.

Os resultados deste estudo mostram diferente prevalência da síndrome entre os gêneros, dos 31 indivíduos participantes, 27 (87%) eram do gênero masculino; assim como no estudo publicado por Boy et al. (2000)22 no qual foi investigado as características clínicas mais significativas entre indivíduos portadores da Síndrome do X-Frágil, sendo 89% da amostra composta por indivíduos do gênero masculino. Estes dados estão de acordo com Cherubini et al. (2008)19 que discorre sobre o fato de que indivíduos do gênero masculino possuem maior predisposição para desenvolver mutação completa e consequentemente fenótipo determinado para a Síndrome do X-Frágil.

Os resultados não mostraram diferença quanto ao relato de episódios de convulsão (Tabela 1), entretanto quando investigado quanto ao uso contínuo de medicamentos (Tabela 2) o uso de anticonvulsivantes (61%) foi o mais citado pelos voluntários podendo ser a justificativa para uma distribuição equilibrada entre os indivíduos com episódios convulsivos. Ainda sobre o uso contínuo de medicamentos, o Cirurgião-Dentista deve estar atento aos efeitos colaterais comumente manifestados por pacientes usuários de antipsicóticos e/ou antidepressivos como retenção urinária, delírio, obstipação intestinal e principalmente xerostomia que pode ser relacionada com maior incidência de cárie ou ainda influenciar no tratamento reabilitador de pacientes usuários de prótese total, além de evitar interações adversas com outros agentes terapêuticos23-25.

Hagerman et al. (2002)3 relataram que a cardiopatia, principalmente o prolapso de válvula mitral foi encontrado em 55% dos indivíduos avaliados portadores da Síndrome do X-Frágil, no presente estudo o relato de cardiopatia foi encontrado em apenas 13% dos voluntários sugerindo que esta afecção pode estar subdiagnosticada devido dificuldade de acesso ao tratamento médico e exames cardiológicos.

Analisando os resultados obtidos (presença de biofilme: 93% e gengivite: 81%) (Tabela 3) quanto à condição bucal dos voluntários avaliados concordam com os dados encontrados na literatura que relacionam a higiene bucal precária e a má condição bucal registrada na maioria dos portadores de transtorno mental e comportamental (Figura 7). Fato não relacionado apenas aos déficits intelectual e motor, como também ao nível de compreensão da importância da escovação dentária para a saúde bucal, que nesta população é baixo. A falta de cooperação destes pacientes para que o responsável realize sua higiene bucal tambémé um fator agravante17.

As alterações bucais avaliadas nos voluntários, presença de má oclusão e palato atrésico encontrados na Tabela 4 apresentaram alta frequência, corroborando com os resultados do estudo de Shellhart et al. (1986)26, no qual foram analisaram 16 voluntários portadores da Síndrome do X-Frágil e encontraram frequência significativamente maior de má oclusão quando comparado com indivíduos não portadores da síndrome.

Quanto à presença de hipoplasia de esmalte (64%), também foi encontrada frequência significativa dessa lesão em um estudo publicado por Haddad (1999)27 que avaliou 36 pacientes, sendo que 18 destes indivíduos portadores da Síndrome do X-Frágil comprovado pelo exame molecular (DNA), e que na dentição permanente foi detectada hipoplasia de esmalte e outras alterações como: anodontia, macrodontia, mancha de esmalte e desgaste incisal.

Os achados clínicos observados nos pacientes neste estudo reforçam as características fenotípicas descritas na literatura24,28 sobre a população portadora da Síndrome do X-Frágil: face alongada, orelhas e fronte proeminentes (Tabela 6). A condução da análise facial executada neste estudo realizada pela aplicação da técnica da faciometria permitiu uma análise facial subjetiva, baseada na avaliação da presença ou ausência de harmonia entre os terços, e a presença de desequilíbrio facial pode ser facilmente observado20 (Figura 1).

Os resultados da avaliação de histórico de deficiência mental na família reforçam os resultados publicados por Boy et al. (2000)22 no qual o relato de casos familiares de deficiência mental compatíveis foi observado em 100%, assim como neste estudo (Tabela 7) (Figura 5 e 6) tornando importante a triagem dos familiares.

Quanto às manifestações comportamentais avaliadas, 94% dos voluntários possuem comportamento hiperativo e 83,9% apresentaram ansiedade (Tabela 8), e esta de acordo com o estudo publicado por Palares et al. (2006)23 no qual a prevalência de problemas de déficit de atenção e hiperatividade foi muito variável, entretanto frequente em pacientes portadores da Síndrome do X-Frágil, assim como a ansiedade que é um componente comum em paciente com deficiência mental. Entretanto, quando avaliado hábitos nocivos apresentados pelos indivíduos estudados, não foi encontrada diferença estatística entre os casos positivos e negativos (Tabela 5).

Dentre as limitações do presente estudo é possível destacar o reduzido número de voluntários do gênero feminino, impossibilitando correlações das características avaliadas com o gênero. Apesar desta limitação o presente estudo apontou importantes características que ajudará no delineamento de futuros estudos.

 

CONCLUSÃO

Conclui-se que existe uma grande variabilidade entre as características manifestadas por indivíduos portadores da Síndrome do X-Frágil, sendo frequente entre esses indivíduos a presença de face alongada, orelhas e frontes proeminentes e deficiência mental associados às alterações bucais como: maloclusão, palato atrésico e hipoplasia do esmalte. Adicionalmente é possível verificar a pobre higiene oral e o uso contínuo de medicamento pelos portadores da síndrome.

 

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Autor para correspondência:
Cristhiane Olívia Ferreira do Amaral
Rua Floriano Borges, 112
Jardim das Rosas – Presidente Prudente – SP
19060-170
Brasil

e-mail: crisamaral@unoeste.br

Recebido em: out/11
Aprovado em: fev/12

CEP/Unoeste nº 297/2010