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Revista da Associacao Paulista de Cirurgioes Dentistas

versão impressa ISSN 0004-5276

Rev. Assoc. Paul. Cir. Dent. vol.66 no.3 Sao Paulo Jul./Set. 2012

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Avaliação do capeamento pulpar indireto e tratamento expectante em molares decíduos

 

Evaluation of indirect pulp capping and expectante treatment in primary molars

 

 

Gláucia Tápias Nardão MoseleI; José Carlos Pettorossi ImparatoII; Symonne P.C.O.L. ParizottoIII

IMestre em Odontopediatria pela Faculdade SLMandic
IIPós-Doutorado em Odontopediatria - Coordenador do mestrado em Odontopediatria da SLMandic
IIIDoutora em Odontopediatria - Coordenadora do Curso de Especialização em Odontopediatria do SIOMS, professora de Odontopediatria da Universidade Anhanguera-Uniderp, Campo Grande – MS

Autor para correspondência

 

 


 

RESUMO

Objetivo: avaliar clínica e radiograficamente o capeamento pulpar indireto e o tratamento expectante em molares decíduos, no período de 12 meses. Materiais e Métodos: Foram selecionados 13 molares decíduos com lesão profunda de cárie e realizado a remoção seletiva da dentina cariada, proteção do complexo dentino-pulpar com cimento de hidróxido de cálcio e restauração com cimento de ionômero de vidro. No grupo controle foi realizada reabertura após 30 dias e remoção total do remanescente cariado e no grupo experimental acompanhamento clínico e radiográfico. Resultados: Os resultados foram realizados por meio do teste qui-quadrado e teste de Ficher. Conclusão: Diante dos resultados encontrados é lícito concluir que a remoção do remanescente cariado após o tratamento expectante, não melhorou o desempenho clínico e radiográfico das restaurações ionoméricas, quando comparado com o capeamento pulpar indireto em molares decíduos por um período de 12 meses de acompanhamento. Relevância Clínica: Tratamento de mínima intervenção que diminui os riscos de exposição pulpar em molares decíduos (mantendo a vitalidade pulpar) e o tempo da criança no consultório, podendo ser realizado em sessão única. Palavras- chave: Tratamento pulpar indireto. Remoção seletiva do tecido cariado. Molares decíduos.

Descritores: cárie dentária; odontopediatria; polpa dentária


 

ABSTRACT

Purpose: The aim of this study was to evaluate the clinical and radiographic indirect pulp treatment in primary molars in one or two sessions, within 12 months. Methods: selected 13 primary molars with deep carious lesions and performed partial removal of the decayed tissue, protection of the pulp-dentin complex with calcium hydroxide cement and restored with glass ionomer cement. In the control group was performed 30 days after reopening and removal of the remaining caries in the experimental group and clinical and radiographic. Results: The results showed no statistically significant difference between the two groups.Given the results we may conclude that the removal of remaining carious after expectant treatment, did not improve the clinical and radiographic performance of ionomeric restorations, when compared with the indirect pulp capping in primary molars for a period of 12 months follow-up. Clinical Relevance: Treatment of minimal intervention that reduces the risk of pulp exposure in primary molars (maintaining pulp vitality) and the child’s time in office, may be performed in one session. Keywords: indirect pulp treatment. Selective removal of carious tissue. Primary molars.

Descriptors: dental caries; pediatric dentistry; dental pulp


 

 

RELEVÂNCIA CLÍNICA

Tratamento de mínima intervenção que diminui os riscos de exposição pulpar em molares decíduos (mantendo a vitalidade pulpar) e o tempo da criança no consultório, podendo ser realizado em sessão única.

 

INTRODUÇÃO

A cárie dentária é uma doença crônica e, portanto, um processo que progride de forma lenta, na maioria dos indivíduos, sendo que raramente é autolimitante e, na ausência de tratamento, progride até destruir totalmente o dente. A destruição localizada dos tecidos duros, geralmente denominada “lesão”,é o sinal da doença1.

Diante de cavidade cariosa profunda, ou seja, aquela que atingiu o terço mais interno da espessura da dentina cariada avaliada clínica e radiograficamente, com probabilidade de exposição pulpar se todo tecido cariado for removido, o tratamento pulpar indireto é uma alternativa para o tratamento dessa lesão, que consiste na remoção do tecido cariado amolecido e irreversivelmente lesado e a manutenção da dentina afetada mantida para evitar exposição pulpar, seguida por proteção da polpa com material biocompatível2.

O tratamento pulpar indireto pode ser realizado em sessão única (capeamento pulpar indireto) ou em duas ou mais sessões (escavação gradativa ou tratamento expectante)3. A principal diferença entre capeamento pulpar indireto e a escavação gradativa ou tratamento expectante é que o capeamento pulpar indireto remove quase completamente a dentina afetada deixando uma leve camada de dentina desmineralizada sobre a parede pulpar, não existindo a necessidade da reabertura, sendo realizada uma restauração definitiva. Já a escavação gradativa ou tratamento expectante é realizado em duas ou mais sessões e tem como objetivo, propiciar condições para uma resposta biológica da polpa por meio da produção da dentina terciária sendo a cavidade vedada por uma restauração provisória4,5,6.

Uma revisão sistemática foi realizada sobre remoção parcial ou total do tecido cariado em dentes com lesão de cárie profunda. Os autores concluíram que em dentes decíduos ou permanentes assintomáticos realizando a remoção parcial do tecido cariado ocorre uma redução do risco de exposição pulpar, sem proporcionar prejuízos para o paciente. Os autores questionaram sobre a falta de evidência da necessidade de reabertura da cavidade para remoção do remanescente cariado. Eles não encontraram diferença entre a remoção parcial e total de tecido cariado relacionado à sensibilidade, progressão da lesão e longevidade da restauração7.

Diante disso, o objetivo desse trabalho foi avaliar a necessidade de reabertura para remoção do remanescente cariado após o tratamento pulpar indireto, por meio de acompanhamento clínico e radiográfico das restaurações ionoméricas em molares decíduos, por 12 meses, em paciente com idade de 4-6 anos.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

A população deste estudo foi constituída por seis crianças assistidas no curso de Especialização de Odontopediatria do Sindicato dos Odontologistas do Mato Grosso do Sul (SIOMS) na faixa etária de 4 a 6 anos, que apresentaram lesão de cárie profunda em molares decíduos. Os pais ou responsáveis autorizaram a participação das crianças, por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e comprometendo-se a comparecerem às consultas. Este trabalho foi aprovado pelo CEP da Faculdade de Odontologia São Leopoldo Mandic sob o número 2008/0213.

Nos pacientes selecionados, foi realizado tratamento curativo em todos os dentes, além da prevenção e educação em saúde. Inicialmente foi realizado ensino de técnica de escovação, uso de fio dental e orientação da dieta por meio do diário alimentar. Foi realizado adequação do meio, com selamento das cavidades médias e rasas e exodontias. Então, realizaram-se as terapias pulpares como tratamento pulpar indireto e pulpectomias e, dando prosseguimento ao tratamento, restaurações definitivas do restante da cavidade bucal.

Critérios de inclusão

Após realização de profilaxia, os dentes foram selecionados de acordo com os seguintes critérios: molares decíduos com lesão de cárie oclusal e ocluso-proximal; lesão de cárie profunda em dentina, isto é, o 3/3 da dentina interna em associação com o exame radiográfico; ausência de fístula; ausência de mobilidade patológica, tendo em vista a idade dos pacientes selecionados; ausência de sinais de irreversibilidade pulpar.

Radiograficamente foi incluído no estudo: dentes com lesão de cárie envolvendo metade interna de dentina, isto é, 3/3 mais profundo da dentina cariada, em associação com o exame clínico; ausência de lesão de cárie envolvendo a polpa; ausência de radiolucidez na região da furca; ausência de reabsorção interna ou externa;

Critérios de exclusão

Foram excluídos deste estudo: pacientes com histórico de comprometimento sistêmico de qualquer natureza; pacientes que apresentaram dor espontânea ou história pregressa de dor contínua; necessidade de realização de pulpotomia ou pulpectomia; processos de reabsorções radiculares patológicas; lesão na região de furca.

O desenho deste estudo foi clínico randomizado e controlado. A amostra foi composta por 13 molares decíduos (houve perda de três dentes do grupo experimental G2). Desta forma, foram alocados de acordo com lista prévia randomizada em oito dentes no Grupo Controle (G1) e cinco do Grupo Experimental (G2). Além do retorno após 30 dias, todos os pacientes retornaram após 6 e 12 meses.

 

METODOLOGIA

Foi avaliada, clinicamente, a dentina afetada da parede pulpar quanto à coloração (amarelo, castanho ou marrom escuro), consistência (dura ou amolecida) e umidade (úmida ou seca)9. Logo após a avaliação clínica da dentina afetada, foi realizado condicionamento da cavidade com ácido poliacrílico durante 10 segundos, com auxílio do microbrush, lavagem com jatos de água em abundância, secagem com bolinhas de algodão, forramento da cavidade com cimento de hidróxido de cálcio (HydroC Dentsply®), com aplicador de dycal Duflex®, restauração com cimento de ionômero de vidro convencional Maxxion R® marca FGM e radiografia periapical final imediatamente após o término do procedimento restaurador.

Após 30 dias, todos os pacientes retornaram para reavaliação da amostra, sendo que: Grupo Experimental – Capeamento Pulpar Indireto - (G2) foi realizado: clinicamente, avaliação quanto à presença de fístula, mobilidade patológica, abcesso e/ou dor. Radiografia periapical para avaliar a região de furca quanto à presença/ausência de radiolucidez bem como avaliar ausência de reabsorção interna ou externa.

No Grupo Controle – Tratamento Expectante - (G1) foi realizado: presença ou ausência de fístula, mobilidade patológica (devido idade dos pacientes), abcesso e/ou dor. Radiografia periapical para avaliar a região de furca quanto à presença/ausência de radiolucidez e reabsorção interna e/ou externa. Logo após realizou-se reabertura da cavidade utilizando broca carbide. Foi observado o aspecto clínico da dentina afetada quanto a cor (amarelo, castanho ou marrom escuro), consistência (dura ou amolecida) e umidade (úmida ou seca). Em seguida, remoção do remanescente dentinário cariado da parede pulpar com colheres de dentina afiadas compatíveis com o tamanho da cavidade, forramento da cavidade com cimento de hidróxido de cálcio (HydroC Dentsply®), com aplicador de Dycal Duflex®, restauração com cimento de ionômero de vidro convencional Maxxion R® marca FGM e radiografia periapical final imediatamente após o término do procedimento restaurador.

A avaliação da associação entre a coloração da dentina afetada e o momento de avaliação foi realizada por meio do teste do qui-quadrado. Já a avaliação da associação das variáveis consistência e umidade da dentina afetada como a variável no momento de avaliação, foi realizada por meio do teste exato de Fisher. A análise estatística foi realizada utilizando-se o software SigmaStat, versão 3.5, considerando um nível de significância de 5%.

A avaliação entre a associação do Grupo Controle e o Grupo Experimental foi realizada associando aspectos clínicos, como condição dos tecidos periodontais (presença/ausência de fístula, mobilidade, dor e/ou abcesso) e radiográficos como ausência de radiolucidez interradicular e reabsorção interna ou externa.

 

RESULTADOS

Neste estudo foram avaliados 13 molares decíduos, sendo que destes, 61,5% (n=8) eram do Grupo Controle e 38,5% (n=5) eram do Grupo Experimental.

 

AVALIAÇÃO CLÍNICA

Grupo Controle (Tratamento Expectante- G1)

Nos dentes selecionados para o grupo controle, ou seja, àquele em que foi realizado o tratamento expectante, foi realizada também a avaliação clínica da dentina afetada.

Em relação à coloração inicial da dentina afetada, (n=8), 50% (n=4) desses dentes apresentavam dentina de cor amarelada, 25% (n=2) apresentavam dentina de cor castanha e 25% (n=2) deles apresentavam dentina de cor marrom escuro. Já em relação à coloração final da dentina afetada, (n=8), 37,5% (n=3) desses dentes apresentavam dentina de cor castanha e 62,5% (n=5) deles apresentavam dentes de cor marrom escuro (Tabela 1). Teste do qui-quadrado: p=0,064 – Não há associação entre a coloração da dentina afetada e o momento de avaliação (teste do qui-quadrado, p=0,064).

A avaliação da associação entre a coloração da dentina afetada e o momento de avaliação foi realizada por meio do teste do qui-quadrado, utilizando-se o software SigmaStat, versão 3.5, considerando um nível de significância de 5%.

Quanto à consistência inicial da dentina, (n=8), 75,0% (n=6) desses dentes apresentavam dentina de consistência mole, enquanto 25% (n=2) apresentavam dentina de consistência dura. Já em relação à consistência final da dentina, após 30 dias, no momento da reabertura dos dentes, (n=8), todos (100,0%) deles apresentavam dentina de consistência dura (Tabela 2). Teste exato de Fisher: p=0,007 – Há associação entre a consistência da dentina afetada e o momento de avaliação (teste do qui-quadrado, p=0,007). A avaliação da associação entre a consistência da dentina afetada e o momento de avaliação foi realizada por meio do teste exato de Fisher, utilizando-se o software SigmaStat, versão 3.5, considerando um nível de significância de 5%.

Em relação à condição inicial da dentina quanto à umidade, (n=8), 25,0% (n=2) desses dentes apresentavam dentina seca e 75% (n=6) deles apresentavam dentina úmida. Já em relaçãoà condição final da dentina quanto à umidade, (n=8) todos (100,0%) apresentavam dentina seca (Tabela 3).Teste exato de Fisher: p=0,007 – Há associação entre a umidade da dentina afetada e o momento de avaliação (teste do qui-quadrado, p=0,007). A avaliação da associação entre a umidade da dentina afetada e o momento de avaliação foi realizada por meio do teste exato de Fisher, utilizando-se o software SigmaStat, versão 3.5, considerando um nível de significância de 5%.

Grupo Controle e Experimental (G1 e G2)

• Condição das restaurações

A avaliação clínica de ambos os grupos, puderam observar os resultados referentes à condição das restaurações após seis meses e 12 meses, e estão apresentados na tabela 4.

Em relação à condição das restaurações após seis meses, entre os dentes do Grupo Controle (n=8), 75% (n=6) deles apresentavam restauração intacta, enquanto que 25,0% (n=2) deles apresentavam perda parcial da restauração. Já entre os dentes do Grupo Experimental (n=5), 40% (n=2) deles apresentavam restauração intacta, um deles (20,0%) apresentava perda parcial da restauração e 40,0% (n=2) deles apresentavam perda total da restauração. Não houve associação entre o Grupo Experimental e Grupo Controle à condição da restauração dos dentes dos pacientes, após seis meses (teste do qui-quadrado, p=0,146).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Já em relação à condição das restaurações após doze meses, entre os dentes do Grupo Controle (n=8), 75,0% (n=6) deles apresentavam restauração intacta, um (12,5%) deles apresentava perda parcial da restauração e outro (12,5%) deles apresentava perda total da restauração. Por outro lado, entre os dentes do Grupo Experimental (n=5), 60,0% (n=3) deles apresentavam restauração intacta e 40,0% (n=2) deles apresentavam perda parcial da restauração. Com doze meses, também não houve associação entre o Grupo Experimental e Grupo Controle às condições da restauração dos dentes dos pacientes (teste do qui-quadrado, p=0,420). Estes resultados estão ilustrados na Tabela 4.

Ressalta-se que, durante o período do estudo, foi realizado reparos nas restaurações.

• Condição do tecido Periodontal

Os critérios clínicos para avaliação do tecido periodontal foi de ausência de fístula, mobilidade patológica (devido idade dos pacientes), edema e sensibilidade dolorosa. Os resultados mostraram, em 12 meses de acompanhamento, ausência de qualquer alteração no tecido periodontal em ambos os grupos.

 

AVALIAÇÃO RADIOGRÁFICA

Os resultados mostraram que nenhum dos pacientes avaliados neste estudo, independente do grupo a que pertenciam (Controle ou Experimental) e do tempo de análise (30 dias, 06 meses e 12 meses), apresentou alteração ao exame radiográfico como lesões radiolúcidas ou reabsorções interna/externa, identificando qualquer impedimento para prosseguimento no estudo.

 

DISCUSSÃO

Com o pensamento voltado para um tratamento mais conservador surgiu o tratamento pulpar indireto3 que pode ser realizado em sessão única4,6,10,11,12,13 ou em duas sessões3,14,15,16,17,18,19 que preconiza a manutenção da vitalidade pulpar, com a remoção seletiva do tecido cariado, pois se o tecido cariado for completamente removido poderá levarà exposição pulpar.

A dentição decídua apresenta características próprias que devem ser levadas em consideração. Devido às menores dimensões da camada de esmalte e dentina em relação ao dente permanente, os riscos de exposições pulpares são aumentados20.

Estudos têm demonstrado5,14 que a remoção total do tecido cariado não garante a completa eliminação dos microrganismos após a escavação, sugerindo que a persistência de bactérias não parece ser uma razão para a reabertura das cavidades nos dentes decíduos após remoção seletiva de cárie17,21. As bactérias permanecem viáveis mesmo quando o tecido amolecido é removido e que não há provas substanciais que se torne necessária a remoção de toda dentina cariada das lesões profundas de cárie para o sucesso do tratamento7,22,23,24.

O sucesso do tratamento pulpar indireto está diretamente relacionado ao bom diagnóstico clínico e radiográfico do dente25. Mudanças importantes foram encontradas em relação à coloração e consistência da dentina neste estudo, concordando com diversos autores9,26,27,28,29que observaram a dentina afetada no momento da reabertura com coloração enegrecida, consistência endurecida e aspecto seco sugerindo sua remineralização, independente do material utilizado como forrador, evidenciando a importância do bom vedamento da cavidade e não do material restaurador. Clinicamente cor e a consistência da dentina afetada mostraram-se um instrumento confiável, tanto para limitar a remoção de dentina cariada em técnicas conservadoras como para avaliar o sucesso da técnica em casos de duas sessões de tratamento14,16,17,19,18,27,28, como realizado neste estudo.

Estudos in vivo e in vitro demonstraram um aumento do conteúdo mineral em lesões de dentina adjacentes e/ou subjacente à restaurações de cimento de ionômero de vidro9, sugerindo uma significativa remineralização potencial exercida por esses materiais. Materiais como o hidróxido de cálcio, óxido de zinco eugenol, cimento de ionômero de vidro e o sistema adesivo vêm sendo utilizados para como material forrador no tratamento pulpar indireto sobre a dentina afetada11,14,16,28. O material mais citado na literatura como forrador do complexo dentino pulpar foi o cimento de hidróxido de cálcio3,13,16,17,18,27,28,29, como utilizado neste trabalho. A técnica tradicional usa uma proteção de hidróxido de cálcio (bacteriostático/ bactericida) sobre dentina cariada para induzir a inativação da lesão e proteger a polpa17. O adesivo dentinário vem sendo utilizado sobre o remanescente cariado e tem demonstrado sucesso por não afetar a longevidade da restauração11,13.

O bom vedamento da cavidade é fundamental para esta opção de tratamento13,18,28. Nesse trabalho optou-se pela utilização do cimento de ionômero de vidro convencional. No entanto, o cimento de ionômero de vidro não possui resistência suficiente para suportar traumas mastigatórios, fato este que pode justificar a fratura e até mesmo a perda do material restaurador, observado neste estudo.

O cimento de ionômero de vidro modificado por resina pode ser mais durável e resistente que o convencional (a tolerância da polpa é similar ao cimento convencional), mas requer utilização de anestesia e isolamento absoluto. Entretanto, estudos têm utilizado materiais adesivos11,28 encontrando tanto adesão, (independente da quantidade de dentina afetada sobre a parede pulpar) quanto maior resistência e durabilidade das restaurações.

A avaliação radiográfica em todos os momentos do estudo é de fundamental importância. As tomadas radiográficas subsequentes foram realizadas no intuito de averiguação das condições indicativas de ausência de patologia pulpar e radicular. Os resultados clínicos e radiográficos mostraram, nesse período de estudo, que não se torna necessária a remoção total do tecido cariado, sendo contraindicado a reabertura dos dentes tratados por meio do tratamento pulpar indireto.

Existem algumas dificuldades para realização dos trabalhos com lesões profundas de cárie18, como por exemplo a falta de padrões claramente explicitados sobre os métodos utilizados para definição de lesão de cárie profunda. Neste estudo, a lesão de cárie foi considerada profunda de acordo com avaliação conjunta clínica e radiográfica, ou seja, lesão de cárie ocluso-proximal atingindo o 3/3 terço da dentina interna cariada.

Outra dificuldade encontrada é sobre a quantidade de tecido cariado que deve ser removida. A remoção seletiva do tecido cariado, realizada neste estudo, onde foi removido da parede pulpar, com auxílio de colheres de dentina, todo o tecido cariado infectado e necrótico, composto por dentina amolecida e desorganizada, sendo deixada nessa parede apenas a dentina mais resistente à remoção. A remoção foi cessada quando houve resistência do instrumental sobre a dentina ou sensibilidade dolorosa, observando uma área mais rígida e uma dentina com aspecto de lascas, que se houvesse persistência na escavação, poderia levar a uma exposição pulpar. Nas paredes circundantes, remoção completa da dentina cariada, com auxílio de brocas esféricas de baixa rotação em toda região de esmalte e junção amelodentinária8,14. A remoção do tecido cariado das paredes circundantes e da junção amelodentinária é proposta para aumentar a adesão do material restaurador eleito9,13.

Pesquisadores discutem a necessidade da reabertura da cavidade7,21,28, pois a progressão do processo de cárie ocorre devido à atividade do biofilme. A reentrada na cavidade para remoção do remanescente cariado é questionada por diversos autores11,13,18,21,27,28 que demonstraram ser a presença de um bom vedamento da cavidade o responsável pela paralisação da lesão de cárie. Portanto, pode ser realizada em sessão única e é dependente de um diagnóstico clínico e radiográfico criterioso, diminuindo o tempo de atendimento deste paciente, e o custo do tratamento e evitando exposições pulpares causando prejuízos à polpa7,22.

 

CONCLUSÃO

Diante dos resultados encontrados é lícito concluir que a remoção do remanescente cariado após o tratamento expectante, não melhorou o desempenho clínico e radiográfico das restaurações ionoméricas, quando comparado com o capeamento pulpar indireto, em molares decíduos por um período de 12 meses de acompanhamento.

 

APLICAÇÃO CLÍNICA

• Procedimento realizado em apenas uma sessão, diminuindo assim, os custos para o consultório.

• Para o paciente, diminui a quantidade de consultas, tendo em vista que o paciente que possui lesão profunda de cárie, não tem apenas um dente a ser tratado.

 

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Autor para correspondência:
Gláucia Tápias Nardão Mosele
Rua 25 de Dezembro, 1258
Rosa - Campo Grande – MS
79010-220
BRASIL

e-mail: glautn@hotmail.com

Recebido em: dez/2011
Aprovado em: abr/2012