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Revista da Associacao Paulista de Cirurgioes Dentistas
versão impressa ISSN 0004-5276
Rev. Assoc. Paul. Cir. Dent. vol.66 no.3 Sao Paulo Jul./Set. 2012
RELATO DE CASO CLÍNICO
Tomografia computadorizada de feixe cônico em implantodontia oral: Relato de série de casos
Cone-beam computed tomography in oral implantology: Case series report
Alexandre Simões NogueiraI; Bruna Stuchi CenturionII; Ana Paula FernandesIII; Adelina da Conceição MendesIV; Lyzete Berriel CardosoV; Ana Lúcia Álvares CapelozzaVI
IMestre em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (CTBMF) - Doutorando em Estomatologia na Faculdade de Odontologia de Bauru - Universidade de São Paulo (FOB/USP) – Brasil
IIMestre em Estomatologia - Doutoranda em Estomatologia na FOB/USP - Brasil
IIIMestre em Odontopediatria - Doutoranda em Odontopediatria na FOB/USP – Brasil
IVGraduação em Odontologia - Mestranda em Periodontia na FOB/USP – Brasil
VMestre em Biologia oral - Doutoranda em Estomatologia na FOB/USP – Brasil
VILivre docente em Estomatologia - Professora do Departamento de Estomatologia da FOB/USP - Brasil
RESUMO
A tomografia computadorizada de feixe cônico (TCFC) é uma ferramenta de diagnóstico por imagem com crescente utilização na Odontologia principalmente na implantodontia oral. Nessa especialidade, a sua utilização proporciona um melhor planejamento visto que medidas mais precisas de altura, largura, espessura e qualidade óssea podem ser obtidas. Além disso, as relações entre os potenciais sítios para instalação de implantes osseointegrados e estruturas anatômicas nobres, especialmente seio maxilar, fossa nasal, forame mentual e canal mandibular, podem ser avaliadas com mais fidelidade. O objetivo deste trabalho foi apresentar uma série de casos onde a TCFC foi utilizada em pacientes submetidos à cirurgia de colocação de implantes osseointegrados. Em dois casos mostrou-se fundamental na determinação pré-operatória das dimensões dos implantes a serem instalados e escolha dos respectivos sítios anatômicos. Nos outros dois casos a TCFC apresentou-se relevante na resolução de complicações advindas da instalação de implantes que foram planejados com base apenas em exames convencionais (radiografias panorâmicas), situações em que houve deslocamentos acidentais para o interior do seio maxilar e do canal mandibular. Com base na série de casos relatados e na literatura consultada conclui-se que a TCFC é um exame de extrema importância na reabilitação oral através de implantes osseointegrados, desde o planejamento, prevenção de acidentes e resolução de eventuais complicações.
Descritores: diagnóstico por imagem; tomografia computadorizada de feixe cônico; implante dentário
ABSTRACT
The cone beam computed tomography (CBCT) is a diagnostic imaging tool recently introduced in dentistry. In oral implantology its use provides a better planning as more precise measurements of height, width, thickness and bone quality can be obtained. In addition, the relationships among potential sites for implant placement and noble anatomic structures, especially the maxillary sinus, nasal cavity, the mental foramen and mandibular canal can be evaluated with more fidelity. The objective of this study was to present a series of cases in which the CBCT was used in patients submitted to implant placement surgery. In two cases the CBCT proved to be important in determining the preoperative dimensions of the implants and choose their anatomical sites. In the other two cases CBCT showed to be relevant to resolve the complications due to the implant installation that were planned based only in conventional exams (panoramic radiograph), in these situations there were accidental implant displacement for inside the maxillary sinus and mandibular canal. Based on these report of a series of cases and in the literature used, it is concluded that CBCT is an exam extremely important in oral rehabilitation with implants, from planning, accident preventions and resolution of any complications.
Descriptors: diagnostic imaging; cone-beam computed tomography; dental implants
RELEVÂNCIA CLÍNICA
A tomografia computadorizada de feixe cônico é considerada o método de diagnóstico por imagem mais preciso para o planejamento em implantodontia oral. O seu conhecimento proporciona maiores chances de sucesso ao procedimento e minimiza a possibilidade de erros.
INTRODUÇÃO
A tomografia computadorizada de feixe cônico (TCFC) é um método utilizado para produzir um volume de imagens de forma mais rápida e fácil em comparação à tomografia convencional, voltado especificamente para produção de imagens direcionadasà região bucomaxilofacial. Desde 2000, esta tecnologia passou a ser comercializada nos EUA e uma vez disponibilizada tem se expandido rapidamente, principalmente no meio odontológico1.
Oferece imagens nítidas de estruturas altamente contrastadas e é bastante útil na avaliação de estrutura óssea. Em relação à tomografia convencional apresenta as seguintes vantagens: direcionamento dos raios X para a área desejada; imagens mais precisas são obtidas; redução da dose de radiação; rápido tempo de varredura, com redução de artefatos devido a movimentos do paciente, redução de artefatos de metal e exibição de imagens maxilofaciais de modo único, permitindo avaliações em computadores pessoais com a disponibilização de softwares para o Cirurgião-Dentista2,3.
O exame permite a reformatação das imagens nos planos axial, sagital e coronal, além da possibilidade de reformatações parassagitais, panorâmica, e em três dimensões (3D). As indicações mais comuns de uso são: avaliação dos maxilares para colocação de implantes, exame de dentes e estruturas faciais para planejamento em ortodontia, avaliação das ATMs em relação às alterações degenerativas, na mensuração da proximidade de terceiros molares com o canal mandibular previamente às exodontias, no exame de fraturas dentárias e lesões periapicais e avaliação óssea em relação à infecção, cistos e tumores. Um grande desafio é identificar quais pacientes precisam de TCFC e quais precisam de exames convencionais2,4.
A principal indicação para a realização da TCFC é para o planejamento de implantes orais, totalizando cerca de 2/3 das indicações na odontologia5,6. Recente revisão sistemática mostrou a aplicação clínica da TCFC em implantodontia no planejamento dos casos e na confecção de guia cirúrgico, além da utilização trans-operatória em enxertos ósseos7.
A TCFC não é indicada em todos os pacientes e o seu uso inadequado pode expor desnecessariamente os pacientes a maiores doses de radiação em comparação às radiografias convencionais, tais como a panorâmica2. A sua indicação é válida quando os benefícios ou justificativas para a realização do exame forem maiores do que os riscos em relação à alta dose de radiação4.Apesar do grande impacto da introdução desta tecnologia, não implica que o método deva ser o de primeira escolha na prática odontológica.É fundamental que o princípio ALARA - o mais baixo nível de exposição à radiação que puder ser conseguido para pacientes, profissionais e o meio ambiente - seja o referencial a nortear a tomada de decisões em relação ao método de diagnóstico por imagem a ser prescrito8,9,10. Constantes estudos sobre TCFC continuam a ser realizados objetivando cada vez mais a redução da dose de radiação sem detrimento da qualidade do exame11.
Apesar da elevada taxa de sucesso relacionada aos implantes osseointegrados, inevitavelmente, fracassos podem ocorrer. Falta de estabilidade inicial, trauma cirúrgico, contaminação trans-operatória e sobrecarga oclusal parecem ser as causas mais importantes dos insucessos12. Acidentes hemorrágicos, lesões a nervos, fraturas mandibulares secundárias à colocação de implantes, posicionamento incorreto dos implantes e mesmo falta de paralelismo com dentes adjacente e possíveis lesões destes, ausência de estabilidade primária devido ao preparo inadequado na colocação dos implantes ou mesmo devido à baixa qualidade óssea, além da migração de implantes no interior do seio maxilar, também foram citados13.
Em relação ao diagnóstico por imagens, quando uma eficaz verificação pré-operatória dos sítios para colocação de implantes não é realizada potenciais complicações podem ocorrer14.
O objetivo deste trabalho é mostrar a importância da TCFC no planejamento da fase cirúrgica de colocação de implantes orais e a consequente minimização de complicações, assim como o seu emprego diante de complicações já ocorridas. Quatro casos clínicos serão apresentados e discutidos, com ênfase aos aspectos imaginológicos.
RELATO DE SÉRIE DE CASOS CLÍNICOS
Caso 1
Paciente do gênero masculino, 80 anos de idade, procurou atendimento odontológico para reabilitação protética bimaxilar. A maxila foi reabilitada através de prótese total convencional visto que havia condição local satisfatória. Na mandíbula foi programada reabilitação através de implantes osseointegrados. Na reformatação panorâmica da TCFC da mandíbula, é possível se visualizar a altura óssea na região anterior, canal mandibular e forames mentuais, além de defeito ósseo no lado esquerdo (Figura 1A). Optou-se pela colocação de dois implantes para reabilitação protética com overdenture. As áreas correspondentes às marcações 100 e 115 foram escolhidas e reformatações parasagitais foram obtidas na TCFC. Considerando as condições anatômicas dos sítios escolhidos, programou-se a colocação de implantes com dimensões 13mm x 3,75mm, o que proporcionava presença de estrutura óssea em volta de todas as faces dos implantes (>1mm de osso) e cuidados inerentes à anatomia mandibular, especialmente a cortical lingual, evitando-se a sua perfuração (Figuras 1B e 1D). Na escolha dos referidos locais também se levou em consideração a adequada distância entre os implantes e os forames mentuais, além de evitar a área do defeito ósseo existente no lado esquerdo, o que pode ser visto na figura 1C. A radiografia panorâmica de controle após dois anos da cirurgia mostra o posicionamento dos implantes (Figura 1E), o qual se baseou no planejamento proporcionado pela TCFC.
Caso 2
Paciente do gênero feminino, 58 anos de idade, procurou atendimento odontológico para reabilitação protética. Após avaliação clínica inicial e obtenção de radiografia panorâmica optou-se, em comum acordo com a paciente, pela colocação de implantes na maxila e mandíbula. Os dentes inferiores apresentavam avançados problemas periodontais. Na reformatação panorâmica da TCFC é possível se visualizar a reduzida altura de tecido ósseo na maxila, especialmente nas regiões posteriores. Na mandíbula, apesar da mobilidade avançada dos dentes remanescentes, além de lesão apical associada ao dente 43, havia satisfatória altura óssea na região ântero-inferior (Figura 1A). Para exemplificar a avaliação da espessura óssea existente na maxila, reformatações parasagitais são apresentadas. Na altura correspondente à marcação 66, região posterior direita da maxila, observa-se apenas 3,22 mm de altura óssea, incompatível com a colocação de implantes sem o uso de técnicas reconstrutivas (Figura 2B). Na região correspondente à marcação 82, região de pilar canino do lado direito, observa-se 9,21 mm de altura óssea. Observa-se que a espessura de 2,40 mm refere-se apenas à crista do rebordo, sendo evidente maior espessura nas áreas mais apicais (Figura 2C). A maxila foi completamente avaliada com a obtenção de outras reformatações parasagitais e diante dos achados optou-se pela colocação de 3 implantes na região ântero-superior, dois deles na altura correspondente aos pilares caninos, de 9 mm x 3,75 mm, e outro colocado na região do forame incisivo, o qual teve o conteúdo vásculo-nervoso esvaziado durante a cirurgia. Nesta região o implante foi de 10 mm x 4 mm e ancoragem nas proximidades da espinha nasal anterior. Para proporcionar condições de reabilitação protética, dois implantes zigomáticos foram fixados nos ossos zigomáticos. Na mandíbula, por orientação das medidas obtidas na TCFC, optou-se pelo uso de 4 implantes imediatos (colocados logo após as exodontias) de 10 mm x 4 mm, respeitando-se as distâncias em relação aos forames mentuais e evitando-se a área de lesão periapical previamente existente (Figura 2D).
Digno de nota é a observação da presença de área hiperdensa na TCFC (Figura 1A) e radiopaca na radiografia panorâmica (Figura 1D), compatíveis com cálculo salivar (sialólito) na glândula submandibular direita. A paciente referiu saber deste achado há muitos anos. Devido ao caráter assintomático, foi sugerido controle clínico e radiográfico desta condição.
Caso 3
Paciente do gênero feminino, 49 anos de idade, realizou tratamento odontológico com implantes osseointegrados. Na região posterior esquerda da maxila foram colocados 3 implantes. Na segunda fase cirúrgica o profissional relatou que na tentativa de colocação dos cicatrizadores, o implante localizado mais posteriormente deslocou-se para o interior do seio maxilar. Para melhor análise foi obtida a TCFC. Na reformatação panorâmica é possível observar a presença de estrutura hiperdensa, compatível com implante dentário, no interior do seio maxilar esquerdo, que se apresentava com velamento (densidade aumentada) em comparação ao seio maxilar contra-lateral, sugestivo de sinusite maxilar. Também é visível a pouca altura óssea existente na região posterior da maxila, região onde estavam posicionados os demais implantes (Figura 3A). As reformatações parassagitais obtidas nas regiões correspondentes às marcações 89/90 (Figura 3B) e 97/98 (Figura 3C) mostram os implantes dentários localizados parcialmente no interior do seio maxilar. Nas marcações 107 e 108 (Figura 3D), é possível a visualização do implante deslocado no interior do seio maxilar, em posição transversal. Em todas as reformatações se visualiza alteração da densidade intra-sinusal, característico de sinusite maxilar. Após a retirada cirúrgica do implante deslocado, nova reabilitação foi programada.
Caso 4
Paciente do gênero feminino, 74 anos de idade, realizou tratamento odontológico com implantes dentários. Dois implantes foram colocados nas regiões correspondentes aos dentes 37 e 36. O profissional relatou que na colocação do implante mais posterior o mesmo "caiu no vazio" durante a instalação, não sendo possível a sua visualização e retirada. Para melhor análise foi obtida a TCFC. Na reformatação panorâmica foi possível visualizar o implante mais anterior em posição adequada, enquanto o implante posterior encontrava-se em posição horizontal na região correspondente ao canal mandibular (Figura 4A). Foram obtidas reformatações parassagitais. Na região correspondente à marcação 46, área posterior direita da mandíbula, um potencial sítio para colocação de implantes, observa-se largura (7,04 mm) e altura (9,62 mm) satisfatórias (Figura 4B). Na marcação 125 observa-se o posicionamento adequado do implante instalado (Figura 4C). Nas marcações 135/136 se visualiza o implante colocado acidentalmente na região do canal mandibular. A paciente optou em não realizar cirurgia adicional para retirada do implante deslocado, apesar do déficit de sensibilidade.
DISCUSSÃO
Reabilitação oral através da utilização de implantes osseointegrados é uma realidade na Odontologia moderna e muito dos avanços nesta área do conhecimento deve-se ao aprimoramento dos métodos de diagnóstico por imagem. Casos mais simples de implantes unitários colocados em áreas que apresentam adequada estrutura óssea em pacientes jovens ou casos mais complexos de reabilitações extensas que envolvem a colocação de múltiplos implantes em pacientes de idades mais avançadas, geralmente com pouca qualidade e quantidade óssea devem ser igualmente valorizados do ponto de vista de planejamento. A simples mensuração do tecido ósseo presente através de exames por imagens não será útil se a determinação dos locais para colocação dos implantes não estiver associada ao planejamento da reabilitação protética.
Uma completa compreensão da anatomia fornece ao cirurgião mais confiança para restaurar a forma, função, estética e saúde de seus pacientes reabilitados através de implantes dentários. O conhecimento das variações anatômicas melhora a avaliação do paciente e proporciona a realização de cirurgias mais precisas15. Nos quatro casos apresentados neste trabalho os exames por imagens mostram estruturas ósseas comprometidas e/ou sítios preferenciais para colocação de implantes próximos a estruturas anatômicas nobres, fundamentando a necessidade de criterioso planejamento previamente à realização da etapa cirúrgica da reabilitação dos pacientes.
A avaliação do local para colocação de implantes é tarefa desafiadora. Além da avaliação clínica, o diagnóstico por imagens oferece o único método não invasivo de análise dos locais mais indicados16. Pesquisa realizada no Brasil mostrou que apenas 1,4% dos Cirurgiões-Dentistas levam em consideração a dose de radiação para determinar o tipo de exame radiográfico a ser solicitado e 63,8% solicitam apenas radiografia panorâmica no planejamento de implantes, baseando-seno custo e abrangência do exame. Apesar de proporcionar visão das estruturas da maxila e mandíbula em uma mesma imagem, a ampliação das estruturas e ausência de informações em cortes transversais são as principais desvantagens relacionadas ao planejamento em implantodontia17. Dentre os casos relatados no presente trabalho, aqueles onde houve insucesso, a radiografia panorâmica era o único exame por imagem disponível no pré-operatório. Por se tratar de casos considerados limítrofes em relação à possibilidade de colocação de implantes, a utilização de exames que proporcionassem visão mais fiel e detalhada em altura, largura e espessura óssea, além da qualidade do tecido presente, provavelmente minimizaria o risco relativo às complicações observadas. Ressalta-se que exames por imagem mais fidedignos, isoladamente, não representam garantia de sucesso e muito menos dispensam a necessidade de criteriosa avaliação clínica de todos os pacientes.
Para uma completa avaliação através de exames imaginológicos, vários objetivos devem ser alcançados e incluem a análise das estruturas anatômicas normais e áreas vizinhas para colocação dos implantes, detecção de patologias, estimativa da quantidade e qualidade óssea e determinação dos caminhos possíveis para inserção dos implantes pela indicação da angulação do rebordo alveolar16. No relato do caso 1 a inserção dos implantes na mandíbula obedeceu ao limite imposto pela angulação do rebordo alveolar, nitidamente perceptível nas reformatações parassagitais da TCFC. Caso somente uma radiografia panorâmica fosse considerada ou mesmo uma imagem panorâmica reformatada (Figura 1A), em tese, haveria mais altura disponível para o aprofundamento da inserção dos implantes ou mesmo a utilização de implantes mais longos, o que seria ideal do ponto de vista de futuro suporte de carga mastigatória caso houvesse osso disponível.
Ainda sobre o caso 1, uma eventual perfuração da cortical lingual representaria inserção inadequada dos implantes e poderia gerar sérias complicações ao paciente. Dois casos de hemorragia na região do assoalho bucal após a instalação de implantes dentários na região ântero-inferior, entre os forames mentuais, foram relatados18. Em um deles, nada de anormal foi observado durante a cirurgia, porém após seis horas o paciente retornou apresentando déficit respiratório e dificuldade de deglutição devido ao extenso hematoma no assoalho bucal, com severo edema e dor no local. A língua encontrava-se projetada em direção ao palato. Entre outros cuidados transoperatórios, os autores ressaltaram a importância da tomografia computadorizada na avaliação pré-operatória da conformação anatômica do rebordo alveolar. Citam que a causa das complicações foi a perfuração da cortical lingual e a consequente transecção ou laceração da artéria sub-lingual ou ramos da mesma. A importância da tomografia computadorizada na identificação de vasos sanguíneos intraósseos localizados na região entre os forames mentuais e sua correlação com a vascularização localizada no assoalho bucal como forma de prevenção de episódios hemorrágicos em cirurgias de colocação de implantes dentários foi anteriormente demonstrada19.
Em relação à instalação de implantes na região superior ao canal mandibular, existe a possibilidade de sua perfuração, sendo recomendando o uso de dispositivos de medida da profundidade na instalação de implantes. Diminuição de resistência não necessariamente significa a perfuração do canal mandibular, mas pode ocorrer devido à característica mais esponjosa do osso à medida que se aprofunda a perfuração. Muitas das deficiências das radiografias bidimensionais podem ser eliminadas com o uso de métodos que forneçam imagens em três dimensões. A verificação prévia da altura óssea disponível é necessária previamente à instalação de implantes nessa região, recomendando-se a utilização de tomografia computadorizada, pois é mais precisa em relação às radiografias periapical e panorâmica20. No caso 4 relatado no presente trabalho houve a penetração acidental do implante no canal mandibular. Melhor definição prévia da altura óssea disponível entre a crista do rebordo e o canal mandibular certamente minimizaria o risco desta complicação e nestas situações deve-se considerar que a radiografia panorâmica tem uma ampliação variável entre 10% e 30%, sendo variável em diversas áreas na mesma radiografia15. Em casos limítrofes, a TCFC é a opção indicada.
Comparativamente, a TCFC também mostrou ser um método mais vantajoso em relação à radiografia panorâmica para avaliação óssea na região entre os forames mentuais para instalação de implantes dentários21. Além de proporcionar a realização do planejamento virtual de instalação de implantes dentários, possibilita ainda a confecção de guias cirúrgicos e a realização de cirurgias minimamente invasivas sem elevação de retalhos, além do respeito às estruturas anatômicas consideradas nobres22.
Casos de deslocamento acidental de implantes dentários para o interior do seio maxilar durante o procedimento de instalação foram anteriormente descritos23,24,25,26, além de um paralelômetro, instrumento utilizado durante as cirurgias para mensurar a inclinação dos implantes27. A região posterior da maxila é considerada crítica para colocação de implantes devido à característica esponjosa do tecido ósseo, especialmente se a altura óssea for reduzida e as dimensões do seio maxilares aumentadas, situação bastante comum devido à combinação de rebordo alveolar reabsorvido e pneumatização do seio maxilar. Nestas situações a utilização apenas de exames imaginológicos convencionais pode ser temerosa, com significativo risco de complicações relacionadas ao seio maxilar. No caso 3 descrito no presente trabalho, a instalação dos três implantes baseou-se em radiografia panorâmica e ocorreu em uma área de pouca altura óssea. A TCFC obtida em um segundo momento mostrou que dois implantes foram colocados parcialmente no interior do seio maxilar, fato que poderia comprometer a sua estabilidade e consequente requisição funcional. O implante mais posterior foi introduzido no seio maxilar em uma segunda fase cirúrgica, mais precisamente na colocação do cicatrizador, ocasião em que as forças utilizadas são mínimas. A complicação observada denota que o implante encontrava-se sem osseointegração, o que proporcionou o seu deslocamento, além de causar sinusite maxilar devido à presença do corpo estranho.
Entre outras vantagens da tomografia computadorizada relacionadas aos implantes dentários está a obtenção de protótipos associados a guias cirúrgicos. Esta ferramenta permite ao profissional obter um modelo semelhante ao que encontrará na cirurgia propriamente dita. O guia cirúrgico é levado à cirurgia e fixado às estruturas ósseas, minimizando a possibilidade de erros durante a colocação dos implantes, o que reduz o tempo cirúrgico e aumenta a previsibilidade8,22,28.
Baseando-se nos casos relatados e na discussão realizada, ressaltamos a importância da TCFC no planejamento das reabilitações orais através de implantes dentários e na minimização de complicações. Também é útil no manejo de complicações já ocorridas, conforme demonstrado nos casos 3 e 4. Porém, advertimos que constitui apenas um dentre os vários fatores a contribuir para o sucesso ou insucesso das reabilitações. Planejamentos integrados que visem não somente a colocação de implantes mas, sobretudo, a perspectiva de reabilitação protética se fazem necessários, devolvendo aos pacientes estética e função. O bom senso, experiência e formação do profissional e criteriosa análise clínica jamais poderão ficar em segundo plano, representando o passo inicial para a busca por tratamentos de excelência.
CONCLUSÃO
Tomando-se por base a série de casos relatados e a literatura consultada conclui-se que a TCFC é um método de diagnóstico por imagens fundamental para o planejamento de reabilitações protéticas através de implantes osseointegrados. Através da determinação da altura, largura e espessura óssea permite selecionar as dimensões do implante a ser instalado, assim como o sítio anatômico mais adequado, minimizando o risco de acidentes, conforme demonstrado nos dois primeiros casos descritos. Além disso, a TCFC proporciona o diagnóstico preciso de complicações advindas da instalação inadequada de implantes baseada apenas em exames bidimensionais, além de representar ferramenta essencial na sua resolução, conforme demonstrado nos dois outros casos de deslocamento acidental dos implantes para o seio maxilar e canal mandibular.
APLICAÇÕES CLÍNICAS
Com esse trabalho conclui-se que o uso da tomografia computadorizada de feixe cônico na implantodontia oral é muito importante e em muitos casos imprescindível, pois a correta localização das estruturas no pré e pós-operatório são demonstrados com segurança por esse exame de imagem.
O Cirurgião-Dentista com o uso dessa nova modalidade de exame tridimensional deve ter o conhecimento de sua aplicação clínica, e, portanto a correta indicação e a realização do exame de TCFC que é facilitar o diagnóstico e planejamento dos casos clínicos, proporcionando como consequência um maior conforto ao paciente e minimizando a possibilidade de erros.
Os exames radiográficos são exames complementares, porém para o planejamento de implantes são fundamentais. A partir desse trabalho com a demonstração dos casos de complicações, conclui-se que atualmente a TCFC, é o exame mais indicado para essa especialidade odontológica.
AGRADECIMENTOS
Aos Protesistas Henrique Casseli e Cássio Pontes pela resolução protética dos casos 1 e 2, respectivamente, e ao Cirurgião Bucomaxilofacial Rodrygo Tavares pela cessão do caso 3.
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Autor para correspondência:
Bruna Stuchi Centurion
Depto. de Estomatologia
Al. Octávio Pinheiro Brisola, 9-75
Bauru - SP
17012-901
Brasil
e-mail: brcenturion@usp.br
Recebido em: mar/2012
Aprovado em: jun/2012