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Revista da Associacao Paulista de Cirurgioes Dentistas

versão impressa ISSN 0004-5276

Rev. Assoc. Paul. Cir. Dent. vol.67 no.1 Sao Paulo Jan./Mar. 2013

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Verificação do grau de severidade estética em perdas dentárias anteriores superiores

 

Assessment of aesthetic impairment severity in cases of upper front teeth loss

 

 

Carolina Burni VerçosaI; Cristiane Escudeiro SantosII; Carlos Alberto Kenji ShimokawaIII; Glauco Fioranelli VieiraIV; Rodolfo Francisco Haltenhoff MelaniV

IDoutoranda em Odontologia Legal - Departamento de Odontologia Social da FOUSP
IIDoutoranda em Odontologia Legal - Departamento de Odontologia Social da FOUSP
IIIMestrando em Dentística - Departamento de Dentística da FOUSP
IVProfessor Doutor - Departamento de Dentística da FOUSP
VLivre Docente - Professor responsável pela disciplina de Odontologia Legal da FOUSP

Autor para correspondência

 

 


RESUMO

A análise das perdas dentárias tem merecido atenção, visto que não há uniformidade de critérios para aplicação das metodologias vigentes de avaliação. Este trabalho objetiva analisar as diretrizes para a avaliação do dano estético relacionado à perda dentária anterior superior, investigando como os médicos e dentistas a avaliam. Foram investigados o grau de gravidade de perdas dentárias anteriores superiores - um, dois, três, quatro, cinco, seis dentes, dois e três dentes alternados, e a avaliação da gravidade do dano entre as áreas profissionais. Foi realizado levantamento de dados mediante aplicação de um protocolo composto por oito fotografias de um mesmo indivíduo, manipuladas pelo programa Photoshop CS3, 2007, que simulam perdas dentárias anteriores superiores de diferentes extensões. A amostra investigada avaliou estes danos de acordo com a escala francesa, que compreende sete graus: muito leve ou insignificante, leve, moderado, médio, suficientemente importante, importante e muito importante. Foram entrevistados 30 médicos e 30 dentistas. Verificou-se que, pela metodologia europeia de avaliação do dano estético, mais da metade do total de atribuições de grau de severidade entre todos os grupos de sequelas odontológicas apresentadas foram situadas entre os graus 6 (25%) e 7 (53%) numa escala de sete graus de gravidade crescente. Apesar do conceito de dano estético ter sido semelhante entre as áreas médica e odontológica, foi demonstrada ausência de parâmetros para aplicação da metodologia apresentada, tendo em vista que, para os diferentes prejuízos gerados pelos diferentes danos, a percepção estética foi alta.

Descritores: Odontologia Legal; Estética Dentária; Perda de Dente


ABSTRACT

The analysis of tooth loss has deserved attention, since there is no uniform criteria for their evaluation. This paper aims to analyze the guidelines for the evaluation of aesthetic damages related to upper front tooth loss, investigating how doctors and dentists evaluate tooth loss. Therefore, the following aspects were investigated: The degree of severity of upper front tooth loss - one, two, three, four, five, six teeth, two and three alternate teeth- and evaluate the severity of aesthetic damage related to tooth loss between the professional areas. The data collection was conducted by applying a protocol composed of eight photographs of the same individual, handled by the program Photoshop CS3, 2007, which simulate upper front tooth loss in different extensions (one, two, three, four, five, six teeth, two and three alternate teeth). The investigated sample evaluated these damages according to the French scale, which comprises seven degrees: very slight or insignificant, mild, moderate, medium, sufficiently important, important and very important. 30 doctors and 30dentists were interviewed. It was found that by the European method for evaluating the aesthetic damage more than half of all assignments severity among all groups were situated between 6 (25%) and 7(53%) degrees in a scale of seven degrees of increasing severity. Despite the aesthetic damages concept between doctor and dentists are similar, this study demonstrated a lack of criteria considering that for different aesthetics damages generated by the different damages, the aesthetic perception was high.

Descriptors: Forensic Dentistry; Tooth Loss; Esthetics, Dental


 

 

RELEVÂNCIA CLÍNICA

A valoração do dano estético e a tipificação das perdas dentárias são algumas das principais dificuldades encontradas pelos profissionais que atuam na área da odontologia legal. A falta de parâmetros para avaliação de um dano de caráter subjetivo reforça a ideia de que lesões similares são quantificadas de formas diferentes, principalmente se analisadas em distintas esferas jurídicas, acarretando prejuízos aos que sofreram as injúrias e necessitam ser indenizados.

 

INTRODUÇÃO

Estética é a percepção geral que cada indivíduo tem da beleza. Assume caráter subjetivo e é diretamente influenciada pela cultura dos povos. Também é responsável pela aprovação ou desaprovação social. As pessoas belas são melhores aceitas pelo outro, principalmente no primeiro contato, o que lhes facilita a interação social1,4.

As exigências com relação à aparência, impostas pela sociedade, têm consequências sobre a medicina e a odontologia. O cirurgião-dentista dispõe, além de aspectos técnicos específicos da área, de perspectivas emocionais, intrínsecas à relação de atendimento1.

O sorriso representa a forma mais primitiva e a essência da capacidade de comunicação humana. O comprometimento da boca, decorrente da perda dos dentes, acarreta distúrbios da fala, da estética, da mastigação e da deglutição. Pode provocar estado de depressão e inferioridade no indivíduo, uma vez que parte de seu corpo foi perdida1,4-6.

A percepção da beleza social sofre influência psicológica eé modificada pelo conhecimento1, o que gera controvérsias na tipificação e valoração dessas lesões. Sendo assim, os critérios de avaliação das deformidades devem ser uniformes, uma vez que tipos similares de injúrias devem ser enquadrados no mesmo artigo do Código Penal Brasileiro7.

Em Direito Civil, a avaliação do dano corporal constitui, hoje, uma importante área de intervenção pericial no âmbito da clínica forense, principalmente, devido ao aumento dos acidentes rodoviários e do número de vítimas2,4,8,9.

Avaliação do dano corporal é realizada para se conhecer as consequências que um traumatismo, geralmente acidental, tem sobre a integridade psicofísica e a saúde de uma pessoa2,4,6,10.

Quando existe um responsável pelos danos sofridos pela vítima, este deve arcar com o ônus econômico-financeiro relativoà reabilitação do ofendido11.

Para alguns autores, o dano estético corresponde à repercussão das sequelas, numa perspectiva estática e dinâmica, envolvendo uma avaliação personalizada da afetação da imagem da vítima quer em relação a si próprio, quer perante os outros4,6,12,13.

As dificuldades resultantes da subjetividade nesta avaliação atenuam-se descrevendo minuciosamente as sequelas quantoà sua localização, forma, dimensões, relevo, textura, coloração e número, e documentando-as fotograficamente para que o magistrado as possa também apreciar6.

O método de valoração médico/odonto-legal de quantificação deste dano que se utiliza na maior parte dos países europeus é o quantitativo. Este método consiste em estabelecer a importância ou intensidade deste dano uma vez descrito, igualando-o a uma das categorias ou adjetivos referidos em uma escala de 7 graus de gravidade crescente, inicialmente desenvolvida na França14-16.

Este trabalho objetiva analisar as diretrizes para a avaliação do dano estético relacionado às diferentes perdas dentárias anteriores superiores, investigando como os médicos e cirurgiões-dentistas as avaliam.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

A amostra foi composta por 30 médicos e 30 cirurgiões-dentistas, tendo sido aleatória a seleção. Os entrevistados receberam um protocolo composto por oito fotografias do mesmo indivíduo, manipuladas pelo programa Photoshop CS3, 2007, que simularam perdas dentárias anteriores superiores de diferentes extensões (um, dois, três, quatro, cinco, seis dentes, dois dentes alternados e três dentes alternados). A ordem das fotos apresentadas aos entrevistados foi sempre a mesma: foto 1 – ausência de 6 dentes; foto 2 – ausência de 2 dentes; foto 3 – ausência de 5 dentes; foto 4 – ausência de 3 dentes; foto 5 – ausência de 4 dentes; foto 6 – ausência de 1 dente; foto 7 – ausência de 2 dentes alternados; foto 8 - ausência de 3 dentes alternados.

A amostra investigada avaliou esses danos através de questionário específico, de acordo com a escola francesa de dano estético, que compreende sete graus, a saber:

• muito leve ou insignificante;
• leve;
• moderado;
• médio;
• suficientemente importante;
• importante;
• muito importante.

No corpo inicial do questionário foram disponibilizadas linhas para informações pessoais do(a) entrevistado(a), que poderiam ou não preenchê-las. A identidade dos entrevistados foi mantida no anonimato. Os questionários permitiram que cada sujeito da pesquisa respondesse a apenas uma alternativa em cada pergunta. A comparação dos resultados foi realizada entre os profissionais e intraprofissionais, para uma análise mais detalhada a respeito do conceito de dano estético e sua avaliação nos âmbitos penal e civil. Para facilitar a compreensão dos valores encontrados, os resultados obtidos em cada questão foram apresentados sob forma de gráficos. Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo, sob o número CAAE 0033.0.017.000-11.

 

RESULTADOS

Foram entrevistados 60 profissionais, 30 cirurgiões-dentistas e 30 médicos.

Quanto ao gênero, a amostra foi composta por 23 (38%) homens e 37 (62%) mulheres. Com relação aos cirurgiões-dentistas, 27% (8) pertenciam ao gênero masculino e 73% (22) ao gênero feminino. Quanto aos profissionais da área médica, 50% (15) pertenciam ao gênero masculino e 50% (15) ao gênero feminino.

Observou-se que a característica considerada mais grave pela população geral foi a ausência de 3 dentes (42), seguida pela ausência de 1 dente (41), 3 dentes alternados (38), 2 dentes (33), 2 dentes alternados (31), 6 dentes (30), 4 dentes (27) e 5 dentes (13), nessa ordem.

Do total de pontos atribuídos aos diferentes graus de perdas dentárias anteriores superiores, 53% se concentrou na tipificação muito importante; 25% importante; 12% suficientemente importante; 4% moderado; médio e leve, 3% cada. O grau muito leve não chegou a atingir 1%.

As figuras abaixo (1 a 16) apresentam as perdas dentárias anteriores superiores consideradas menos atraentes para a população das áreas odontológica e médica, avaliadas de acordo com a escala de dano estético da Escola Francesa.

Em relação à ausência de 6 dentes (figuras 1 e 2), dos profissionais da área odontológica, nenhum indivíduo considerou esse dano como muito leve ou leve; 3% (1) afirmou ser moderado; nenhum indivíduo considerou ser médio; 7% (2) suficientemente importante; 20% (6) consideraram-no importante; e 70% (21) muito importante. No que respeita à área médica, nenhum indivíduo o considerou muito leve ou leve; 7% (2) afirmaram ser moderado; 3% (1) médio; 17% (5) suficientemente importante; 43% (13) consideraram-no importante; e 30% (9) muito importante.

 

 

 

 

 

Quanto à ausência de 2 dentes (figuras 3 e 4), na área odontológica, nenhum indivíduo considerou esse dano como muito leve; 3% (1) o apontou como leve; 7% (2) afirmaram ser moderado; nenhum indivíduo considerou-o médio; 3% (1) suficientemente importante; 17% (5) consideraram-no importante; e 70% (21) um dano estético muito importante. No que respeita à área médica, nenhum indivíduo considerou esse dano muito leve, leve ou moderado; 7% (2) afirmaram ser médio; 10% (3) suficientemente importante; 43% (13) importante e 40% (12) consideraram-no muito importante.

 

 

 

 

 


Para os profissionais da área odontológica, no que tangeà ausência de 5 dentes (figuras 5 e 6), nenhum indivíduo considerou considerou esse dano muito leve; para 3% (1) resultou em dano estético leve; 10% (3) afirmaram ser moderado; nenhum indivíduo o apontou como médio; 23% (7) suficientemente importante; 30% (9) consideraram-no importante; e 34% (10) muito importante. Dentre os profissionais da área médica 3% (1) considerou esse dano como muito leve; 7% (2) leve; 7% (2) afirmaram ser moderado; 7% (2) médio; 33% (10) suficientemente importante; 33% (10) consideraram-no importante; e 10% (3) muito importante.

 

 

 

 

 

Em se tratando da ausência de 3 dentes (figuras 7 e 8), os profissionais da área odontológica assim o classificaram: nenhum indivíduo considerou esse dano muito leve ou leve; 10% (3) afirmaram ser moderado; nenhum o considerou médio; 7% (2) suficientemente importante; 10% (3) consideraram-no importante; e 73% (22) muito importante. Da mesma maneira, para a área médica, esse dano não foi considerado muito leve ou leve por nenhum indivíduo; 3% (1) afirmou ser moderado; nenhum o considerou médio; 3% (1) suficientemente importante; 27% (8) consideraram-no importante; e 37% (20) muito importante.

 

 

 

 

 

Já a ausência de 4 dentes (figuras 9 e 10) entre os profissionais da área odontológica não foi considerada muito leve ou leve por nenhum indivíduo; 7% (2) afirmaram ser moderado; 7% (2) médio; 7% (2) suficientemente importante; 23% (7) consideraram-na importante; e 56% (17) muito importante. No que respeita à área médica, nenhum indivíduo considerou esse dano muito leve; 7% (2) apontaram-no leve; 3% (1) afirmou ser moderado; 3% (1) médio; 20% (6) suficientemente importante; 34% (10) consideraram-no importante; e 33% (10) um dano estético muito importante.

 

 

 

 

 

O grau de importância do dano estético para a perda dentária de 1 dente (figuras 11 e 12), na área odontológica, foi considerado muito leve para 3% (1); 7% (2) o consideraram leve; nenhum indivíduo afirmou ser moderado ou médio; 7% (2) suficientemente importante; 13% (4) consideraram-no importante; e 70% (21) muito importante. No que respeita à área médica, nenhum indivíduo considerou esse dano muito leve, leve, moderado ou médio; 10% (3) afirmaram ser suficientemente importante; 23% (7) consideraram-no importante; e 67% (20) muito importante.

 

 

 

 

 

Quanto à ausência de 2 dentes alternados (figuras 13 e 14), nenhum indivíduo da área odontológica considerou esse dano muito leve; 7% (2) afirmaram ser leve; 3% (1) afirmou ser moderado; 3%(1) médio; 17%(5) suficientemente importante; 23%(7) consideraram-no importante; e 47%(14) muito importante. Nenhum indivíduo da área médica considerou esse dano muito leve; 3%(1) o considerou leve; nenhum afirmou ser moderado; 7%(2) médio; 7%(2) suficientemente importante; 27%(8) consideraram-no importante; e 56%(17) um dano estético muito importante.

 

 

 

 

 

Em relação à ausência de 3 dentes alternados (figuras 15 e 16), dos profissionais da área odontológica nenhum indivíduo considerou muito leve esse dano; 3%(1) afirmou ser leve; 3%(1) moderado; 3%(1) médio; 14%(4) suficientemente importante; 17%(5) consideraram-no importante; e 60%(18) como muito importante. No que respeita à área médica, nenhum indivíduo considerou esse dano muito leve ou leve; 3%(1) afirmou ser moderado; nenhum médio; 13%(4) suficientemente importante; 17%(5) consideraram-no importante; e 67%(20) um dano muito importante.

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Como vivemos em uma sociedade pautada pela estética, a aparência do indivíduo assume caráter fundamental para suas relações pessoais e profissionais. Portanto, quanto maior for o dano estético sofrido, principalmente na face, maior será a reação negativa das outras pessoas, independentemente do gênero. À medida que a importância da face foi aumentando, os dentes passaram a ganhar relevância como componentes estéticos do sorriso, o que resultou na busca por tratamentos e cuidados dentários1,4.

No presente estudo, optou-se por avaliar o dano estético das perdas dentárias anteriores superiores, já que esse tipo de injúria é considerado por muitos o item mais desagradável em um sorriso1.

Quanto ao gênero, o grupo de participantes foi constituído por 23 (38%) homens e 37(62%) mulheres. No grupo dos profissionais da área médica, houve homogeneidade da amostra 15 (50%) homens e 15(50%) mulheres.

No grupo dos cirurgiões-dentistas entrevistados, o predomínio de mulheres (73%) reforça o que se observa nos cursos de graduação em odontologia nos quais, há alguns anos, a população feminina supera o contingente masculino, o que já foi relatado em outros estudos1,4.

A característica considerada mais grave pela população geral foi a ausência de 3 dentes, seguida pela ausência de 1 dente, 3 dentes alternados, 2 dentes, 2 dentes alternados, 6 dentes, 4 dentes e 5 dentes, nessa ordem. Não se pode deixar de ressaltar que, enquanto o grau de importância do dano estético para a perda dentária de 1 dente foi considerado muito importante por 70% dos cirurgiões-dentistas e por 67% dos médicos, a ausência de 5 dentes foi considerada muito importante por apenas 34% dos mesmos cirurgiões-dentistas e 10% dos médicos.

Isso se deve à falta de parâmetros para avaliação de um dano de caráter subjetivo e reforça a ideia de que lesões similares são quantificadas de formas diferentes, acarretando prejuízos aos que sofreram as injúrias e que necessitam ser indenizados. A dificuldade de conceituar o dano estético e valorá-lo se pauta nas próprias metodologias em uso, que não são claras em relação ao critério valorador.

A perda dentária de 2 dentes (11 e 21) foi considerada um dano estético muito importante para 70% dos cirurgiões-dentistas, enquanto a perda de 2 dentes alternados (11 e 22) foi considerada muito importante por 47% deles. Este resultado aponta para a importância de se levar em conta o tipo de dente perdido no momento da avaliação do dano.

O conceito de dano estético entre as áreas profissionais foi muito semelhante, apesar de a classe médica ter situado alguns dos grupos de perdas dentárias anteriores superiores em níveis de gravidade menores que os cirurgiões-dentistas. Pode-se observar uma sobrevaloração da alteração estética devido à importância que a sociedade atribui à beleza.

Quanto à ausência de 6 dentes, 70% dos cirurgiões-dentistas a consideraram um dano estético muito importante, enquanto 43% dos profissionais da área médica julgaram-na importante. A mesma avaliação foi verificada em relação à ausência de 2 dentes. Quanto à ausência de 5 dentes, 34% dos cirurgiões-dentistas a consideraram um dano estético muito importante, enquanto 33% dos profissionais da área médica julgaram-na suficientemente importante. A ausência de 3 dentes foi considerada muito importante por 73% dos cirurgiões-dentistas e 37% dos médicos. No que tange à ausência de 4 dentes, 56% dos cirurgiõesdentistas a consideraram um dano estético muito importante, enquanto 34% dos profissionais da área médica julgaram-na importante. A ausência de 1 dente foi considerada muito importante por 70% dos cirurgiões-dentistas e 67% dos médicos. Quanto à ausência de 2 dentes alternados, 47% dos cirurgiões-dentistas a consideraram um dano estético muito importante, assim como 56% dos médicos. A ausência de 3 dentes alternados foi julgada muito importante por 60% dos cirurgiões-dentistas e 67% dos profissionais da área médica.

O fato dos médicos terem avaliado alguns danos de maneira menos severa revela, possivelmente, a noção que estes profissionais têm do indivíduo como um todo, não apenas focando suas atenções no sorriso. O mesmo não acontece com os cirurgiõesdentistas, que têm a tendência de supervalorar as injúrias que acometem o sistema estomatognático.

Do total de pontos atribuídos aos diferentes graus de perdas dentárias anteriores superiores, 53% se concentrou na tipificação muito importante; 25% importante; 12% suficientemente importante; 4% moderado; médio e leve, 3% cada. O grau muito leve não chegou a atingir 1%. Estes resultados confirmam achados de outro estudo (4) em que profissionais da área jurídica, médica, odontológica e comercial avaliaram a perda de elementos dentários segundo a mesma escala de 7 pontos. Dos entrevistados da área jurídica, 27% consideraram esse dano como muito importante; 27% dos médicos, suficientemente importante; 64% dos cirurgiões-dentistas, como muito importante, bem como 60% da área comercial.

Ressalta-se que o dano estético deve ser avaliado estática e dinamicamente, devendo ser levado em conta também o seu grau de notoriedade e o desgosto manifestado pela vítima (considerada a sua idade, sexo, estado civil e estatuto sócio-profissional), e assinalada a sua eventual possibilidade de recuperação, até mesmo cirúrgica. Isso ressalta a necessidade de novos estudos em que sejam incluídos tais parâmetros no momento da avaliação.

 

CONCLUSÃO

A análise dos resultados obtidos no presente estudo permitiram as seguintes conclusões:

• No que concerne à gravidade do dano, para a população em geral a perda de 3 dentes foi considerada a mais grave, seguida pela ausência de 1 dente, 3 dentes alternados, 2 dentes, 2 dentes alternados, 6 dentes, 4 dentes e 5 dentes, nessa ordem.
• Deve-se considerar que o conceito de dano estético entre as áreas profissionais é muito semelhante, apesar da classe médica ter situado alguns dos grupos de perdas dentárias anteriores superiores em níveis de gravidade menores que os cirurgiões-dentistas.
• Verificou-se que, pela metodologia europeia de avaliação do dano estético, mais da metade do total de atribuições de grau de severidade entre todos os grupos de sequelas odontológicas apresentadas foram situadas entre os graus 6 (25%) e 7 (53%) numa escala de sete graus de gravidade crescente. Apesar do conceito de dano estético ter sido semelhante entre as áreas médica e odontológica, foi demonstrada ausência de parâmetros para aplicação da metodologia apresentada, tendo em vista que, para os diferentes prejuízos gerados pelos diferentes danos, a percepção estética foi alta.

 

APLICAÇÃO CLÍNICA

O entendimento do dano estético é de extrema importância para os profissionais da área clínica odontológica, especialmente para as especialidades de implantodontia, ortodontia e prótese. Ocorre que tais especialidades têm sido objeto de elevado número de processos - de responsabilidade civil e penal -, em virtude do descontentamento do paciente com o resultado final do tratamento dentário, que não atingiu as suas expectativas. Além disso, só estes mesmos profissionais que normalmente recebem os pacientes que foram vítimas de algum tipo de dano estético, para reabilitação não só das funções orgânicas como das características não atraentes.

 

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Autor para correspondência:
Carolina Burni Verçosa
Departamento de Odontologia Social
Av. Professor Lineu Prestes, 2227
Cidade Universitária - São Paulo – SP
05508-000
Brasil

e-mail:
vercosacarol@gmail.com

Recebido em: set/2012
Aprovado em: nov/2012