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Revista Brasileira de Odontologia
versão On-line ISSN 1984-3747versão impressa ISSN 0034-7272
Rev. Bras. Odontol. vol.69 no.2 Rio de Janeiro Jul./Dez. 2012
ARTIGO DE REVISÃO
Ateromas de carótida nas panorâmicas: como o clínico pode identificar?
Carotid atheromas in panoramic radiographs: how can the general practioner identify?
Inger Teixeira de Campos TuñasI; Eduardo José da Costa SantosII; Leonardo de Mello de VeigaIII; Luiz Fernando DeluizIV; Sérgio de Carvalho WeyneV
IEspecialista em Radiologia da Universidade Estácio de Sá (Unesa) Doutora em Clínica Odontológica pela FOP/Unicamp Coordenadora das Disciplinas de Dentística da Unesa
II Especialista em Radiologia Oral pela UFRJ e em Estomatologia pela Unesa; Professor da Graduação Politécnica e da Especialização em Radiologia Odontológica e Imaginologia da Unesa
III Mestre em Radiologia pela São Leopoldo Mandic;Professor da Graduação e da Especialização em Radiologia Odontológica e Imaginologia da Unesa
IV Mestre e Especialista em Radiologia pela UFRJ; Coordenador do Curso de Especialização em Radiologia Odontológica e Imaginologia da Unesa
V Doutor em Odontologia pela UFRJ Coordenador da Disciplina de Microbiologia da Unesa
RESUMO
A presença de ateromas de carótida é associada ao desenvolvimento de acidente vascular encefálico, angina, enfarto do miocárdio e morte. Como a radiografia panorâmica é um dos exames mais utilizados na rotina odontológica, é fundamental evidenciar ateromas calcificados na artéria carótida de pacientes em acompanhamento odontológico a fim de encaminhá-los a avaliação médica na qual outros exames serão feitos para confirmação de diagnóstico e tratamento adequado. Foram avaliadas fichas de pacientes inativos da Faculdade de Odontologia da Universidade Estácio de Sá (RJ). Dos 29 pacientes examinados, seis (20,68%) apresentaram ateromas de carótida. Estes pacientes tinham idade compreendida entre 52 e 73 anos. O objetivo deste trabalho é elucidar como os ateromas de carótida podem ser vistos nas radiografias panorâmicas pelo clínico geral.
Palavras-chave: ateromas; carótida; panorâmicas.
ABSTRACT
The presence of carotid atheroma is associated with the development of stroke, angina, myocardial infarction and death. As long as panoramic radiography is one of the most used exams in routine dental care, is very important for the general dentist to evidence calcified carotid artery atheromas of the patients, in order to direct them to the medical evaluation in which other procedures will be done to confirm the diagnosis and appropriated treatment. We evaluated inactive patient records from the College of Dentistry of Estácio de Sá University (RJ, Brazil). From the total of 29 patients examined, 6 (20.68%) had carotid atheroma. These patients were aged between 52 and 73 years. The objective of this paper is to elucidate how the carotid atheroma can be seen on panoramic radiographs by the general dentist.
Keywords: atheromas; carotid; panoramic radiographs.
Introdução
As artérias carótidas são os vasos responsáveis pelo suprimento sanguíneo cerebral. Quando acometidas por placas ateroscleróticas, podem determinar manifestações de isquemia cerebral pela liberação de coágulos (embolia) ou por obstrução (trombose) 1. A aterosclerose, que apresenta como lesão fundamental o ateroma ou placa ateromatosa, localiza-se preferencialmente nas artérias carótidas comuns, interna e externa, e constitui-se de depósitos de lipídeos que ao se acumularem nos vasos são a causa mais comum de acidentes vasculares encefálicos (AVE) 5,14.
O AVE é uma prioridade em saúde pública devido a sua alta mortalidade (20 a 35%) e alto potencial de incapacitação para a vida produtiva. Nos Estados Unidos, onde esta patologia é a terceira causa de morte e a primeira em invalidez, estimam-se ocorrer 730.000 novos casos de por ano, com custo estimado em 40 bilhões de dólares. Destes, 2/3 são ocasionados por doença estenótica oclusiva das artérias carótidas 1,3,8.
Os fatores de risco para a formação de ateromas incluem: obesidade, hipertensão arterial, fumo, Diabetes Mellitus, altos níveis de colesterol e triglicérides no sangue, sedentarismo e idade avançada 2,13.
A presença de ateromas de carótida em indivíduos assintomáticos é frequentemente associada ao desenvolvimento de AVE, angina, infarto do miocárdio e morte. Depósitos de cálcio foram identificados nas artérias carótidas em número considerável de pacientes com doença vascular cerebral assintomática pelo uso de tomografia computadorizada. Esses mesmos depósitos também foram notados em radiografias panorâmicas 14,18.
Como a radiografia panorâmica é um dos exames mais utilizados na rotina odontológica, é fundamental evidenciar ateromas calcificados na artéria carótida de pacientes em acompanhamento odontológico a fim de encaminhá- los a avaliação médica na qual outros exames serão feitos para confirmação de diagnóstico e tratamento adequado 2,19.
Desta forma, o objetivo deste trabalho é elucidar como os ateromas de carótida podem ser vistos nas radiografias panorâmicas pelo clínico geral.
Material e Método
Foram avaliadas 300 fichas do arquivo de pacientes inativos da Clínica Odontológica da Universidade Estácio de Sá (Unesa), RJ. Os critérios de seleção das fichas para exame foram: 1. ter radiografia panorâmica; 2. pacientes nascidos antes de 1959, ou seja, com mais de 50 anos. Das 300 fichas, 29 (9,6%) atendiam aos dois critérios. A avaliação das radiografias panorâmicas foi feita por dois examinadores que, em caso de dúvida, chegaram a um consenso. O exame foi feito em negatoscópio com máscara de cartolina negra ao redor da radiografia e cobrindo todo o seu entorno, em sala escura e com uso de lupa de aumento. Os ateromas podem ser vistos na radiografia panorâmica, abaixo da mandíbula, adjacentes à vértebra cervical, no nível da junção intervertebral C3 e C4.
Resultados
Dos 29 pacientes examinados, seis (20,68%) apresentaram ateromas de carótida (Figura 1 e 2). Estes pacientes tinham idade compreendida entre 52 e 73 anos.
Discussão
A radiografia panorâmica é o exame mais solicitado pelos dentistas. A técnica é simples, rápida, de fácil execução ao mesmo tempo em que proporciona visualização geral das estruturas bucomaxilofaciais. Ressalta-se que requer dose de radiação relativamente baixa. Como limitação relata-se a sobreposição de estruturas anatômicas 19.
Além de evidenciar uma visão global das estruturas bucomaxilofaciais, as panorâmicas também podem identificar alterações não diretamente relacionadas com a Odontologia, o que amplia ainda mais a sua utilidade 19.
FRIEDLANDER & LANDE 11 sugeriram que tais radiografias seriam um recurso válido na detecção de pacientes com risco para AVE que apresentam ateromas de carótida. Quando calcificadas, as placas ateromatosas podem ser vistas nas laterais das radiografias panorâmicas, na região de C3 e C4, de 2 a 4 cm abaixo do ângulo da mandíbula, acima ou abaixo do osso hioide 5,10,11. Das 1000 panorâmicas observadas pelos autores, 2% apresentaram calcificação patológica em pacientes entre 50 e 75 anos. Desses 88% tinham calcificação de carótida e os 12% restantes eram sialolitos, flebólitos e calcificações dos linfonodos. FRIEDLANDER et al. 10 observaram em 1548 panorâmicas, 4,2% de ateromas de carótida em pacientes com mais de 50 anos.
Apesar de haver concordância entre os autores sobre a utilidade das radiografias panorâmicas para evidenciar ateromas de carótida em pacientes assintomáticos 3,10, MADDEN et al. 17concluíram que este exame, quando comparado à ultrassonografia, apresenta baixa sensibilidade em detectar calcificação da artéria carótida e estenoses.
Na região cervical, pode haver ocorrência de sialolitos, tonsilólitos, calcificações de linfonodos e vasos sanguíneos. Essas calcificações devem ser diferenciadas entre si, de estruturas anatômicas e de outras estruturas passíveis de calcificação como o ligamento estilo-hióideo, cartilagem tritícea e o corno superior da cartilagem tireoidea 19.
Sialolitos são deposições calcáreas encontradas no interior dos ductos ou das glândulas salivares maiores e menores. Os sialolitos estão normalmente localizados na glândula submandibular ou no seu ducto e se apresentam como uma calcificação única ou como calcificações difusas, algumas vezes com sintomatologia e quase sempre unilaterais. Na imagem panorâmica podem ser vistos superpostos ao corpo ou ramo da mandíbula ou abaixo desta, localizando-se anteriormente às calcificações da artéria carótida 2,19 (Figura 3).
Os flebólitos são calcificações no interior de veias, de pequenas dimensões, comumente menores que os sialolitos, podem apresentar radiopacidade concêntrica com anéis radiolúcidos 2.
Já os tonsilolitos são pequenas calcificações que se formam nas criptas das amídalas e observadas, na maioria dos casos, em exames radiográficos de rotina, como imagens radiopacas superpostas ao ramo mandibular 2.
O processo estiloide está localizado na porção petrosa do osso temporal, que inclui o processo mastoide, pode ser visto na radiografia panorâmica como uma imagem cilíndrica e radiopaca, que se projeta para frente e para baixo entre o ramo da mandíbula e o processo mastoide 2 (Figura 4).
Na radiografia panorâmica é possível observar o osso hioide como uma imagem radiopaca bilateral, horizontal, localizada abaixo da mandíbula. Consiste de um corpo com um corno maior e outro menor de cada lado. O corno maior do osso hioide estende-se para cima e para trás, formando um ângulo de 135° e atravessando a área radiolúcida formada pela passagem de ar da faringe, com córtex bem definido e um padrão trabécula 2 (Figura 5).
Ainda que algumas estruturas anatômicas e outras patológicas possam atrapalhar o clínico no diagnóstico dos ateromas, a possibilidade de detectar ateromas de carótida nas radiografias panorâmicas antecipa o tratamento do paciente reduzindo os riscos de morbidade e mortalidade 6,7,8,9,10,11,12.
A hipertensão arterial, Diabetes Mellitus, hiperlipidemia, terapia de radiação, menopausa 7, doença renal 15 e apneia obstrutiva do sono 9 são apontados como aceleradores na formação dos ateromas de carótida.
Relata-se que apesar das radiografias panorâmicas identificarem calcificações sugestivas de ateromas, elas não possibilitam avaliar o grau de obstrução da carótida nem a correta localização do ateroma. Desta forma, outros recursos se tornam necessários para um diagnóstico definitivo. A ultrassonografia de Doppler é o exame mais indicado para a confirmação da presença, localização e tamanho dos ateromas de carótida. Trata-se de um exame de baixo custo quando comparado aos contrastes angiográficos e com a tomografia computadorizada 5.
Assim sendo, o dentista clínico pode identificar o ateroma de carótida e tem papel fundamental no encaminhamento dos pacientes para tratamento médico prevenindo possíveis complicações 2,3,4,11,15,16,18.
Conclusão
Os ateromas de carótida podem ser identificados pelos clínicos nas radiografias panorâmicas, abaixo da mandíbula, na região de tecido mole, entre as vértebras C3 e C4, 2 a 4 cm abaixo do ângulo da mandíbula, acima ou abaixo do osso hioide. A detecção precoce das imagens que sugerem ateromas de carótida e o encaminhamento dos pacientes ao médico especialista contribuem para evitar acidentes vasculares encefálicos e suas sequelas.
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Endereço para correspondência:
Inger Teixeira de Campos Tuñas
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