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RFO UPF

versão impressa ISSN 1413-4012

RFO UPF vol.18 no.2 Passo Fundo Mai./Ago. 2013

 

 

Frequência de reabsorção radicular inflamatória decorrente de trauma em dentes anteriores

 

Inflammatory root resorption frequency due to trauma in anterior teeth

 

 

Luiz Fernando Machado Silveira*; Letycia Barros Gonçalves**; Melissa Feres Damian***; Luis Eduardo Rilling da Nova Cruz****; Cristina Braga Xavier*****; Josué Martos*

* Doutor em Clínica Odontológica, Faculdade de Odontologia da UFPel, Departamento de Semiologia e Clínica, Pelotas, RS, Brasil.
** Cirurgiã-dentista, Faculdade de Odontologia da UFPel, Pelotas, RS, Brasil.
*** Doutora em Radiologia Odontológica, Faculdade de Odontologia da UFPel, Departamento de Semiologia e Clínica, Pelotas, RS, Brasil.
**** Doutor em Odontologia, Faculdade de Odontologia da UFPel, Departamento de Semiologia e Clínica, Pelotas, RS, Brasil.
***** Doutora em Odontologia, Faculdade de Odontologia da UFPel, Departamento de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, Pelotas, RS, Brasil.

Endereço para correspondência

 

 


 

RESUMO

Objetivo: a reabsorção radicular inflamatória é uma das consequências do traumatismo dentário, sendo a detecção e o tratamento precoces determinantes na limitação de seus danos. Assim, o objetivo deste estudo foi investigar, em dentes anteriores permanentes traumatizados, a prevalência de reabsorção radicular inflamatória, relacionando-a com os diferentes tipos de traumatismos nos tecidos de sustentação e dentários. Sujeitos e método: os dados relativos à reabsorção inflamatória foram coletados a partir de 111 dentes, nos prontuários de 74 pacientes de um serviço de tratamento de trauma dental da FO/UFPel, no período de 2005 a 2011. Foram registrados, ainda, o sexo e a idade dos pacientes, os dentes envolvidos no trauma, a presença de rizogênese completa ou não e o tempo inicial para o aparecimento da reabsorção. A avaliação dos dados foi realizada por estatística descritiva e teste qui-quadrado, com correção de Yates, ao nível de significância de 5%. Resultados: a reabsorção radicular inflamatória foi mais frequente em pacientes do sexo masculino, em incisivos superiores, em dentes com rizogênese completa e nas lesões de menor gravidade nos tecidos dentários e de sustentação. Ainda, as lesões nos tecidos de sustentação, quando não combinadas às fraturas dentárias, apresentaram maior frequência de reabsorção. O tempo inicial para o aparecimento da patologia foi dentro dos primeiros trinta dias após o trauma. Conclusão: é importante diagnosticar detalhadamente os traumas nos tecidos dentários, a fim de verificar o comprometimento dos tecidos de sustentação, devendo a proservação desses casos ser sistemática e contínua para interceptar a reabsorção radicular.

Palavras-chave: Traumatismo dental. Reabsorção dentária. Fratura coronária.


 

ABSTRACT

Objective: inflammatory root resorption is one of the consequences of dental trauma so its early detection and treatment are crucial in limiting their damage. Thus, this study aimed to investigate the prevalence of inflammatory root resorption in traumatized permanent anterior teeth, relating it to the different types of trauma in support and dental tissues. Subjects and method: data concerning inflammatory resorption were collected from 111 teeth, in medical records of 74 patients of a dental trauma care in UFPel’s Dentistry School, from 2005 to 2011. Gender and age of patients, teeth involved in the trauma, presence or absence of full rooting, and the initial time of root resorption emergence were also registered. Data assessment was performed by descriptive statistics and chi-square test with Yate’s correction, at significance level of 5%. Results: inflammatory root resorption was most frequent in male patients, in upper incisors, in teeth with complete root formation, and in minor injuries of dental and support tissues. Also, the supporting tissues injury presented higher resorption frequency when not combined with dental fractures. The starting time for pathology emergence was within the first thirty days after the trauma. Conclusion: it is important to thoroughly diagnose the trauma in dental tissues to verify the impairment of support tissues, since the proservation of these cases should be systematic and continuous to intercept root resorption.

Keywords: Dental traumas. Dental resorption. Crown fracture.


 

 

Introdução

O trauma dental pode resultar no desenvolvimento de lesões nos tecidos dentários e nos tecidos de sustentação, de forma isolada ou concomitante. Assim, o prognóstico pulpar pós-trauma é dependente do dano periodontal e dos danos aos tecidos duros do dente, tendo o diagnóstico do trauma dentário valor duvidoso se esses dois fatores não forem avaliados em conjunto1.

A extensão do traumatismo dentário e suas repercussões nos tecidos de sustentação são diretamente proporcionais à energia de impacto. Um golpe de baixa velocidade causa um dano maior às estruturas de sustentação, porém fraturas dentárias menos pronunciadas. Em contrapartida, impactos em alta velocidade proporcionam uma maior incidência de fraturas dentárias, contudo com menor dano às estruturas de sustentação2. A experiência clínica sugere que a energia de impacto é dissipada na criação de fraturas, reduzindo a sua transmissão na direção dos tecidos de suporte2.

Diversos fatores biológicos interferem no padrão das lesões após os episódios de traumatismos. A resiliência do osso alveolar em crianças, decorrente do fato de tal tecido ser menos mineralizado3, além da contínua deposição de dentina e cemento no decorrer do tempo, altera as propriedades mecânicas do dente e do ligamento periodontal4. Nas fraturas coronárias, a orientação dos prismas de esmalte determina o trajeto da linha de fratura ao nível coronal, ao passo que na dentina, preponderantemente, é perpendicular aos túbulos dentinários. A explicação é que seus pontos mais fragilizados encontram-se nesses trajetos5. Ainda, a resiliência do objeto que causa o impacto, bem como sua forma, pode absorver ou dissipar a energia direcionada. Além disso, a interposição do lábio no momento do traumatismo poderia atuar como um elemento de amortecimento, evitando fraturas coronárias, porém aumentando os riscos de luxações ou fraturas alveolares6.

Esses fatores não ocorrem isoladamente, mas se associam, ainda, à direção da energia de impacto e ao ângulo de incidência sobre o elemento dental7. Geralmente, esses fatores determinantes da energia de impacto são inconclusivos na avaliação clínica; mesmo assim, devem ser presumidos para que possamos monitorar com maior precisão o aparecimento das complicações do traumatismo dentário8.

Os danos infligidos às estruturas periodontais podem resultar em reabsorção substitutiva, no qual ocorre uma união entre osso alveolar e estrutura radicular, sendo a substância radicular gradualmente substituída por osso. No entanto, uma resposta inflamatória reabsortiva progressiva poderá se instalar, com áreas em forma de pires, envolvendo tanto o tecido cementário quanto a dentina, associadas a uma inflamação do tecido periodontal adjacente. Em geral, a necrose pulpar faz-se presente com contaminação bacteriana do canal radicular, agindo como fator interveniente na manutenção da atividade reabsortiva9. A reabsorção inflamatória é esperada após luxações intrusivas, luxações laterais severas, luxações extrusivas e com menor frequência nas subluxações. Essa reabsorção instala-se em torno de duas semanas após o trauma e atua de forma rápida. A detecção e o tratamento precoces tornam-se determinantes nas limitações dos danos produzidos pela sua atividade de reabsorção7. Hecova et al.10, avaliando o traumatismo em dentes permanentes, observaram que a reabsorção externa estava presente em 16% dos dentes, sendo a reabsorção inflamatória dependente da intensidade das injúrias nos tecidos de sustentação, e que dentes com fratura de coroa não apresentaram reabsorções.

Assim, a finalidade do presente estudo foi relacionar a prevalência e o padrão do aparecimento da reabsorção radicular inflamatória com os diferentes tipos de traumatismos nos tecidos de sustentação e nos tecidos dentários, por meio dos dados clínicos e radiográficos obtidos no Centro de Estudo, Tratamento e Acompanhamento de Traumatismos de Dentes Permanentes (CETAT), da Faculdade de Odontologia (FO) da UFPel, no período de 2005 a 2011.

 

Sujeitos e método

Este foi um estudo retrospectivo realizado no programa de extensão CETAT da FO/UFPel, serviço que promove o acompanhamento mediato de pacientes que sofreram traumatismos em dentes permanentes e que foram submetidos a procedimentos de emergência realizados em Pronto Atendimentos da Rede Pública de Saúde da cidade de Pelotas/RS e região.

Os pacientes desse programa são examinados e cuidados por alunos de graduação em Odontologia, que são treinados e constantemente supervisionados por uma equipe de professores com formação em Cirurgia Bucomaxilofacial, Endodontia, Periodontia, Radiologia e Clínica Geral. Seu acompanhamento é realizado clínica e radiograficamente, e as avaliações são periódicas, de acordo com a gravidade e o tipo de lesão.

Os prontuários do CETAT fornecem dados pessoais relativos aos pacientes, como nome, endereço, data de nascimento e sexo, e incluem um termo de consentimento livre e esclarecido assinado pelo paciente ou por seus pais ou responsáveis. Ainda, contêm informações sobre a causa do trauma, história e tipo de lesão, local, data e circunstância em que ocorreu o trauma, de acordo com a classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS) para esses tipos de lesões, modificada por Andreasen e Andreasen7. Antes de ser iniciado, o projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética da FO/UFPel e obteve parecer favorável para execução (protocolo nº 202/2011).

Foram incluídos no estudo todos os pacientes que foram conduzidos ao CETAT, no período de março de 2005 a dezembro de 2011, com sinais de trauma em dentes permanentes anteriores, tanto maxilares quanto mandibulares, que afetaram os tecidos duros dentários e/ou os tecidos de sustentação. Os dentes foram considerados como amostras isoladas, independentemente se o paciente apresentasse mais de um elemento dentário envolvido. As variáveis rizogênese, completa ou incompleta, sexo e idade do paciente foram consideradas relevantes. Os casos de avulsão dentária, de fraturas alveolares, bem como aqueles em que a lesão nos tecidos de sustentação não pôde ser determinada, foram excluídos do estudo. A amostra final foi composta por 111 dentes anteriores, superiores e inferiores, dos prontuários de 74 pacientes.

Destes 111 dentes selecionados, foram avaliadas as radiografias periapicais do primeiro acesso do paciente ao CETAT e dos períodos de proservação, observando se os dentes traumatizados apresentavam reabsorção radicular do tipo inflamatória. Todas as radiografias apresentavam excelente qualidade de imagem quanto à técnica e ao processamento, além de terem sido, preferencialmente, realizadas pela técnica do paralelismo. As imagens foram interpretadas quanto à presença de áreas de reabsorção radicular inflamatória, por comparação entre imagens subsequentes.

A presença da patologia foi relacionada às variáveis sexo, idade, tipo de fratura nos tecidos dentários, tipo de trauma nos tecidos de sustentação, dente afetado, rizogênese e tempo inicial da reabsorção. Os dados foram submetidos à estatística descritiva e ao teste qui-quadrado de Pearson com correção de Yates, ao nível de significância de 5%, utilizando o software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences®) versão 8.0 para Windows.

 

Resultados

As Tabelas 1 a 3 apresentam o resultado do comparativo entre as variáveis analisadas. Um total de 74 indivíduos, com idade entre 6 e 46 anos, perfazendo uma unidade amostral (n) de 111 dentes, pôde ser incluído no estudo, de acordo com os critérios de inclusão e exclusão já descritos, sendo 74,8% do sexo masculino e 25,2% do feminino.

A reabsorção inflamatória radicular pôde ser detectada em radiografias de pacientes de ambos os sexos e em todas as faixas etárias avaliadas. Com relação ao sexo, apesar da presença de reabsorção ter sido maior no masculino (24,3%) comparativamente ao feminino (6,3%), não foi possível observar diferença estatística significativa, pelo teste qui- -quadrado e correção de Yates, para essa variável. Para a idade, a prevalência da reabsorção foi semelhante entre as faixas etárias, não havendo, mais uma vez, diferença estatística entre a presença ou não da patologia (Tab. 1).

 

 

 

Conforme a Tabela 1, dos 111 dentes analisados, os incisivos centrais e laterais superiores foram os mais afetados por trauma e os únicos a apresentarem lesões de reabsorção inflamatória, ressaltando- -se que não foram detectados traumas nos caninos inferiores, bem como no canino superior direito e no incisivo lateral inferior esquerdo. Todavia, não foi detectada diferença estatística significativa entre os dentes avaliados quanto à presença de reabsorção. Da mesma forma, não houve diferença pelo teste estatístico na detecção ou não de reabsorção para os casos de trauma em dentes com rizogênese completa e incompleta; porém, naqueles com ápice radicular aberto, o índice de reabsorção inflamatória foi menor. No entanto, o teste qui-quadrado com correção de Yates mostrou que houve diferença entre a presença e a ausência da reabsorção radicular inflamatória de acordo com o tempo em que o trauma foi monitorado radiograficamente. Mesmo que a alteração tenha sido detectada em todos os tempos avaliados, seu início foi mais prevalente quando o tempo de monitoramento radiográfico da lesão foi inferior a 30 dias após o trauma.

Os dentes que sofreram injúrias de fratura esmalte/ dentina com exposição pulpar ou no nível radicular, com e sem polpa exposta, não apresentaram reabsorção inflamatória. Contudo, quando as fraturas envolviam esmalte e dentina em nível coronário, ou quando o trauma não provocou fratura nos tecidos dentários, a prevalência da reabsorção foi maior, apesar de o teste estatístico não mostrar diferença entre presença ou ausência de reabsorção. Dentre as lesões dos tecidos de sustentação, com exceção dos traumas de diagnóstico inconclusivo, em todas as outras classificações, foi possível detectar lesões de reabsorção inflamatória, tendo a subluxação apresentado maior frequência dessa patologia, com índice de 15,5% nas radiografias dos 111 casos avaliados (Tab. 2). Todavia, mais uma vez, não foi possível detectar diferença estatística entre a presença ou a ausência de reabsorção radicular inflamatória de acordo com os traumas nos tecidos de sustentação e dentários.

 

 

 

A combinação entre fratura dentária e trauma nos tecidos de sustentação, associada à presença de reabsorção, é apresentada na Tabela 3 e nas Figuras 1 e 2. A presença de reabsorção nas lesões de trauma foi mais pronunciada nos casos em que não houve fratura dentária, tendo a subluxação sido o tipo de trauma mais frequente em que a reabsorção inflamatória foi detectada. Todavia, nos casos em que a reabsorção radicular foi visualizada, não houve uma associação estatisticamente significativa (p = 0,378) entre tipo de fratura e tipo de trauma.

 

 

 

 

 

 

 

A Tabela 4 apresenta a somatória de lesões nos tecidos dentários e a somatória das lesões nos tecidos de sustentação, relacionando-as à presença ou ausência de reabsorção. Nessa tabela, é possível verificar uma prevalência da ausência da patologia; contudo, pelo teste qui-quadrado (X2) e correção de Yates, considerando-se apenas os casos em que há reabsorção, observa-se uma concordância estatisticamente significativa na presença dessa patologia quando não ocorrem fraturas dos tecidos dentários.

 

 

 

Discussão

O CETAT promove o atendimento de pacientes com traumatismo dentário e nos tecidos de sustentação, que, em sua maioria, foram submetidos, primeiramente, a procedimentos de emergência em hospitais do serviço público de saúde ou outras unidades de emergência da cidade de Pelotas e da região. Consequentemente, o tratamento tardio pode influenciar na conclusão do diagnóstico, sobretudo se o paciente retardar o tratamento das sequelas do trauma ocorrido. Alguns sinais e sintomas podem ser suprimidos, e pode ser estabelecido um diagnóstico equivocado nas lesões dos tecidos de sustentação11,12.

A taxa de resposta na coleta de dados foi alta porque o atendimento do serviço odontológico inclui os procedimentos necessários para a reparação das sequelas dos traumas que requerem longos períodos de intervenção e observação. Vale ressaltar que esse número é pequeno em relação à população da cidade de Pelotas, tendo em vista que são limitados o número de indivíduos que procuram o serviço e a capacidade de atendimento. Assim, as conclusões deste trabalho apresentam apenas validade interna, embora contribuam ao estudo relacionado ao tema apresentado.

O índice de reabsorção inflamatória alcançou um percentual de 15,5% em dentes que sofreram lesão de subluxação, todos com necrose pulpar constatada em médio e longo prazo. Sendo a necrose uma predisposição à infecção, a reabsorção apresenta-se como sequela provável nesses casos de luxação em que não há fratura dentária. Quando a subluxação está associada à fratura dental sem exposição pulpar, a frequência de reabsorção inflamatória não é elevada; contudo, não houve diferença quando a fratura dentária não estava presente. Lauridsen et al.13 conjecturam que a fratura coronária absorveria grande parte da energia de impacto e, dessa forma, reduziria as lesões do ligamento periodontal e, consequentemente, as reabsorções dentárias.

No caso das subluxações, a proservação por um longo período é que vai verificar o envolvimento pulpar ou não, uma vez que os testes de sensibilidade pulpar não são conclusivos nos períodos iniciais do pós-trauma. Assim, a intervenção endodôntica ocorrerá de maneira mediata, ou seja, somente quando o dente apresentar sinais de rarefação óssea apical e/ou reabsorção na radiografia de controle e, em alguns casos, a presença de trajeto fistuloso.

No cômputo geral, com a somatória de lesões nos tecidos dentários associados ou não às lesões dos tecidos de sustentação, observa-se a prevalência da ausência de reabsorção. Tal fato pode ser explicado, em parte, pela efetividade do programa de monitoramento que institui a terapia endodôntica adequada assim que a necrose pulpar é detectada, prevenindo, dessa forma, a instalação do processo reabsortivo. Considerando-se apenas os casos em que há presença de reabsorção, constata-se uma diferença estatística significativa na presença da patologia quando não ocorrem fraturas dos tecidos dentários. Essa observação está em conformidade com Hecova et al.10, que relatam que a presença da patologia é mais prevalente quando não ocorre a absorção da energia de impacto pela fratura dos tecidos dentários.

Mesmo a análise estatística não mostrando diferença significante entre a presença e a ausência das lesões de reabsorção, nos casos de fratura dentária sem exposição pulpar, de subluxação sem fratura dentária, de luxação lateral e luxação extrusiva, a presença de reabsorção é grande. Tal fato evidencia-se porque essas lesões de luxação lateral e extrusiva apresentam um envolvimento endodôntico paralelo que requer intervenção imediata, impedindo a manifestação da reabsorção14. Assim, os casos de subluxação apresentaram, neste estudo, um índice de reabsorção maior que os demais traumatismos de maior extensão nos tecidos de sustentação, contrariando o esperado conforme a literatura7.

Nesse mesmo sentido, os dentes com rizogênese incompleta apresentaram menor índice de reabsorção inflamatória porque a vitalidade pulpar tem maior probabilidade de ser mantida pelo maior suprimento apical vascular de irrigação, visto que a necrose pulpar associada à infecção é o fator que mantêm a reabsorção inflamatória15. O aparecimento da reabsorção radicular surgiu em até um ano após o trauma, porém a maior incidência ocorreu precocemente, em período inferior a um mês.

Embora não seja frequente nas fraturas radiculares, as reabsorções podem se instalar nas áreas correspondentes às fraturas que não puderam ser reduzidas satisfatoriamente. O determinismo biológico promoveria a remodelação das arestas dos fragmentos dentários, evitando uma agressão de parte destas aos tecidos circunvizinhos. Nesses casos, não há necessidade de intervenção endodôntica, porém a proservação deve ser realizada por longo prazo para verificar se ela se estenderá comprometendo os fragmentos do elemento dentário afetado7,9.

É recomendável que as fraturas de coroa sejam restauradas o mais breve possível e as trincas sejam seladas para reduzir a probabilidade de acesso bacteriano à polpa levando à necrose pulpar e, consequentemente, predispondo a instalação de processos de reabsorção. A proservação, portanto, deve ser realizada por períodos regulares num prazo não inferior a cinco anos, com a finalidade de intervir imediatamente após o surgimento das alterações radiográficas e/ou clínicas das reabsorções radiculares inflamatórias, visto que em fases iniciais são facilmente controladas. Observa-se, neste estudo, que a reabsorção não se torna prevalente quando se promove o controle sistemático e regular dos casos de traumatismos dentários. É importante que as lesões traumáticas nos tecidos dentários sejam submetidas a um procedimento de diagnóstico mais detalhado para verificar o nível de comprometimento dos tecidos de sustentação13.

 

Conclusão

Os dados obtidos permitem concluir que, quando estabelecemos um controle sistemático dos casos de traumatismo dentário, a reabsorção radicular inflamatória não é prevalente. Considerando-se a totalidade dos casos com presença de reabsorção, de forma isolada, a absorção da energia de impacto pela fratura dos tecidos dentários reduziu de forma significativa a instalação do processo reabsortivo. A reabsorção inflamatória, geralmente, surge em períodos inferiores a trinta dias após o trauma, sendo mais frequente quando associada à subluxação.

 

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Endereço para correspondência:
Melissa Feres Damian
Faculdade de Odontologia da Universidade Federal
de Pelotas
Rua Gonçalves Chaves, 457- Centro
96015-560 Pelotas, RS

e-mail:
melissaferesdamian@gmail.com

Recebido: 30/01/2013
Aceito: 20/08/2013