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versão impressa ISSN 1516-0939
Arq. Odontol. vol.48 no.3 Belo Horizonte Jul./Set. 2012
ARTIGO ORIGINAL
Humanização no atendimento odontológico: acolhimento da subjetividade dos pacientes atendidos por alunos de graduação em Odontologia
Humanization in dental care: reception of the subjectivity of patients treated by undergraduate students in dentistry
Luciane de Queiroz MotaI; Danilo Barboza Lopes Magalhães FariasII; Thalita Almeida dos SantosII
IDepartamento de Clínica e Odontologia Social, Curso de Odontologia, Universidade Federal da Paraíba, UFPB, João Pessoa, PB, Brasil
IICurso de Odontologia, Universidade Federal da Paraíba, UFPB, João Pessoa, PB, Brasil
RESUMO
Objetivo: O objetivo do presente estudo foi avaliar a subjetividade dos pacientes, quanto ao seu atendimento por alunos de graduação; à existência de ansiedade odontológica; e ao perfil de um dentista ideal.
Materiais e Métodos: A pesquisa, descritiva e exploratória, utilizou o método quanti-qualitativo, com análise de conteúdo. O instrumento de coleta de dados foi uma entrevista estruturada com perguntas objetivas e subjetivas e a amostra foi constituída por 48 usuários da demanda espontânea das clinicas odontológicas da Universidade Federal da Paraíba, selecionada por conveniência. Foram incluídos na amostra os pacientes a partir de 12 anos de idade, de ambos os gêneros, sem distinção de raça, que procuraram os serviços odontológicos no período de novembro de 2009 a maio de 2010. Foram excluídos da pesquisa os pacientes portadores de necessidades especiais, que não tinham condições de interagir com o pesquisador. Foi identificado, em cada questão, o(s) núcleo(s) de sentido existente(s), de onde foram extraídos os indicadores visando a classificação nas categorias e a sua contagem, cujos resultados foram expressos através de freqüência e números absolutos.
Resultados: A maioria dos entrevistados (56,3%) se sentia seguro ao serem atendidos por alunos de graduação; 41,7% dos pacientes consideraram que um dentista ideal deveria ter capacidade técnica e ser atencioso; e 35% possuíam ansiedade odontológica.
Conclusões: Os pacientes se sentem seguros e confiantes ao serem atendidos por alunos do curso de Graduação nas escolas de Odontologia e almejam que um dentista ideal seja um profissional com habilidades técnicas, mas, sobretudo, que tenham um contato humanizado e acolhedor com o paciente. A ansiedade odontológica ainda é um temor freqüente entre os pacientes, mas, acredita-se que num futuro próximo esse sentimento seja minimizado em virtudes das novas políticas de humanização nos serviços de saúde.
Descritores: Ansiedade ao tratamento odontológico. Humanização da assistência. Acolhimento.
ABSTRACT
Aim: The present study aimed to evaluate the subjectivity of patients according to their treatment provided by undergraduate students, the existence of dental anxiety, and the profile of an ideal dentist.
Materials and Methods: The present study is descriptive and exploratory, using a quantitative and qualitative method with content analysis. The data collection instrument included a structured interview with both objective and subjective questions, and the sample consisted of 48 spontaneous users of the dental clinics of Universidade Federal da Paraíba who fit the criteria of this study. Included in this sample were patients as of 12 years of age, of both genders, with no distinction of race, who had sought out dental care from November 2009 to May 2010. Excluded from the study were patients with special needs, who had no conditions to interact with the researcher. Identified in each case were the nuclei of existing meaning, from which the indicators were extracted in an attempt to determine their classification in categories and their overall count, whose results were expressed through frequency and whole numbers.
Results: Most respondents (56.3%) felt safe when treated by undergraduate students; 41.7% of the patients considered that an ideal dentist should have technical skills and be attentive, and 35% presented dental anxiety.
Conclusions: The patients feel safe and confident when they are treated by undergraduate dental students and feel that an ideal dentist should be a professional with technical skills, but above all, should maintain a humane and friendly contact with the patient. Dental anxiety is still a common fear among patients, but it is believed that this feeling will be minimized in the near future through new humanization policies within health services.
Uniterms: Dental anxiety. Humanization of assistance. User embracement.
INTRODUÇÃO
O desenvolvimento das relações interpessoais é fundamental para que se estabeleça um melhor entendimento entre a pessoa assistida e o profissional. Este tem que pensar no indivíduo como um "ser" e não apenas se preocupar com a sua sintomatologia. As pessoas desejam profissionais capazes tecnicamente, mas almejam também o aspecto humano nas relações sociais1. Portanto, é necessário dar um significado mais humanístico à prática odontológica, pois, quanto mais o dentista compreende as pessoas que o procuram, mais positivo poderá torna-se o tratamento.
A disparidade entre o que o paciente espera do atendimento (necessidade sentida) daquela que o dentista identifica como necessidade realé responsável pela dissonância de satisfação quanto aos resultados finais. Muitos profissionais não associam o sucesso do tratamento à satisfação do paciente2. Um estudo, realizado em Rio das Pedras-SP, objetivou verificar o hábito dos cirurgiões-dentistas quanto à transmissão de informações aos pacientes e à ocorrência de insatisfação com o tratamento. Os resultados demonstraram que os cirurgiões-dentistas pesquisados não possuíam o hábito de transmissão de informações adequadas aos seus pacientes, tendo como conseqüência relatos de insatisfação por parte deles3.
A satisfação do usuário é um dos fatores que determina a qualidade do atendimento nos serviços de saúde, e por meio dela se obtêm dados sobre expectativas e se buscam soluções para a melhoria do serviço prestado. Assim, o conhecimento da subjetividade dos pacientes quanto ao atendimento odontológico é de fundamental importância para um bom andamento do tratamento a ser realizado4. Muitos pacientes apresentam medos, traumas, ansiedade e expectativas, e o profissional deve estar habilitado a lidar com esses temores, adequando os procedimentos ao perfil de cada individuo.
A capacitação do estudante de Odontologia para avaliar as reações do paciente e para empregar estratégias psicológicas que minimizem a ansiedade e aumentem a freqüência de emissão de comportamentos colaborativos deveria ser considerada tão importante quanto a sua preparação técnica. Em um estudo para avaliar o impacto dos cursos de Odontologia, com orientações distintas, na formação profissional de cirurgiões-dentistas, foi observado que a instituição escolar, mesmo quando mais voltada para a saúde coletiva, não foi capaz de formar valores humanos nos seus egressos e sim capacitar aqueles que já eram mais sensíveis às questões sociais para atuarem neste campo5.
É de fundamental importância a formação de profissionais aptos para lidar com as mais diferentes realidades de forma integral e humanitária, de modo a proporcionar uma articulação entre profissional e paciente. A relação paciente/profissional abrange uma série de aspectos subjetivos que vão além do tratamento odontológico. O cirurgião dentista deve atentar para quadros de ansiedade experimentados pelo seu paciente, para transmitir-lhe confiança e firmar-se na imagem de alguém que reconstrói e repara. A consulta ao dentista é um momento de grande significado emocional para o paciente, pois se trata de um ato de bastante intimidade. Então, existe a necessidade da conscientização de que o trabalho do dentista deve ser revestido de um caráter muito maior e muito mais profundo do que somente recuperar a função e a estética e aliviar a dor do paciente6.
O paciente ao ser atendido de forma mais tranqüila e humana, torna-se mais cooperativo. O cirurgião-dentista não pode ignorar a parte emocional dos pacientes, e aumentar o vínculo afetivo entre profissional e paciente é vital para o bom andamento do tratamento odontológico. Uma atitude empática do dentista, seu respeito às queixas e sentimentos do paciente e a explicação clara dos procedimentos que serão realizados podem minimizar e até suprimir a ansiedade do paciente. Dessa forma, confiança, segurança, tranqüilidade e serenidade devem ser encorajadas pelo cirurgião-dentista durante as consultas7-8.
A discussão sobre a humanização do atendimento nos serviços de saúde tem ocupado, recentemente, uma posição de destaque nas propostas de melhoria das condições de saúde da população. Sendo assim, torna-se importante averiguar o sentimento presente nos pacientes atendidos por alunos nas escolas de Odontologia, para que se possa empregar, se necessário, estratégias que minimizem a ansiedade dos mesmos e aumentem a freqüência da emissão de comportamentos mais colaborativos. Além disso, o estudo irá contribuir para a discussão sobre a qualidade do atendimento e a satisfação dos usuários, com ênfase na humanização, que influenciará diretamente na formação dos futuros profissionais de saúde.
MATERIAIS E MÉTODOS
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do CCS/UFPB, sob o protocolo nº 005. Os pacientes foram convidados a fazer parte deste estudo e depois de serem informados sobre a importância e procedimentos da pesquisa, decidiam sobre a sua participação ou não. Para aqueles que se mostraram interessados em compor a amostra, foi entregue um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, para ser assinado por eles ou por um representante legal, quando de menor, de acordo com a resolução CNS 196/96 no que se refere às questões de ética em pesquisa com seres humanos. A taxa de resposta foi de 100%.
A pesquisa é do tipo descritiva, exploratória e observacional e utilizou métodos de análise quantiqualitativos9. A população foi constituída pelos pacientes da demanda espontânea das clínicas de Odontologia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). O processo de seleção da amostra foi por conveniência, representada por 48 pacientes, a partir de 12 anos de idade, de ambos os gêneros, sem distinção de raça, que procuraram os serviços odontológicos no período de novembro de 2009 a maio de 2010. Foram excluídos da pesquisa os pacientes portadores de necessidades especiais, que não tinham condições de interagir com o pesquisador.
Os dados foram coletados pelo método de autorelato, cujo instrumento de coleta foi uma entrevista estruturada com perguntas abertas e elaboradas especificamente para esse fim (Quadro 1). A coleta foi feita por um único pesquisador, devidamente treinado. Previamente, foi realizado um estudo piloto para verificar a necessidade de uma possível adequação do instrumento de coleta de dados (foi verificado se o roteiro da entrevista levantava os dados necessários para o alcance do objetivo proposto; se apresentava as questões redigidas de maneira compreensível para o paciente, se podia ser aplicado em tempo não prejudicial ao entrevistado e se permitia a análise dos dados pelo método selecionado).
Algumas diretrizes para o entrevistador foram estabelecidas, visando salvaguardar a regularidade das decisões e comportamentos e manter constantes as condições nas quais se processaram a entrevista: abordagem do paciente na sala de espera de atendimento; explicação sobre a pesquisa e assinatura do Termo de Consentimento; comunicação ao paciente que as respostas seriam anotadas e que os registros seriam validados com ele.
Após a coleta dos dados, os mesmos foram examinados com o uso da análise de conteúdo10, orientada pelo plano de pesquisa e pelos objetivos do estudo, adotando-se o tema como regra de recorte para as perguntas principais (com relação ao sentimento do paciente ao ser atendido por aluno e quanto ao perfil de um dentista ideal). Os dados relacionados à caracterização da população e das perguntas secundárias (se possuía ansiedade ao tratamento odontológico; e se tinha preferência para ser atendido por uma pessoa do sexo masculino ou feminino) foram apresentados descritivamente. Neste estudo, o recorte do texto foi de ordem semântica, isto é, a unidade de registro ou unidade de significação utilizada foi o "tema" (núcleo de sentido). Assim, foi identificado nas respostas do paciente a cada questão o(s) núcleo(s) de sentido existente(s), de onde foram extraídos os indicadores visando a classificação nas categorias e a contagem frequencial.
RESULTADOS
A amostra foi composta de 48 pacientes, entre 16 a 76 anos, com idade média de 50 anos, sendo 31,25% do sexo masculino e 68,75% do sexo feminino. Quanto ao nível de instrução, 58,4% tinham uma escolaridade igual ou acima do ensino médio completo, enquanto que 41,6% cursaram do ensino fundamental incompleto até o médio incompleto. Ressalta-se que nenhum entrevistado era analfabeto. As respostas das questões foram analisadas por categorias e indicadores. Para facilitar a compreensão, serão descritas, a seguir, as categorias que representaram os significados de cada questão e seus respectivos indicadores, ilustrados com exemplos de frases dos pacientes.
Questionamento sobre a subjetividade do paciente ao ser atendido por um aluno
Sentimento de insegurança - foram classificadas como pertencentes a esta categoria as referências dos pacientes quanto à falta de confiança ou firmeza no aluno e a existência de timidez. Indicadores: não passar firmeza; ter um pouco de medo; ainda estar aprendendo; ter apreensão; ter receio; ter vergonha. Ex: "Insegura, pois às vezes o estudante não passa firmeza".
Sentimento de segurança pela supervisão do professor - foram classificadas como pertencentes a esta categoria as referências dos pacientes quanto à existência de confiança e convicção no aluno em virtude do mesmo está sob a supervisão de um professor. Indicadores: ter um professor observando; ter um professor de lado; ter um professor olhando; ter um professor explicando passo a passo; ter um professor que observa e orienta; ter um professor sempre por perto. Ex: "Normal, pois sei que tem um professor observando".
Sentimento de segurança e tranquilidade - foram classificadas como pertencentes a esta categoria as referências dos pacientes quanto à existência de confiança, convicção e satisfação em ser atendido por um aluno, independente da presença do professor. Indicadores: trabalhar muito bem; trabalhar com cautela; ter capacidade; ser uma situação normal; ser mais observadores que os profissionais mais antigos; não fazer diferença; ter confiança neles; fazer um bom atendimento; agir como profissional. Ex: "Gosto muito, pois eles trabalham muito bem e com cautela".
Questionamento sobre o perfil de um dentista ideal
Eficiente - foram classificadas como pertencentes a esta categoria as referências dos pacientes quanto ao profissional que realiza as técnicas operatórias corretas e que está atualizado. Indicadores: fazer um bom serviço; mostrar profissionalismo; saber trabalhar direito; fazer um trabalho que o cliente fique satisfeito; não errar; ter um bom estudo; trabalhar bem com responsabilidade. Ex: "Que fosse eficiente no que faz".
Eficiente e atencioso - foram classificadas como pertencentes a esta categoria as referências dos pacientes quanto ao profissional que realiza as técnicas operatórias corretas, que está atualizado e que interage e é afável com os mesmos. Indicadores: Ser brincalhão, além de seguro na teoria e realizar bem a prática; cuidar de todos os problemas bucais e ser atencioso; passar segurança para a pessoa e ser atencioso; simpático, atencioso e experiente. Ex: "Seria o profissional que cuidasse de todos os problemas bucais e que tivesse atenção com o paciente".
Atencioso - foram classificadas como pertencentes a esta categoria as referências dos pacientes quanto ao profissional que interage e é afável com os mesmos. Indicadores: Ser paciente; ser atencioso; não ser ignorante; ser dedicado; ser sensível; se importar com o bem-estar do paciente; ser comunicativo; tratar bem os pacientes; ser simpático; ser calmo; ser educado. Ex: "Que seja atencioso, explique e que não seja ignorante".
As categorias de respostas obtidas quanto à subjetividade do paciente ao ser atendido por um aluno estão dispostas na Tabela 1. Observa-se que a maioria dos pacientes (56,2%) se sentia seguro ao ser atendido por um aluno, independentemente do mesmo estar sob a supervisão de um professor, enquanto que 31,3% dos entrevistados somente tinha segurança em ser atendido por um aluno, em virtude do mesmo se encontrar sob a vigilância do docente. Apenas 12,5% dos pacientes se sentiam inseguros ao serem atendidos por um aluno.
Na Tabela 1 também pode se observar as categorias de respostas obtidas quanto à opinião dos pacientes sobre como seria um dentista ideal. Verifica-se que a maioria dos entrevistados (41,7%) considerou que o dentista deveria ser eficiente (técnico) e atencioso; 33,3% afirmaram que teriam que ser eficiente e 25% opinaram que ser atencioso era o melhor predicativo para que o dentista seja considerado um profissional ideal.
A predileção dos pacientes, usuários das clínicas, pelo gênero do dentista que faria o atendimento foi investigada (Tabela 1). Verificou-se que a maioria (69%) não demonstrou qualquer preferência pelo gênero do profissional, enquanto que 31% praticamente se dividiram na preferência entre dentistas homens e mulheres.
A distribuição do percentual e números absolutos dos pacientes com ansiedade odontológica, também pode se observada na Tabela 1. Verifica-se que 65 % dos que responderam a pesquisa disseram não sentir qualquer temor, e 35% dos entrevistados responderam positivamente.
DISCUSSÃO
A humanização vem sendo preconizada na legislação vigente como essencial no processo de formação do cirurgião-dentista, bem como na prática diária profissional. Tornar essa teoria uma prática habitual é fundamental para o novo perfil delineado para o cirurgião-dentista11.
Este estudo partiu do desejo de se buscar informações a respeito da subjetividade dos pacientes ao serem atendidos por alunos de graduação, visto que pouco se relata na literatura sobre o assunto, ficando esse sentimento ignorado pelos profissionais e comunidade científica. E no processo de humanização dos serviços de saúde todos os dados que contribuam para a discussão sobre o acolhimento do usuário se torna relevante. Observou-se que a maioria dos pacientes se sentia seguro ao ser atendido por um aluno, independentemente do mesmo estar sob a supervisão de um professor. Tal fato poderá ser justificado pela atenção que os alunos dispensam aos seus pacientes, criando uma situação de cordialidade e amabilidade recíproca, que fortalece a confiança e a credibilidade, o que difere da maioria dos profissionais, que se limita a comunicação com seus pacientes, apenas tecnicamente3.
A atuação tecnicista do dentista, produto de um sistema de ensino em que habilidades manuais e procedimentos tecnológicos são preponderantemente ensinados e reforçados, contrasta, muitas vezes, com a necessidade de uma atuação mais humanística, exigida pela própria situação de proximidade física e pelo estado emocional vulnerável de muitos pacientes. Observa-se que um profissional preocupado apenas com o procedimento a ser realizado pode não perceber manifestações de ansiedade e, por isso, não oferecer o amparo necessário e imediato ao paciente12.
É muito importante a capacitação dos alunos de Odontologia para o acolhimento da subjetividade dos pacientes, com vistas à obtenção de comportamentos mais colaborativos, com maior resolutividade no atendimento13. Entretanto, alguns pesquisadores4 observaram que a instituição escolar, mesmo quando mais voltada para a saúde coletiva, não foi capaz de formar valores humanos nos seus egressos, demonstrando que princípios morais e afetivos são inerentes a formação do indivíduo, portanto, difíceis de serem ensinados na escola. Mas, o reforço desses ensinamentos na escola, poderá aprimorar o trato com o paciente, visando à formação de profissionais aptos para lidar com as mais diferentes realidades, de modo a proporcionar um serviço de saúde mais humanitário, com consequente melhoria da sua qualidade.
Se for realizada uma análise mais aprofundada desses resultados, é possível que todos os pacientes que responderam que se sentiam seguros em serem atendidos por alunos de graduação (87,5%) apresentaram esse sentimento por estar em âmbito escolar, o que implicitamente corresponde à existência de supervisão das atividades pelo professor. Entretanto, optou-se por dividir em duas categorias ("sentimento de segurança pela supervisão do professor"; e "segurança e tranqüilidade") visto que havia indicadores nas falas dos entrevistados que orientavam fortemente para a distinção entre elas. Esses dados parecem reforçar a credibilidade, por parte da comunidade, nas instituições de ensino superior, mas, seria interessante que esses resultados fossem comparados com outros estudos, com alunos fazendo o atendimento dos pacientes em outros espaços, como por exemplo, nos campos de estágio, onde não existisse a presença do docente.
Destaca-se que se for realizada uma somatória das opiniões dos pacientes quantoà necessidade do profissional ser atencioso, para ser considerado um dentista ideal, nas duas categorias que referem esse predicativo, verifica-se que uma alta frequência dos entrevistados tinha esse conceito. O tratamento odontológico se torna satisfatório quando o profissional mantêm uma comunicação com o paciente, entretanto, a sua capacidade técnica também é imprescindível14. Portanto, a maneira como o profissional se relaciona com o pacienteé tão importante, quanto a sua capacidade técnica, para que o atendimento odontológico tenha êxito, visto que a necessidade sentida pelo paciente poderá ser diferente da encontrado pelo profissional, resultando em expectativas frustrantes para o paciente, com conseqüente insatisfação no tratamento.
Os pacientes pesquisados não possuíam preferência pelo gênero do profissional para o atendimento odontológico. Entretanto, um estudo verificou que existe uma tendência do paciente escolher o profissional do mesmo sexo15. Por outro lado, o processo de socialização das mulheres ocasionou uma diferença de comportamento com relação aos homens, tornando-as mais afetivas e atenciosas para com o paciente, criando a expectativa que elas seriam preferidas pelos pacientes, em detrimento dos dentistas do sexo masculino16. Mas, esse estudo não mostra qualquer predileção, acreditando-se que quando o profissional possui domínio da técnica,associada ao trato humanizado com o paciente, como foi discutido anteriormente, seu gênero tem pouca importância.
O percentual de pacientes com ansiedade odontológica encontrado nessa pesquisa se assemelha a um estudo anterior, onde foi utilizada a MDAS (Modified Dental Anxiety Scale), e identificado 28,2% dos indivíduos com algum grau de ansiedade, num estudo com 252 pacientes acima de 18 anos17. Mas, outras pesquisas apontaram uma freqüência de ansiedade odontológica bem mais elevada18,19.É importante enfatizar que a amostra avaliada neste estudo contou com uma grande quantidade de pacientes adultos e idosos e que há uma nítida redução da ansiedade, na medida em que aumenta a idade do paciente18.
É possível que ocorra uma diminuição da ansiedade odontológica gradativamente, visto que as pessoas estão se informando mais sobre os procedimentos odontológicos que serão submetidos. Além disso, novas tecnologias estão sendo desenvolvidas no sentido de minimizar a utilização de protocolos clínicos mais dolorosos. E a humanização dos tratamentos de saúde, com maior ênfase nos dias atuais, gera uma relação de confiança entre paciente e profissional que favorece a redução desse temor.
A existência de ansiedade pode estar relacionada com histórico de experiência desagradável de atendimentos com a doença já instalada, o que normalmente causa mais desconforto. Mas, o bom relacionamento do profissional com seu paciente colabora para reduzir os seus anseios12,20.
Embora não tenha sido objetivo do estudo avaliar os sinais e sintomas dos pacientes que declararam ter alguma ansiedade relacionada com os procedimentos odontológicos, a maioria descreveu que apresentava sudorese, tremor e tensão. O paciente ansioso pode ser identificado pelo seu comportamento e pela avaliação ou reconhecimento de alguns sinais e manifestações, como sudorese intensa, distúrbios gastrintestinais, inquietação, agitação, palidez, taquicardia, tensão muscular, choro, náuseas, tonturas, tremores, entre outros20-26. Também existem pacientes que falam o tempo todo quase sem parar, que não param de cuspir como se fosse algo incontrolável e que nem conseguem abrir a boca27. A ansiedade exerce uma influência negativa no tratamento, afetando desde a freqüência de ida ao profissional até a cooperação do paciente20,28. E apesar do desenvolvimento de novas técnicas, os profissionais ainda precisam aperfeiçoar o manejo com a dor e o medo do paciente, além de controlar a própria ansiedade, que quando transmitida, pode ser um fator causador ou agravante da ansiedade do paciente12.
CONCLUSÕES
Os pacientes se sentem seguros e confiantes ao serem atendidos por alunos do curso de Graduação em Odontologia, nas Instituições de Ensino, e almejam que um dentista ideal seja um profissional com habilidades técnicas, mas, sobretudo, que tenham um contato humanizado e acolhedor com o paciente, independentemente do gênero do profissional. A ansiedade odontológica ainda é um temor freqüente entre os pacientes, mas, acredita-se que num futuro próximo esse sentimento seja minimizado em virtudes das novas políticas de humanização nos serviços de saúde.
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Autor correspondente:
Luciane de Queiroz Mota
Rua Sebastião Interaminense, 369/ 301 – Bessa
CEP: 58.036-300 – João Pessoa - PB - Brasil
e-mail:lucianeqmota@uol.com.br
Recebido em 05/09/2011 – Aceito em 23/01/2012