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Odontologia Clínico-Científica (Online)
versão On-line ISSN 1677-3888
Odontol. Clín.-Cient. (Online) vol.9 no.3 Recife Set. 2010
RELATO DE CASO CASE REPORT
Reconstrução estética utilizando prótese adesiva como forma de reabilitação oral em serviço público
Aesthetic reconstruction using adhesives prosthesisfor oral rehabilitation in public service
Ivone Lima SantanaI; Cadidja Dayane Sousa do CarmoII; Lívia Câmara de Carvalho GalvãoIII; Adriana de Fátima Vasconcelos PereiraIV
IProfessora Adjunta III Doutora de Prótese Dentária UFMA
IIMestranda em Odontologia pela UFMA
IIIGraduada em Odontologia UFMA
IVProfessora Adjunta II Doutora de Periodontia UFMA
RESUMO
OBJETIVO: Relatar um caso clínico sobre uso de prótese adesiva para reabilitação bucal em serviço público odontológico.
MÉTODOS: Foram confeccionados pônticos da prótese adesiva com resina composta reforçada por fibra de vidro para substituir dentes ântero-superiores, perdidos em paciente atendida na clínica odontológica da escola Sotero dos Reis, integrante do Programa Saúde na Escola.
RESULTADOS: Dentro das limitações de uma instituição pública, foi possível realizar um procedimento reabilitador de forma satisfatória.
CONCLUSÃO: Através desse procedimento clínico, houve o restabelecimento da função, estética e a inclusão social da paciente.
Descritores: Reabilitação Bucal; Prótese Dentária; Assistência Pública.
ABSTRACT
OBJECTIVE: To present a clinical case report about using adhesive prosthesis for mouth rehabilitation in public dental assistance.
METHODS: Pontics of adhesive prosthesis were placed in patient utilizing direct resin-bonded fibre-reinforced composite for maxillary central anterior teeth replacement. The study was held at the dental clinics of Sotero dos Reis School Health Program.
RESULTS: Within the limitations of public service, it was possible to perform oral rehabilitation satisfactory.
CONCLUSION: This clinical procedure was viewed as a simple means of allowing the function, aesthetic and social patient's inclusion.
Keywords: mouth rehabilitation, dental prosthesis, public assistance.
INTRODUÇÃO
A cárie e a doença periodontal são apontadas como as doenças bucais de maior prevalência e, na maioria das vezes, responsáveis por grande parte das perdas dentais1, assim como o trauma por queda, colisão, atividades esportivas, violência e outras2.
Somando-se a isso, a condição sócio-econômica dos indivíduos também deve ser considerada, já que muitos deles, especialmente os de baixo nível sócio-econômico, têm a extração dentária como método de solução para a dor3.
Sabe-se que a ausência de elementos dentais, principalmente anteriores, desempenha um importante papel na estética e harmonia por meio da autoestima, autoexpressão, comunicação e estética facial4.
A Odontologia, nas últimas décadas, tem apresentado inúmeras opções restauradoras com o intuito de oferecer resultados cada vez mais satisfatórios ao paciente5. E, como técnicas disponíveis para reabilitar ausência de elemento dental anterior, tem-se, por exemplo, o uso de prótese implanto-suportada6, prótese adesiva indireta7, prótese adesiva confeccionada em resina laboratorial associada à fibra de reforço8, prótese adesiva direta confeccionada com o próprio dente natural9 ou prótese fixa convencional10.
As próteses adesivas foram inicialmente propostas por Rochette em 1973, como forma de ferulização periodontal11. A indicação para substituição de dentes anteriores, entretanto, foi introduzida por Howe & Denehy em 197712.
Em destaque, o uso de prótese adesiva tem como vantagens o menor desgaste da estrutura dentária sadia, quando comparada com os preparos para as próteses fixas convencionais assim como facilidade na execução do preparo, menor tempo clínico, excelente estética, reversibilidade do tratamento e menor custo. Como limitações, oclusão em sobremordida, espaço edêntulo extenso, dentes pilares com coroas clínicas curtas e pacientes com parafunção6. Em casos de espaço protético muito amplo, existe a necessidade de se associar pró-tese adesiva com plástica dental prévia, sendo esta última definida pela caracterização total dos dentes, utilizando todos os recursos à disposição do cirurgião-dentista, desde a ameloplastia até o acréscimo em resina composta, para proporcionar beleza e melhor aparência ao indivíduo13.
A evolução dos sistemas adesivos e a associação de fibras de reforço possibilitaram o surgimento da prótese adesiva livre de metal6. Dessa forma, os sistemas de fibras vêm sendo empregados como novo tipo de procedimento restaurador para substituição de um ou dois elementos dentais perdidos, com o mínimo de desgaste da estrutura sadia. Com isso, a impregnação das fibras pelo sistema adesivo e a associação com resina composta permite a somatória da resistência à tração das fibras de vidro com a resistência à compressão da resina composta, resultando em menor índice de falhas, quando comparado às ferulizações com fios ortodônticos14.
Deve ser ressaltado que a Odontologia é uma ciência vinculada à promoção de saúde, que busca harmonização e satisfação do paciente. No entanto, os conceitos básicos referentes a tratamento odontológico vêm sofrendo evolução, e, com ela, a busca pela estética ganhou reforços, na medida em que não é mais dissociada da saúde, sendo considerada pré-requisito para o bem-estar psíquico-social do indivíduo15.
Dentro desse contexto, este trabalho objetiva mostrar um caso clínico de confecção de prótese adesiva direta em resina composta com associação de fibras de reforço impregnadas por resina composta como método reabilitador de espaço edêntulo referente a dois elementos dentais ântero-superiores.
RELATO DE CASO
Paciente leucoderma, 14 anos de idade, sexo feminino, compareceu à clínica da Escola Sotero dos Reis integrante do Programa Saúde na Escola - PSE, em São Luís/MA. Inicialmente, foram realizados anamnese e exame físico, nos quais foi verificada destruição total das coroas dos dentes 21 e 22. A radiografia periapical revelou a necessidade da remoção dos remanescentes radiculares devido ao grande comprometimento destes. A paciente encontrava-se em condição emocional prejudicada, pois se constrangia em sorrir, o que ocasionava mal-estar psicossocial.
Planejou-se, então, a fase cirúrgica assim como as fases protética, laboratorial e clínica, para reabilitação estética da paciente.
A fase cirúrgica foi iniciada com a remoção dos remanescentes radiculares dos dentes 21 e 22 (Figura 1). Em seguida, foi realizada moldagem do arco superior (Figura 2) e inferior bem como registros intermaxilares, para viabilizar o início da fase protética.
Sobre os modelos, foram, então, realizadas todas as etapas prévias à fase clínica. A mensuração do espaço edêntulo permitiu a confecção dos pônticos em resina composta Z350 (3M ESPE FiltekTM) assim como o posicionamento des-tes. Esse relacionamento foi registrado a partir de um guia de silicone. Os pônticos foram obtidos em resina composta (Figura 3), com o auxílio de coroas pré-fabricadas de poliacetato (Ableh moldados termoplásticos LTDA - Brasil).
Os nichos foram confeccionados nos pônticos, em toda a extensão palatina e à altura dos cíngulos e nos suportes em gesso, dos dentes 11 e 23, respectivamente nas faces mésio e distopalatinas (Figura 4).
A fase protética clínica foi iniciada com a confirmação da cor obtida nos pônticos, conforme informações durante o exame clínico: A3,5 no terço cervical, A3, no terço médio e A2, na incisal, além do opaco OA3. Foram confeccionados os nichos nos dentes suportes de forma similar aos preparos confeccionados nos modelos de gesso (Figura 5), sendo, para tanto, utilizadas brocas nº 2130 e 2131 (KG Soresen).
Os pônticos e dentes suportes foram submetidos à profilaxia, utilizando pedra pomes e água, a fim de se evitar qualquer contaminação que pudesse interferir na adesividade do cimento resinoso (3M ESPE RelyX TM ARC) utilizado para fixar a fibra de vidro aos nichos confeccionados nesses dentes. Foi feito o isolamento do campo e ataque ácido em pônticos e suportes. Após lavagem e secagem, utilizou-se adesivo de três passos (3M ESPE Scotchbond TM Multi-Purpose).
O procedimento de cimentação se deu com o auxílio da guia de silicone (Zetalabor Zhermack) (Figura 6) a qual foi devidamente posicionada e, em seguida, os pônticos. O tamanho exato da fibra de reforço foi obtido a partir de mensuração inicial com fio dental, para se obter o real tamanho e contorno da fibra, procedimento indispensável para evitar excessos desta e facilitar a sua inserção e adaptação aos nichos. O cimento resinoso (3M ESPE RelyX TM ARC) foi inserido e, sobre ele, a fibra de reforço (Fibra de vidro Interlig Ângelus), sendo o conjunto fotoativado por 40 segundos. Depois disso, restaurações foram feitas nas faces palatinas de pônticos e suportes.
O ajuste oclusal foi executado com o auxílio de papel carbono (AccuFilm II) , e, por fim, acabamento e polimento (Figura 7)
Orientações sobre higiene e cuidados foram prestadas à paciente. Após três dias, ela voltou para que fosse feita a caracterização dos pônticos, o que trouxe um resultado estético superior àquele obtido após o acabamento e polimento (Fotografia 8). A referida paciente autorizou a realização de tais procedimentos por meio de assinatura de um termo de consentimento livre e esclarecido.
DISCUSSÃO
Numerosos estudos mostram que as consequências da perda dental não estão limitadas aos aspectos clínicos e que há uma relação direta com as atividades diárias dos indivíduos16. No entanto, alguns profissionais, ainda, valorizam somente os aspectos biológicos e restauradores, desconsiderando as implicações da perda dental no bem-estar de cada indivíduo17,18,19. Problemas estes de ordem funcional, como comer, mastigar ou falar e social, como alterações comportamentais, insatisfação com a aparência, não aceitação na sociedade e no mercado de trabalho4.
Os traumatismos dentários podem produzir desloca-273 mentos dentários, fraturas coronárias e/ou radiculares e lesões ósseas e dos tecidos moles. A reabilitação de espaços anteriores por meio de prótese adesiva é perfeitamente viável, pois o aprimoramento de técnicas adesivas restringiu grandemente o desgaste da estrutura dentária remanescente de um dente a ser restaurado, visto que a união do material restaurador se dá às custas da adesão.
Considerando a condição clínica da paciente, aliada ao abalo psicossocial e à condição financeira desfavorável, optou-se pela realização de prótese adesiva confeccionada com resina composta e reforçada com fibra de vidro como tratamento reabilitador. Esse tratamento será, inicialmente, de caráter temporário, até o momento em que a paciente tenha condições de lançar mão de outro tipo de reabilitação. O resultado alcançado foi extremamente satisfatório, uma vez que resgatou a função, a estética e o bem-estar social, proporcionando à paciente os anseios de vida oferecidos por um sorriso.
A prótese adesiva com reforço de fibra de vidro foi a opção escolhida, por apresentar efetividade reabilitadora11, fornecer a associação da resistência à tração das fibras de vidro com a resistência à compressão da resina composta20, além de ser um procedimento conservador da estrutura dental, de rápida execução e de menor custo, o que torna possível sua realização dentro do serviço público odontológico.
Dessa forma, o serviço público tem que ser visto como opção de promoção, prevenção e reabilitação da saúde bucal e não, como mera opção mutiladora. O cirurgião-dentista deve ter como objetivo oferecer o melhor para o paciente dentro de suas condições de trabalho assim como deve alertar a administração do serviço público sobre a necessidade de condições dignas que o permitam realizar uma Odontologia de qualidade.
Percebe-se a necessidade de maior dedicação dos profissionais de saúde, por deterem o conhecimento científico odontológico e dos respectivos gestores, que são pessoas capacitadas e responsáveis pela oferta de condições de trabalho com o intuito de que mais tratamentos como esses possam ser eticamente oferecidos e realizados.
CONCLUSÃO
Diante dos resultados estéticos e psicológicos, obtidos com o caso descrito, conclui-se que o uso de prótese adesiva reforçada com fibra de vidro pode ser uma opção para a reabilitação de dentes anteriores perdidos, dentro das limitações do serviço público odontológico.
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Endereço para correspondência
Ivone Lima Santana
Departamento de Odontologia I UFMA
Rua Quéops - Qda. 22, Nº 14, Ap 703 - Renascença II - São Luís MA/BRASIL
CEP 65075-800
E-mail: ilima@usp.br
Recebido para publicação: 25/09/09
Aceito para publicação: 09/11/09