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Odontologia Clínico-Científica (Online)

versão On-line ISSN 1677-3888

Odontol. Clín.-Cient. (Online) vol.9 no.4 Recife Dez. 2010

 

RELATO DE CASO CASE REPORT

 

O uso da tomografia cone beam no auxílio ao diagnóstico e planejamento de cirurgia periapical: relato de caso clínico

 

The use of cone-beam volumetric tomography to help diagnose and plan a periapical surgery clinical case report

 

 

Paulo Sérgio dos Santos D'AddazioI; Neuza Maria Souza Picorelli AssisII; Celso Neiva CamposIII; Tiago dos Reis BastosIV; Raphaela de Mello LopesIV

IMestre em Clínica Odontológica – Professor Substituto de Endodontia - FO/UFJF
IIDoutora em Odontologia Restauradora – Professora Adjunta de Cirurgia - FO/UFJF
IIIDoutor em Clínica Odontológica – Professor Associado de Endodontia - FO/UFJF
IVGraduandos em Odontologia – FO/UFJF

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O diagnóstico e o planejamento das intervenções são fundamentais na execução de um tratamento cirúrgico. Um método rotineiramente usado para auxiliar no diagnóstico de lesões periapicais é a radiografia periapical, porém, com essa técnica, estruturas anatômicas tridimensionais são comprimidas em imagens bidimensionais, resultando em superposição de estruturas de interesse diagnóstico. Este artigo relata um caso clínico de um paciente que apresentava uma lesão cística, de dimensões expressivas, na região anterior da maxila cuja cirurgia foi planejada e executada após a visualização das margens da lesão por imagens de tomografia computadorizada Cone Beam (TCCB). Dessa forma, foi possível concluir que a TCCB constitui-se como um método preciso para auxiliar no diagnóstico, propiciando uma maior exatidão no planejamento, pois permite a visualização tridimensional das estruturas.

Descritores: Tomografia Computadorizada Cone Beam; Cirurgia periapical; Diagnóstico.


ABSTRACT

The diagnosis and planning of interventions are vital for the execution of a surgical treatment. A method used routinely to help diagnose periapical lesions is the periapical radiography. However, with this technique, three-dimensional anatomic structures are compressed into two-dimensional images resulting in the superposition of structures of diagnostic interest. This article reports the clinical case of a patient who presented a cystic lesion of expressive dimensions in the anterior region of the maxilla, and whose surgery was planned and performed after visualization of the lesions' margins by means of Cone Beam Computed Tomography (CBCT). Thus, it is possible to determine that CBCT constitutes a precise method to help diagnosis, providing better accuracy for planning as it allows the three-dimensional visualization of structures.

Keywords: beam Computed Tomography, Periapical Surgery, Diagnosis.


 

 

INTRODUÇÃO

No planejamento de uma cirurgia periapical, deve-se avaliar a área afetada pela lesão e as estruturas anatômicas adjacentes. Ao se realizar o exame radiográfico, deve-se optar por técnicas de imagem que possam fornecer maiores informações da região como, por exemplo, as radiografias panorâmicas1.

Um método rotineiramente usado para auxiliar o diagnóstico e tratamento de lesões perapicais é a radiografia periapical, porém, com essa técnica, estruturas anatômicas tridimensionais são comprimidas em imagens bidimensionais , resultando em superposição de estruturas de interesse diagnóstico2. Embora as radiografias panorâmicas e periapicais reproduzam detalhes aceitáveis no sentido mésio-distal, a observação no sentido vestíbulo-lingual é inadequada 3. A tomografia computadorizada, devido às suas características, proporciona a visualização tridimensional de lesões patológicas e sua relação com estruturas anatômicas importantes2.

A tomografia computadorizada é um método auxiliar no diagnóstico, que permite a observação e a localização tridimensional de lesões císticas , dos dentes adjacentes e das estruturas anatômicas envolvidas e circunvizinhas, permitindo a realização do planejamento e do procedimento cirúrgico com maior precisão4.

A tomografia computadorizada Cone Beam ( TCCB), também denominada tomografia volumétrica digital, apresentou-se recentemente como o mais novo recurso de imagem em Odontologia, sendo que o seu uso nas mais diversas especialidades vem sendo descrito na literatura, como, por exemplo, no auxílio ao diagnóstico e ao planejamento de intervenções em cirurgia oral5. A TCCB é uma nova tecnologia que produz imagens tridimensionais a um menor custo, menor dose de radiação , permitindo um exame de realização mais fácil e com maior rapidez6. Sua tecnologia usa um feixe de radiação de formato cônico para adquirir uma imagem em volume com uma simples rotação em 360º, similar à radiografia panorâmica. Em seguida, com a ajuda de softwares, podem ser obtidas visualizações axiais , coronais e sagitais com cortes de 0,125 a 2 mm e reconstruções tridimensionais (3D). A capacidade de reduzir ou eliminar a superposição de estruturas adjacentes torna a TCCB superior à radiografia periapical7-8, auxiliando no diagnóstico e a valiação pré-cirúrgica e apresentando benefícios em relação à tomografia médica e radiografias periapicais7-9. As vantagens em relação à tomografia convencional incluem: escaneamento único para maxila e mandíbula, maior nitidez, permite diferenciar os tecidos dentários, menor presença de artefatos gerados por estruturas metálicas5-10.

Diante do exposto, a TCCB apresenta grande valor no planejamento de cirurgias maxilofaciais 10-11, como a apicectomia12, podendo, também, contribuir para o diagnóstico de lesões periapicais13-14.

Este estudo objetivou demonstrar um caso clínico de cisto periapical inflamatório, em que a hipótese diagnóstica e a determinação do correto plano de tratamento foram confirmadas através de imagens em cortes transversais oblíquos de Tomografia Computadorizada Cone Beam.

 

RELATO DO CASO

Paciente do sexo masculino, 35 anos, leucoderma, compareceu à Clinica do Serviço Especial de Cirurgia Oral (SECO), da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Juiz de Fora, com queixa de fístula na região vestibular do dente 22. O paciente relatou histórico de tratamento e retratamento endodôntico dos elementos dentários 11, 21 e 22, sendo a última intervenção realizada há cerca de seis meses . Ao exame clínico, observou-se apinhamento do dente 23 sobre o 22 e presença de fístula na região vestibular, mobilidade grau I dos dentes 21 e 22, ausência de bolsas periodontais à sondagem e resposta positiva aos testes de vitalidade pulpar do dente 23. Não havia queixa de sintomatologia dolorosa na região.

O paciente apresentou radiografia periapical realizada há cerca de dois meses , mostrando uma lesão radiolúcida, estendendo-se da mesial do dente 21 até a mesial do 23, intimamente relacionada com o assoalho da cavidade nasal e parede anterior do seio maxilar . Foi solicitada uma radiografia panorâmica para avaliação do caso (Figura 1), na qual a lesão apresentava-se com limites pouco nítidos, não permitindo a identificação precisa de suas margens e sua relação com as estruturas anatômicas adjacentes. A primeira hipótese diagnóstica foi de cisto periapical inflamatório, de acordo com o histórico do caso e com o aspecto radiográfico. Foi então, indicada a enucleação da lesão e exame anátomo-patológico da peça. No planejamento cirúrgico, houve a dúvida se a lesão já havia invadido ou não as cavidades naturais adjacentes (seio maxilar e cavidade nasal) e da necessidade ou não de exodontia dos dentes adjacentes à lesão, com confecção de prótese parcial removível provisória. Com o objetivo de se obter melhor visualização, determinação dos limites da lesão, bem como a sua relação com dentes e cavidades vizinhas, e o estabelecimento de um correto plano de tratamento, foi solicitada uma Tomografia Computadorizada Cone Beam (Figura 2). Após a análise das imagens em cortes transversais oblíquos e a observação nítida de seus limites, optou-se pela cirurgia periapical com remoção da lesão e apicectomia dos dentes 21 e 22 (Figura 3). O exame histopatológico confirmou a hipótese diagnóstica de cisto periapical inflamatório. O paciente foi orientado quanto à higiene oral e a necessidade de retornos periódicos para proservação. A radiografia periapical, realizada após 6 meses, mostrou significativa regressão da lesão(figura 4).

 

 

 

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Os cistos periapicais são lesões revestidas por epitélio, com grande alteração quanto à prevalência, podendo variar entre 7 a 54% das radiotransparências periapicais 15-16. Caracteristicamente os pacientes não apresentam sintomatologia, como o caso clínico deste artigo. Porém, se a lesão atingir um maior tamanho, pode ser observada tumefação e sensibilidade16, aspectos não identificados na anamnese e exame clínico deste relato.

É importante que todo tecido alterado removido durante uma cirurgia deva ser submetido a um exame histológico para seu correto diagnóstico. A formação dos cistos periapicais está associada à proliferação dos restos epiteliais de Malassez , associados a um elemento dentário com necrose ou presença de bactérias nos condutos15-16. O caso clínico relatado apresentava três dentes anatomicamente relacionados com a lesão , submetidos anteriormente a dois tratamentos endodônticos sem sucesso e com coroas clínicas escurecidas.

É fato que as lesões podem variar de tamanho, apresentando a perda da continuidade do ligamento periodontal na visualização radiográfica. A cirurgia periapical está indicada para lesões acima de 2 cm e em dentes em que está descartada a hipótese de sucesso pelo tratamento endodôntico convencional16-17. Destaca-se também que se o tratamento e/ ou retratamento endodôntico por meio convencional não tiveram resultados positivos, a cirurgia periapical parece ser o procedimento mais indicado, incluindo a curetagem da lesão e a amputação radicular16-17.

Com relação às imagens obtidas , as radiografias periapicais e panorâmicas permitiam a visualização global das margens e limites da lesão e das estruturas adjacentes1, não evidenciando, contudo, detalhes da relação da lesão com cavidades naturais, raízes dos dentes afetados e estruturas anatômicas2-3. O planejamento cirúrgico inicial , baseado nas radiografias, previa a remoção cirúrgica da lesão, juntamente com a exodontia dos dentes afetados15-16 e a colocação de uma prótese provisória imediata.

A observação de imagens por Tomografia Computadorizada Cone Beam em planos de secção transversal permitiu a observação da região em profundidade, eliminando sobreposições2-6, contornando, assim, uma grande limitação das radiografias periapicais, que é a ausência de profundidade. Desse modo, foi possível a observação mais apurada dos dentes e das estruturas relacionadas, propiciando a verificação exata das margens da lesão e sua íntima relação com estruturas adjacentes7-9-18, conduzindo a uma abordagem mais conservadora na terapia cirúrgica10-11. Foi indicada, então, a enucleação do cisto, seguida de apicectomia2-16-17, com envio do material para exame patológico15-16.

É importante o exame cuidadoso das lesões e sua relação anatômica com estruturas adjacentes antes do planejamento de uma cirurgia oral menor , para evitar complicações cirúrgicas19. As informações obtidas nos exames clínicos ou por imagens influenciam diretamente nas decisões clínicas , sendo que dados precisos permitem decisões mais adequadas e um prognóstico mais favorável. Dentro deste contexto, a TCCB possibilita aos cirurgiões informações mais relevantes que não poderiam ser obtidas por radiografias convencionais7.

Deve-se salientar, contudo, que os exames radiográficos odontológicos convencionais devido às suas características, como facilidade de aquisição, interpretação e baixo custo, ainda constituem-se em um importante recurso auxiliar ao diagnóstico e planejamento de um procedimento cirúrgico, devendo ser a primeira opção do profissional. Outro ponto importante a ser considerado é que os exames tomográficos Cone Beam apresentam uma maior quantidade de radiação em comparação às radiografias convencionais, bem como um maior custo, sendo necessária uma análise criteriosa do caso para verificar a real necessidade de sua utilização e o custo-benefício do exame. A expectativa é a de que , com o desenvolvimento da tecnologia da TCCB, e a redução dos custos do exame, esta venha a ser utilizada de maneira mais rotineira em procedimentos de cirurgia oral menor.

 

CONCLUSÃO

A Tomografia Computadorizada Cone Beam propicia uma maior exatidão no planejamento de intervenções cirúrgicas, pois permite a visualização das estruturas em 3D, eliminando as deficiências de visualização bidimensionais, obtidas pelas radiografias convencionais, contribuindo assim para um correto diagnóstico e a elaboração de um plano de tratamento eficiente, que são fundamentais para o sucesso do tratamento.

 

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Endereço para correspondência
Paulo Sérgio dos Santos D'Addazio
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Telefone: 32- 3233-2624 / 32 - 9988-3803
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Recebido para publicação: 08/03/10
Aceito para publicação: 10/06/10