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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial
versão On-line ISSN 1808-5210
Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.10 no.4 Camaragibe Set./Dez. 2010
ARTIGOS ORIGINAIS
Acidentes e complicações associadas à cirurgia dos terceiros molares realizada por alunos de odontologia
Accidents and complications associated to third molar surgeries performed by dentistry students
Rogério Bentes Kato; Renan de Barros Lima Bueno; Patrício José de Oliveira Neto; Michel Campos Ribeiro; Marcelo Rodrigues Azenha
Mestre em CTBMF - Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (USP)
RESUMO
O objetivo deste artigo é o de demonstrar as taxas de acidentes e complicações nas cirurgias de terceiros molares realizadas por alunos do último ano do curso de graduação em Odontologia.
METODOLOGIA: a análise retropectiva do prontuário de 122 pacientes submetidos à extração dos terceiros molares foi realizada. A idade dos pacientes, o gênero, a posição do dente no arco e os acidentes e complicações decorrentes das cirurgias foram considerados. Prontuários com dados incompletos foram excluídos do estudo. Do total, 88 pacientes foram incluídos, totalizando 210 extrações.
RESULTADOS: A maioria dos pacientes era do gênero feminino (70,47%), com idade média de 24 anos. Os molares inferiores corresponderam a mais da metade dos procedimentos cirúrgicos (56,2%), senda a posição vertical (60,37%) a mais encontrada. Os casos de acidentes e/ou complicações totalizaram 10,47% dos procedimentos, sendo a hemorragia (2,38%), as fraturas radiculares (1,90%) e as fraturas da tuberosidade maxilar (1,90%) as mais encontradas. Outros acidentes/complicações encontrados foram deiscência de sutura (1,45%), comunicação buco-sinusal (0,95%), parestesia (0,95%), alveolite (0,47%) e infecção (0,47%).
CONCLUSÕES: a inexperiência do cirurgião não pôde ser considerada como um fator determinante para o aumento das taxas de acidentes e complicações em exodontias dos terceiros molares, tendo em vista a semelhança dos resultados deste trabalho com estudos desenvolvidos por cirurgiões experientes. É importante salientar a necessidade do conhecimento por parte dos alunos dos tratamentos mais adequados para os diferentes acidentes e complicações encontradas.
Descritores: Acidentes; Complicações; Terceiro Molar; Cirurgia.
ABSTRACT
The aim of this work is to demonstrate accidents and complications rates on third molars surgeries performed by senior dentistry students.
METHODS: a restrospective study of 122 patient charts submitted to third molars surgeries was done. Patient age, gender, dental in arch position, and accidents/complications were considered with the charts presenting incomplete dates being excluded from study. After all, 88 patients (210 surgeries) were included.
RESULTS: the majority of the patients were female (70,47%), with average age of 24 years old. Mandibular molars represented more than half of the surgical procedures (56,2%), with teeth at vertical position the most found (60,37%). The cases of accidents and complications totalized 10,47% of all performed procedures, being bleeding (2,38%), root fractures (1,90%) and maxilar tuberosity (1,90%) the most found. Suture dehiscence (1,45%), oro-antral comunications (0,95%), paresthesia (0,95%), alveolitis (0,47%) and infection (0,47%) were also observed.
CONCLUSIONS: surgeons inexperience was not considered a determinant factor to modify the rates of accidents and complications at third molars surgeries when compared to previous works developed by experienced surgeons. Is important to highlight the necessity of the students knowledge of the most adequate treatments of each of the accidents and complications.
Key-words: accidents; complications; third molar; surgery.
INTRODUÇÃO
As principais razões para a extração dos terceiros molares incluem quadros de pericoronarite aguda ou crônica, lesões teciduais, problemas periodontais, lesões cariosas, dor idiopática e tratamentos ortodônticos. A grande maioria das cirurgias dos terceiros molares é realizada sem intercorrências, mesmo sendo um dos procedimentos cirúrgicos mais realizados na clínica odontológica. Entretanto, tal procedimento pode acarretar sérias complicações ao paciente, como hemorragia, alveolite, infecção, fratura radicular, parestesia e fratura do tecido ósseo, além de fratura mandibular e lesão aos dentes vizinhos1. As taxas de acidentes ou complicações associadas à extração dos terceiros molares pode variar de 2.6% a 30.9%, com diferentes fatores, podendo influenciar nos resultados, como idade do paciente e seu estado de saúde, gênero, grau de impacção do dente, experiência do cirurgião, tabagismo, uso de medicação anticoncepcional, qualidade da higiene oral, técnica cirúrgica, entre outros4. Bui et al.5 afirmam haver uma forte associação entre os índices de acidentes/complicações e três principais fatores que incluem a idade do paciente, história médica e grau de impacção dentária.
Previamente a qualquer procedimento cirúrgico, o paciente deve ser informado dos possíveis acidentes e/ou complicações que possam ocorrer durante todo o tratamento, estando ciente de que toda e qualquer situação não planejada deverá ser tratada da maneira mais adequada possível. A forma mais adequada de prevenção das situações inesperadas é o planejamento do procedimento cirúrgico desde o conhecimento da história médica do paciente até os cuidados pós-operatórios que cada paciente deve observar2,3. Com isso, o objetivo deste estudo foi o de realizar uma análise retrospectiva dos índices de acidentes e complicações associados à extração de terceiros molares em cirurgias realizadas por alunos do último ano de graduação em Odontologia. Foram analisados os tipos de acidentes e complicações encontrados, as características de cada paciente e o tratamento instituído em cada situação
MATERIAL E MÉTODOS
A avaliação retrospectiva do prontuário de 122 pacientes submetidos à extração dos terceiros molares foi realizada com o objetivo de verificar possíveis acidentes e/ou complicações encontradas na Clínica de Cirurgia da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto. Os critérios para inclusão dos pacientes no estudo foram: a realização dos procedimentos cirúrgicos pelos alunos do último ano de graduação, sob anestesia local; a necessidade de extração de, pelo menos, um terceiro molar; ausência de alterações sistêmicas que inviabilizassem a cirurgia; descrição detalhada do procedimento cirúrgico no prontuário; e acompanhamento pós-operatório mínimo de sete dias. Após avaliação desses critérios, 88 pacientes (210 extrações) foram incluídos no estudo, sendo o gênero, a idade, a posição do dente no arco e os acidentes e complicações avaliadas.
Para a realização dos procedimentos cirúrgicos, o protocolo de antissepsia proposto por Barros6 foi empregado, sendo realizado o bloqueio dos nervos alveolares inferiores, bucais e linguais nas técnicas de extração dos dentes inferiores e o bloqueio dos nervos palatinos maiores e alveolares superiores posteriores para os procedimentos cirúrgicos realizados nos dentes superiores. A solução anestésica empregada em todos os casos foi a Mepivacaína a 2% com epinefrina 1:100.000 (Mepivalem, Dentsply, Cantanduva, SP, Brasil). Todos os pacientes foram submetidos a técnicas cirúrgicas similares através do uso de elevadores e/ ou fórceps, além da realização, quando necessário, das técnicas de osteotomia e odontossecção através do uso de broca tronco-cônica montada em motor de alta rotação sob irrigação abundante. Imediatamente após as exodontias, os cuidados com o alvéolo foram realizados, e as suturas concluídas com o uso do fio de Seda 4-0 (Ethicon, Johnson&Johnson, São José dos Campos, SP, Brasil). Ao término dos procedimentos cirúrgicos, todos os pacientes foram orientados aos cuidados pós-operatórios e medicados com Dipirona Sódica (40 gotas, uso oral de 6 em 6 horas) e Ibuprofeno (400 mg por via oral de 12 em 12 horas) por 3 dias, sendo orientados a retornar após 7 dias para controle pós-operatório e remoção da sutura.
Durante a análise dos prontuários e com o uso dos exames por imagens, os dentes extraídos foram classificados em mesioangulados, distoangulados, verticais ou horizontais, definindo, assim, seu posicionamento no arco. Respeitando os princípios éticos de participação voluntária, todos os pacientes incluídos neste estudo assinaram o Termo de Consentimento Informado, sendo os riscos da cirurgia explicados em detalhes a todos eles previamente aos procedimentos.
RESULTADOS
Oitenta e oito pacientes operados na Clínica de Cirurgia da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (USP), entre os anos de 2008 e 2009, foram incluídos no estudo, sendo 26 do gênero masculino (29,54%) e 62 do gênero feminino (70,45%), com média de idade de 24 anos. No total, foram extraídos 210 terceiros molares, 92 superiores (43,8%) e 118 inferiores (56,2%). Quanto à classificação de Winter, 127 (60,37%) dos dentes extraídos estavam na posição vertical, 33 (15,09%) na posição mesioangulada, 28 (13,20%) na posição horizontal e 23 (11,32%) estavam na posição distoangular (Gráfico 1). Os casos de acidentes e complicações ocorridos no estudo totalizaram 10,47% dos dentes extraídos (22 dentes), sendo classificados em: 5 casos de hemorragia (2,38%), 4 casos de fratura radicular (1,90%), 4 casos de fratura da tuberosidade maxilar (1,90%), 3 casos de deiscência de sutura (1,45%), 2 casos de comunicação buco-sinusal (0,95%) e de parestesia (0,95%) e 1 caso de alveolite (0,47%) e de infecção (0,47%). (Gráfico 2)
Houve uma maior taxa de acidentes e complicações nos pacientes do gênero feminino (73,91%), quando comparado aos pacientes do gênero masculino (27,28%) (Tabela 1). A posição dos terceiros molares parece ter influenciado na taxa das complicações. Dos 28 dentes extraídos na posição horizontal, 8 desses dentes tiveram acidentes ou complicações, totalizando uma taxa de complicação de 28,57%. Os dentes extraídos que se encontravam na posição mesioangulada apresentaram uma incidência de 3 acidentes/complicações (9,3%), seguido dos dentes na posição vertical, em que 11 (8,6%) acidentes/complicações foram observados dentre 127 cirurgias. Já os dentes classificados como distoangulados apresentaram a menor taxa de acidentes/complicações, com 1 (4,34%) episódio dentre 23 cirurgias. (Tabela 2).
Considerando o tratamento de cada acidente ou complicação, as hemorragias ocorreram no período transoperatório e foram controladas por pressão manual com gaze e suturas. Ocorreram 4 fraturas radiculares, sendo todos os fragmentos removidos no mesmo tempo cirúrgico. Nas situações em que foi observada a fratura da tuberosidade maxilar, o fragmento ósseo foi removido por apresentar-se aderido à distal do terceiro molar, sem, contudo, ocasionar transtornos aos pacientes. Nos casos de comunicação buco-sinusal, optou-se pelo fechamento imediato através do deslocamento do retalho e suturas, com nenhum paciente apresentando complicações tardias. Nos casos de alveolite, o tratamento de escolha foi a irrigação com soro fisiológico da região, formação de coágulo, aplicação tópica de Alveosan®e sutura, com a troca da medicação sendo realizada durante três dias. As situações de parestesia evoluíram de maneira satisfatória, com os dois pacientes recuperando as funções normais nos primeiros 30 dias após a cirurgia sem, contudo, serem necessários tratamentos adicionais, apenas o acompanhamento clínico. O episódio de infecção foi tratado com drenagem da coleção purulenta via alvéolo, limpeza do local com soro fisiológico, sutura do retalho e prescrição de Amoxicilina por via oral durante 7 dias, com ausência de sinais infecciosos após esse período.
DISCUSSÃO
Os acidentes e as complicações estão associados a diferentes fatores, como idade do paciente, gênero, história médica pregressa, o uso de medicações, quadros prévios de pericoronarite, qualidade da higiene oral, tabagismo, tipo de impacção, tempo cirúrgico, técnica cirúrgica empregada, experiência do cirurgião, uso ou não de antibióticos e antissépticos tópicos, dentre outros3-5,7-9. Por se tratar de um estudo retrospectivo, os autores do presente estudo foram cautelosos quanto à inclusão dos pacientes na pesquisa. Pacientes com alterações sistêmicas ou que faziam uso de medicação para tratamento de doenças crônicas, como doenças cardiovasculares e/ou alterações endócrinas, foram excluídos do estudo assim como pacientes tabagistas, com histórico de pericoronarite e com higiene oral insatisfatória. Com isso, procurou-se padronizar as características individuais de cada paciente, para que os resultados encontrados fossem os mais fiéis possíveis em relação aos acidentes e às complicações.
A cirurgia de remoção dos 3m é o procedimento mais comumente realizado dentre as cirurgias orais, e, como todo tipo de cirurgia, possui riscos e acidentes e/ou complicações que podem acometer os pacientes. É considerado acidente toda situação inesperada ocorrida durante o ato cirúrgico e complicação as situações inesperadas encontradas após o término da cirurgia. Considerando as complicações, os episódios mais frequentes são: alveolite, infecção, hemorragia, parestesia temporária, hematoma e edema exacerbado, sendo incomuns as situações de fraturas mandibulares, comunicação buco-sinusal persistente, dano permanente ao nervo, lesões aos dentes vizinhos, ou ainda, quadros de osteomielite3-5,8,9. Considerando os acidentes decorrentes das cirurgias dos terceiros molares, os mais comuns são fraturas radiculares, fratura do processo alveolar e hemorragias. Acidentes, como fratura do túber, deslocamento do 3º molar para os espaços fasciais, injúrias ao nervo, comunicação buco sinusal ou fraturas mandibulares, são considerados incomuns e, até mesmo, raros. As avaliações de dor e edema pós-operatório não foram incluídos no nosso trabalho por não haver na literatura um consenso sobre essas complicações e por acreditarmos serem consequências do trauma cirúrgico3-5,9,10. Nossos resultados demonstraram uma taxa de acidentes e complicações de 10.47%, resultados similares aos achados científicos mais recentes (2.6% a 30.9%), demonstrando não haver diferença nos índices de acidentes e complicações dos procedimentos realizados por acadêmicos e profissionais experientes.
O gênero feminino apresentou maior índice de acidentes e complicações (73,91%) do que o masculino (27,28%), porém apenas estes valores descritivos não dão a certeza de que realmente o gênero feminino possa ter um maior risco de desenvolver acidentes/ complicações nas cirurgias dos terceiros molares. Neste estudo a grande maioria dos pacientes (70,45%) eram do gênero feminino, aumentando, com isso as chances de um acidente ou complicação ocorrer nesse grupo de pacientes. Cohen & Simecek11 demonstraram haver um maior número de complicações em pacientes do gênero feminino, sem, contudo, apontar as reais causas, o que difere de Muhonen et al.12 que encontrou maiores índices em pacientes do gênero masculino.
Dentre os acidentes e/ou as complicações mais comumente encontrados, a hemorragia e a alveolite merecem destaque. Em relação à hemorragia, tal situação pode ocorrer tanto no período transoperatório (acidente) quanto após o término da cirurgia (complicação), sendo nesses casos classificada em tardia ou recorrente. Nas situações de sangramento intenso, classificado como tardio, a hemorragia tem início apenas após o término do tratamento, uma única vez. Nos casos de hemorragias recorrentes, mais de um episódio de sangramento abundante ocorre com o extravasamento sanguíneo acontecendo mesmo após debelado inicialmente. Variações anatômicas, posicionamento do dente em relação ao canal mandibular e quadros de discrasia sanguínea são as principais causas das hemorragias. Os quatro casos de hemorragia do presente estudo (2,38%) ocorreram durante o ato cirúrgico de extração dos dentes inferiores e foram controlados através da compressão local com gaze estéril. Não houve a necessidade do uso de nenhum material com propriedades coagulantes. Bouloux et al.3 afirmam que os episódios de hemorragia representam de 0.2% a 5.8% dos acidentes/complicações e que a manobra de compressão é uma técnica segura e confiável no controle dos sangramentos intensos. Em nenhum dos casos, foi observado qualquer sinal de variação anatômica ou alterações sanguíneas. Acreditamos que o grau de impacção dos dentes possa ter ocasionado os sangramentos transoperatórios, tendo em vista a proximidade do dente ao plexo vásculo-nervoso do canal mandibular. Concluímos, portanto, que os sangramentos foram decorrentes de lesões às estruturas presentes no interior do canal mandibular.
A alveolite, entretanto, é um dos temas mais controversos em cirurgia bucal, principalmente quanto ao seu diagnóstico, aos fatores etiológicos e à prevenção3,5,13-15. Define-se alveolite como sendo uma dor intensa e latejante, incessante com o uso de analgésicos de rotina, com surgimento entre o 2º e o 5º dia após a cirurgia, presença de odor fétido e ausência de tecido íntegro no interior do alvéolo. Esse processo se dá devido à fibrinólise do coágulo, sendo associado por muitos pesquisadores à invasão bacteriana11,14-16. Como possíveis fatores de risco, podemos incluir manobras cirúrgicas intempestivas, experiência do cirurgião, posição do dente, idade do paciente, tabagismo, gênero feminino, o uso de contraceptivos orais e corticoides, uso de anestésicos locais com vasoconstritor, fatores intrínsecos, como discrasias sanguíneas, entre outros8,11,14,16. Precious et al.17, avaliando os riscos e benefícios da extração dos terceiros molares, afirmam que as situações de alveolite variam entre 1% e 5%, independentemente da habilidade do cirurgião ou das técnicas cirúrgicas utilizadas. A maioria dos artigos apresenta um índice variando entre 5% e 10% 2,5,9. Os resultados obtidos no nosso estudo demonstraram que apenas 0.95% dos pacientes apresentaram alveolite, o que difere dos autores citados anteriormente. Nossos resultados são de extrema importância quando discutimos dois pontos: todas as cirurgias foram realizadas sem profilaxia antibiótica e os operadores foram alunos de graduação. Isso demonstra não haver a necessidade de profilaxia antibiótica para a cirurgia dos terceiros molares em pacientes que não apresentam distúrbios sistêmico e que a experiência do operador não tem influencia no estabelecimento das situações de alveolite.
Considerando o uso de contraceptivos por via oral, Okamoto & Perri de Carvalho18 demonstraram que o uso de tais medicações provoca intenso atraso no processo de reparo por ocasionar um retardo na fase de formação do coágulo. Cohen et al.11, através de uma revista na literatura dos trabalhos mais relevantes, sugerem que há dados suficientes para considerar os contraceptivos orais como importante fator de risco para alveolite em cirurgias eletivas de remoção dos terceiros molares, sugerindo que o ideal seria realizar esse tipo de tratamento nos dias em que o medicamento não está sendo utilizado. Entretanto, não foram encontradas evidências suficientes para afirmar que o ciclo menstrual possa influenciar na instalação dos quadros de alveolite. Garcia et al.15 e Benediktsdóttir et al.16 afirmam ainda que mulheres que fazem o uso de contraceptivos orais apresentam até 5 vezes mais chances de desenvolver alveolite do que homens. Os dois casos de alveolite diagnosticados em nosso estudo foram observados em pacientes do gênero masculino, demonstrando, com os nossos resultados, não haver relação entre o gênero dos pacientes com quadros de alveolite.
Outras considerações que devem ser feitas em relação à alveolite é a idade do paciente, podendo haver deficiência no processo de reparo e cicatrização nos pacientes mais velhos e uma piora da qualidade do tecido ósseo7. Tais dados não condizem com os nossos resultados, pois ambos os pacientes que apresentaram alveolite eram jovens e com boa qualidade óssea. Fatores anteriormente citados, como dificuldade da cirurgia, experiência do cirurgião, posição do dente no arco, tabagismo e o uso de anestésicos locais com vasoconstritor não apresentam dados científicos conclusivos para assegurar que esses fatores são relevantes para a formação dos quadros de alveolite5,11,14. Diferentes manobras são indicadas para a prevenção da alveolite, incluindo a lavagem generosa da cavidade com soro fisiológico durante a ato cirúrgico, utilização de antisséptico nos períodos pré e pós-operatório e manutenção do coágulo no interior do alvéolo com técnicas de sutura adequadas. Quando a alveolite já está instalada no interior do alvéolo, pode-se lançar mão de substâncias medicamentosas intra-alveolares, ou simplesmente, a irrigação do alvéolo com solução fisiológica e formação do coágulo. No presente estudo, os casos com diagnóstico de alveolite foram tratados com a colocação de pasta medicamentosa intra-alveolar (Alveosan®) imediatamente após o diagnóstico, sendo o curativo substituído diariamente durante 3 dias. Todos os casos evoluíram satisfatoriamente, demonstrando a eficácia do tratamento proposto19.
As fraturas radiculares são as complicações encontradas com a segunda maior incidência neste estudo, sendo observado que os pacientes acima de 24 anos são os mais afetados5. É de nossa opinião que os dentes terceiros molares devam ser extraídos, preferencialmente antes da rizogênese completa, diminuindo os riscos de fraturas radiculares, corroborando os resultados de Arrigoni & Lambrecht20. Em todos os casos acompanhados por nós, as raízes fraturadas foram removidas sem dano aos tecidos adjacentes. Entretanto, quando tal manobra não é possível, o tratamento mais indicado é o sepultamento radicular e proservação, evitando, com isso, remoção exacerbada de tecido ósseo ou lesão aos tecidos vizinhos. Nesses casos, exames por imagens periódicos são indicados para o controle do remanescente radicular.
Outra complicação encontrada em nosso estudo foi a deiscência do retalho nos dias seguintes à cirurgia. Essa situação é observada, quando o tecido mole sofre uma retração, expondo o tecido ósseo subjacente. As principais causas são a inadequada técnica de fechamento do retalho, rompimento prematuro das suturas ou forças mecânicas locais. Dentre os trabalhos pesquisados, não foram encontradas citações sobre essa complicação. Acreditamos que tenham sido incluídas nas seções de infecções citadas por outros autores4. Encontramos uma taxa de deiscência de 1.42%, o que pode ser explicado pela falta de experiência do operador tanto na realização da sutura (dificuldade de acesso, falta de habilidade), quanto à falta de cuidados no período pós-operatório por parte dos pacientes. O tratamento dos casos de deiscência incluiu a limpeza da área exposta, anestesia da região e nova sutura, com todos os casos evoluindo de maneira adequada, após a intervenção.
Apresentando uma frequência que pode variar de 0.008% até próximo de 1%, a comunicação bucosinusal (CBS) é definida como qualquer abertura que se forma entre o seio maxilar e a cavidade bucal, podendo ocorrer no transoperatório e,também, no pós-operatório1,3,5. Dentes com íntimo contato com o seio maxilar apresentam elevado risco de lesionar a membrana sinusal durante as manobras de exodontia, devendo o tratamento das CBS ser realizado de acordo com cada situação clínica. O tratamento é imediato, ou seja, o fechamento da CBS ocorrida durante a cirurgia deve ser realizado com o posicionamento de um retalho de espessura total sobre a comunicação através dos retalhos bucal, palatal, lingual ou pedículo do corpo adiposo da bochecha, entre outros. O importante é ter a certeza da completa obliteração da ferida cirúrgica, evitando, com isso, CBS tardias que requerem procedimentos cirúrgicos adicionais. Orientações pós-operatórias aos pacientes são essenciais para o sucesso do tratamento nos primeiros dias de pós-operatório, como evitar o uso de canudos, espirrar de boca aberta, não realizar bochechos e não assoar o nariz. Na presente pesquisa, encontramos 2 casos (0.95%) de CBS, ou seja, dentro da média descrita na literatura.
Blondeau & Daniel9 encontraram 1.1% de incidência de parestesia do nervo alveolar inferior após a extração dos terceiros molares, sendo que em 0.5% dos casos, os pacientes relataram quadro de parestesia permanente. Estudos prévios apresentam índice de parestesia variando entre 0.4% e 8.4%, não fazendo citação em relação ao tempo de parestesia1,10. Afirmam ainda que o grau de impacção tem influência direta nos quadros de parestesia, demonstrando que dos 6 casos encontrados, cinco encontravam-se na posição IIC e um caso, na posição IC, além de as posições mesioangulares e distoangulares apresentarem duas vezes mais chances de provocarem algum grau de parestesia. Considerando danos ao nervo lingual, a manipulação excessiva do retalho e o uso inadequada dos instrumentais são as principais causas de parestesia. Observa-se que o índice de parestesia da região lingual pode variar de 0% e 23%4,8,16. Os resultados do nosso trabalho estão de acordo com todos os estudos pesquisados, em que observamos apenas 2 (0,95%) casos de parestesia temporária do nervo alveolar inferior, com resolução espontânea até 30 dias após a cirurgia, com os dentes extraídos apresentando elevado grau de impacção (IIC) em posição horizontal e nenhuma situação de lesão ao nervo lingual, resultados idênticos aos de Bui et al.5.
Trabalhos avaliando as taxas de acidentes e complicações após a cirurgia de terceiros molares realizadas por cirurgiões experientes demonstraram que as fraturas da tuberosidade maxilar ocorreram em apenas 0.6% dos procedimentos cirúrgicos1. Devido à falta de experiência dos operadores responsáveis pelas cirurgias dos pacientes, encontramos um índice bastante superior (1.9%), possivelmente pelo uso excessivo de força ou pela inadequada sindesmotomia da região distal ao terceiro molar superior. Outras possíveis causas são: o posicionamento do dente, sua relação com o seio maxilar e a qualidade do tecido ósseo. As opções de tratamento desse acidente incluem a remoção do fragmento fraturado ou o reposicionamento deste.
A última complicação encontrada em nosso trabalho foi a infecção pós-cirúrgica imediata. Fatores, como idade do paciente, utilização das técnicas de osteotomia e/ou odontossecção, atraso no reparo alveolar, estado prévio de inflamação local, inexperiência do cirurgião e a falta do uso da profilaxia antibiótica são considerados predisponentes para a infecção3,7,16. A profilaxia antibiótica é o fator mais controverso dentre todos citados3,8,9,14,16,21 com alguns trabalhos apontando para a necessidade do seu uso apenas nas situações onde há exposição do plexo vásculo-nervoso do canal mandibular, aumentando em até 7 vezes as chances de infecção16. A taxa de infecção do presente estudo foi de 0.47%, enquanto que a descrita na literatura sugere uma variação entre 0.8% e 4.3%1,3,5,9. Isso possibilita concluir que, como citado anteriormente, o uso profilático dos antibióticos para a extração dos terceiros molares se faz desnecessário e que a experiência do cirurgião não é um fator fundamental para o aparecimento da infecção. Outro fator a ser considerado em nosso estudo foram os critérios de inclusão. Apenas pacientes com bom estado geral de saúde e boa higiene bucal foram selecionados, o que pode ter influenciado nos resultados.
CONCLUSÕES
1. A inexperiência do cirurgião não é um fator determinante para o aumento das taxas de acidentes e complicações nas cirurgias dos terceiros molares.
2. Pacientes do gênero feminino apresentaram índices de acidentes e complicações mais elevados, possivelmente devido ao número maior de cirurgias realizadas neste grupo de pacientes.
3. Os índices de acidentes e complicações deste estudo são similares aos estudos científicos prévios.
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Correspondência:
Dr. Marcelo Rodrigues Azenha
Departamento de Morfologia, Estomatologia e Fisiologia
Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto, USP
Av. do Café, s/n, Monte Alegre
Ribeirão Preto SP CEP 14040-900
marceloazenha@usp.br / marceloazenha@yahoo.com.br
(16) 36024805 / (16) 81789938
Recebido em 14/01/2010
Aprovado em 04/05/2010