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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.13 no.1 Camaragibe Jan./Mar. 2013

 

 

Osteoma de mandíbula: relato de caso

 

Osteoma of the mandible: a case report

 

 

Thiago Serafim CesaI; Jean Carlos Della GiustinaI; Alessandra Ferreira da SilvaII; José Luis DissenhaIII; Laurindo Moacir SassiIV

I Cirurgião-Dentista. Residente do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-facial, Hospital erasto Gaertner, Curitiba - PR (CBMF-HeG)
II Cirurgiã-Dentista. estagiária do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-facial, Hospital erasto Gaertner, Curitiba - PR (CBMF-HeG)
III Cirurgião-Dentista do Serviço de CBMF-HeG, Curitiba - PR. especialista em CTBMF (Uningá)
IV Chefe do Serviço de CBMF-HeG, Curitiba - PR. Doutor em Ciências da Saúde, Universidade Federal de São Paulo, UNIFeSP. Coordenador da Residência, CTBMF-HeG. Coordenador da Coremu (1- Programa Multiprofissional atenção ao Câncer; 2- Programa Saúde Odonto- Cirurgia e Traumatologia BucoMaxiloFacial-HeG)

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Osteomas são tumores de crescimento ósseo benigno, que se apresentam sob a forma periosteal ou endosteal e acometem comumente os ossos do esqueleto craniofacial, sendo raramente encontrados em outras partes do corpo. Quando presentes, frequentemente são encontrados na mandíbula, maxila, nos seios paranasais e no osso frontal. São neoplasias de crescimento lento, geralmente assintomáticas, que podem se desenvolver em osso esponjoso ou compacto. O osteoma periférico apresenta-se, geralmente, como um tumor solitário, unilateral, encontrado mais frequentemente no corpo da mandíbula. Neste artigo, é descrito um relato de caso de um osteoma periférico em uma paciente do sexo feminino, na oitava década de vida, sintomático, localizado em corpo mandibular, com 10 anos de evolução.

Descritores: Osteoma; Mandíbula; Maxila; Neoplasias ósseas.


ABSTRACT

Osteomas are benign tumors of growing bone that present in a periosteal or endosteal form and commonly affect the craniofacial skeleton bones, being rarely found in other parts of the body. When present, they are often found in the mandible, maxilla, frontal bone and paranasal sinuses. They are slow-growing neoplasms, usually asymptomatic, which can develop in compact or cancellous bone. The peripheral osteoma usually presents as a solitary unilateral tumor, most often found in the body of the mandible. This paper presents a case report of a peripheral osteoma located in the mandibular body in a symptomatic female patient in her eighth decade of life with ten years of progression.

Keywords: Osteoma; Mandible; Maxilla; Bone Neoplasms.


 

 

INTRODUÇÃO

O osteoma é um tumor benigno osteogênico, que pode acometer o esqueleto craniofacial, com ocorrência rara em outros ossos1-3. Tal neoplasia pode surgir a partir do osso esponjoso ou compacto, recebendo a denominação de central ou endosteal e periosteal ou periférico, a depender da região de sua ocorrência1. O osteoma periférico, de localização periférica ou superficial ao osso, é descrito como uma massa óssea, pediculada, de crescimento lento e assintomático, que, muitas vezes, pode estar associado à deformidade facial ou inchaço intrabucal2,4. De uma maneira geral, os osteomas são encontrados em ambos os sexos, em pacientes de faixas etárias variáveis, com notável preferência por adultos3,5,6. A maioria dos osteomas são encontrados na mandíbula, maxila ou nos seios paranasais, com predominância do tipo periosteal5,6. O diagnóstico do osteoma periférico é estabelecido com o auxílio de recursos radiográficos, combinados com a análise das características histológicas4,7,8. É necessário, porém, diferenciar clinicamente a exostose (hamartoma) do osteoma, o qual, apesar de poder ser confundido com uma deformidade tecidual de desenvolvimento, é uma neoplasia verdadeira1. A natureza assintomática e o crescimento lento da lesão permitem uma atitude conservadora frente a esse tumor, estabelecendo, para esses casos, um acompanhamento clínico e radiográfico regular do paciente5. Pacientes com sintomatologia ou aumento de volume podem ter o seu tratamento cirúrgico indicado tanto pela dor quanto pela dificuldade de mastigação ou por razões estéticas1,9. A recorrência desse tipo de lesão é rara, e a associação dos osteomas com a Síndrome de Gardner ou traumas anteriores deve ser investigada7. O presente artigo trata de um caso clínico de um grande osteoma periférico de mandíbula.

 

RELATO DE CASO

Paciente D.A.D.S, sexo feminino, 77 anos procurou o Serviço de Cirurgia Buco-Maxilo-Facial do Hospital Erasto Gaertner (HEG), relatando aparecimento de um tumor na boca, assintomático, com 10 anos de evolução, o qual causava dificuldade de deglutição e disfonia. Ao exame clínico, observou-se uma massa tumoral pediculada de superfície lisa, de coloração rósea, semelhante à mucosa, dura à palpação, com aproximadamente 5 cm em seu maior diâmetro, em região de rebordo mandibular esquerdo (Figura 1). O exame de tomografia computadorizada demonstrou uma lesão óssea expansiva, densamente calcificada, que emerge da região lingual de corpo de mandíbula em direção à cavidade oral (Figura 2). Após a realização da biópsia em nível ambulatorial, foram solicitados os exames pré-operatórios e programado ressecção cirúrgica em centro cirúrgico. O paciente foi submetido a procedimento cirúrgico, sob anestesia geral, sendo realizada uma incisão em rebordo alveolar inferior, em corpo de mandíbula esquerdo, anterior à localização do tumor. Após o descolamento do retalho, observou-se a presença de um osso cortico-esponjoso. Para facilitar a remoção do tumor, optou-se pela secção do bloco ósseo em vários segmentos (Figura 3). Após a ressecção total da lesão, optou-se por uma plastia óssea, assim como a exodontia dos elementos dentários, pela condição precária apresentada. A mucosa foi suturada com fio vicryl 3.0 (Figura 4). Após 1 ano de pós operatório, o paciente encontra-se em acompanhamento mediante avaliação clínica e radiográfica, por meio da qual se observou excelente consolidação óssea, não apresentando sinais de recidiva.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Osteoma é uma neoplasia benigna incomum de tecido ósseo, de crescimento lento e contínuo10,11, que ocorre comumente nos ossos craniofaciais2,12. É caracterizado pela proliferação de osso compacto e/ou esponjoso2,6, o que permite classificá-lo em dois grupos: osteoma periosteal, que surge superficialmente ao osso e osteoma endosteal, localizado no osso medular1. A etiologia da doença não está clara. Baena et al. (2011) explicam que, no caso do osteoma periférico, ele não pode ser considerado uma anomalia de crescimento, pois a lesão é observada, principalmente, em pacientes que não estão mais em seu período de desenvolvimento; mas sim, que poderia ter uma natureza reativa em casos de trauma confirmado13. Pacientes com histórico de trauma que resultou no desenvolvimento de osteoma periférico com crescimento lento e constante são relatados nos trabalhos de Cutilli e Quinn (1992), Bjornland et al. (2009) e Baena et al. (2011), respectivamente com 7, 11 e 15 anos de crescimento gradual9,11,13. O osteoma periosteal ou periférico, relatado no nosso caso clínico, é geralmente uma lesão unilateral e pediculada, que pode evoluir por meio de expansão lenta, causando assimetria facial, com provável prejuízo funcional e estético para o paciente14. Os sinais e sintomas frequentemente descritos são assimetria facial2,3,5,6,9,10,13-16 e inchaço1,2,4,9,10-15 no local, devido à presença da lesão, sendo a ausência de sintomatologia dolorosa um relato comum5,6. Quando grandes lesões são encontradas, pode haver prejuízo na estética e função, como a dificuldade de deglutição12,14; o que está de acordo com o relato de caso, no qual a dificuldade de falar e a disfagia constituem parte do quadro clínico. Em nossa paciente, também foi observado um nódulo (com aproximadamente 5 cm de extensão, em seu maior diâmetro), de consistência endurecida e indolor à palpação, com superfície lisa, de cor semelhante à mucosa normal e base pediculada. Características consistentes com a maioria das manifestações clínicas correspondentes ao osteoma periosteal, que geralmente se apresenta como uma massa nodular ou tumoral, fixa e de consistência rígida, frequentemente pedunculada2,16. É importante investigar a associação do aparecimento do osteoma com a evidência de pólipos intestinais, o que seria consistente com a síndrome de Gardner9,14,16. Tal síndrome pode ter o seu diagnóstico confirmado em pacientes submetidos ao exame de colonoscopia6 positivo para a presença de pólipos, associado à verificação de anomalias dentárias e de osteomas na região oral e maxilofacial, além de histórico familiar, confirmando a existência da síndrome17. A identificação precoce do quadro clínico dessa condição é muito importante, haja vista o alto risco de transformação maligna dos pólipos intestinais, os quais aparecem, todavia, vários anos após o surgimento das manifestações orais mediante osteomas17. O diagnóstico diferencial para esse tipo de tumor são, principalmente, as exostoses4,15 e o osteoblastoma4, sendo o diagnóstico definitivo baseado nos achados clínicos, radiográficos e anatomopatológico4,7,8. Radiografias convencionais são necessárias assim como exames por tomografia computadorizada são valiosos instrumentos para uma avaliação pré-operatória e um diagnóstico mais preciso11,13, pois osteomas costumam ter a mesma densidade óssea do osso normal11. No entanto, a radiografia panorâmica da paciente atendida em nosso serviço apresentava uma imagem radiolúcida com focos radiopacos (mista), localizada na região posterior esquerda da mandíbula e sem limites definidos, sugerindo uma impressão distinta das características radiográficas mais comuns nesse tipo de patologia que seria de uma massa densa e radiopaca, bem definida e bem circunscrita8,9,14,16. A localização mais comum dos osteomas é a mandíbula3,5-7, a maxila5-7 e os seios paranasais5,6 podendo ocorrer, todavia, no osso frontal como localização preferencial, de acordo com pesquisa realizada por Sayan et al. (2002), na qual foram analisados 35 casos de osteomas7. O tipo predominante é o osteoma periférico3,5-7, sendo a localização preferencial do osteoma periosteal a superfície lingual e borda inferior do corpo da mandíbula2. Kaplan et al., em estudo de 10 casos de osteoma periférico, afirmam ter sido nove o número de pacientes nos quais a lesão se encontrava localizada na borda inferior da mandíbula, porém da face vestibular, tendo apenas um caso evidente no aspecto lingual8. Casos de osteoma periférico têm sido relatados na literatura, demonstrando o seu crescimento lento ao longo de anos9,11,13,14. Kerckhaert et al. (2005) abordam um caso em que o crescimento da lesão ocorreu durante um longo período de 40 anos14. Os osteomas, de uma maneira geral, são diagnosticados em diferentes idades3,5-7, com maior prevalência, a partir dos 30 anos de idade5,7, não havendo predileção por sexo3,5,6. A maioria dos osteomas periféricos são diagnosticados após a idade de 25 anos, sendo que a duração das lesões varia de 1 a 22 anos de desenvolvimento8. A paciente do caso clínico estava com 77 anos de idade no momento do diagnóstico e apresentou uma lesão com 10 anos de desenvolvimento na face lingual do rebordo inferior esquerdo da mandíbula. O padrão histológico do tumor é descrito, principalmente, por sua composição de osso compacto2,10,13,15,16, com secções do espécime (massa óssea), podendo conter um trabeculado irregular12, liso16, lobu lado10,16 e branco10 e, até mesmo, uma fina camada de tecido fibroso cobrindo esse tecido ósseo11. Em nossa amostra, foi possível observar, macroscopicamente, múltiplos fragmentos ósseos, espiculados, com segmento de tecido irregular, elástico, liso, de cor castanha e opaco, medindo aproximadamente 3,5 x 2,4, x 0,4 cm. Quanto ao tratamento, pode-se optar pelo invasivo por meio de excisão cirúrgica9,12,15, nos casos em que a assimetria ou alguma sintomatologia se faz presente1,5,13. Ou seja, por razões estéticas ou para alívio da pressão sobre estruturas vizinhas, causado pelo crescimento lesional e que podem estar resultando em dor, prejuízo ou perda de função1. Pacientes que tiveram osteomas removidos cirurgicamente devem ter um acompanhamento clínico e radiográfico cuidadoso, devendo ele ser mantido nas lesões assintomáticas para as quais um tratamento mais conservador foi o escolhido5. Nenhuma transformação maligna tem sido relatada14, sendo as recidivas não comuns nesse tipo de tumor2,7,8,9,12. Em nossa paciente, o tratamento de escolha foi a ressecção cirúrgica da lesão devido à queixa de sintomas, como a dificuldade de falar e deglutir. A paciente encontra-se em acompanhamento pós-operatório de um ano, sem sinais clínicos ou radiográficos de recidiva.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O osteoma periférico pode ser confundido, clinicamente, com exostoses (hamartomas), tendo o seu diagnóstico sido comprovado por meio da análise dos exames radiográficos bem como do resultado histológico da lesão biopsiada. O tratamento da lesão sintomática ou associada à assimetria facial acontece por meio de excisão cirúrgica simples, com posterior acompanhamento do paciente. A recidiva pode ocorrer, mas é raro. Nesse relato, foi apresentado um caso de um grande osteoma periférico em mandíbula, sintomático, com tempo de evolução de dez anos, cujo tratamento foi a ressecção da lesão. O paciente está em acompanhamento há um ano, sem sinais clínicos e radiográficos de recidiva.

 

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Endereço para correspondência:
Laurindo Moacir Sassi
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