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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial
versão On-line ISSN 1808-5210
Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.13 no.4 Camaragibe Out./Dez. 2013
Análise epidemiológica dos traumas bucomaxilofaciais de um serviço de emergência
Epidemiological analysis of maxillofacial trauma of an emergency service
Fábio Luiz Ferreira ScannavinoI; Fabiano de Sant'Ana dos SantosII; José Pereira Novo NetoIII; Leonardo Pereira NovoIV
I Doutor em Ciências Odontológicas pela Faculdade de Odontologia de Araraquara, São Paulo, Universidade Estadual de São Paulo Julio de Mesquita Filho. Professor da disciplina de Metodologia Científica do Curso de Odontologia do Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos, São Paulo.
II Doutor em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, São Paulo. Professor da disciplina de Diagnóstico e Cirurgia do Curso de Odontologia do Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos, São Paulo.
III Mestre em Reabilitação Oral pela Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Professor Mestre das disciplinas de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, Diagnóstico e Cirurgia do Curso de Odontologia do Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos, São Paulo.
IV Cirurgião-Dentista. Graduado pelo Curso de Odontologia do Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos, São Paulo.
RESUMO
Objetivo: Analisar a epidemiologia dos traumas bucomaxilofaciais de um serviço de emergência. Metodologia: Estudo retrospectivo de corte longitudinal histórico realizado por meio da análise de prontuários de pacientes atendidos no serviço de emergência da Santa Casa de Misericórdia de Barretos, São Paulo, Brasil, no período de março de 2004 a abril de 2009. Resultados: Foram analisados 250 prontuários, sendo a maioria do gênero masculino (85%; n=213). Quanto a faixa etária, (36%; n=90) dos traumatismos bucomaxilofaciais ocorreram entre 26 a 40 anos de idade. Trinta e cinco por cento (n=87) dos pacientes foram vítimas de acidentes de trânsito. As agressões físicas corresponderam a (24%; n=60) das emergências realizadas. Vinte e dois por cento (n=55) dos traumas se enquadraram em "outros", 15% (n=38) dos traumas foram provocados por acidentes domésticos e 3% (n=8) por acidentes laborais. Um por cento (n=2) foi relacionado a acidente por arma de fogo. Conclusão: Os traumas bucomaxilofaciais são frequentes nos serviços de emergência e os acidentes de trânsito e a violência urbana são os principais fatores etiológicos desta epidemia.
Descritores: Traumatismos faciais; Fraturas maxilomandibulares; Ferimentos e lesões; Acidentes de trânsito; Violência.
ABSTRACT
Objective: To analyze the epidemiology of maxillofacial trauma of an emergency service. Methodology: A retrospective study of historical longitudinal conducted through analysis of medical records of patients seen in the emergency department of the "Santa Casa de Misericórdia de Barretos", São Paulo, Brazil, from March 2004 to April 2009. Results: We analyzed 250 records, mostly male (85.0%, n=213). As for the age group (36.0%, n=90) of maxillofacial injuries occurred between 26 and 40 years old. Thirty five percent (n=87) of patients were victims of traffic accidents. The assaults accounted for (24.0%, n=60) performed emergencies. Twenty two percent (n=55) of trauma not fit in "other", (15.0%, n=38) of the injuries were caused by home accidents and (3.0%, n=8) for industrial accidents. One percent (n=2) was related to the accident by firearms. Conclusion: The maxillofacial trauma are common in emergency services and traffic accidents and urban violence are major etiological factors of this epidemic.
Descriptors: Facial Injuries. Maxillofacial Injuries. Wounds and Injuries. Accidents, Traffic. Violence.
INTRODUÇÃO
Traumas resultantes de colisões de trânsito, afogamento, envenenamento, quedas ou queimaduras, agressões pessoais, as guerras matam mais de 5 milhões de pessoas em todo o mundo anualmente e causam danos a outros milhões, sendo reconhecido como uma pandemia. Eles são responsáveis por 9% da mortalidade mundial, e são uma ameaça à saúde em todos os países do mundo. Para cada morte, estima-se que há dezenas de hospitalizações, centenas de visitas aos departamentos de emergências e milhares de consultas médicas. Uma grande proporção de pessoas sobreviventes dos ferimentos incorre deficiências temporárias ou permanentes, sobrecarregando os serviços de reabilitações.1-3
As lesões e ferimentos bucomaxilofaciais apresentam grande importância na sociedade contemporânea. A face é uma parte do corpo que está normalmente exposta sem proteções externas, que quando traumatizada resulta em lesões graves. O trauma facial é um assunto de grande relevância, pois é uma emergência médica cada vez mais frequente, principalmente nas últimas 4 décadas, estando associado ao aumento dos acidentes com veículos automotores e da violência urbana.2,4,5
As fraturas de mandíbula, nariz e do zigomático são as mais prevalentes da região maxilofacial. A epidemiologia das fraturas da face variam com o tipo, gravidade e etiologia da lesão, podendo depender da população pesquisada.6 Da região bucal, os incisivos centrais seguido dos incisivos laterais da maxila são os dentes mais prevalentes as injúrias traumáticas ocasionadas por quedas, acidentes automobilísticos e violência.7
O objetivo dessa pesquisa foi verificar os tipos de fraturas bucomaxilofaciais e tratamentos realizados em pacientes atendidos no serviço de emergência do Departamento de Traumatologia Bucomaxilofacial da Santa Casa de Misericórdia de Barretos, São Paulo, Brasil.
METODOLOGIA
Estudo retrospectivo de corte longitudinal histórico realizado por meio da análise de prontuários pertencentes aos pacientes atendidos pelos profissionais do Departamento de Traumatologia Bucomaxilofacial da Santa Casa de Misericórdia de Barretos, São Paulo, Brasil, no período de março de 2004 a abril de 2009.
Os dados foram coletados utilizando uma ficha que contemplava as seguintes variáveis: gênero, faixa etária a época do trauma, etiologia (automobilístico, motociclístico, ciclístico, violência interpessoal, atropelamento, queda, acidentes laboral e doméstico, arma de fogo e branca e "outros" no qual foram incluídos acidentes de menor incidência com agressão com barra de ferro na face, cabeçada de cavalo, cabeçada entre pessoas, esportes, coices de boi ou cavalo, objetos metálicos sobre o paciente, pisadas de boi ou cavalo, acidente com trator, localização anatômica da lesão e terapêutica realizada no paciente).
Em seguida, os dados eram armazenados no aplicativo Microsoft Office Excel 2003 e as análises estatísticas dos dados foram realizadas por meio do Programa EpiInfo, versão 3.2.2 e pelo SPSS versão 11.0. Para a isenção de conflitos éticos e de interesse relacionados à pesquisa, o trabalho foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos – CEP/UNIFEB, sob protocolo nº 004/2009.
RESULTADOS
A análise dos 250 prontuários permitiu inferir que em relação ao gênero, 85% (n=213) dos traumas bucomaxilofaciais ocorreram em homens. Quanto a faixa etária, 36% (n=90) dos traumatismos ocorreram entre 26 a 40 anos de idade, conforme consta na Figura 1.
Quanto a etiologia, 35% (n=87) dos pacientes atendidos na emergência foram vítimas de acidentes provocados por veículos automotores, motocicletas e bicicletas. As agressões físicas corresponderam a 24% (n=60) das emergências realizadas. Vinte e dois por cento (n=55) dos traumas se enquadraram em "outros", 15% (n=38) dos traumas foram provocados por acidentes domésticos e 3% (n=8) por acidentes laborais. Um por cento (n=2) foi relacionado a acidente por arma de fogo. Quanto à localização das lesões, esses dados podem ser visualizados na Figura 2. Dos tratamentos realizados nos pacientes traumatizados, a redução cirúrgica incruenta por meio de ganchamento e arco de Erich com ou sem fio de aço foi predominante em 40% (n=100) dos prontuários pesquisados, seguido da redução cruenta em 38% (n=95) e as extrações e reimplantes dentários em 22% (n=55).
A análise dos prontuários, também permitiu o cruzamento de dados. Nesse sentido, quando comparado o gênero com a etiologia dos traumas, o masculino esteve relacionado diretamente com os acidentes automobilísticos, motociclísticos e ciclísticos em 32% (n=80), conforme ilustrado na Figura 3.
A comparação entre a faixa etária e o local da fratura, apontou que dos 16 a 25 anos a mandíbula foi a mais acometida nos traumatismos (Figura 4).
Tendo em vista o local da fratura e o tratamento realizado, a redução cruenta na maioria dos casos foi realizada na mandíbula (Figura 5).
DISCUSSÃO
No presente estudo observou-se a ocorrência de traumas bucomaxilofaciais, em sua maioria, no gênero masculino, cuja faixa etária corresponde à fase de transição da juventude para à adulta. Outros estudos epidemiológicos retrospectivos semelhantes a essa pesquisa corroboram nossos achados.4,7-9 A maior frequência das lesões e ferimentos bucomaxilofaciais em homens adultos jovens pode ser explicada pelo fato do homem trabalhar fora de casa e assumir atividades de risco, tornando-o mais vulnerável aos acidentes.10
Os acidentes de trânsito foram os principais responsáveis pelas causas das lesões e ferimentos bucomaxilofaciais, seguido das agressões físicas. Esses resultados concordam com os dados obtidos por outros pesquisadores.5,11,12 Estudos tem descrito que a agressão física tem sido o principal agente etiológico dos traumas bucomaxilofaciais como consequência direta do aumento da violência urbana.2,4,13 Recentemente, um estudo prospectivo analisou as injúrias de cabeça e de face de jovens adolescentes vítimas de morte não naturais, o resultado do estudo revelou que as lesões por arma de fogo foram responsáveis pela maioria das mortes seguido dos acidentes provocados pela violência de trânsito.14
Os acidentes de trânsito foram os maiores responsáveis pelas fraturas de mandíbula descritas nesse estudo. Outros estudos corroboram os achados da presente pesquisa apontando a mandíbula como a estrutura facial mais suscetível a lesões e ferimentos.10,15,16 As lesões cortocontusas em nossa pesquisa ocorreram em 18% dos pacientes. A frequência das lesões envolvendo a maxila, o malar, o arco zigomático e a órbita perfizeram um total de 16%. Um estudo epidemiológico realizado com 211 prontuários de pacientes com traumas de face atendidos em um hospital da Paraíba constatou frequência de 11,9% para as lesões cortocontusas (lábio, nariz e palato) e duas vezes maior para as estruturas ósseas referidas anteriormente.17 Na presente pesquisa, as fraturas de nariz ocorreram com menor frequência, quando comparados com dados de outros pesquisadores que demonstraram ser o nariz a estrutura mais acometida nos acidentes, sendo este fato explicado por esta estrutura assumir uma posição proeminente e centralizada na face, assim como as estruturas delgadas que o constituem.13,18
Todos os tratamentos realizados pelos autores dessa pesquisa foram realizados no centro cirúrgico sob sedação ou anestesia geral visando o controle do edema, ou então entre o terceiro e sétimo dia após o desaparecimento do mesmo, conforme descrito por outros autores.11 A redução de fraturas simples do malar exige que sejam realizadas pelo menos duas osteossínteses para estabilização óssea. Casos em que ocorra fratura cominutiva envolvendo órbita e maxila, permanece uma instabilidade mesmo com osteossíntese. Estes casos exigem imobilização por meio da suspensão com o fio de aço apoiado no processo zigomático do osso frontal e posterior fixação intermaxilar, usando arco de Erich.19 A redução das fraturas zigomáticas foram realizadas por meio de acesso direto com objetivo de reposicionar os fragmentos. As fraturas de mandíbula foram realizadas por meio de redução cruenta, fixação de placas e parafusos de titânio e odontossíntese ou redução incruenta e odontossíntese, conforme já descrito por outros autores.5,10,11
As exodontias e reimplantes dentários descritos nos prontuários dessa pesquisa tiveram como agente etiológico os acidentes de trânsito por automóvel, motocicletas e bicicletas. Na literatura é possível constatar a existência de associação positiva entre a ocorrência de acidente automotivo e a presença de lesão na cavidade bucal, especialmente, o traumatismo dentário com as vítimas deste tipo de acidente apresentando duas vezes mais chances de sofrerem injúrias nesta região.18 Uma pesquisa que avaliou acidentes motociclísticos, os traumatismos dentoalveolares foram encontrados, sendo que a fratura coronária foi a de maior prevalência, seguida da avulsão dentária, fratura alveolar, luxações extrusiva, intrusiva, lateral e subluxação.6 Em nosso estudo, os dados pormenorizados não constavam nos prontuários dos pacientes, sendo esse achado uma dificuldade de se pesquisar com dados secundários, uma vez que as informações são incompletas inviabilizando a transcrição fiel dos dados, conforme já relataram outros autores.18
CONCLUSÃO
As lesões e ferimentos bucomaxilofaciais é uma realidade frequente nos serviços de emergência, sendo o gênero masculino mais acometido. Os adolescentes e adultos jovens foram os mais suscetíveis aos traumas bucomaxilofaciais. Os acidentes de trânsito provocaram com maior frequência os traumas bucomaxilofaciais. A região mandibular foi mais acometida pelos traumas bucomaxilofaciais analisados nessa pesquisa. Os autores sugerem que para que os traumas bucomaxilofaciais sejam prevenidos, são necessárias campanhas de conscientização e fiscalização do uso de cinto de segurança, capacete e consumo de bebida alcoólica. Ações sociais e comunitárias também devem ser estimuladas nas escolas e clubes de serviços, pois as pesquisas tem apontado um crescimento das agressões interpessoais e, consequentemente, um aumento expressivo nas lesões e ferimentos bucomaxilofaciais, uma epidemia crescente que assola a sociedade.
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