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    Revista da Associacao Paulista de Cirurgioes Dentistas

      ISSN 0004-5276

    Rev. Assoc. Paul. Cir. Dent. vol.69 no.3 Sao Paulo jul./sep. 2015

     

    Revisão de literatura (Autor convidado)

     

    Do controle de placa ao controle do biofilme supragengival: o que aprendemos ao longo dos anos?

     

    From plaque control to the supragingival biofilm control: what have we learnt over time?

     

     

    Patrícia Daniela Melchiors AngstI; Sabrina Carvalho GomesII; Rui Vicente OppermannIII

     

    I Mestre e doutora em Clínica Odontológica, ênfase em Periodontia, no programa de pós-graduação em Odontologia, da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil (UFRGS)
    II Doutora - professora adjunto do Departamento de Odontologia Conservadora da Faculdade de Odontologia da UFRGS, Porto Alegre, RS, Brasil
    III Doutor - professor titular do Departamento de Odontologia Conservadora da Faculdade de Odontologia da UFRGS, Porto Alegre, RS, Brasil

    Endereço para correspondência

     

     


     

    RESUMO

    As doenças periodontais de maior prevalência são aquelas relacionadas à presença da placa bacteriana, hoje entendida como um biofilme dental. A compreensão da dinâmica deste reacendeu antigas discussões que, desde então, buscavam determinar quais as formas elegíveis e preferíveis para o tratamento daquelas doenças. Sob o conceito de "placa dentária", o tratamento da gengivite, mas principalmente o da periodontite, ora levaram ao extremo da tentativa de eliminação de toda e qualquer "placa", ora conduziram ao uso, até hoje indiscriminado, de antibióticos. Atualmente, o conceito de biofilme dental, entendido como comunidades microbianas com mecanismos interdependentes de autorregularão, nutrição e comunicação, a ponto de manterem um sinergismo que vai ao encontro da sua subsistência, alterou a forma não só de entender a etiologia das doenças periodontais, mas de como tratá-las. Neste conceito, o papel dos microrganismos não necessariamente aponta para tipos bacterianos específicos como causadores da doença, mas para as doenças periodontais como uma infecção oportunista. Paralelamente, o biofilme supragengival passou a significar mais do que o fator etiológico das gengivites, passando a ser compreendido, também, como fundamental modulador do ambiente subgengival. Neste cenário, a terapia periodontal passa por desafios inerentes a uma mudança conceitual, tais como compreender o significado do controle supragengival para a prevenção, tratamento e manutenção dos resultados terapêuticos. Portanto, esta revisão teve por objetivo apresentar a plausibilidade biológica do controle do biofilme supragengival como fundamental para a terapia periodontal e, além disto, discutir resultados de estudos sob o conceito de doença periodontal como uma infecção oportunista.

    Descritores: placa dentária; higiene bucal; periodontite; raspagem dentária


     

    ABSTRACT

    The most prevalent periodontal diseases are those associated with the presence of dental plaque, nowadays understood as a dental biofilm. The comprehension of the biofilm dynamics rekindled old discussions that, since then, sought to determine the eligible and preferred therapies for periodontal diseases. Under the concept of "dental plaque", the gingivitis treatment, and also the periodontitis one were based on the elimination of every and any plaque or of some bacteria species. The later determining the indiscriminate use of antibiotics. Currently, the biofilm concept, understood as microbial communities with interdependent mechanisms of self-regulation, nutrition and communication and involved in a synergism to render its subsistence, changed the way not only to understand the periodontal diseases etiology but, in special, the way to treat them. Under this concept, the role of microorganisms not necessarily points to specific bacteria infecting the sites and causing diseases, but to periodontal diseases as an opportunist infection linked to a retro feeding process between the dental biofilm and the host. Alongside, the supragingival biofilm has meant more than the etiologic factor of gingivitis, but also as an important modulator of subgingival environment. In this sense, the periodontal therapy is challenged by conceptual trends, such as the comprehension of the meaning of supragingival control for the prevention, treatment and maintenance of therapeutic results. Therefore, the present review aimed to revise the role of the supragingival biofilm control to periodontal condition, and, also, to discuss results of studies under the concept of periodontal diseases as opportunists infections.

    Descriptors: biofilms; oral hygiene; periodontal diseases; dental scaling


     

     

    RELEVÂNCIA CLÍNICA

    A compreensão do modelo etiopatogênico baseado no conceito da doença periodontal como uma infecção oportunista sugere o controle do biofilme supragengival como uma intervenção essencial para a prevenção, terapia e manutenção dos resultados terapêuticos, e, assim, justifica um cuidado especial para com a condição supragengival dos indivíduos ao longo do tempo.

     

    INTRODUÇÃO

    As discussões que tangem o tema controle do biofilme dental que se estabelece no ambiente supragengival não são recentes. Do ponto de vista periodontal, diversos estudos têm investigado e demonstrado o efeito positivo das intervenções de controle supragengival quando realizadas durante a fase de tratamento periodontal.1-5 Ainda que de forma mais discreta, pois os estudos disponíveis não tiveram o objetivo específico de investigar o efeito do controle supragengival, este controle também tem sido implicado na manutenção dos resultados terapêuticos, durante a fase de Manutenção Periódica Preventiva (MPP).6-8 No entanto, após um período de quase estagnação nas publicações relacionadas ao tema, o controle supragengival, em seus diferentes aspectos e implicações, tem recebido atenção renovada, e passa, mais uma vez, por um olhar atento, criterioso e de destaque.

    Esta retomada de atenção sobre o controle supragengival pode ser observada frente às declarações oriundas do 11º Workshop Europeu em Periodontia, as quais foram publicadas por meio de uma série de artigos no Journal of Clinical Periodontology. 9 Tais publicações abordam o tema "controle supragengival" como uma intervenção ímpar e essencial durante a terapia periodontal ao declarar que "a raspagem profissional, tão profunda quanto o necessário para a remoção de todos os depósitos moles e duros, é importante para permitir o adequado controle mecânico do biofilme pelo paciente", e que "orientações de higiene bucal, repetida e individualmente entregues aos pacientes, são o elemento chave para se alcançar a saúde gengival".9 Além disso, estes artigos alinham o controle do biofilme supragengival ao sucesso terapêutico longitudinal ao apontar que "a remoção mecânica profissional do biofilme é ineficaz, em longo prazo, quando não acompanhada por um adequado padrão de higiene bucal pelos pacientes", e que, desta forma, "medidas educativas voltadas para a saúde bucal, baseadas em orientação, motivação e mudança de hábito, devem ser estabelecidas".9 Não obstante, existe também um posicionamento da Federação Europeia de Periodontia, após este workshop, sinalizando para a necessidade de se reascenderem as discussões sobre o controle do biofilme supragengival, principalmente durante a fase de MPP, onde o efeito deste controle permanece a ser mais bem esclarecido.10

    Ainda que se reconheça a relevância e a necessidade de se incorporar o paciente periodontal tratado em um programa de manutenção periódica,6,8,11 dúvidas permanecem quanto à frequência das consultas de MPP, e, especialmente, sobre quais intervenções clínicas devem ser realizadas nestas consultas a fim de se manter a saúde periodontal longitudinalmente. Questiona-se, por exemplo, a necessidade de se realizar instrumentações subgengivais a cada consulta de MPP.7,10,12 Existem, neste cenário, evidências que apontam para o controle supragengival como uma intervenção tão efetiva quanto a intervenção subgengival durante a fase de MPP, sendo este entendimento baseado e suportado pelo papel do biofilme supragengival como modulatório do ambiente subgengival.13

    Frente a estas observações, a presente revisão teve, como objetivo, apresentar perspectivas contemporâneas que suportam a validade do controle do biofilme supragengival durante a terapia periodontal e na manutenção longitudinal dos resultados obtidos.

     

    REVISÃO DA LITERATURA

    Relação entre os biofilmes supra e subgengival e o ambiente subgengival

    A relação do biofilme supragengival com o ambiente e composição microbiológica subgengivais pode ser inicialmente verificada por estudos relacionados à formação inicial do biofilme supragengival. Este tema foi abordado por Weidlich et al., em 2001, em um estudo experimental com o objetivo de analisar o padrão de formação do biofilme supragengival, durante um período de quatro dias, e clinicamente avaliar a resposta inflamatória gengival neste período.14 Para tanto, seis participantes com saúde gengival foram incluídos, e avaliações do volume de Fluido Crevicular Gengival (FCG) e da Zona Livre de Placa (ZLP) foram realizadas ao baseline (hora 0), e em 24, 48, 72 e 96 horas após o livre acúmulo do biofilme supragengival. Os autores reportaram que 24 horas após o acúmulo de biofilme supragengival foi possível observar uma fina camada deste biofilme sobre a superfície dentária, mas que esta camada estava separada da margem gengival por uma zona livre de placa. Com o passar do tempo, porém, esta camada de biofilme passou a apresentar um crescimento em direção incisal, ao mesmo tempo em que a ZLP tendeu a desaparecer. Por fim, após 96 horas, esta ZLP não pôde mais ser observada, o que, consequentemente, culminou com o contato do biofilme com a margem gengival. Além disso, paralelamente, pode-se verificar um aumento no volume de FCG. Frente a estes achados, os autores sugeriram que o desaparecimento da ZLP, que possibilitou o primeiro contato do biofilme supragengival com o ambiente subgengival, parece estar relacionado a dois mecanismos: 1) ao crescimento apical do biofilme através da área intra-sulcular; e/ou, mais importante e provável, 2) às alterações em direção cervical da margem gengival como parte da resposta inflamatória, ou seja, do edema. Por conseguinte, este segundo mecanismo estaria também relacionado com englobamento daquele biofilme supragengival para um ambiente subgengival. Estas observações remetem à informação de que com o aparecimento da resposta inflamatória gengival (edema e aumento do volume de FCG), criam-se condições nutricionais e ambientais adequadas ao estabelecimento e perpetuação de uma microbiota subgengival.13

    Esta interação entre os biofilmes e a resposta inflamatória do hospedeiro pode ser ilustrada, também, a partir de um caminho inverso, considerando-se pacientes doentes. Kawada et al., em 2004, por exemplo, avaliaram a relação entre o número de bactérias Porphyromonas gingivalis em amostras subgengivais e o quadro clínico periodontal dos pacientes.15 Neste estudo, amostras subgengivais foram coletadas de nove pacientes com periodontite, em quatro sítios com profundidade de sondagem (PS) igual ou superior a 4 mm, e analisadas por reação em cadeia da polimerase (PCR) em tempo real. Os autores reportaram uma correlação significativa entre o número de bactérias e os valores de PS (r2 = 0.37, p < 0.001), onde cada 1 milímetro de aumento da PS correspondeu a um aumento de 10 vezes no número destas bactérias. Na mesma direção, um estudo mais recente com o objetivo de entender a ecologia das comunidades bacterianas subgengivais, e, principalmente, elucidar a relação entre inflamação e o microbioma subgengival, foi realizado por Abusleme e colaboradores.16 Vinte e dois pacientes com periodontite crônica e 10 pacientes com saúde periodontal foram incluídos no estudo. Amostras subgengivais foram coletadas em dois sítios com semelhante condição de destruição periodontal (PS = 5 mm), porém diferindo quanto à presença ou ausência de sangramento à sondagem (SS), nos pacientes do grupo "doença periodontal", e em um sítio sem sangramento nos pacientes do grupo "saúde periodontal". As amostras foram analisadas por meio da técnica de piro-sequenciamento. Como resultados, pode-se observar maior carga bacteriana em sítios apresentando SS, em comparação a sítios com perda de inserção e sem sangramento, e em comparação a sítios saudáveis. Além disso, os autores observaram que as comunidades bacterianas eram qualitativamente semelhantes em saúde e doença, muito embora numericamente diferentes, e inferiram que estas diferenças poderiam ser um reflexo da extensão da PS. Coletivamente, mais uma vez, estes resultados apontam que a relação entre resposta inflamatória e os microrganismos é dinâmica, recíproca e interdependente, visto que maior carga bacteriana pode representar um maior desafio ao hospedeiro, o qual responde com um aumento na inflamação (e.g., maior PS, FCG, SS), o que, retroalimentando o processo, por sua vez, propicia um aumento na carga bacteriana via maior aporte de nutrientes.

    Não surpreendentemente, as observações relacionadas a estes estudos nos remetem ao conceito da doença periodontal como uma infecção oportunista.13 Tal conceito é entendido pelo seguinte raciocínio: ao início do acúmulo do biofilme supragengival há uma predominância de microrganismos associados à saúde. Com o passar do tempo, no entanto, sem a disrupção deste biofilme, há o estabelecimento da primeira resposta inflamatória que clinicamente diagnostica-se como gengivite. Algumas das características desta condição, devido à maior vascularização tecidual, são o aumento do volume de FCG e o aparecimento do sangramento marginal, os quais passam a proporcionar um ambiente mais abundante em nutrientes, tais como hemina, glicoproteínas, e proteínas do hospedeiro, que servirão como substratos ao metabolismo bacteriano e fornecerão importantes fatores de crescimento para espécies bacterianas anaeróbicas e proteolíticas. Paralelamente, devido ao edema, há um aumento da PS, constituindo-se um local ideal para que bactérias anaeróbicas facultativas (localizadas na entrada da bolsa, i.e. unidade sangrante) empobreçam o oxigênio disponível e produzam dióxidos de carbono e hidrogênio, o que, por sua vez, favorece e cria um ambiente anaeróbico dentro da bolsa. Além disso, o metabolismo bacteriano contínuo determina pequenas elevações na temperatura e pH local, que são fatores essenciais para o crescimento, competitividade e agressividade de algumas espécies de bactérias. Consequentemente, é possível um aumento numérico expressivo destas bactérias com maior potencial patogênico, e que antes estavam em menor número nos biofilmes supra e subgengival, resultando em um expressivo aumento também no número total de bactérias no biofilme. Se este quadro de acúmulo destes biofilmes é mantido, há a retroalimentação contínua do processo, via maior desafio bacteriano ao hospedeiro, o qual responde aumentando a resposta inflamatória, refletindo em piora nos indicadores clínicos periodontais.13 Este quadro, naqueles indivíduos susceptíveis, poderá evoluir para a periodontite. Deste modo, o termo infecção oportunista é vinculado à necessidade de retroalimentação constante entre bactérias e resposta inflamatória. Portanto, a partir deste mecanismo de retroalimentação, pode-se entender o papel primordial do ambiente supragengival como fonte primária dos microrganismos subgengivais. Não obstante, este processo pode fundamentar o controle do biofilme supragengival como uma intervenção capaz de modular o ambiente subgengival.13

    Inseridos neste contexto, existem estudos de intervenção que mostraram esta relação de modulação sob o ponto de vista clínico. Estes estudos partem do princípio de que por meio do controle da gengivite, tem-se a redução dos indicadores clínicos, como PS e SS, que podem, então, influenciar os demais indicadores. Um destes estudos foi conduzido por Gomes e colaboradores, em 2007, tendo como objetivo avaliar o efeito do controle supragengival nos indicadores clínicos de pacientes com periodontite.3 Para tanto, 50 pacientes (25 fumantes e 25 nunca-fumantes) com diagnóstico de periodontite moderada à avançada foram acompanhados por 180 dias com consultas semanais para o controle do biofilme unicamente supragengival. Pode-se verificar que o controle supragengival estrito foi capaz de reduzir significativamente os níveis de placa, gengivite, e SS, bem como os valores médios de PS e perda de inserção (PI), independentemente da categoria de PS, e sem diferenças entres os grupos. Estas alterações, além disso, foram mantidas durante todo o período do estudo.

    Outros estudos de intervenção, por sua vez, demonstraram esta relação de modulação valendo-se da investigação de outros indicadores, como marcadores imunológicos ou microbiológicos. Exemplificando, o estudo realizado por Dahlén et al., em 1992, buscou verificar o efeito nos indicadores clínicos e microbiológicos de um programa de controle do biofilme supragengival que incluía instruções meticulosas de higiene bucal e monitoramento profissional, durante um período de dois anos.2 Sessenta e dois pacientes foram incluídos e distribuídos nos seguintes grupos: Grupo AB, composto por 23 pacientes que apresentavam perda de inserção e PS maiores ("sítios profundos") e menores ("sítios rasos") que 4 mm; e Grupo C, com 39 pacientes com gengivite e apenas sítios "rasos". Controle supragengival, orientações de higiene bucal e motivação foram entregues em 4-8 consultas, durante os três primeiros meses. Novos exames foram realizados 24 meses após o início do estudo. Pôde-se verificar que os indicadores clínicos de placa, gengivite e PS foram reduzidos significativamente em todos os grupos, tanto em sítios "rasos" quanto "profundos, e que os níveis de inserção foram mantidos. Além disso, entre as categorias de PS, houve um aumento no número de sítios rasos e diminuição dos profundos. Na mesma direção, os marcadores microbiológicos foram significativamente alterados, tanto em sítios rasos como profundos, como observado pela redução da média do total de bactérias viáveis e pelo número e percentual de sítios positivos para determinadas espécies bacterianas. Baseados nestes resultados, os autores concluíram que a microbiota subgengival foi influenciada não somente por fatores locais dentro da bolsa, mas, também, pelo ambiente supragengival e que as alterações observadas nos sítios profundos estavam associadas à redução da PS, ocasionada pelo controle do biofilme supragengival. Este processo, por sua vez, levou à redução da carga microbiológica e às alterações qualitativas da microbiota subgengival. Estes resultados são corroborados pelo estudo de Gomes et al., em 2008,17 que publicaram os resultados microbiológicos do estudo de 2007.5 Nesta investigação, pôde-se observar que o controle do biofilme supragengival marcadamente reduziu as contagens subgengivais das espécies bacterianas estudadas (Porphyromonas gingivalis, Parvimonas micra, Dialister pneumosintes e Aggregatibacter actinomycetemcomitans), bem como do domínio Eubactéria, em ambos os grupos, e longitudinalmente. A despeito do conjunto destas observações, neste processo interdependente entre os biofilmes supra e subgengival ainda não se tem esclarecida, por exemplo, a ordem dos fatores, ou seja, se as melhoras clínicas são consequência da redução da microbiota, ou se as alterações microbiológicas são em decorrência da diminuição dos indicadores clínicos de inflamação.

    O modelo de infecção oportunista fundamenta, também, o controle do biofilme supragengival como etapa e ferramenta essenciais para o sucesso do tratamento das periodontites. Embora inexista um ensaio clínico randomizado (ECR) no qual o controle supragengival tenha sido abordado como uma modalidade de intervenção única, em comparação à sua realização como uma etapa prévia ao tratamento da periodontite ou à sua realização concomitante ao controle do biofilme subgengival, estas abordagens foram comparadas em 2014, em um ECR sob modelo de boca-dividida.5 Vinte e cinco pacientes com periodontite crônica receberam, por quadrantes, os seguintes regimes terapêuticos: I) controle supragengival estrito, em 1 quadrante, no dia 0, e sendo controle este mantido ao longo de todo o período experimental; II) controle supra e subgengival simultâneos, em 2 quadrantes, no dia 0; e III) controle supragengival no dia 0 e o controle subgengival após 30 dias, em 1 quadrante. Este estudo desenvolveu-se em 450 dias, durante os quais os pacientes foram reavaliados e orientados em relação ao controle do biofilme supragengival (em média a cada 2.2 ± 1.64 meses). Pôde-se observar que os três regimes propostos levaram a alterações significativas nos níveis de placa e gengivite, bem como reduções nos indicadores de PS, SS e PI, sendo que as maiores reduções nestes indicadores subgengivais ocorreram nos quadrantes que receberam a intervenção subgengival. Por outro lado, o controle supragengival como etapa prévia reduziu as necessidades de intervenção subgengival em quase 50%. Esta redução pode ser entendida da seguinte forma: 72% dos sítios com SS+ ao baseline no grupo II receberam a intervenção subgengival; em contrapartida, no grupo III somente 37% permaneceram necessitando receber a intervenção subgengival (neste grupo entregue no dia 30), como avaliado pelo percentual de sítios que permaneceram com sangramento subgengival, após terem recebido o controle supragengival. Além disso, observou-se que as maiores reduções em todos os indicadores clínicos foram observadas já aos 60 dias, quando, então, estes valores foram mantidos longitudinalmente. Pôde-se inferir, portanto, que um controle adequado do biofilme dental, atestado pelos baixos índices de placa e sangramento marginal ao longo do tempo, permitiu a estabilidade dos indicadores subgengivais.

    Semelhante avaliação foi realizada já em 1983.1 Muito embora empregando um delineamento mais simples, e voltado unicamente para a análise dos marcadores microbiológicos, Smulow et al. conduziram um estudo com a inclusão de 14 pacientes apresentando pelo menos 4 bolsas com PS ≥ 5 mm, onde cada sítio/bolsa (de um total de 56) foi alocado à uma das seguintes intervenções: 1) controle supra e subgengival no dia 0, seguido de controle supragengival por 20 dias; 2) controle supragengival estrito no dia 0, seguido de controle supragengival por 20 dias; 3) controle supra e subgengival no dia 0, porém sem qualquer controle posterior; e 4) nenhuma intervenção e sem qualquer controle posterior. Amostras de biofilme subgengival foram coletadas destes sítios e avaliadas por meio da técnica de cultura e microscopia. Pôde-se verificar que aqueles grupos que receberam atenção supragengival continuada experimentaram reduções significativas nas contagens bacterianas totais e de morfotipos bacterianos (espiroquetas e espécies anaeróbias facultativas e obrigatórias). Por outro lado, os grupos sem controle supragengival apresentaram comportamento oposto, com aumento destas contagens. Já à época, estes autores, em conclusão, sugeriram que a microbiota subgengival era fortemente afetada pelo controle do biofilme supragengival uma vez que este biofilme seria a fonte primária daquela microbiota.

    No mesmo contexto, avaliando desfechos clínicos e microbiológicos, Feres et al., em 2009, compararam os efeitos da intervenção subgengival isolada em relação à sua realização combinada ao controle mecânico do biofilme supragengival, ou ainda complementada pelo controle químico deste biofilme.4 Para tanto, 60 pacientes com periodontite crônica, generalizada, foram alocados a receber uma das seguintes intervenções: 1) raspagem e alisamento radicular (RAR) realizada de forma estrita; 2) RAR combinada ao controle mecânico do biofilme supragengival; e 3) RAR combinada ao controle químico supragengival com digluconato de clorexidina. O controle supragengival foi realizado durante 63 dias, iniciando-se juntamente com a RAR, e reexames foram conduzidos após 2 e 6 meses. Clinicamente, observou-se maiores reduções de PS, SS e PI, tanto ao 2º como ao 6º mês pós-terapia subgengival, nos grupos que receberam também o controle do biofilme supragengival. Além disso, embora o grupo com controle químico tenha apresentado uma tendência à maior redução nos indicadores avaliados, esta mudança não foi estatisticamente diferente daquela observada no grupo com controle mecânico. Mesmo comportamento foi observado em relação aos marcadores microbiológicos: as maiores reduções foram relacionadas aos grupos com controle supragengival, com especial impacto sobre as espécies bacterianas dos complexos vermelho e laranja. Por fim, ambos os achados clínicos e microbiológicos suportaram as conclusões dos autores de que o controle supragengival realizado durante e após a intervenção subgengival promoveu uma melhora dos desfechos do tratamento.

    A partir das evidências oriundas destes estudos, é possível identificar questões fundamentais relativas ao controle do biofilme supragengival. Este controle, se realizado pelo paciente diariamente, e de forma adequada, é fundamental em qualquer etapa da atenção periodontal. Por outro lado, a educação do paciente é de responsabilidade profissional e deve, portanto, ser trabalhada em todas as fases da terapia periodontal, por meio da identificação das necessidades individuais em relação ao controle mecânico supragengival e, quando necessário, da adequação ou modificação dos hábitos do paciente. Além disto, muito embora a atuação deste binômio paciente-profissional, objetivando o controle supragengival, não se constitua como uma intervenção terapêutica única para a periodontite, sua realização, como etapa prévia e separada da intervenção de raspagem e alisamento radicular, pode proporcionar reduções relevantes nos indicadores inflamatórios, o que, por sua vez, pode auxiliar no posterior controle subgengival e em sua efetividade. Não obstante, na falta de um controle supragengival adequado, o efeito terapêutico da intervenção subgengival será limitado, provisório ou mesmo nulo. Neste ponto, não surpreendentemente, destaca-se a posição de alguns autores em seus artigos vinculados ao 11º Workshop Europeu em Periodontia.9

    Controle supragengival durante a fase de manutenção periódica preventiva

    Pelo glossário da Sociedade Brasileira de Periodontologia,18 a Manutenção Periódica Preventiva é definida como: "(...) procedimentos realizados em intervalos selecionados para ajudar o indivíduo a manter sua saúde bucal. Fazendo parte da terapia periodontal, um intervalo estabelecido para cuidados periodontais periódicos...". Neste sentido, a MPP tem como principais objetivos: 1) prevenir a recorrência e progressão da doença periodontal em pacientes previamente tratados; 2) prevenir ou reduzir a incidência de perda dentária nesses pacientes; 3) auxiliar no diagnóstico precoce e tratamento, em tempo adequado, de outras doenças e condições encontradas na cavidade oral.

    A motivação para a MPP surgiu, inicialmente, do reconhecimento da importância do biofilme no estabelecimento e progressão da gengivite. Adicionalmente, a reconhecida dificuldade de manterem-se níveis adequados de higiene bucal por parte da população colocava um desafio para o tratamento das doenças periodontais. A proposta de realização de consultas periódicas, nas quais o profissional interviria buscando atenuar as consequências da má higiene bucal, e ao mesmo tempo motivando o paciente para um melhor controle diário do biofilme, surgiu a partir dos trabalhos de avaliação longitudinal da terapia periodontal realizados principalmente pelos grupos liderados por Ramfjord e por Lindhe & Nyman.6,11 Estes autores observaram que diferentes técnicas cirúrgicas ou diferentes procedimentos terapêuticos apresentavam resultados semelhantes desde que os pacientes, na sequência, participassem de uma sessão de controle profissional dos biofilmes supra e subgengival a intervalos de a cada 2-3 meses. Entretanto, pelos resultados observados por Ramfjord et al., o sucesso terapêutico, durante a manutenção, era independente dos padrões de controle do biofilme realizado pelos pacientes.6 Por outro lado, o grupo de Lindhe & Nyman demonstrava que um adequado controle do biofilme pelo paciente, e por consequência a ausência de gengivite, era, sim, fator determinante, juntamente com a MPP, do sucesso das terapias.11 A despeito destas divergências, o conjunto desses estudos, bem como a constatação de que as terapias periodontais passaram a apresentar melhores resultados quando acompanhados pela manutenção periódica, coloca a MPP como parte integral da atenção periodontal. Da mesma forma, origina-se destes estudos, a periodicidade que até hoje se divulga para as consultas de MPP. Em geral, o intervalo estabelecido é de consultas a cada 3-4 meses. Entretanto, cabe ressaltar, esta rotina não se baseia em estudos que se destinaram a comparar a eficácia e segurança de diferentes intervalos de tempo entre as consultas.

    Além disto, contemporaneamente, a periodicidade das consultas de MPP tem sido sugerida, também, pela "necessidade" de se realizar instrumentação subgengival em sítios com PS ≥ 3 mm, acompanhados ou não pela presença de SS, visando-se desorganizar/ reduzir as contagens de bactérias patogênicas em contanto com os tecidos periodontais, tomando por base a "velocidade" de recolonização dos sítios periodontais. Estudos sugerem que a quantidade de bactérias após a instrumentação profissional, devido à recolonização da área subgengival, pode alcançar valores similares aos iniciais em um período de dias, meses ou até mesmo um ano.19 Todavia, devido a diferenças metodológicas entre os estudos, com avaliações por diferentes indicadores periodontais, amostras oriundas de diferentes populações e com critérios de inclusão distintos, extrapolações são problemáticas. Não obstante, uma vez que haja a recolonização, esta não implicará necessariamente em recorrência da doença. Por outro lado, alguns autores propuseram basear a periodicidade das consultas de MPP no perfil de risco periodontal individual dos pacientes, sendo este dado pela história de progressão da doença, adesão e motivação do paciente para o autocuidado com a higiene bucal e em parâmetros clínicos. 20 Essas informações tão pouco fornecem orientações precisas para um intervalo definido no tempo e o que ainda se observa é a permanência daqueles intervalos pré-sugeridos.

    Dadas essas observações, contudo, primariamente mais importante do que se identificar a periodicidade ideal das consultas de MPP, deve ser a investigação da efetividade, impacto e magnitude das medidas de controle do biofilme supragengival em se manter os resultados alcançados durante o tratamento, evitando, assim, a recolonização dos sítios e a consequente recorrência da doença.

    Com base na relação dinâmica e interdependente entre os biofilmes supra e subgengival, e esta relação sendo capaz modular o ambiente subgengival, pode-se igualmente entender e assumir o controle supragengival como uma intervenção eficaz também durante a fase de MPP. Neste sentido, em outras palavras, pode-se questionar qual é a necessidade de se realizar repetidas intervenções subgengivais a cada consulta de MPP, uma vez que o paciente periodontal foi tratado com sucesso e agora apresenta um quadro periodontal associado à saúde.

    Ao olharmos para a literatura disponível sobre esta temática, existem somente três artigos que tentaram responder a este questionamento objetivamente: um ECR, uma revisão sistemática da literatura e um posicionamento da Federação Europeia de Periodontia. O ECR, conduzido por Jenkins et al., em 2000, buscou investigar o efeito da combinação das intervenções supra e subgengival nos indicadores clínicos de pacientes previamente tratados para periodontite crônica, em comparação à intervenção unicamente supragengival.7 Trinta e um pacientes previamente tratados por terapia cirúrgica ou não-cirúrgica, em um Hospital-Escola de Odontologia, porém apresentando pelo menos quatro bolsas residuais com PS ≥ 4 mm e SS+, e com inconsistência nos níveis de biofilme supragengival ao longo do tempo, constituíram a amostra. Este indivíduos foram alocados em um dos dois regimes MPP e receberam as respectivas intervenções e reexames a cada três meses, durante 1 ano. Pôde-se verificar ausência de diferença significativa entre os dois regimes propostos em relação aos indicadores clínicos de PS, PI e SS, bem como ausência de diferença entre os exames, ao longo de todo o período do estudo. Frente a estes achados, os autores concluíram que não houve benefício adicional da realização da intervenção subgengival, e, portanto, colocaram a realização desta intervenção em questão.

    Na sequência, em 2002, Heasman et al. conduziram uma busca sistemática na literatura a fim de revisar e analisar as evidências disponíveis em relação à efetividade clínica do controle supragengival em comparação à intervenção subgengival, durante a fase de MPP.12 No total, 28 estudos foram identificados pela busca manual e eletrônica, mas apenas 11 artigos, com pelo menos 12 meses de acompanhamento, foram incluídos. Somente um estudo comparou diretamente as intervenções de interesse,7 e entre os demais observou-se grande heterogeneidade. A fim de compensar esta heterogeneidade, alguns ajustes estatísticos foram conduzidos. Por fim, os autores reportaram resultados semelhantes, em relação à PS e a PI, entre os estudos incluídos relacionados às intervenções de interesse, ao longo do tempo. Estes achados suportaram a conclusão dos autores de que, frente às melhores evidências disponíveis, ambos os regimes foram comparáveis clinicamente. Além disso, estes autores também sugeriram a condução de novos e adequados estudos sobre esta temática.

    Com base naquela revisão de literatura, este tema foi discutido durante o 4º Workshop Europeu em Periodontia, em 2002. Neste momento houve um posicionamento da Federação Europeia de Periodontia, também chamando a atenção para a necessidade de estudos adicionais nesta temática, inclusive propondo diretrizes para estes futuros estudos.10 Algumas destas diretrizes, por exemplo, sugeriam que os novos estudos: 1) claramente definissem quando se iniciaria o baseline da fase de MPP e os critérios de inclusão dos participantes; 2) avaliassem outros desfechos além dos clínicos, como marcadores microbiológicos e imunológicos, e de percepção/adesão dos pacientes; e, 3) detalhadamente descrevessem as intervenções realizadas. Por outro lado, houve, ainda, um consenso dessa Federação de que ambas as terapias levavam a um resultado clínico semelhante.

    Desde então, mesmo frente ao chamamento por novos estudos, e ao melhor do conhecimento, nenhum estudo foi publicado no qual a comparação direta entre essas intervenções tenha sido realizado. A constatação da ausência de novos estudos pode ser observada frente aos novos artigos referentes ao mais recente encontro daquela Federação,9 bem como após a condução de uma busca sistemática na literatura sobre estudos reportando aspectos microbiológicos durante a fase de MPP. A realização desta busca foi determinada pelo importante papel dos microrganismos no processo dinâmico do modelo de infecção oportunista que aponta para o controle supragengival como terapia eficaz durante a manutenção periodontal. Caso disponíveis, os resultados microbiológicos durante esta fase poderiam complementar e estender a compreensão dos resultados clínicos reportados.10

     

    MATERIAIS E MÉTODOS

    Brevemente, uma busca sistemática foi realizada na base de dados MEDLINE, via PUBMED, bem como na lista de referência de outras revisões de literatura previamente publicadas, sem restrições de linguagem e data de publicação, e utilizando diferentes arranjos dos seguintes descritores: randomized clinical trial, randomized controlled trial, clinical trial, longitudinal study, prospective study, supportive periodontal care, periodontal maintenance, e microbiology. Buscou-se, especificamente, por estudos realizados em humanos, apresentando delineamento de ensaio clínico randomizado ou ensaio clínico de braço único, com um mínimo de seis meses de duração, e reportando resultados microbiológicos subgengivais decorrentes de pelo menos uma das intervenções de interesse (controle supragengival estrito, ou controle combinado dos biofilmes supra e subgengival).

    Dentre os 1.828 títulos identificados pelos mecanismos de busca, apenas 18 estudos apresentavam tais características metodológicas. Não foram encontrados estudos comparando diretamente ambas as intervenções quanto aos desfechos microbiológicos, estando disponíveis somente estudos reportando uma das intervenções de interesse: cinco estudos relacionados ao controle supragengival,21-25 e 13 e relacionados ao controle combinado supra e subgengival.26-38 De interesse, os estudos disponíveis foram, em sua maioria, investigações reportando desfechos microbiológicos de diferentes terapias periodontais, longitudinalmente. Nestes estudos, devido ao longo período de acompanhamento, uma das intervenções de interesse foi realizada como procedimento de MPP, e, em geral, iniciando-se passados três meses após a terapia inicial. Assim, se considerados somente os dados relacionados ao período após o início da fase de MPP, haveria a possibilidade de se avaliar, nestes estudos, os resultados referentes a esta fase. No entanto, semelhante à revisão quanto aos desfechos clínicos conduzida por Heasman et al.,12 observou-se grande heterogeneidade entre os estudos. Tais diferenças foram principalmente devido aos diferentes métodos microbiológicos empregados. Além disso, a maior parte dos estudos somente reportou os dados por meio de gráficos, o que impossibilitou a coleta e uma análise estatística dos dados.

    Apesar destas limitações, descritivamente, pela leitura dos resultados e levando-se em consideração as conclusões dos autores de cada estudo, ambas as intervenções investigadas parecem estar associadas a uma tendência de estabilidade, ou até mesmo de redução, nos marcadores microbiológicos subgengivais ao longo do tempo. No entanto, nenhuma conclusão pode ser estabelecida.

    Portanto, frente aos aspectos e estudos até aqui discutidos, claramente se verifica a escassez de evidências, tanto no que se refere aos indicadores clínicos quanto aos microbiológicos subgengivais, sobre qual deve ser a atenção periodontal a ser entregue aos pacientes durante a MPP para se manter os resultados positivos alcançados com o tratamento periodontal e evitar um futuro restabelecimento e/ou progressão de doença. Por outro lado, a princípio, a literatura disponível parece apontar para uma ausência de benefício adicional da realização de intervenções subgengivais e credita a manutenção dos resultados durante a fase de MPP, majoritariamente, ao controle do biofilme supragengival.

     

    DISCUSSÃO

    A presente revisão de literatura sugere que o controle do biofilme supragengival difira do controle de placa não somente em termos semânticos. Pelo contrário, a partir da compreensão da placa bacteriana como um biofilme dental, pode-se elencar uma série de mudanças no "olhar" sobre o que se considera processo saúde-doença periodontal que, por sua vez, conduz a uma proposição de uma atenção profissional diferenciada.

    De acordo com algumas publicações,1,2,13 existe uma estreita relação entre a formação do biofilme supragengival e a dinâmica de estabelecimento do biofilme subgengival, bem como a alteração quantitativa e qualitativa deste biofilme. Estas últimas diretamente associadas à presença de inflamação marginal inicialmente, e da perpetuação de um ambiente subgengival favorável ao desenvolvimento de um biofilme subgengival, com características cada vez mais propícias para o desenvolvimento e progressão das periodontites.13 No entanto, como este nem sempre foi a compreensão sobre os biofilmes dentais, iniciou-se uma etapa, na Periodontia, muito voltada para a instrumentação subgengival de qualidade como o objetivo principal a ser alcançado e a "eliminação" de bactérias como uma forma de garantir sucesso terapêutico longitudinalmente.

    Recentemente, retomaram-se, em encontro e publicações de grande impacto, estas discussões.9,10 Em linhas gerais, se destacou o papel fundamental do controle do biofilme supragengival em todas as fases de atenção ao paciente: prevenção, tratamento e manutenção. A plausibilidade para esta importância recai sobre o conceito de doença periodontal como infecção oportunista, 13 capaz de determinar inflamação gengival/periodontal, ao mesmo tempo em que apresenta crescimento qualitativo e quantitativo de alguns tipos bacterianos permitido, exatamente, pela expressão inflamatória gerada. Estabelece-se assim, um mecanismo de retroalimentação, de alguma forma já ilustrado em publicações como a de Kawada et al.,15 Abusleme et al.,16 e Gomes et al.17

    Por meio dos resultados aqui apresentados, depreende-se que o controle supragengival é o que incialmente irá modular o estabelecimento e a qualidade da microbiota subgengival, além de manter uma situação de equilíbrio entre agressão e defesa.13-17 Por outro lado, na ausência deste controle, os resultados terapêuticos são perdidos, situação para a qual não existe remediação, como por exemplo, o uso de antibióticos locais/sistêmicos. Ao assumir esta dinâmica relação entre o biofilme supragengival e aquele subgengival o profissional se impõe grandes desafios. Seria muito mais fácil poder garantir o sucesso do tratamento se este dependesse tão somente da intervenção terapêutica, ou só do uso de um fármaco, por exemplo. Porém, não é esta a realidade que se apresenta. Cada vez mais a literatura tem mostrado quão importante é o trabalho do binômio paciente-profissional na busca e manutenção do sucesso terapêutico.8,9 É por esta razão que os estudos começam a identificar que: 1) o controle supragengival bem estabelecido influencia o ambiente subgengival em pacientes com periodontite, independente de esta ser moderada ou severa; 2) que o controle do biofilme supragengival prévio ao do biofilme subgengival permite reduzir a necessidade de intervenção subgengival; e 3) que na fase de manutenção periódica preventiva parece não existir benefícios adicionais da deplacagem subgengival quando comparada à deplacagem unicamente supragengival. Como o controle do biofilme supragengival é uma função diária, há necessidade de se estabelecer rotinas de controle deste biofilme junto ao paciente e uma constante interação com o mesmo, objetivando atingir níveis adequados de controle supragengival advindo de constante atividade de educação para a saúde.

     

    CONCLUSÃO

    A evolução do conceito de biofilme possibilitou entender as doenças periodontais como uma infecção oportunista. Sob este modelo etiopatogênico, visualiza-se inicialmente a dependência do biofilme subgengival em relação ao pré-estabelecimento do biofilme supragengival. Consequentemente, tem-se o controle do biofilme supragengival como capaz de exercer importante ação modulatória no ambiente subgengival por diversos mecanismos biológicos, alguns destes, inclusive, ainda não totalmente esclarecidos. Baseado neste processo dinâmico e interdependente entre os biofilmes, as evidências disponíveis na literatura têm cada vez mais suportado o cuidado, pelo binômio paciente-profissional, para com o controle do biofilme supragengival como uma intervenção efetiva e necessária em todos os aspectos e etapas do manejo dos pacientes periodontais.

     

    APLICAÇÃO CLÍNICA

    A partir das questões aqui abordadas, cunhando o conceito do biofilme supragengival como fundamental na Periodontia, espera-se que não somente o periodontista, mas, também, o clínico-geral possam atuar compreendendo a extensão dos benefícios que sua atenção à educação para a saúde bucal, em especial ao controle supragengival, trará para o paciente periodontal.

     

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    Rui Vicente Oppermann
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    Recebido: jul/2015
    Aceito: ago/2015