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Revista da Associacao Paulista de Cirurgioes Dentistas

versão impressa ISSN 0004-5276

Rev. Assoc. Paul. Cir. Dent. vol.70 no.3 Sao Paulo Jul./Set. 2016

 

Revisão de literatura

 

Aspectos relevantes da síndrome de Sjögren para o Cirurgião-Dentista

 

Sjogren's syndrome's relevant aspects for the dental surgeon

 

 

Lucas Macedo Batitucci AmbrósioI; Emanuel da Silva RovaiII; Henrique FukushimaIII; Henrique Aparecido Bueno da SilvaIV; Ieda Santos AbreuV; Priscila VivasVI; Silvia Vanessa LourençoVII; Marinella HolzhausenVIII

 

I Cirurgião-Dentista pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (Fousp) - Mestrando em Periodontia na Fousp
II Mestre em Odontologia Restauradora pela Unesp-SJC - Doutorando em Periodontia pela Fousp
III Mestre em Periodontia pela Fousp - Cirurgião- Dentista especialista em Implantodontia e Periodontia
IV Mestre em Periodontia pela Fousp - Cirurgião-Dentista
V Mestre em Periodontia pela Fousp - Cirurgiã- Dentista Bucomaxilofacial
VI Mestre em Periodontia pela Fousp - Periodontista atuante em clínica particular
VII Professora associada da Disciplina de Patologia Geral da Fousp
VIII Professora doutora da Disciplina de Periodontia da Fousp



Endereço para correspondência

 

 


 

RESUMO

A síndrome de Sjögren (SS), conhecida como síndrome sicca, é uma doença autoimune caracterizada pela hipofunção das glândulas salivares e lacrimais, cuja prevalência na população mundial é de aproximadamente 0,5% a 1%. Por ser uma doença autoimune complexa e de difícil diagnóstico, é sub-diagnosticada e sub-tratada segundo o consenso realizado em 2012 pelo Colégio Americano de Reumatologia (ACR). O Cirurgião-Dentista pode desempenhar papel importante na detecção de possíveis alterações compatíveis com a síndrome, além de auxiliar no tratamento de diversas patologias orais decorrentes da síndrome. Este trabalho tem como objetivo explanar aspectos importantes referentes ao diagnóstico e tratamento da síndrome aqui discutida. A SS apesar de ser considerada uma doença de evolução lenta, em estágios avançados pode ser fatal, principalmente por aumentar as chances dos pacientes virem a desenvolver linfoma não Hodking. O tratamento odontológico dos pacientes com SS deve principalmente ser profilático, com a recomendação do uso de repositores de saliva e controle rígido da higiene bucal.

Descritores: síndrome de sjögren; xerostomia; xeroftalmia; periodontite.


 

ABSTRACT

Sjogren's syndrome (SS), known as the sicca syndrome, is an autoimmune disease characterized by salivary and lacrimal glands hypofunction which prevalence in the world population is approximately around 0,5% to 1%. For being a complex autoimmune disease and with difficult diagnosis, it is sub diagnosed and miss treated according to the consensus occurred in 2012 by the American College of Rheumatology (ACR). The surgeon-dentist (SD) may play a important role on the detection of possible changes compatible to the syndrome, besides can help in the treatment of many oral pathologies caused by the syndrome. This work has the main purpose to explain the important aspects regards to the correct diagnosis and treatment of this syndrome. The SS besides been considered a slow evolution disease, in advanced stages it can be fatal, mainly for increasing the patient's chances of developing non-Hodking lymphoma. The dental treatment of patients with SS must be prophylactic, with the recomedations of the use of salivary replenishing and careful control of the oral hyigiene.

Descriptors: sjogren's syndrome; xerostomia; xerophthalmia; periodontitis.


 

 

RELEVÂNCIA CLÍNICA

A Síndrome de Sjögren é a doença autoimune mais prevalente no mundo e tem como sinal clínico mais relevante a diminuição da salivação, a qual pode acarretar em alterações bucais como aumento de infecções fúngicas, cárie e doença periodontal.

 

INTRODUÇÃO

A Síndrome de Sjögren (SS) é uma alteração autoimune crônica que afeta principalmente o epitélio das glândulas lacrimais e salivares, resultando nos sintomas de xerostomia e xeroftalmia.1,2 Clinicamente, sua apresentação pode variar de sintomas relativamente leves de xerostomia e xeroftalmia, artralgias, fadiga e fibromialgia, aos sintomas sistêmicos mais graves como vasculite, glomerulonefrite, linfoma não-Hodking e uma série de manifestações neurológicas.3

A SS pode apresentar-se por si só, sem a existência de outras condições autoimunes (SS primária-SSp), ou então pode estar associada a alguma alteração autoimune pré-existente, como o lúpus eritematoso e/ou artrite reumatoide, sendo então classificada como SS secundária (SSs).3

A etiopatogenia da SS não é completamente elucidada, entretanto, estudos sugerem um conjunto de alterações imunológicas de origem infecciosas e/ou genéticas, que combinadas podem estar associadas ao desenvolvimento do processo autoimune. 4,5 Dentre essas alterações destacamos a infecção por vírus Epstein-Barr, hepatite C, leucemia de células T por vírus1, deficiência de hormônios andrógenos, concentrações elevadas no plasma de fator ativador de céluas B (BAFF), fator reumatoide (FR), anticorpo antinuclear Ro e La, IgG, TNF- α, INF-g.4

A prevalência desta síndrome segundo critério AECC (Consenso Euro-Americano) está em torno de 0,3 a 2,7% da população, sendo as mulheres as mais afetadas, numa proporção de (9M:1H).3 Usualmente o diagnóstico da doença é feito entre a quarta e quinta década de vida pelo médico reumatologista, no entanto, qualquer profissional da saúde deve conhecer os aspectos mais relevantes da doença, e a partir da suspeita inicial da síndrome, fazer o encaminhamento ao especialista que irá desenvolver o melhor tratamento para este paciente.6,7

A pouca produção de saliva em decorrência da SS pode resultar em diversas alterações na cavidade oral, fazendo com que esses pacientes possam apresentar maior prevalência de lesões de cárie, infeccões fúngicas e doença periodontal.8

Assim, o objetivo deste estudo é fazer uma revisão da literatura atual sobre os aspectos clínicos, diagnóstico e tratamento da SS para o Cirurgião-Dentista.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Esta revisão foi baseada em um levantamento bibliográfico sobre a síndrome de Sjögren em relação a sua etiopatogenia, diagnóstico, prevalência mundial, aspectos sistêmicos, clínicos e os cuidados a serem apreciados pelo Cirurgião-Dentista para o atendimento clínico desses pacientes. Os assuntos foram separados nos seguintes tópicos: 1) sintomas e manifestações extra-orais 2) alterações orais 3) critério de diagnóstico 4) tratamento e 5) conclusão. A busca foi feita utilizando as palavras chaves; Sjögren`s Syndrome AND classification, ((sjogren's syndrome) AND review) AND primary AND epidemiology, sjogren's review nos seguintes bancos de dados; PubMed e Lilacs.

Dos 841 artigos encontrados, foram selecionados 29 artigos que incluíram 9 revisões de literatura, 15 estudos transversais, 1 estudo epidemiológico, 3 estudos clínicos, 1 workshop.

 

REVISÃO DE LITERATURA

Sintomas e manifestações extra-orais da síndrome de Sjogren

Os pacientes portadores da S.S geralmente relatam, na primeira consulta, sintomas como secura dos olhos e da boca. Nos olhos a sensação de areia é frequente, clinicamente esses pacientes podem apresentar ulcerações, infecções e déficit na visão.9 Os sintomas relacionados aos olhos, geralmente são percebidos antes da boca. Securas relacionadas a outras regiões do corpo como no nariz, pele e vagina também são frequentemente relatadas.7

A S.S muitas vezes está relacionada a outras alterações de ordem imunológica. Pereira et al. (2013)10 relataram que a maioria dos pacientes com S.S (84%) já havia sido diagnosticado com alguma outra doença autoimune, como artrite reumatoide, lúpus eritematoso e fibromialgia. E 13% destes pacientes apresentavam algum sintoma pulmonar relacionado.

Aproximadamente 1/3 dos pacientes apresentam um aumento de volume da glândula parótida, o qual é firme, difuso, bilateral, indolor e persistente. Isto ocorre devido ao processo inflamatório de caráter crônico-degenerativo. Estudos demonstram que quanto mais evoluída a doença, maior o aumento das glândulas e maior o risco de desenvolvimento de sialadenite bacteriana retrógada.11

Alterações orais da Síndrome de Sjögren

Frequentemente, pacientes com Sjögren apresentam atrofia das papilas linguais, língua fissurada e mucosa oral avermelhada e dolorida.2 Além disso, a hipossalivação, que é uma característica clínica medida pelo fluxo salivar, e a xerostomia, uma característica estritamente sintomatológica, podem causar dificuldades na fala, na mastigação e inclusive mudanças na microbiota oral, com o aumento de espécies como Lactobacillus acidophilus, Streptococcus mutans e Candida albicans.12 Sendo assim, a importância da saliva1,2 é destacada por diversos mecanismos como:

I. Lubrificante natural, com a função de revestir as mucosas de maneira a formar uma barreira, protegendo contra estímulos nocivos, toxinas microbianas e pequenos traumas;

II. Sua consistência fluida provê uma ação de lavagem mecânica sobre as superfícies, removendo depósitos alimentares e microrganismos;

III. As proteínas salivares, prolina, glicina e glutamato, são adsorvidas fortemente pela hidroxiapatita dos dentes que além de protegê-los contra a dissolução ácida e desgaste mecânica, dificulta a instalação e a formação do biofilme sobre os mesmos.

Ainda, a redução do fluxo salivar, na sua forma crônica, aumenta a susceptibilidade às doenças bacterianas e fúngicas como;

I. Cárie em regiões de margem gengival, superfícies radiculares e superfícies adjacentes às restaurações dentárias.2

II. Candidose eritematosa e queilite angular.2

Critério diagnóstico para a Síndrome de Sjögren

Não há um consenso na literatura sobre o método mais eficaz para o diagnóstico do Sjögren. Atualmente o mais utilizado é o SICCA, que foi desenvolvido através de um consenso entre a Liga Europeia de Combate ao Reumatismo (EULAR) e o Colégio Americano de Reumatologia (ACR).7

Para a avaliação do comprometimento sistêmico da doença, dentre os critérios mais utilizados estão os elaborados pela EULAR:

a) O Índice de atividade sistêmica reportado pelo paciente (ESSPRI). É considerado não muito sensível as mudanças do quadro imuno-inflamatório sistêmico do paciente, porém é de grande uso em pesquisas que avaliam o quadro sintomatológico após uso de medicamentos ou terapia de suporte, uma vez que os sintomas e os comprometimentos sistêmicos são componentes diferentes da doença, devendo ser avaliados separadamente.17 A avaliação pelo índice é divido em três domínios, sendo todos com o mesmo peso. O cálculo para atividade deve então ser feito somando os valores obtidos em cada nível, dividindo o valor por três.

b) O Índice de atividade sistêmico da Síndrome de Sjögren primária (ESSDAI). Considerado o padrão ouro para avaliação sistêmica, avalia clinicamente o paciente através de 12 domínios, sendo que cada domínio têm um peso diferente.

Ao Cirurgião-Dentista é importante salientar que alguns exames importantes no diagnóstico após a suspeita inicial, poderão ser realizados pelos mesmos, destacando-se:

a) Biópsia de glândulas salivares menores:

A biópsia das glândulas salivares menores em pacientes portadores de S.S é considerada uma ferramenta para auxiliar o diagnóstico da doença. É uma técnica simples, rápida, com baixo custo e pouca necessidade de conhecimento técnico para sua execução, porém é invasiva e em estágios iniciais da doença não mostra grandes alterações nas glândulas. Desta maneira, ela não é utilizada como rotina para o acompanhamento da evolução da síndrome. Já, a realização da biópsia em um intervalo de um ano, deve ser realizada, porque que em alguns casos, os resultados inicialmente negativos podem vir a se confirmar positivos. Essa mudança é consequência do maior recrutamento de linfócitos durante esse período.18 Usualmente, é realizada uma incisão na mucosa de aparência normal, na porção interna do lábio inferior, com dimensões de 1,5cm-2cm entre a linha média e a comissura labial. Durante o processo há a exposição de glândulas salivares menores, que são excisadas e acondicionadas adequadamente para envio ao exame histopatológico.19 Assim, o patologista verifica as características histológicas do tecido biopsiado e procura por possíveis alterações compatíveis com a S.S.10 As principais características histopatológicas relatadas nas biopsias das glândulas salivares labiais são a sialadenite linfomioepitelial com destruição dos ductos excretores e, posteriormente, atrofia de todo o parênquima glandular, levando, em casos avançados da doença, à completa fibrose da glândula salivar.

b) Sialometria:

Utilizada para medir a quantidade de saliva produzida em um determinado tempo. A saliva, não estimulada, é depositada em um tubo específico por 5 ou 15 minutos. Os valores menores que 0,1 ml/min são considerados anormais.7 Este método pode mostrar alterações que ocorrem nos estágios iniciais da doença e é um método facilmente reprodutível, que quando combinado com o uso de anticorpos, torna-se uma alternativa viável ao uso da biópsia de lábio20, e também pode ser usado como controle para avaliar a progressão da doença e o curso da terapia. Entretanto, existem estudos demonstrando que até 45% dos pacientes com S.S têm um fluxo salivar normal21, o que não inviabiliza o uso da medição do fluxo salivar de modo rotineiro em consultórios médicos e odontológicos para o monitoramento dos pacientes portadores da S.S.

Tratamento da Síndrome de Sjögren

O acompanhamento desses pacientes pelo Cirurgião-Dentista é considerado importante, e tem como objetivo minimizar os sinais e sintomas clínicos da doença, tanto por meio da indicação do uso de salivas artificiais para lubrificação oral, ou por meio do controle químico e mecânico adequado da placa bacteriana.6 Na maioria dos casos, o tratamento feito pelo médico reumatologista é de suporte aos sintomas glandulares, mas existem também os medicamentos para os pacientes que têm algum comprometimento sistêmico.22

a) Tratamento Tópico Ocular

O tratamento tópico ocular pode ser dividido em:

- Medidas não farmacológicas: evitar leituras prolongadas, ambientes secos - usar umidificadores no ambiente em que estiver - fumar, usar drogas que possam vir a prejudicar a lubrificação ocular como diuréticos, beta-bloqueadores, antidepressivos tricíclicos, anti-histamínicos e em alguns casos, selamento cirúrgico do ducto de drenagem lacrimal na parte interna dos cílios.23

- Reposição de lágrimas: uso de lágrimas artificiais na forma de emulsões, soluções hipotônicas. Uso de soluções lubrificantes para os olhos obtidas do plasma sem células do próprio paciente.

- Uso de drogas tópicas: drogas que contenham ciclosporina - As aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância em Saúde (Anvisa), corticoides e anti-inflamatórios não-esteroidais.

b) Tratamento Tópico Oral

O tratamento tópico sintomático da xerostomia se divide em:

- Medidas não farmacológicas: adequada hidratação, evitar exposição a substâncias irritantes contidas no álcool, cigarro e café, evitar uso de substâncias que causem xerostomia, prática diária de meticulosa higiene dental, uso de chicletes sem açúcar e pastilhas com maltose.

- Medidas farmacológicas: uso de enxaguantes bucais, géis, óleos que contenham mucina, carbometicelulose, hidroximetilcelulose a fim de substituir a saliva.

c) Tratamento Sistêmico

Uso de medicamentos sistêmicos para combate do complexo sintomático da SICCA:

Temos nesse grupo medicamentos sialogogos como a pilocarpina e a cevimelina, que promovem o aumento do fluxo salivar e lacrimal por serem substâncias agonistas de receptores muscarínicos. Seus efeitos colaterais são um tanto incômodos aos que a usam, podendo causar suor, náuseas e aumento da frequência em urinar, denominada poliúria.

Há também o uso de drogas que possam vir a modificar o curso inflamatório e sintomático da síndrome. Muitas dessas drogas já vêm sendo usadas em doenças autoimunes como no reumatismo.

Nesse grupo temos os I. corticosteroides, II. anti-maláricos, III. imunossupressores e as IV. drogas biológicas.

I. Há poucos estudos feitos com o uso de corticosteroides no tratamento dos sintomas relacionados a S.S, o que não permite uma conclusão efetiva a despeito do seu uso no tratamento. Sabe-se que as doses altas desses medicamentos diminuem o processo inflamatório nas glândulas salivares e lacrimais, não havendo evidências que poderiam aumentar o fluxo das glândulas exócrinas.24

II. Os medicamentos anti-maláricos diminuem os sintomas ligados à fadiga e artrofibromialgia. A hidroxicloroquina mostra propriedades anti-neoplásicas, diminui os níveis expressos de BAFF, aumentam o fluxo salivar, diminui os índices inflamatórios associados à síndrome.25,26

III. Os imunossupressores como a ciclosporina-A, azatioprina usados no tratamento da SS, não têm muitos relatos na literatura sobre seus reais benefícios no tratamento, sendo mais usados em manifestações extra-glandulares e em órgãos específicos acometidos pela síndrome.9,27

IV. Nenhuma droga biológica atualmente está em uso para tratamento da S.S. Mas na literatura experimental há a pesquisa com uso de medicamentos anti TNF- α(Fator de necrose tumoral α) e anticorpos monoclonais (anti-CD20 e anti-CD22). O anti TNF-α parece não ser efetivo em evitar o aparecimento de sintomas glandulares e extra-glandulares.

O uso de anti-CD20 apesar de poucos estudos, se mostrou um tanto quanto interessante em evitar aparecimento de sintomas glandulares e extra-glandulares na S.S. Mostrou-se efetivo em estimular o fluxo salivar e fluxo lacrimal, diminuir o número do fator reumatoide (RF), diminuir os sintomas de fadiga, porém não diminuiu os níveis da auto-imunoglobulina produzida pelas células B que após o uso do medicamento tenderam a ter seus níveis reestabelecidos nos tecidos conjuntivos.9,28,29

O uso de anti-CD22 ainda não foi bem elucidado na literatura, mas parece atuar bem no controle da regulação do CD22 que se mostra super expresso nas células B periféricas.

 

DISCUSSÃO

A hipossalivação como consequência da S.S está relacionada com uma maior incidência de alterações bucais, fazendo assim, com que o Cirurgião-Dentista tenha importante atuação no tratamento e manutenção desses pacientes. Como resultado da falta de saliva há uma mudança na microbiota oral, resultando no aumento da microbiota cariogênica e infecções fúngicas. Devido à limitada capacidade tampão da saliva, o processo de remineralização do dente fica comprometido, podendo levar à maior incidência de lesões de cárie. Ainda, a pouca quantidade de mucinas, uma redução dos anticorpos presentes na saliva e dos fatores de crescimento epiteliais, podem afetar a saúde da mucosa e a cicatrização de feridas orais. Por fim, os pacientes podem apresentar problemas na retenção de próteses, alterações no paladar, mastigação, fala, formação do bolo alimentar e deglutição.8

A literatura relacionando a S.S com a doença periodontal é controversa. Alguns estudos apontam que pacientes com S.S podem apresentar piores parâmetros clínicos periodontais e maior perda de volume ósseo interproximal quando comparados a pacientes saudáveis.13 Celenligil et. al. em (1998)14 observaram valores significativamente mais altos de índice de placa, sangramento à sondagem e profundidade de sondagem em pacientes com S.S quando comparados com pacientes saudáveis, além disso, esses pacientes também apresentaram níveis significativamente elevados de anticorpos contra Actinobacillus actinomycetemcomitans e Porphyromonas gingivalis. Pers et. al., (2005)13 encontraram níveis significativamente elevados de citocinas pró-inflamatórias no fluido gengival e na saliva de pacientes com S.S quando comparados com controle, fato que poderia explicar uma maior destruição dos tecidos periodontais. Entretanto, alguns estudos falharam ao tentar relacionar a S.S com alterações clínicas e microbiológicas relacionadas à presença da doença periodontal.15,16 Sendo assim, há necessidade de mais estudos a fim de maiores esclarecimentos.

Por fim, o acompanhamento desses pacientes pelo Cirurgião-Dentista é considerado importante, e tem como objetivo minimizar os sinais e sintomas clínicos da doença, tanto por meio da indicação do uso de salivas artificiais para lubrificação oral, ou por meio do controle químico e mecânico adequado da placa bacteriana.6 Na maioria dos casos, o tratamento feito pelo médico reumatologista é de suporte aos sintomas glandulares, mas existem também os medicamentos para os pacientes que têm algum comprometimento sistêmico.22

 

CONCLUSÃO

O diagnóstico precoce melhora a qualidade de vida do paciente e é de vital importância para os pacientes portadores de SS, pois dependendo da severidade da doença, esta pode ser letal. É constatado também que pacientes com S.S apresentam maior risco de desenvolvimento de outras doenças autoimunes, de leves a graves.

É de fundamental importância que o cirurgião-dentista tenha conhecimento sobre os sinais e sintomas da S.S no consultório, saiba encaminhar ao especialista para o diagnóstico e saiba como proceder no tratamento específico de sua área, para com esses pacientes.

 

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Endereço para correspondência:
Marinella Holzhausen - Fousp
Av. Professor Lineu Prestes, 2227
Cidade Universitária - São Paulo - SP
05508-000
Brasil

e-mail:
marinella@usp.br


Recebido: nov/2015
Aceito: mai/2016