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Revista da Associacao Paulista de Cirurgioes Dentistas

versão impressa ISSN 0004-5276

Rev. Assoc. Paul. Cir. Dent. vol.70 no.3 Sao Paulo Jul./Set. 2016

 

Artigo original

 

Análise morfoestrutural de biomateriais para auxílio no processo de identificação humana

 

Morphostructural analysis of biomaterials for assistance in the human identification process

 

 

Synara Soares MoreiraI; Bruno Silva da CunhaII; Fabio Valverde Rodrigues Bastos NetoIII; Adriana Furtado MacedoIV

 

I Mestranda em Laser em Odontologia, Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo-SP
II Especialista em Implantodontia, Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo-SP
III Doutor em Laser em Odontologia, Universidade Cruzeiro do Sul - Professor do curso de Odontologia da Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo-SP
IV Doutora em Ciências pela Unifesp/EPM - Professora do curso de Odontologia da Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo-SP, Brasil




Endereço para correspondência

 

 


 

RESUMO

O objetivo do estudo foi avaliar as alterações de biomateriais restauradores e protéticos submetidos a temperaturas elevadas para o estabelecimento de parâmetros físicos que auxiliem nos casos de identificação humana em corpos carbonizados. A amostra do estudo experimental in vitro foi composta por 40 corpos de prova dividida em quatro grupos: GI (corpos de prova de cimentos de iônomero de vidro químico), GII (amálgama de prata), GIII (resina composta híbrida) e GIV (liga de cobre alumínio). Os corpos de prova foram submetidos a temperaturas de 300°C, 500°C, 700°C e 900°C. Após a incineração, os biomateriais foram submetidos a análises macroscópicas sobre as modificações de estrutura, coloração, forma e estabilidade dimensional e os dados analisados pela Análise de Variância e teste de Dunn (p<0,05). Os dados obtidos demonstraram em relação à radiopacidade uma diferença estatisticamente significante para as médias de densidade radiográfica no GI entre as temperaturas 700°C e 900°C; GIV entre as temperaturas 300°C e 900°C; 500° e 900°C. O GII atingiu seu ponto de fusão à 700ºC com aspecto pulverulento e lojas isoladas de mercúrio a 900°C. O GIII apresentou mudança estrutural nas temperaturas à 700°C e 900°C. No GIV não se constatou modificações relevantes. Assim, pode-se coligir que a resina composta micro hibrida e o amálgama apresentam severas alterações morfoestruturais enquanto o ionômero de vidro e o cobre alumínio não sofrem mudanças significativas em suas características originais. As alterações sofridas pelos materiais fornecem dados relevantes para o auxilio no processo de identificação humana de corpos carbonizados.

Descritores: odontologia legal; identificação de vítimas; incineração; materiais dentários.


 

ABSTRACT

The aim of this study was to evaluate the changes of restorative and prosthetic biomaterials subjected to high temperatures for the establishment of physical parameters that assist in cases of charred bodies in human identification. The sample of the experimental in vitro study was composed by 40 specimens divided into 4 groups: GI (specimens of cements of ionomer of chemical glass), GII (silver amalgam), GIII (hybrid composite resin) and GIV (copper alloy aluminum). The specimens were subjected to temperatures of 300°C, 500°C, 700°C and 900°C. After incineration the biomaterials were submitted macroscopic analysis on changes of structure, color, shape and dimensional stability and all data were analyzed by ANOVA and Dunn's test (p <0.05). Regarding the radiopacity there was statistically significant difference for the mean radiographic density in GI temperatures within 700°C and 900°C; GIV temperatures within 300°C and 900°C, 500°C and 900°C. The GII has reached its melting point at 700ºC with powdery appearance and isolated stores of mercury at 900°C. The GIII had structural change at 700°C and 900°C. In GIV it not observed significant changes. Thus, one can gather that the micro hybrid composite resin and amalgam exhibit severe morphostructural changes while the glass ionomer aluminum and copper does not undergo significant changes in their original characteristics. The changes undergone by materials provide relevant data to aid in the identification process of human bodies charred.

Descriptors: forensic dentistry; victims identification; incineration; dental materials.


 

 

RELEVÂNCIA CLÍNICA

A carbonização de corpos dificulta o processo de identificação humana, sendo necessário realizar a identificação mediante características do sistema estomatognático.

 

INTRODUÇÃO

A Odontologia Legal é a especialidade que tem como escopo a pesquisa de fenômenos psíquicos, físicos, químicos e biológicos que podem atingir ou ter atingido o homem, vivo, morto ou ossada, e mesmo fragmentos ou vestígios. A atuação engloba análises periciais em foro civil, criminal, trabalhista e processos de identificação humana com distintas ocasiões embasadas na apreciação dos elementos dentários. As identificações forenses dentárias são relevantes, principalmente em desastres em massa dependendo fundamentalmente da disponibilidade de registros odontológico do indivíduo antemortem.

Os órgãos dentais são os primeiros elementos analisados para se determinar a identidade de um indivíduo em um processo de identificação, principalmente em casos de destruição corpórea com impossibilidades de reconhecimento. Esses casos que resultam na falta de identificação cadavérica são normalmente provocados por desastres de grandes proporções naturais ou induzidos pelo homem, como a carbonização de corpos resultantes de acidentes aéreos. O corpo humano se torna disforme, mutilado ou carbonizado e nessas situações os órgãos dentais permanecem viáveis para serem utilizados na identificação humana.

Esse processo de identificação humana é possível porque os elementos dentais são as melhores estruturas preservadas do corpo humano em quaisquer situações como em alterações de pH, salinidade, umidade e altas temperaturas. Para a identificação humana mediante a aplicação de métodos que utilizam os órgãos dentais, são comparados dados dos prontuários odontológicos antemortem e postmortem sendo imprescindível a manutenção do prontuário odontológico de maneira apropriada. No entanto, os elementos dentais podem estar submetidos a tratamentos odontológicos e atualmente existem diversos biomateriais de uso rotineiro no ambiente clínico e possivelmente cada material apresenta um determinado comportamento frente às alterações de temperatura.1,2

A identificação pelo exame dos órgãos dentais é considerada um método célere, de baixo custo e com a unicidade apresentada pelas restaurações dentárias similares as impressões digitais, além de apresentarem um grande desafio a equipe profissional que realizam cuidadosa inspeção os locais de acidentes.3-5

A identificação por meio das evidências dentárias tem sido descrita como um dos métodos mais confiáveis no processo de identificação humana principalmente em vítimas de acidentes aéreos, onde o reconhecimento torna-se laborioso pela elevada condição destrutiva em que se encontram os corpos. Os elementos dentais aduzem maior resistência aos efeitos ambientais, como incêndios, dessecação e decomposição, permanecendo quase inalterados à intervenção térmica quando ocorre o selamento labial em razão da proteção da musculatura e estrutura óssea envolvente. Os materiais resinosos sob alta temperatura, tornam-se irregulares e rugosos com poucas alterações observadas na microscopia eletrônica de varredura.6-8

Dessa forma, o objetivo dessa pesquisa foi avaliar as alterações de biomateriais restauradores e protéticos submetidos a temperaturas elevadas testando a hipótese de que haja significativas modificações morfoestruturais, com a finalidade de se estabelecer parâmetros físicos que auxiliem nos casos de identificação humana em corpos carbonizados.

 

MATERIAL E MÉTODO

O estudo baseia-se em pesquisa experimental in vitro, mediante confecção de corpos de prova de biomateriais odontológicos. Foi confeccionada uma placa em silicone (zetalabor®) medindo 13x18cm, com orifícios circulares de 5mm de diâmetro e 10mm de altura para que houvesse padronização nas dimensões dos corpos de prova. A placa foi preenchida com resina composta microhíbrida (Filtek Z-250®, 3M-ESPE), cimento de ionômero de vidro (Vidrion R®, S.S. White ), amálgama em cápsula (Septalloy®, NG 50) e ligas e cobre-alumínio (Goldent®, LA), totalizando 40 corpos de prova com 0,5mmm de diâmetro. A amostra foi dividida em quatro grupos: GI (10 corpos de prova de cimentos de iônomero de vidro químico), GII (amálgama de prata), GII (resina composta híbrida) e GIV (liga de cobre alumínio). Posteriormente os corpos de prova foram incinerados em triplicata conforme metodologia descrita pelo autor em forno Bravac Ltda® analógico utilizado para a confecção de próteses dentárias. O forno foi previamente calibrado e os corpos de prova incinerados a temperatura de 300°C, 500°C, 700°C e 900°C, permanecendo cinco minutos dentro do forno em cada temperatura, não havendo, portanto variação de tempo. Para a facilitação da manipulação dos corpos de prova, os mesmos foram colocados sobre bandeja confeccionada com material de revestimento refratário específico para essa finalidade. Finalizado o tempo, aguardou-se cinco minutos para o esfriamento das amostras e efetuou-se a aquisição de imagens radiográficas com filmes oclusais (Kodak®) em aparelho radiológico X-TIMEX 70X®DRS (Gnatus®), com 70kVp, 7mA e tempo de exposição de 0,8 segundos de radiação, seguindo a técnica de padronização geométrica, na qual o feixe central de raios X incide em ângulo de 90º com a superfície do corpo de prova à distância focal de 10cm. As películas radiográficas foram processadas em ambiente específico pelo método tempo e temperatura em uma única vez. As aquisições de imagens radiográficas foram digitalizadas e a radiopacidade foi obtida pela contagem dos pixels por meio da ferramenta histograma do software Image J.9-10

Na avaliação visual macroscópica, observaram-se alterações na forma, cor, estrutura e estabilidade dimensional mediante visão direta das amostras com imagens digitais obtidas por câmara digital Flash Macro Ring Lite MR-14EX, com abertura f/22 e velocidade 1/30s, ISO 100.

As aquisições de imagens foram digitalizadas com o auxílio de uma câmera fotográfica digital (Canon EOS 60D e lente Canon Macro 100mm), com abertura e velocidade fixas (f/22, 1/4s, ISO 100), montada em tripé, em sala escura, com as películas colocadas sobre um negatoscópio. Após a digitalização, a radiopacidade das imagens foi mensurada com auxílio da ferramenta "histograma" do software Image J.

Na avaliação visual macroscópica, observaram-se alterações na forma, cor, estrutura e estabilidade dimensional mediante visão direta das amostras com imagens digitais obtidas por câmera fotográfica digital (Canon EOS 60D, lente Canon Macro 100mm e Flash Macro Ring Lite MR-14EX), com abertura f/22 e velocidade 1/30s, ISO 100, sobre um campo branco.

 

RESULTADOS

Os resultados referentes à radiopacidade dos biomaterais após a incineração foram tratados por meio dos métodos estatísticos Análise de Variância e Dunn com nível de significância de 5%. Em relação à radiopacidade dos biomateriais houve diferença estatisticamente significante (p<0,05) para as médias de densidade radiográfica entre as temperaturas 700°C e 900°C para os corpos de prova de cimento de ionômero de vidro. A liga de cobre-alumínio também apresentou diferença estatisticamente significante entre as temperaturas 300°C e 900°C; 500° e 900°C (Tabela 1).

Na avaliação macroscópica a resina composta microhíbrida não demonstrou alterações morfoestruturais e na coloração à temperatura de 300°C, modificando levemente sua cor original branco-amarelado para branco-acastanhado. A 500°C observou-se alteração de cor tornando-se mais escurecida, não havendo ainda nenhuma alteração visível em sua estrutura. Com maior notoriedade verificou-se uma mudança estrutural nas temperaturas à 700°C e 900°C, havendo rachaduras no material, além da alteração total de cor de castanho para branco (Figura 1).

No amálgama em cápsula, a análise macroscópica visual aduziu modificações na coloração e estrutura nas diversas temperaturas. O biomaterial mostrou-se de cor cinza opaco a 300°C, tornando-se escurecido e com fraturas à 500ºC. À 700ºC o amálgama de prata apresentou pequenas bolhas de mercúrio em sua estrutura, ponto inicial de fusão do componente, tornando-se pulverulento (forma de pó), com presença manchas enegrecidas na placa denotando também que a prata atingiu seu o ponto de fusão (Figura 2).

 

 

 

Ficaram evidentes alterações de cor, brilho, textura e contração entre 700°C a 900°C, apresentando inicialmente pequenos orifícios e intumescendo até a fase da separação dos componentes da liga, terminando somente com a presença da prata metálica, lojas isoladas de mercúrio e coloração prateada clara a 900°C (Figura 3).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O cimento de ionômero de vidro, na avaliação visual exibiu transformações na coloração entre 300°C e 500°C, alterando-se de sua cor original esbranquiçada para amarelo acastanhado com presença de pigmentos mistos de outras cores. Na transcrição da temperatura a 700°C para 900°C, o biomaterial modificou nitidamente sua morfologia com presença de trincas, bolhas esbranquiçadas em sua superfície, e alteração em sua cor primitiva originariamente clara para preto acinzentado (Figura 4).

Na liga de cobre-alumínio, não se constatou modificações relevantes a 300°C, 500°C e 700° C. A 900°C fez se notar aparição de manchas esbranquiçadas na superfície (Figura 5).

 

DISCUSSÃO

A perícia odontolegal mostra-se cada vez mais eficaz na identificação de corpos humanos que sofreram ação do fogo, exemplificados em alguns casos de desastres em massa incididos anteriormente, como o Tsunami em Sumatra ocorrido em 2004 e a queda do vôo Airbus em São Paulo no ano de 2007, carbonizando 199 vítimas. A fatalidade em larga escala e o rompimento de diversas vidas rompem estruturas familiares de maneira abrupta, sendo às vezes, a dor pela perda amenizada com a identificação do familiar. 10-12

As identificações de corpos carbonizados se permeiam em diversas dificuldades principalmente devido às cristas papilares das polpas digitais que são destruídas pela ação do fogo, impedido a identificação pelo método datiloscópico. O reconhecimento visual é prejudicado em razão de o fogo causar encolhimento dos membros e dos músculos, de duas a três vezes o seu tamanho natural, e em altas temperaturas as proteínas são desnaturadas obstando o exame de DNA. Assim, no processo de identificação dos corpos carbonizados, muitas vezes não é possível qualificar a vítima e evidenciar sua identidade em resultado do estado corpóreo, sendo necessário realizar a assimilação mediante características do sistema estomatognático. Os materiais utilizados para restaurar os dentes resistem à ação do fogo considerados agentes facilitadores no processo de reconhecimento de corpos carbonizados devido à rigidez dos músculos da face, a cavidade bucal se transforma em uma caixa forte, protegendo os dentes e os trabalhos odontológicos realizados pregressamente, da ação do fogo. Nessa etapa os peritos buscam com os parentes um contato com o Cirurgião-Dentista da vítima, para a obtenção da documentação odontológica incluindo exames radiográficos e fichas clínicas onde serão mensurados dados antemortem e postmortem.4,13,14

A técnica de identificação odontolegal apresenta vantagens dentre outras metodologias. Proporciona baixo custo, confiabilidade dos resultados obtidos, facilidade e rapidez no processo. Agregando-se ao fato que os elementos dentais possuem variações fisiológicas, patológicas e restauradoras, resultantes de intervenção odontológica, que as tornam informações particulares biológicas classificadas como unicidade, perenidade e imutabilidade, relevantes a metodologia aplicada para a identificação humana.10,15,16

No presente estudo o amálgama em cápsula iniciou seu processo de fusão à 300°C com a presença de manchas enegrecidas no corpo de prova. Entretanto, essa alteração morfoestrutural não foi compatível com o resultado obtido de outro estudo17, o qual o amálgama de prata iniciou seu ponto de fusão a 200°C. Tal alteração em relação à exata temperatura do ponto de fusão do amálgama, pode ocorrer à submissão desse biomaterial à temperaturas diferentes, acarretando em resultados distintos sobre o ponto de fusão desse biomaterial. A tonalidade do material alterou-se de maneira incontestável a 500°C, tornando-se escurecido e com rompimento das bordas à 700°C, corroborando com outras análises em que o amálgama sofreu rompimento em sua estrutura à 450°C e contração a partir dos 600°C.18,19 Nos corpos de prova de amálgama ficaram evidentes alterações de cor, brilho, textura e contração em todos os níveis de temperatura, apresentando inicialmente pequenos orifícios, turgescendo até a fase da separação dos componentes da liga, finalizando com a presença da prata metálica e lojas isoladas de mercúrio. Deste modo, a restauração em amálgama sofre fusão e posterior união dos componentes de maneira irregular e desordenada, dissociando e liberando o mercúrio.20 Contrapondo-se as mudanças físicas, a radiopacidade não se altera, mantendo-se constante nas distintas elevações térmicas. O amálgama de prata é o biomaterial que resiste menos a ação do fogo, configurando borbulhas gasosas inicialmente e voltando a forma original no resfriamento, assim, dentre os diversos biomaterias odontológicos, o amálgama de prata é o mais frágil ao calor, sendo as porcelanas, ligas de metal, os compostos, e o ouro os mais resistentes à ação térmica.7 Desse modo, esse material restaurador odontológico transpõe-se de amplas mudanças estruturais possibilitando estabelecer parâmetros entre suas mutações físicas e a temperatura em que a vítima foi incinerada. 7,15,16

Os metais utilizados para fins protéticos são altamente resistentes a elevadas temperaturas. A liga de cobre-alumínio foi o biomaterial que sofreu menor alteração morfoestrutural perante os demais. Similar comportamento também ocorre com as ligas áureas, níquel e carbono. Assim, a presença de metais utilizados em reabilitações protéticas são os melhores subsídios para o processo de identificação humana mediante análises comparativas radiográficas antemortem e postmortem, uma vez que possuem resistência às altas temperaturas não sofrendo alterações morfoestruturais. Entretanto, os metais nobres nas suas formas puras são cada vez menos empregadas em Odontologia devido ao seu elevado custo e fator estético. O metal notoriamente mais aplicado na Odontologia contemporânea é o titânio na área da implantodontia, sendo necessárias pesquisas para se inferir sobre comportamento deste biomaterial no processo de identificação em casos de carbonização.

A resina composta, nesse estudo apresentou mudanças na coloração nas diversas temperaturas, sendo que alteração de cor foi observada já por volta de 300°C, calcinação por volta de 500°C e a partir de 700°C as fraturas em sua superfície. No entanto, a densidade radiográfica manteve-se constante evidenciando que para uma comparação radiográfica o material fornece informações essenciais para identificação humana, no entanto deve-se avaliar criteriosamente em casos de comparações visuais haja vista as modificações colorimétricas a partir de baixas temperaturas e de superfície em sensações térmicas elevadas.

A resina composta não sofre mudanças físicas até os 200°C, a alteração cromática ocorre somente por volta de 400°C e posterior calcinação a 600°C.15,19,21 As divergências nos resultados baseiam-se nas marcas distintas aplicadas em cada estudo, mas de forma generalizada pode-se considerar que mesmo em temperaturas térmicas, não tão elevadas, relativas ao calor, a resina composta sofre modificações independentemente da marca e tipo utilizada no tratamento restaurador da vítima carbonizada. Os cimentos de ionômeros de vidro, também demonstraram variações na coloração a partir dos 300°C e física a 700°C, com irregularidades marcantes nos corpos de prova. De acordo com Patidar et al.22,o cimento de ionômero de vidro torna-se acinzentado contrapondo-se a cor esbranquiçada encontrada nessa pesquisa. Tal fato alvitra que os cimentos de ionômero de vidro comportam-se de maneira similar às resinas compostas, denotando modificações colorimétricas e equivalência na interpretação radiográfica nas distintas temperaturas a qual foi submetido. Assim, uma análise criteriosa deve ser feita sobre as resinas compostas e os cimentos de ionômero de vidro no exame visual inserido no sistema de identificação humana de carbonizados.16-18

Dessa forma, os resultados dessa pesquisa demonstram a relevância da Odontologia Legal na identificação humana de corpos carbonizados decorrentes de desastres em massa ou crimes, sendo incontestável sua contribuição na assimilação da vítima mediante a análise comparativa de biomateriais odontológicos dentre outras variáveis ponderadas no complexo processo de identificação humana.

 

CONCLUSÃO

Os materiais restauradores avaliados nesta pesquisa apresentaram alterações de cor, volume, contração (por desidratação) e textura da superfície externa (de lisa para pulverulenta, carbonizada e até calcinação), quando submetidos a temperaturas elevadas. A resina composta micro hibrida apresentou características comportamentais semelhantes às da amalgama, já o ionômero de vidro e o cobre alumínio não sofreram mudanças significativas em suas características originais. As alterações sofridas pelos materiais restauradores observadas neste estudo poderão servir de base para confronto com os registros odontológicos das vítimas no auxilio de identificação humana de corpos que sofreram carbonização total.

 

APLICAÇÃO CLÍNICA

Fornecer meios de identificação mediante as características dos biomaterias em corpos amplamente destruídos pela ação do fogo, que impossibilita a aplicação de qualquer outro meio de identificação humana.

 

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Endereço para correspondência:
Adriana Furtado de Macedo
Universidade Cruzeiro do Sul
Departamento de Odontologia
Rua Galvão Bueno, 868
Liberdade - São Paulo – SP
01506-000
Brasil

e-mail:
adriana.macedo@cruzeirodosul.edu.br


Recebido: nov/2015
Aceito: mar/2016