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Revista Brasileira de Odontologia

versão On-line ISSN 1984-3747versão impressa ISSN 0034-7272

Rev. Bras. Odontol. vol.69 no.1 Rio de Janeiro Jan./Jun. 2012

 

ARTIGO ORIGINAL/ ORIGINAL ARTICLE

 

Efeito inibitório de enxaguatórios bucais sobre o crescimento de Lactobacilos casei

 

Inhibitory effect of mouthwashes on Lactobacilus casei growth

 

 

Ianny Alves RamosI; Rafaella Bastos LeiteI; Karyna de Melo MenezesI; Vanessa Carvalho JovitoII; Yuri Wanderley CavalcantiII; Leopoldina de Fátima Dantas de AlmeidaIII; Ricardo Dias de CastroIV; Alessandro Leite CavalcantiV

I Alunas de Graduação em Odontologia da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Bolsistas de Iniciação Científica (PIBIC/CNPq/UEPB)
II Alunos de Graduação em Odontologia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
III Mestranda em Odontologia Preventiva Infantil pela UFPB
IV Professor Doutor Adjunto do Departamento de Clínica e Odontologia Social da UFPB
V Professor Doutor do Programa de Pós-Graduação em Odontologia da UEPB

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este estudo avaliou efeito inibitório de enxaguatórios bucais sobre o crescimento de Lactobacilos casei (ATCC 7469). A amostra foi composta por seis produtos (Plax®, Listerine®, Cepacol®, Oral B®, Sanifill® e Periogard®), os quais foram analisados quanto à determinação da Concentração Inibitória Mínima (CIM). A CIM dos enxaguatórios bucais Plax®, Listerine®, Cepacol®, Oral B®, Sanifill® e Periogard® foi verificada, respectivamente, nas concentrações 1:2, 1:8, 1:4, 1:8, 1:16 e 1:32. Concluiu-se que os enxaguatórios bucais apresentaram ação antimicrobiana frente a L. casei, sendo o maior efeito inibitório observado para o Periogard® e Sanifill®.

Palavras-chave: Microbiologia; testes de sensibilidade microbiana; Lactobacillus casei.


ABSTRACT

This study assessed the inhibitory effect of mouth rinses on the growth of Lactobacillus casei (ATCC 7469). The sample consisted of six products (Plax®, Listerine®, Cepacol®, Oral B®, Sanifill® and Periogard ®) which were analyzed to measure their Minimum Inhibitory Concentration (MIC). The MIC of the mouthwashes Plax®, Listerine®, Cepacol®, Oral B®, Sanifill® and Periogard® were measured at concentrations of 1:2, 1:8, 1:4, 1:8, 1:16, and 1:32, respectively. It was concluded that the mouthwashes presented antimicrobial activity against L. casei, and the largest inhibitory effect was with Periogard® and Sanifill®.

Keywords: Microbiology; microbial sensitivity tests; Lactobacillus casei.


 

 

Introdução

A cárie dentária é considerada uma doença infecciosa de alta prevalência 3, a qual possui caráter multifatorial, verificada pela interação de fatores como: hospedeiro, dieta, microbiota e tempo 14. A alta ingestão de sacarose, associada à higiene oral deficiente e à presença de micro-organismos patogênicos contribui para mudança ecológica do biofilme ao longo do tempo, o que pode resultar em lesões cariosas 5.

A formação do biofilme dentário ocorre por meio de processos complexos, que proporcionam a instalação de uma comunidade microbiana diversa, cooperativa, dinâmica, de alto potencial patogênico. Na formação do biofilme dental ocorre fixação de bactérias sobre as superfícies dentárias. Dessa forma, o biofilme, devido a sua característica contínua de agressão, adquire novas espécies de micro-organismos como S. mutans, S. mitis, S. sanguis, S. sobrinus e L. casei em cada etapa do seu desenvolvimento 6,14,17.

As bactérias do gênero Lactobacillus desempenham papel importante na progressão da cárie, especialmente nos casos de lesões cavitadas, tendo em vista que fazem parte do grupo de colonizadores secundários do biofilme cariogênico e, devido às características acidogênicas, contribuem para progressão do efeito destrutivo 5.

Assim, a remoção do biofilme dental, realizada mediante associação de métodos químicos e mecânicos, constitui estratégia eficaz na prevenção da cárie e da doença periodontal. A remoção mecânica do biofilme dental, através da escovação, não pode ser substituída por estratégias de controle químico do biofilme, uma vez que o emprego de soluções antimicrobianas não é eficaz na remoção do biofilme maduro 5. Dessa forma, a utilização de agentes de controle químico deve complementar a escovação dentária, nos casos em que se verificam dificuldades no controle do biofilme 1,15. Considera-se, portanto, que os enxaguatórios bucais com ação antimicrobiana são adjuvantes na manutenção da higiene oral, contribuindo para a redução do número de microrganismos patogênicos 1.

Os enxaguatórios bucais são a forma mais simples para veiculação de substâncias antissépticas, sendo uma mistura de componente ativo (antimicrobiano), água, álcool, surfactantes, umectantes e flavorizantes 15. Os agentes químicos para higienização bucal, além de servirem como veículo aos agentes terapêuticos, também devem colaborar para remoção de manchas e controle da halitose 16.

Os principais agentes antimicrobianos presentes nos enxaguatório são fluoreto de sódio, fluoreto estanhoso, cloreto de cetil peridíneo, triclosan, óleos essenciais e clorexidina 13,15,16. Pesquisa prévia demonstrou que um agente antimicrobiano contendo clorexidina e cloreto de cetil peridíneo contribuiu para a redução dos índices organolépticos, níveis de compostos sulforados voláteis e acúmulo de saburra lingual 16. Dessa forma, verifica-se que os principais componentes ativos dos enxaguatórios bucais viabilizam a redução dos micro-organismos e de seus subprodutos.

Porém, a literatura é escassa quanto à contribuição desses agentes antissépticos para o controle de biofilmes maduros, no qual se verifica a presençado micro-organismo Lactobacillus casei. Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar in vitro o efeito inibitório de enxaguatórios bucais comercialmente disponíveis sobre o crescimento do L. casei.

 

Material e Método

Adotou-se uma abordagem indutiva com procedimento comparativo e técnica de observação direta em laboratório 8. Foram analisados seis diferentes enxaguatórios bucais, os quais são apresentados no Quadro I. A solução de digluconato de clorexidina na concentração de 0,12% (Periogard®. Colgate-Palmolive Ind. Com. São Paulo-SP, Brasil) foi utilizada como controle.

 

 

 

A atividade antimicrobiana dos enxaguatórios bucais foi avaliada frente Lactobacillus casei (ATCC 7469), por meio da técnica de difusão em agar 2. A partir da concentração pura dos produtos testados, obteve-se seis diluições seriadas (1:1 até 1:32), as quais foram testadas para determinação da Concentração Inibitória Mínima (CIM). Suspensões do micro-organismo envolvido (1,5x106 células/mL) foram semeadas em placas de agar Sangue (agar Muller Hinton - DIFICO®, Detroit, Michigan, EUA – adicionado em 5% de sangue de carneiro desfibrinado), sobre as quais foram perfurados sete poços (6 mm de diâmetro). Em cada um dos poços foram inseridos 50μL dos produtos testados e de suas respectivas diluições 2. Os testes foram realizados em triplicata e as placas foram incubadas em estufa bacteriológica, a 37º C, por 24h. Os halos de inibição do crescimento foram mensurados em milímetros, com o auxílio de um paquímetro, e analisados descritivamente pela obtenção de médias. A CIM foi considerada a menor concentração capaz de inibir o crescimento de L. casei, ao produzir halos de inibição iguais, ou superiores, a 10 mm de diâmetro 2.

 

Resultados

Os resultados obtidos para os valores médios de inibição do crescimento provocado pelos produtos testados frente à cepa de L. casei (ATCC 7469) são apresentados na Tabela I.

 

 

 

Todos os enxaguatórios bucais avaliados foram eficazes e exibiram atividade sobre L. casei. O Periogard® (digluconato de clorexidina a 0,12%) apresentou inibição em todas as concentrações testadas. A CIM dos enxaguatórios bucais Plax®, Listerine®, Cepacol®, Oral B® e Sanifill® foi verificada, respectivamente, nas concentrações 1:2, 1:8, 1:4, 1:8 e 1:16.

 

Discussão

O presente estudo corrobora os achados da literatura quanto à atividade antimicrobiana de enxaguatórios bucais 4,9,10,13. Entretanto, as investigações que consideram a atividade desses agentes químicos frente ao microrganismo L. casei ainda são escassas 7,12.

Nesta pesquisa, os produtos testados inibiram a atividade de L. casei, sendo verificada divergência na determinação da CIM. Além das diferenças fenotípicas verificadas entre os micro-organismos testados, as quais podem resultar em efeito inibitório diversificado, destacam-se as limitações da técnica empregada no estudo.

A técnica de difusão em meio sólido (agar Sangue) apresente baixa sensibilidade na avaliação da atividade antimicrobiana, uma vez que as propriedades físico-químicas dos produtos testados podem influenciar na difusão do meio de cultura facilitando ou dificultando o contato do agente ativo com os micro-organismos 4,10,11. Entretanto, não foram identificados estudos que avaliaram, pelo método de difusão em agar, a atividade de enxaguatórios bucais sobre o crescimento de L. casei, o que inviabiliza a comparação da técnica empregada.

Pesquisa anterior demonstrou que o enxaguatório à base de óleos essências (Listerine®) foi mais efetivo no controle dos micro-organimos Fusobacterium nucleatum, Streptococcus mutans, Prevotella intermedia, Lactobacillus casei e Candida albicans 12. Conforme observado no presente estudo, o Listerine® apresentou efeito semelhante ao Oral B® e inferior ao Sanifill® e Periogard®.

A presente pesquisa ratifica os achados descritos previamente 13, posto que confirmou a atividade antimicrobiana do Periogard® (digluconato de clorexidina), Plax®, Cepacol®, Oral B® e Sanifill® (compostos por cloreto de cetil peridíneo) contra o Lactobacillus casei.

A atividade de enxaguatórios bucais disponíveis comercialmente sobre cepas de Candida foi avaliada por CAVALCANTI et al. 4 e PÉREZ et al. 10, os quais identificaram que os melhores resultados foram observados para as soluções à base de cloreto de cetil peridíneo e digluconato de clorexidina. No presente estudo, os enxaguatórios que apresentaram menor efeito inibitório foram o Cepacol® e o Plax®, nos quais o cloreto de cetil peridíneo é o principal composto ativo. As diferenças encontradas entre os produtos testados podem ser justificadas pela presença de outros componentes químicos que podem contribuir para atividade antimicrobiana, a exemplo do fluoreto de sódio, fluoreto estanhoso, triclosan e álcool 7,9.

Semelhante ao verificado neste estudo, HERRERA et al. 7 identificaram que a solução de digluconato de clorexidina apresenta excelente efeito inibitório frente a L. casei e outros micro-organismos do meio bucal. No entanto, a associação com outros compostos ativos e a utilização do álcool etílico na composição do enxaguatório potencializa o efeito antimicrobiano 9.

Os resultados desta pesquisa apontam que as soluções à base de digluconato de clorexidina, óleos essenciais e cloreto de cetil peridíneo podem ser efetivas no controle do biofilme cariogênico, especialmente nos casos em que se verifica contaminação por L. casei. No entanto, o uso dessas soluções antimicrobianas deve ser orientado pelo profissional de saúde bucal, uma vez que o uso indiscriminado destes produtos pode contribuir para um desequilíbrio ecológico da microbiota oral e desenvolvimento de resistência microbiana frente aos agentes utilizados 1.

 

Conclusão

Todos os enxaguatórios bucais apresentaram ação antimicrobiana na concentração dependente frente a L. casei, sendo o maior efeito inibitório observado para o Periogard® (Digluconato de Clorexidina a 0,12%) e Sanifill® (Cloreto de Cetil Peridíneo).

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Endereço para correspondência:
Alessandro Leite Cavalcanti
Universidade Estadual da Paraíba
Departamento de Odontologia
Av. das Baraúnas, S/N – Bodocongó
Campina Grande/PB, Brasil – CEP: 58109-970

e-mail:
dralessandro@ibest.com.br

 

Recebido em 30/01/2012
Aprovado em 19/04/2012