SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.69 número2 índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Revista Brasileira de Odontologia

versão On-line ISSN 1984-3747versão impressa ISSN 0034-7272

Rev. Bras. Odontol. vol.69 no.2 Rio de Janeiro Jul./Dez. 2012

 

ARTIGO DE REVISÃO

 

Desenvolvimento dental: aspectos morfogenéticos e relações com as anomalias dentárias do desenvolvimento

 

Dental formation: morphogenetic aspects and relationship with the development of dental anomalies

 

 

Rodrigo Porpino MafraI; Rodrigo Gadelha VasconcelosII; Marcelo Gadelha VasconcelosIII; Lélia Maria Guedes QueirozIV; Carlos Augusto Galvão BarbozaV

I Aluno de Graduação em Odontologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
II Doutorando do Programa de Pós-graduação em Patologia Oral da UFRN
III Doutor em Patologia Oral da UFRN
IV Professora Associada do Programa de Pós-graduação em Patologia Oral da UFRN
IV Professor Associado do Departamento de Morfologia e do Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva da UFRN

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A odontogênese compreende uma série de eventos celulares e moleculares altamente coordenados que culminam com a formação dos dentes. O processo requer interações recíprocas do epitélio oral com o ectomesênquima, cujo funcionamento envolve contatos intercelulares, interações mediadas por componentes da matriz extracelular e induções célula-a-célula por meio de fatores indutores. Diversas moléculas são responsáveis pela regulação do processo, dentre as quais merecem destaque os fatores de transcrição, fatores de crescimento e componentes da matriz extracelular. O presente trabalho tem por objetivo discorrer sobre a odontogênese, apresentando os principais fenômenos ocorridos em cada uma de suas etapas e abordando a atuação de algumas moléculas relacionadas à regulação do processo, bem como correlacionar com as anomalias dentárias do desenvolvimento.

Palavras-chave: odontogênese; genética; anomalias dentárias.


ABSTRACT

The odontogenesis comprises a series of cellular and molecular events that culminate in highly coordinated with the formation of teeth. The process requires reciprocal interactions of oral epithelium with mesenchyme, whose operation involves contacts intercellular interactions mediated by components of the extracellular matrix and inductions cell-to-cell by inducing factors. Several molecules are responsible for regulating the process, noteworthy among which the transcription factors, growth factors and extracellular matrix components. This paper aims to discuss the odontogenesis, including the main phenomena occurring in each of its steps and addressing the role of some molecules related to regulation of the process, and correlate with the developmental dental anomalies.

Keywords: odontogenesis; genetics; dental anomalies.


 

 

Introdução

A odontogênese consiste em um processo complexo que abrange eventos celulares e moleculares altamente coordenados, os quais culminam com a formação dos elementos dentários 10, sendo a sua forma, tamanho e posição determinada pela proliferação, diferenciação e apoptose de diferentes populações celulares 16. Embora seus mecanismos não sejam completamente elucidados, sabe-se que o desenvolvimento do dente depende de interações recíprocas do epitélio oral (derivado do ectoderma) com o ectomesênquima (derivado de células da crista neural), as quais são mediadas pela expressão de diversos genes 5,6,7,8,12,13,16,17,23,25. De acordo com SILVA & ALVES 21 e BERKOVITZ et al. 6, as interações epitélio- -ectomesênquima durante o processo envolvem contatos intercelulares, interações mediadas por componentes da matriz extracelular e induções célula- -a-célula através de fatores difusíveis (indutores).

Os eventos iniciais da odontogênese são semelhantes para todos os grupos morfológicos dos elementos dentários 16, iniciando-se ao final da quinta semana de vida intrauterina 12. O primeiro sinal perceptível da formação dos dentes consiste em um espessamento do epitélio da cavidade oral primitiva, denominado banda epitelial primária 6,15,20, o qual sofre uma divisão originando dois componentes: a lâmina dentária (processo interno, que originará os germes dentários), e a lâmina vestibular (processo externo, o qual contribuirá para a formação do vestíbulo bucal) 6,10,15.

O presente estudo tem por objetivo discorrer sobre o processo de odontogênese, apresentando os principais fenômenos ocorridos em cada uma de suas etapas e a participação de moléculas reguladoras. Também serão discutidas as relações deste processo com as anomalias dentárias do desenvolvimento.

Revisão da Literatura Odontogênese: Considerações Morfogenéticas

O estágio inicial da odontogênese, denominado botão ou broto, inicia-se após a formação da lâmina dentária a partir do epitélio oral. Nesta faixa de espessamento epitelial, as células proliferam formando projeções com formato semelhante a botões, que invaginam em direção ao ectomesênquima subjacente 2,4,5,12,15,16,26). Em cada lâmina dental, formam-se 10 centros de proliferação 4,20,25, os quais constituem os locais de desenvolvimento dos futuros dentes 4,21,25.

Nos botões em desenvolvimento, verifica-se alta atividade mitótica, com as células centrais apresentando formato poligonal, e as periféricas, morfologia cilíndrica ou cuboidal 15. Concomitantemente a esta proliferação epitelial, ocorre uma condensação de células ectomesenquimais ao redor do botão 12,26. Supõe-se que a ligação da molécula de superfície celular Sindecan-1 à Tenascina (presente na matriz extracelular) intermedia a condensação celular 15.

Durante a fase de botão, os sinais necessários à progressão da odontogênese partem principalmente do epitélio oral para o ectomesênquima. As ações indutivas são mediadas por moléculas como proteínas morfogenéticas do osso (BMPs), fatores de crescimento fibroblástico (FGFs), Sonic hedgehog (Shh) e Wingless integrated (Wnts) 27. Após recebidos esses sinais, o ectomesênquima adquire o potencial de estimular os processos de morfogênese e citodiferenciação 26.

Após estes eventos, variações de concentração de fatores de crescimento promovem uma proliferação celular de forma heterogênea 12, havendo maior atividade mitótica nas células periféricas, as quais invaginam em direção ao ectomesênquima, o que resulta em uma estrutura de formato semelhante a um boné 12,19. O surgimento desta estrutura caracteriza a fase de capuz (casquete), em que as células epiteliais centrais formam uma concavidade, próximo à qual se verifica uma maior condensação de células ectomesenquimais, comparativamente a fase de botão 15.

Durante a fase de capuz, as células mais internas da proliferação epitelial adquirem morfologia estrelada e sintetizam grande quantidade de glicosaminoglicanas. Com o aumento na quantidade de substância intercelular, as células tornam- -se mais afastadas e adquirem longos processos citoplasmáticos, recebendo a denominação de células do retículo estrelado 6,12,15.

Ao final desta fase, podem ser visualizados os germes dentários, constituídos por um componente epitelial (órgão do esmalte) e um componente ectomesenquimal (papila dentária), os quais originam, respectivamente, o esmalte e o complexo dentinopulpar 4,9,15,19. O órgão do esmalte é composto pelo epitélio externo (células pavimentosas, na região de convexidade) e epitélio interno (células cilíndricas baixas, na região de concavidade), entre os dois grupos celulares se encontram as células do retículo estrelado 6,15,20.

Abaixo do epitélio interno do órgão do esmalte, observa- -se a papila dentária, composta por uma área de condensação de células ectomesenquimais 2,6,10,12,20,25. Também se verifica, envolvendo todo o germe dentário, uma condensação do ectomesênquima, cujas células constituem o folículo dentário. Este componente tem a função de originar componentes do periodonto, através dos cementoblastos, fibroblastos e osteoblastos 4,7,9,10,12,14,15,20,25,26.

No estágio subsequente, conhecido como fase de campânula ou sino, surgem duas a três camadas de células achatadas entre o epitélio interno e o retículo estrelado do órgão do esmalte, as quais constituem o estrato intermediário 4,6,12,15,26. Nesse estágio também é possível observar a região de encontro dos epitélios interno e externo (alça cervical), bem como a separação entre o epitélio oral e o germe dentário, o qual se torna completamente envolvido pelo folículo dentário 6,10,15. Uma das importâncias desse estágio é a formação de crescimentos localizados no epitélio externo do órgão do esmalte, situados lingualmente aos germes dentários, os quais posteriormente originarão os dentes permanentes, com exceção dos molares. Estes elementos desenvolvem-se diretamente a partir de extensões da lâmina dentária 6,15.

Durante a fase de campânula, a atividade mitótica das células do epitélio interno do órgão do esmalte é encerrada, prosseguindo a partir dos vértices das cúspides em direção à alça cervical. Nos locais em que a proliferação já foi suspensa, formam-se dobras que determinam a forma da coroa do dente, bem como acúmulos de células epiteliais nos locais das futuras cúspides, conhecidos como “nós” de esmalte 2,6,15,20. Acredita-se que tais estruturas também estão relacionadas à determinação do formato das coroas 2, reforçando o estímulo dos dobramentos e invaginações epiteliais, o que resulta na formação das cúspides 16. Além disso, os “nós” de esmalte produzem moléculas de sinalização importantes para a proliferação das células adjacentes, também contribuindo para a diferenciação dos odontoblastos 1216,26. Um exemplo destas moléculas é o Shh, o qual induz a liberação de sinais recíprocos do ectomesênquima para o epitélio 8.

A determinação do formato do dente depende da expressão de diversos genes envolvidos nas interações epitélio- ectomesênquima, a exemplo dos genes homeobox, cuja expressão se inicia antes do desenvolvimento dos elementos dentários 26,27. As moléculas envolvidas no processo abrangem componentes da matriz extracelular, fatores de transcrição e fatores de crescimento 6,21.

Segundo SRISUWAN et al. 24, os componentes da matriz extracelular desempenham papéis fundamentais na proliferação celular, migração, diferenciação e apoptose, ao interagirem com receptores de superfície celular (integrinas), o que resulta na modulação da expressão de genes específicos.

Define-se os fatores de transcrição como moléculas responsáveis por modular a expressão de genes, por meio de interação com regiões específicas do DNA 21,23. Como exemplos, pode-se citar o msx, dlx, lef, pax e Shh (Sonic hedgehog) 21. Outro fator de transcrição bastante reconhecido é o Runx2, o qual é expresso na papila dentária e folículo dentário, participando na diferenciação dos odontoblastos e manutenção do funcionamento dos componentes do ligamento periodontal 9.

Os fatores de crescimento, por sua vez, são moléculas secretadas que se ligam a receptores na superfície de células específicas, exercendo ação sinalizadora 21,23 parácrina ou autócrina. Alguns destes fatores envolvidos na odontogênese são os das famílias BMP, FGF, Wnt e EGF 6,7,13,21,25,27). É sabido que as BMPs atuam nas fases de iniciação e morfogênese dos dentes 21, bem como no desenvolvimento do ectomesênquima 6. Por sua vez, as moléculas da família FGF induzem a proliferação do epitélio e do ectomesênquima (21), tendo várias de suas funções desempenhadas em associação aos fatores BMP. Por último, os EGFs constituem agentes mitógenos, responsáveis por estimular ou manter a proliferação de células indiferenciadas de origem ectodérmica, mesodérmica e endodérmica 21.

Retomando a sequência de eventos da odontogênese, as células do epitélio interno do órgão do esmalte, até então com núcleos próximos à papila dentária e apresentando morfologia cilíndrica baixa, diferenciam-se em pré-ameloblastos, tornando-se cilíndricas altas e com polaridade invertida, isto é, com núcleos localizados do lado oposto à lâmina basal 4. Após essa transformação, os pré-ameloblastos estimulam a diferenciação das células da papila dentária adjacentes ao epitélio interno em odontoblastos. Tal processo depende da atuação de componentes da matriz extracelular, a exemplo das integrinas, que interagem com domínios RGD (fibronectina e vitronectina), GER (colágeno I) e YIGSR (laminina) 24, bem como do estímulo do fator de crescimento BMP-4 11,20.

Uma vez diferenciados, os odontoblastos invertem a polaridade de seus núcleos e sintetizam a primeira camada de matriz de dentina (dentina do manto) 4,11,15,16,25, tornando-se uma nova fonte de sinais moleculares. Estes sinais, juntamente com a presença da dentina do manto, levam à diferenciação dos pré-ameloblastos em ameloblastos, os quais iniciam a síntese da matriz orgânica do esmalte, conforme mostra a figura 1 4,15,27.

Posteriormente, inicia-se o estágio de coroa, cujos principais eventos são a continuação do processo de dentinogênese e amelogênese. A deposição do esmalte ocorre de forma centrífuga e a da dentina, de forma centrípeta, sendo que, quanto mais próxima da cúspide for a região examinada, mais avançados se encontram os estágios de diferenciação das células da papila dentária em odontoblastos e pré-ameloblastos em ameloblastos 15. Nas regiões de “nós” do esmalte, a expressão gênica de fatores de crescimento como BMP-2, 4 e 7, FGF-4 e 9, determina o número e a morfologia das cúspides 20.

Durante a dentinogênese, os odontoblastos secretam matriz orgânica composta principalmente por colágeno tipo I, a qual posteriormente sofre mineralização. Isso resulta em um tecido tubular – túbulos dentinários – composto por longos processos odontoblásticos contidos em cilindros de material mineralizado 4 e por uma camada de dentina não mineralizada (pré-dentina), a qual se situa entre os odontoblastos e a dentina mineralizada 15. Na amelogênese, o esmalte é depositado a partir da junção amelodentinária pelos ameloblastos, sendo constituído principalmente por proteínas hidrofóbicas, tais como amelogenina, ameloblastina, enamelina e tufulina 7. Ao longo do processo, eventos celulares e moleculares levam a uma maturação do tecido, o qual se torna altamente mineralizado, com composição predominantemente inorgânica (cristais de hidroxiapatita) 11,16. Em estudo de MATALOVÁ et al. 16, foi constatado que o fator de transcrição c-Myb está relacionado ao metabolismo do cálcio nos ameloblastos e odontoblastos. Assim, provavelmente a referida molécula participa do processo de mineralização do esmalte e da dentina.

Finalizada a deposição do esmalte e da dentina na coroa, o dente inicia a fase de formação da raiz; um evento importante para o processo de erupção dentária 21. Com a proliferação dos epitélios interno e externo do órgão do esmalte, na região da alça cervical são originados o diafragma epitelial e a bainha epitelial radicular de Hertwig (BRH) 7,15,20,25. De acordo com OHSHIMA 18, ULMER et al. 25,YEN & SHARPE 26, BATH-BALOGH & FEHRENBACH 4 e WRIGHT 28, a BRH possui a importância de contribuir com a formação da dentina radicular, determinando o formato da raiz.

Através de estímulos provenientes da bainha epitelial radicular de Hertwig, células ectomesenquimais da papila dentária diferenciam-se em odontoblastos, os quais formam a dentina radicular, levando ao crescimento da raiz. As células da BRH, após estimularem a diferenciação dos odontoblastos, cessam sua proliferação, tornando-se mais afastadas à medida que o comprimento da raiz aumenta. Este fenômeno é conhecido como fragmentação da bainha de Hertwig 15.

A fragmentação da bainha epitelial radicular de Hertwig permite o contato das células ectomesenquimais do folículo dentário com a superfície da dentina radicular, resultando na deposição da primeira camada de cemento 4,11,17,18. BARTOLD et al. 3 citam uma das teorias da formação do cemento, segundo a qual, na superfície da dentina radicular, é depositada uma matriz que permite a adesão e diferenciação de células progenitoras do folículo dentário em cementoblastos. Também se originam do folículo dentário os fibroblastos e osteoblastos, os quais formam, simultaneamente, o ligamento periodontal e o osso alveolar 14,18,26. Após a fragmentação da bainha, permanecem grupos isolados de células, denominados restos epiteliais de Malassez 15.

Ao final da formação do dente, ocorre atrofia do órgão do esmalte, com desaparecimento do retículo estrelado. Os epitélios interno e externo do órgão do esmalte, em conjunto, formam um revestimento (epitélio reduzido do órgão do esmalte) que recobre a coroa dentária até o término do processo de erupção, após o qual contribuirá com a formação do epitélio juncional da gengiva 15.

Alterações do Desenvolvimento

Anomalias dentárias do desenvolvimento (ADDs) são encontradas com frequência na clínica odontológica e acarretam problemas funcionais (mastigação e fonação) e estéticos aos pacientes, comprometendo a sua qualidade de vida. Diversas dessas anomalias resultam da expressão de moléculas que participam de etapas da odontogênese, podendo ou não haver a influência de fatores ambientais 22.

A hipodontia é definida como a ausência de um a seis elementos dentários na dentição decídua ou permanente, representando uma ADD relativamente comum. Nesta condição, microdontia, dentes conóides e impacção de dentes decíduos são achados comuns. A hipodontia, que pode estar associada a anomalias congênitas ou síndromes, tais como displasia ectodérmica e síndrome de Down 1,22, ocorre devido à ausência de formação de parte dos botões epiteliais a partir da lâmina dentária 22. A interrupção da odontogênese no estágio de botão, que resulta em hipodontia, pode ser o resultado de mutações no gene PAX-9 8 ou da ausência dos fatores de transcrição Msx-1 e Msx-2 6. Finalmente, SCHOENWOLF et al. 20ressaltam que a hipodontia pode ser o resultado de defeitos na sinalização envolvendo o fator de crescimento Wnt.

Em contrapartida, a hiperdontia, que consiste na formação de dentes em número superior ao normal, é o resultado da hiperatividade da lâmina dentária, a qual origina botões epiteliais em excesso. Casos de múltiplos dentes supranumerários acometem frequentemente portadores de displasia cleidocraniana 22. Esta condição é causada por mutações do fator de transcrição Runx2 1, cuja função está relacionada à atividade proliferativa da lâmina dentária 9. Os referidos autores citam ainda a Síndrome de Gardner, distúrbio genético no qual ocorre formação de múltiplos dentes supranumerários em associação a lesões como pólipos intestinais, osteomas e cistos cutâneos e dos tecidos moles. Adicionalmente, evidências científicas sugerem que mutações nos genes FGF, BMP, SHH e B-Catenina relacionam-se à hiperdontia 8.

WRIGHT 28afirma que a bainha epitelial fornece o modelo para a formação das raízes e pode, em casos de falhas de sinalização molecular, ocasionar o taurodontismo. Este distúrbio pode ser explicado por um atraso ou deficiência na invaginação da bainha epitelial, o qual leva à formação de uma câmara pulpar alongada, com região de furca situada apicalmente. O nível da invaginação epitelial é um fator determinante para a gravidade desta anomalia. Similarmente à hipodontia, o taurodontismo pode estar associado a condições como a displasia ectodérmica e a síndrome de Down. Além disso, sabe- -se que os fatores de transcrição msx-1 e msx-2 estão envolvidos na rizogênese, podendo estar implicados nas alterações de número, tamanho e forma das raízes 21.

Amelogênese imperfeita (AI) compreende um grupo de anomalias estruturais relacionadas à formação do esmalte. Tais condições manifestam-se como áreas focais com amelogênese deficiente ou ausência de esmalte. Nestes quadros clínicos, a coloração dos dentes varia do amarelo ao marrom, e seu tamanho varia de acordo com a espessura do esmalte, podendo a superfície se apresentar lisa ou áspera. Dentre os genes relacionados à AI, destacam-se o ENAM (enamelina), MMP-20 e KLK-4 2. Mutações no gene da amelogenina (AMELX) também estão implicadas no desenvolvimento de alguns subtipos de AI 8, bem como a expressão aberrante de fatores de transcrição da família dlx 20.

Outras ADDs estruturais compreendem a dentinogênese imperfeita e as displasias dentinárias, distúrbios relacionados a mutações no gene DSPP. Na dentinogênese imperfeita (DI), observam-se coroas globulosas, com constrição cervical, nas quais o esmalte tende a sofrer fraturas, expondo a dentina. Outro achado característico é a presença de raízes curtas e finas 2. A displasia dentinária tipo I, por sua vez, caracteriza-se por dentes com coloração usualmente normal, cavidade pulpar obliterada, raízes curtas e cônicas, o que leva à mobilidade dentária e exfoliação prematura. Sua etiologia ainda não está bem elucidada.Na displasia dentinária tipo II (DD-II), as câmaras pulpares apresentam forma de cardo e contêm cálculos pulpares. A coloração da coroa é opalescente em dentes decíduos, similarmente ao verificado na DI, e normal nos permanentes 2. WRIGHT 28 acrescenta que a DI e a DD-II podem ser ocasionadas por mutações nos genes COL1A1 e COL1A2 (colágeno I), o que reforça a importância dos componentes da matriz extracelular na formação das estruturas dentárias.

 

Conclusão

A odontogênese é um fenômeno biológico de complexidade surpreendente, altamente regulado, na qual ocorre a participação de diversas células e moléculas, culminando com a formação dos tecidos dentários e periodontais. Os principais genes envolvidos codificam fatores de transcrição, fatores de crescimento e componentes da matriz extracelular, os quais regulam os eventos deste processo. A compreensão acerca das vias moleculares da odontogênese, bem como da forma pela qual se relacionam, constitui um desafio.

Atualmente, são reconhecidos diversos genes relacionados às ADDs. O estudo de seu funcionamento e interação com fatores ambientais permite um maior entendimento das manifestações associadas aos referidos distúrbios. Dessa forma, torna-se importante a realização de pesquisas que investiguem os eventos e vias moleculares da odontogênese, de modo a contribuir para uma maior compreensão acerca da etiologia das ADDs.

Outro fator que justifica um maior número de pesquisas acerca dos eventos da odontogênese consiste na necessidade de se obter uma maior compreensão acerca dos cistos e tumores odontogênicos - lesões de grande relevância no campo da Patologia Oral. Considerando que tais entidades patológicas recapitulam diversos estágios da odontogênese, estudos acerca deste processo podem elucidar a etiologia e comportamento biológico estas lesões.

 

Referências Bibliográficas

1. BAILLEUL-FORESTIER, I., BERDAL, A., VINCKIER, F. et al. The genetic basis of inherited anomalies of the teeth. Part 2: Syndromes with significant dental involvement. European Journal of Medical Genetics. 2008; 51: 383-408.         [ Links ]

2. BAILLEUL-FORESTIER, I., MOLLA, M., VERLOES, A. et al. The genetic basis of inherited anomalies of the teeth: Part 1: Clinical and molecular aspects of non-syndromic dental disorders. European Journal of Medical Genetics. 2008; 51: 273-91.

3. BARTOLD, P. M., SHI, S., GRONTHOS, S. Stem cells and periodontal regeneration. Periodontol. 2000; 40: 164-72.

4. BATH-BALOGH, M., FEHRENBACH, M. J. Anatomia, histologia e embriologia dos dentes e das estruturas orofaciais. 2. ed. Barueri: Manole; 2008. Cap. 6, Desenvolvimento e erupção do dente; p. 61-91.

5. BEI, M. Molecular genetics of tooth development. Curr. opin. genet. dev. 2009; 19: 504-10.

6. BERKOVITZ, B. K. B., HOLLAND, G. R., MOXHAM, B. J. Anatomia, embriologia e histologia bucal. 3 ed. Porto Alegre: Artmed; 2004. Cap. 21, Desenvolvimento inicial do dente; p. 290-303.

7. BLUTEAU, G., LUDER, H. U., DE BARI, C. et al. Stem cells for tooth engineering. Eur. Cell Mater. 2008; 16: 1-9.

8. BROOK, A. H. Multilevel complex interactions between genetic, epigenetic and environmental factors in the aetiology of anomalies of dental development. Archives of oral biology. 2009; 54s: 3-17.

9. CAMILLERI, S., MCDONALD, F. Runx2 and dental development. Eur. J. Oral Sci. 2006; 114: 361-73.

10. COBOURNE, M. T. The genetic control of early odontogenesis. Br. J. Orthod. 1999; 26 (1): 21-8.

11. FONG, H. K., FOSTER, B. L., POPOWICS, T. E. et al. The crowning achievement: getting to the root of the problem. J. Dent. Educ. 2005; 69 (5): 555-70.

12. GOVORKO, D. K., BECIC, T. VUKOJEVIC, K. et al. Spatial and temporal distribution of Ki-67 proliferation marker, Bcl-2 and Bax proteins in the developing human tooth. Arch Oral Biol. 2010; 55 (12): 1007-16.

13. HAU, G. R., LOPES, C. M. L., BALDANI, M. H. et al. Revisão preliminar sobre a viabilidade de utilização de células-tronco provenientes de dentes humanos decíduos e permanentes na regeneração tecidual. Ci. Biol. Saúde. 2006; 12 (1): 47-55.

14. HUANG, Y., YANG, J., WANG, C. et al. Dental Stem Cells and Tooth Banking for Regenerative Medicine. J. Exp. Clin. Med. 2010; 2 (3): 111-7.

15. KATCHBURIAN, E., ARANA, V. Histologia e embriologia oral. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2004. Cap. 6, Odontogênese; p. 147-75.

16. MATALOVÁ, E., BUCHTOVÁ, M., TUCKER, A. S. et al. Expression and characterization of c-Myb in prenatal odontogenesis. Develop Growth Differ. 2011; 53 (6): 793-803.

17. MORSCZECK, C., SCHMALZ, G., REICHERT, T. E. et al. Somatic stem cells for regenerative dentistry. Clin. Oral Invest. 2008; 12: 113-8.

18. OHSHIMA, H. Overview: Developmental Biology of Hertwig´s Epithelial Root Sheath (HERS) and Tooth Root Formation. J. Oral Biosci. 2008; 50 (3): 147-53.

19. PETERS, H., BALLING, R. Teeth – where and how to make them. Trends Gen. 1999; 15 (2): 59-65.

20. SCHOENWOLF, G. C., BLEYL, S. B., BRAUER, P. R. et al. Larsen: Embriologia humana. 4. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2009. Cap. 7, Desenvolvimento da pele e anexos; p.181-202.

21. SILVA, E. R., ALVES, J. B. A genética da odontogênese. Biosci J. 2008; 24 (2): 113-24.

22. SILVA, E. R., PEREIRA, M. Anomalias dentárias – agenesias e supranumerários – revisão bibliográfica. Biosci J. 2005; 21 (2): 105-13.

23. SLAVKIN, H. C., BARTOLD, P. M. Challenges and potential in tissue engineering. Periodontol. 2006; 41: 9-15.

24. SRISUWAN, T., TILKORN, D. J, WILSON, J. L. et al. Molecular aspects of tissue engineering in the dental field. Periodontol. 2006; 41: 88-108.

25. ULMER, F. L., WINKEL, A., KOHORST, P. et al. Stem Cells – Prospects in Dentistry. Schweiz Monatsschr Zahnmed. 2010; 120 (10): 860-72.

26. YEN, A. H., SHARPE, P. T. Stem cells and tooth tissue engineering. Cell Tissue Res. 2008; 331: 359-72.

27. YU, J., SHI, J., JIN, Y. Current Approaches and Challenges in Making a Bio-Tooth. Tissue Eng. Part B Rev. 2008; 14 (3): 307-19.

28. WRIGHT, T. The Molecular Control of and Clinical Variations in Root Formation. Cells Tissues Organs. 2007; 186: 86-93.

 

 

Endereço para correspondência:
Rodrigo Gadelha Vasconcelos
Avenida Praia dos Búzios, 9067 - Ponta Negra
Natal/RN, Brasil - CEP: 59092-200

e-mail:
rodrigogadelhavasconcelos@yahoo.com.br

 

Recebido em 21/11/2012
Aprovado em 13/12/2012