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Revista Brasileira de Odontologia

versão On-line ISSN 1984-3747versão impressa ISSN 0034-7272

Rev. Bras. Odontol. vol.69 no.2 Rio de Janeiro Jul./Dez. 2012

 

ARTIGO DE REVISÃO

 

Avaliação antimicrobiana dos vapores de para monoclorofenol e tricresol formalina utilizando uma nova metodologia

 

Antimicrobial evaluation of vapors of paramonochlorophenol and tricresol formalin using a new methodology

 

 

Emmanuel J. N. L. SilvaI; Evelyn GoldbergII; Natasha C. C. AjuzIII; Claudio M. FerreiraIV; Tauby S. Coutinho-FilhoV

I Doutor em Clínica Odontológica (Endodontia); Professor de do Curso de Especialização em Endodontia da Uer
II Cirurgiã-Dentista
III Mestre em Endodontia Professora do Curso de Especialização em Endodontia da Uerj
IV Professor do Curso de Especialização em Endodontia da Uerj
IV Doutor em Endodontia; Professor de Endodontia da Uerj

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo do presente estudo foi avaliar o efeito antimicrobiano do Paramonoclorofenol Canforado (PMCFC) e do Tricresol Formalina (TF) frente ao Enterococcus faecalis utilizando uma nova metodologia para simular a volatilização dos compostos. Enterococcus faecalis foram inoculados em placas de Petri com BHI, na qual foram fincados escalpes contendo algodão embebido em PMCFC e TF. Bolinhas de algodão sem medicação foram utilizadas como controle negativo. Após 48 horas de cultivo, foi avaliada a formação de halos de inibição de crescimento bacteriano. Pode-se constatar que o grupo com TF produziu halos de inibição em 100% dos escalpes, enquanto o PMCFC e o controle negativo não produziram halo de inibição. Conclui-se que somente o TF apresentou atividade antimicrobiana por volatilização.

Palavras-chave: Endodontia; medicação intracanal; microbiota endodôntica.


ABSTRACT

The aim of the present study was to evaluate the antimicrobial effects of paramonochlorophenol and tricresol formalin using a new methodology to simulate the volatilization of these substances. Enterococcus faecalis were inoculated em petri dishes with BHI and mm scalps containing cotton balls soaked with the tested substances were stucked in the petri dishes. Cotton balls without medication were used as negative control. After 48 hours the inhibition halo formation was evaluated. The results showed that tricresol formalin group presented inhinition zones in 100% of scalps, while paramochlorophenol and control group produced no inhibition zone. The results suggested that the vapor of formalin tricresol has antibacterial activity; however paramonochlorophenol was unable to exert antibacterial activity from the volatilization of its gases.

Keywords: Endodontics; intracanal dressing; endodontics microbiology.


 

 

Introdução

Os micro-organismos desempenham um papel central no desenvolvimento e progressão das doenças pulpares e periapicais 12, sendo um dos fatores determinantes do fracasso do tratamento endodôntico 9,15,16. A persistência das infecções endodônticas tem sido atribuída a permanência de tais micro-organismos em áreas de difícil acesso, como ístmos, ramificações, reentrâncias, canais laterais, deltas apicais e túbulos dentinários 13,14,17,18. Estes sítios propriciam o abrigo de micro-organismos, ficando protegidos da ação da solução irrigadora e dos instrumentos endodônticos, contribuindo dessa forma para a perpetuação da infecção e gerando um desafio adicional para a completa limpeza e desinfecção dos canais radiculares.

Os medicamentos antimicrobianos utilizados durante o intervalo entre sessões têm mostrado reduzir significantemente o número de micro-organismos, aumentando o número de canais com menor carga bacteriana 6,12. O medicamento mais utilizado atualmente é o hidróxido de cálcio, que possui efeito bactericida por contato, preenche fisicamente o canal radicular e é biocompatível com os tecidos dentários e perirradiculares 7. No entanto, ainda faz parte da realidade endodôntica o uso do paramonoclorofenol canforado e do tricresol formalina, principalmente no atendimento de urgência ou até mesmo como medicação entre sessões. Ambos são utilizados embebidos em bolinhas de algodão dispostas na câmara pulpar. Dessa forma, espera-se que seu efeito seja exercido a distância do local de aplicação, através da volatilização de seus componentes bactericidas. Apesar de seu frequente uso, ainda existem controvérsias acerca da efetividade bactericida desses vapores ao longo de todo o comprimento do canal radicular 11.

Dessa forma, o presente estudo teve como finalidade analisar o efeito antimicrobiano do Paramonoclorofenol Canforado e do Tricresol Formalina frente ao Enterococcus faecalis utilizando uma nova metodologia para simular a volatilização dos compostos.

 

Material e Método

Os materiais analisados foram: Paramonoclorofenol canforado (Biodinâmica ® Química e Farmacêutica Ltda., Ibiporã, PR, Brasil) e Tricresol Formalina (Maquira® Indústria de Produtos Odontológicos Ltda., Maringá, PR, Brasil). Para verificar a ação antimicrobiana da volatilização dos compostos, utilizaram-se amostras do micro-organismo Enterococcus faecalis (ATCC 19433). As cepas foram semeadas em caldo BHI (Brain Heart Infusion, Difco) e incubadas a 37ºC por 24 horas. Após o período de incubação, fez-se padronização da cultura na turbidez 1.0 da escala de McFarland em um novo tubo contendo 5mL de caldo BHI estéril, para utilização como teste inóculo. As placas de Petri com ágar Mueller-Hinton foram então inoculadas com a suspensão microbiana, com o auxílio de um swab estéril.

Para simulação das raízes dentárias, foram utilizados escalpes estéreis 25G (Lamedid®, Barueri, SP, Brasil), que foram cortados em pedaços com 10mm. Em seguida, foi marcado, a distância de 2 mm da ponta de cada escalpe, para padronização do posicionamento das bolinhas de algodão contendo a medicação. Foram preparadas 10 bolinhas de algodão para cada grupo, de modo que tivessem aproximadamente o mesmo tamanho. Estas seriam medicadas com paramonoclorofenol canforado, com tricresol formalina e para o controle negativo as bolinhas não receberiam medicação. Uma gota de cada medicação foi pingada na bolinha de algodão e o excesso do medicamento foi removido apertando a bolinha de algodão contra gazes estéreis. As bolinhas foram então posicionadas no interior do escalpe e os mesmos foram vedados na extremidade superior com cimento à base de óxido de zinco e sulfato de zinco (Coltosol®, Vigodent S.A. Indústria e Comércio, Rio de Janeiro, RJ, Brasil), para simular o vedamento temporário que é realizado entre sessões de um tratamento endodôntico. Após o vedamento, os escalpes foram posicionados nas placas de petri e as mesmas mantidas em uma estufa a 37ºC por 24 h (Figura 1).

 

 

 

Resultados

Utilizando a metodologia para simular a volatização dos compostos, apenas o tricresol formalina foi capaz de produzir um halo de inibição (8,7 ± 2,5 mm). Não houve inibição nem no grupo do paramonoclorofenol canforado nem no grupo controle.

 

Discussão

Apesar de o paramonoclorofenol canforado e o tricresol formalina serem usados na Endodontia desde o início do século XX e, desde essa época, tem sido realizadas inúmeras pesquisas científicas em relação a esses medicamentos, ainda hoje, continua controversa a questão da efetividade antibacteriana dos vapores liberados por eles 2,3,8,11. O objetivo do presente estudo foi avaliar o efeito antimicrobiano do Paramonoclorofenol Canforado e do Tricresol Formalina frente ao Enterococcus faecalis utilizando uma nova metodologia para simular a volatilização dos compostos.

Neste estudo, optou-se por utilizar placas de Petri com escalpes de 10 mm, no qual o algodão com o medicamento seria colocado na região superior do escalpe e o mesmo seria vedado, simulando uma restauração temporária. Dessa forma pode-se determinar a efetividade dos vapores dos medicamentos após a sua difusão pelo escalpe, simulando o que aconteceria clinicamente. Esta metodologia difere- -se de metodologias utilizadas anteriormente, já que não realiza um contato direto entre o medicamento e as colonias bacterianas e simula com maior reprodutibilidade o conduto radicular.

A escolha do Enterococcus faecalis, para o presente estudo, foi baseada em evidências científicas que mostram este micro-organismos como o mais prevalente nos casos de fracaso do tratamento endodôntico 1,4,5. Além disso, o Enterococcus Faecalis apresenta considerável resistência a substâncias químicas auxiliares e medicações utilizadas em Endodontia e é um micro-organismo relativamente fácil de ser cultivado e de alta relevância clínica 4,5.

Os resultados do presente estudo demonstraram haver inibição do crescimento bacteriano em torno dos escalpes medicados com tricresol formalina. Tanto o paramonoclorofenol canforado quanto o controle negativo, não promoveram nenhum halo de inibição. Estes resultados confirmam achados prévios de que o paramoclorofenol canforado não é capaz de atingir os terços médio e apical do sistema de canais radiculares 1 e de que o formocresol é mais eficaz que o paramonoclorofenol canforado mesmo em contato direto 2,3,7,8,11. A maior difusibilidade do tricresol formalina pode estar associada a sua ação a distância, através da liberação de gases. Por outro lado, o paramonoclorofenol canforado só atua por contato direto, não possuindo ação a distância, explicando dessa forma a ausência dos halos de inibição 10.

 

Conclusão

Baseado na metodologia aplicada e nos resultados obtidos, pode-se concluir que o tricresol formalina se mostrou eficaz para exercer efeito antimicrobiano à distância. Com relação ao paramonoclorofenol canforado, os resultados não puderam constatar a ação antimicrobiana esperada. Dessa forma, o presente trabalho espera contribuir para que profissionais conduzam seus tratamentos avaliando criteriosamente os materiais utilizados como curativo de demora.

 

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Endereço para correspondência:
Emmanuel J. N. L. Silva
Rua Herotides de Oliveira, 61/902 – Icaraí
Niterói/RJ, Brasil – CEP: 24230-230

e-mail:
nogueiraemmanuel@hotmail.com

 

Recebido em 14/11/2012
Aprovado em 30/11/2012