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Revista Brasileira de Odontologia

versão On-line ISSN 1984-3747versão impressa ISSN 0034-7272

Rev. Bras. Odontol. vol.70 no.2 Rio de Janeiro Jul./Dez. 2013

 

ARTIGO DE REVISÃO

 

Cimentação em cerâmicas: evolução dos procedimentos convencionais e adesivos

 

Cementation in ceramics: improvement of conventional and adhesive procedures

 

 

Lucia Regina Namoratto I; Reinaldo de Souza Ferreira II; Raimundo Alexandre Vidigal Lacerda III; Hélio Rodrigues Sampaio Filho IV; Fernanda Pitta Ritto V

I Especialista em Prótese Dentária pela Odontoclínica Central da Marinha (OCM)
II Doutorando em Dentística pela FO/Uerj. Professor do Curso de Especialização em Dentística da OCM
III Doutorando em Dentística pela FO/Uerj. Professor de Dentística e Materiais Dentários da Faculdade São José
IV Professor Adjunto de Dentística e Materiais Dentários da FO/Uerj
V Doutoranda em Dentística pela FO/Uerj. Professora do Curso de Especialização em Dentística da OCM

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo deste estudo foi coletar dados científicos para revisão de literatura sobre cimentação de cerâmicas, ressaltando propriedades, técnicas, indicações e contraindicações. O agente cimentante ideal deve apresentar como principais características alta resistência à compressão, tração e cisalhamento, além de selamento marginal adequado, baixa solubilidade aos fluidos bucais e espessura mínima de película. Em relação à técnica, foi observado que diferenças na microestrutura e composição dos sistemas cerâmicos exigem protocolos específicos de preparo da peça cerâmica e da superfície dentária. Atualmente, os tipos de agentes cimentantes disponíveis são: fosfato de zinco, ionômero de vidro convencional e modificado por resina, cimentos resinosos e autoadesivos. A evolução desses materiais ocorre no sentido de melhorar propriedades e simplificar a técnica.

Palavras-chave: cimentos dentários; cimentação; porcelana dentária.


ABSTRACT

The objective of the study was to collect scientific data to perform a literature review of ceramic cementation, highlighting their properties, techniques, indications and contraindications. An ideal luting agent has to present as main characteristics high compressive strength, tensile and shear, adequate marginal sealing, low solubility to oral fluids and minimal thickness of film. Concerning the technique, it was observed that differences on microstructure and composition on ceramic systems require specific protocols on preparation for the ceramic structure and for the dental element surface. Nowadays, the available luting agents are: zinc phosphate, conventional and modified glass ionomer, resin cements and self adhesive cements. The evolution of these materials occurs to improve properties and to simplify technique.

Keywords: dental cement; luting; dental porcelain.


 

 

Introdução

Com a evolução tecnológica e a constante busca pelos pacientes por uma Odontologia de restaurações "invisíveis", muitos materiais têm sido desenvolvidos no sentido de unir qualidades biomecânicas e estéticas, possibilitando a confecção de restaurações livres de metal. Assim, materiais estéticos como a cerâmica estão sendo cada vez mais utilizados em reabilitações dentárias, no sentido de promoverem um resultado final mais satisfatório e natural (20).

Antigamente, a retenção de uma restauração dependia somente da forma geométrica do preparo, da precisão da adaptação da restauração e da resistência do cimento. Hoje em dia, essa retenção pode ser ampliada se o agente cimentante apresentar união química às estruturas dentárias e à superfície da restauração ou até mesmo desprezada, no caso das cerâmicas, com a utilização de cimentos adesivos com preparos arredondados e expulsivos (30).

As restaurações indiretas sejam elas parciais ou totais, confeccionadas com cerâmicas ou ligas metálicas, dependem de certos artifícios para uma fixação segura sobre o dente preparado. Além da retenção, o vedamento das margens faz-se necessário para que não haja recidiva de lesões de cárie e danos à polpa. Tais restaurações podem ser fixadas sobre os dentes preparados utilizando-se cimentos capazes de promoverem união mecânica, micromecânica, química ou a combinação desses (30,32).

Além da evolução no campo das cimentações, o material cerâmica propriamente dito utilizado em Odontologia também se desenvolveu. Atualmente, diversos tipos de cerâmicas estão disponíveis para serem utilizados. Como exemplo, podem-se citar as cerâmicas reforçadas por: alumina, zircônia, leucita, dissilicato de lítio, entre outras (3,20).

No entanto, com essa evolução paralela de cimentos e materiais restauradores, houve uma modificação de todo o procedimento clínico, desde o preparo dental até a preparação da peça. Devido a isso e também à imensa disponibilidade de tipos e marcas de agentes cimentantes, muitos profissionais apresentaram dificuldades em seguir um correto protocolo de cimentação.

Assim, esta revisão de literatura tem como objetivo principal mostrar a evolução dos procedimentos em cimentação de restaurações cerâmicas, além de elucidar os protocolos atuais que podem ser utilizados.

 

Revisão de Literatura

Histórico

A cerâmica, cuja denominação vinda do grego Keramike significa a arte do oleiro, é descrita como material inorgânico não metálico, fabricado a partir de matérias primas naturais, cuja composição básica é a argila, feldspato, sílica, caulim, quartzo, filito, talco, calcita, dolomita, magnesita, cromita, bauxita, grafita e zirconita. Foi utilizada como material odontológico em 1774, na França, pelo químico Alex Duchateou e pelo dentista Nicholas Dubois, com sucesso. Atualmente, com o domínio tecnológico da fabricação de cerâmica associadas a potentes e controlados fornos de queima, as cerâmicas dentais apresentam características físicas e mecânicas excelentes, representando, dentre os materiais dentários com finalidade restauradora, a melhor opção na busca de uma cópia fiel dos elementos dentários (36).

O sucesso clínico de reabilitação protética com cerâmica livre de metal depende de muitos fatores, incluindo o processo de cimentação. A cimentação é uma etapa fundamental no protocolo clínico das restaurações indiretas. Esse procedimento vem sendo modificado e aprimorado com o surgimento de novos tipos de cimentos (26).

Um agente cimentante pode ser considerado ideal se ele apresenta características como insolubilidade no meio bucal, isolante térmico, elétrico e mecânico, bom selamento marginal, biocompatibilidade, alta resistência à compressão e à tração, pequena espessura de película, adesão às estruturas dentais e aos materiais restauradores, entre outras características (8).

Os primeiros agentes cimentantes utilizados em cerâmicas eram o cimento de fosfato de zinco e o cimento de ionômero de vidro. No entanto, algumas características destes materiais levavam ao insucesso de determinados procedimentos por falhas estéticas, deslocamento da peça protética ou infiltrações marginais (33).

Com o surgimento da Odontologia adesiva, o paradigma das cimentações cerâmicas mudou, trazendo novos tipos de preparo, novas técnicas e materiais para cimentação. Assim, surgiram os cimentos resinosos, os quais apresentam uma composição bem semelhante à da resina composta, constituindo- se de matriz orgânica e cargas. Esses materiais possuem características adesivas e estéticas, resistência mecânica e são insolúveis em água. No entanto, trazem uma técnica mais detalhada com tratamento da superfície cerâmica e do substrato dentário (36).

Atualmente, a busca por uma Odontologia adesiva mais simplificada, trouxe o desenvolvimento de um novo tipo de cimento resinoso, o chamado cimento autoadesivo. Este material foi projetado com intenção de superar algumas limitações dos cimentos convencionais (cimentos de fosfato de zinco, policarboxilato, e ionômero de vidro) e dos cimentos resinosos, bem como reunir em um único produto características favoráveis de diferentes cimentos. A sensibilidade da técnica adesiva foi também simplificada com a aplicação do cimento, em um único passo, eliminando a aplicação prévia de um agente adesivo ou outro pré-tratamento ao dente.

Agentes Cimentantes

Cimento de Fosfato de Zinco

O cimento de fosfato de zinco tem sido utilizado na Odontologia por mais de um século, assim, é o agente cimentante mais antigo em uso, introduzido em 1800 e com longa história de sucesso clínico para próteses metálicas, métalo-cerâmicas e cerâmicas (19).

É obtido através de uma reação ácido-base iniciada através da mistura do pó (composto por 90% de óxido de zinco e 10% de óxido de magnésio) com o líquido, que consiste, aproximadamente, de 67% de ácido fosfórico tamponado com alumínio e zinco. Fixa as restaurações indiretas às estruturas dentárias por meio de retenção mecânica através das irregularidades da superfície dentária e da fundição (30).

É um dos cimentos mais utilizados na cimentação de coroas, visto que apresenta baixo custo, facilidade de trabalho, boas propriedades mecânicas e ainda apresenta uma pequena espessura de película, devido ao seu bom escoamento, o que favorece o assentamento final da prótese e limita o metabolismo de bactérias cariogênicas (13,24).

No entanto, o cimento de fosfato de zinco apresenta algumas limitações como: falta de adesão à estrutura dentária e alta solubilidade, aumentando a possibilidade de ocorrer infiltração marginal e também de causar irritação pulpar e sensibilidade pós-operatória devido ao seu pH ácido (4,25,27).

Este tipo de cimento é utilizado até os dias de hoje, principalmente por sua comprovação científica e seu baixo custo. Ele pode ser empregado na cimentação de próteses unitárias ou parciais fixas com metal, retentores intrarradiculares e alguns autores também indicam a sua utilização em restaurações cerâmicas do Sistema In-Ceram e Empress 2.

Cimento de Ionômero de Vidro (CIV) Cimento de Ionômero de Vidro Convencional

O cimento de ionômero de vidro foi introduzido em 1971 por WILSON & KENT. Este material é resultado de uma reação ácido-base decorrente da mistura (aglutinação) da porção líquida, composta de copolímeros do ácido polialcenóico com o pó, que contém partículas vítreas de fluorsilicato de alumínio. Possui adesão às estruturas dentárias pela formação de ligações iônicas na interface dente-cimento, como resultado da quelação dos grupos carboxila do ácido com os íons cálcio e/ou fosfato na apatita de esmalte e dentina. Possui baixa solubilidade, melhor compatibilidade biológica se comparado ao fosfato de zinco e, além disso, libera flúor. Contudo, um controle efetivo durante sua presa inicial é bastante necessário, pois se exposto à umidade e saliva neste momento, o mesmo pode apresentar alta solubilidade e degradação marginal (23).

Alguns autores, após testarem a resistência à tração de núcleos metálicos fundidos cimentados, com e sem condicionamento ácido da dentina (ácido fosfórico a 30% por 1 minuto), concluíram que o condicionamento aumenta a resistência à tração do cimento de ionômero de vidro (29).

Por outro lado, como medida de proteção pulpar, ANUSAVICE (5) recomenda que não se remova a smear layer previamente à cimentação com compostos ionoméricos para que a mesma possa agir como uma barreira à penetração dos componentes ácidos do cimento através dos túbulos dentinários.

O cimento de ionômero de vidro convencional está indicado para cimentação final de retentores intrarradiculares, coroas e próteses parciais fixas com metal e sem metal tipo Procera, In-Ceram e Empress2.

Cimento de Ionômero de Vidro Modificado por Resina

Este grupo de materiais foi desenvolvido para melhorar o desempenho clínico dos cimentos de ionômeros pela incorporação de uma matriz resinosa na sua composição. A adição de ácido poliacrílico e de hidroximetilmetracrilato (HEA) proporciona-lhe uma porção resinosa com características de adesivo hidrofílico, ativado pela luz e outra ionomérica, que sofre reação química tipo ácido-base (4).

A maior vantagem deste tipo de cimento é a facilidade de manipulação e uso, além de sua adequada espessura de película, possuindo resistência tensional diametral e compressiva superiores ao fosfato de zinco e alguns ionômeros convencionais. O seu uso está indicado para coroas e próteses parciais fixas em cerômeros Targis/Vectris ou cerâmica Empress 2, In-Ceram em geral e Procera. Contudo, sua utilização para cimentação de restaurações totalmente cerâmicas do tipo Feldspática é desaconselhada, pois sua expansão tardia poderia causar fraturas nas mesmas (9).

Cimentos Resinosos (CR)

Existe atualmente uma grande variedade de cimentos resinosos disponíveis no mercado, que podem ser utilizados na fixação de brackets, na cimentação de próteses adesivas e na cimentação de restaurações de cerâmicas indiretas. A polimerização pode ser realizada pela indução peróxido-amina ou por fotoativação. Vários sistemas utilizam os dois mecanismos e são chamados de dupla polimerização ou duais. Este tipo de cimento é insolúvel aos fluídos bucais e o limite de fratura é maior quando comparado com os outros cimentos. No entanto, como todo material resinoso, este cimento pode causar irritação ao tecido pulpar (4,21).

A composição da maioria dos cimentos resinosos é semelhante à das resinas compostas para restauração (matriz resinosa com cargas inorgânicas tratadas com silano). Entretanto, diferem dos mesmos, sobretudo pelo menor conteúdo de carga e pela menor viscosidade. Os monômeros com grupos funcionais que têm sido usados para induzir adesão à dentina são incorporados a estes cimentos. Eles incluem os sistemas organofosfonatos, hidroximetilmetacrilato, e do 4- metacrietil trimetílico anidrido (4- META) (4,22).

As principais vantagens destes cimentos são: adesão às estruturas metálicas, resinosas e de porcelana, baixa solubilidade, grande resistência a tensões e possibilidade de seleção da cor do agente cimentante. A estabilidade de cor dos cimentos resinosos é outro fator importante. No entanto, apresentam algumas desvantagens relativas como alto custo, sensibilidade de técnica, necessidade de isolamento absoluto durante a cimentação e dificuldade de remoção dos excessos principalmente nas áreas proximais. O cimento resinoso apresenta uma técnica sensível devido a seus inúmeros passos de tratamento de superfície dentária e peça protética. Além disso, esse tipo de cimentação sofre diminuição de suas propriedades adesivas quando há presença de cimento endodôntico à base de óxido de zinco e eugenol, podendo interferir na adesão. Este material também apresenta uma característica de maior radiopacidade, se comparado aos cimentos convencionais (1).

Os cimentos resinosos químicos e de cura dual são indicados para cimentação final de próteses unitárias e parciais fixas com ou sem estruturas metálicas, próteses parciais fixas adesivas indiretas e retentores intrarradiculares. Já os cimentos resinosos fotoativados são deficientes na polimerização em cimentação de peças protéticas espessas e opacas, não permitindo a formação de cimento mecanicamente resistente e com boa adesão. Estes são indicados, principalmente, na cimentação de facetas laminadas cerâmicas, por se tratarem de peças de pouca espessura, permitindo passagem de luz e polimerização efetiva do agente cimentante (15).

Cimentos Autoadesivos

Os cimentos autoadesivos foram introduzidos em 2002 como um novo subgrupo de cimentos resinosos (ex.: RelyX Unicem, 3M, St Paul, MN, USA) e ganharam popularidade rapidamente, com mais de uma dezena de marcas disponíveis no mercado. Têm sido indicados para união com vários substratos como esmalte, dentina, amálgama, metal e porcelana. Adicionalmente, têm sido indicados para serem utilizados para cimentação de restauração à base de zircônia. Estes materiais foram projetados com intenção de superar algumas limitações dos cimentos convencionais (cimento de fosfato de zinco, policaboxilato e ionômero de vidro) e dos cimentos resinosos, bem como reunir em único produto características favoráveis de diferentes cimentos (28).

A sensibilidade da técnica adesiva foi também resolvida pela simples aplicação do cimento em um único passo, eliminando a aplicação prévia de um agente adesivo ou outro pré-tratamento ao dente (12). De acordo com informações dos fabricantes de tais materiais, como a smear layer não é removida, nenhuma sensibilidade pós-operatória é esperada. Adicionalmente, moderada a baixa resposta inflamatória pulpar e liberação de íons fluoretos são observados (11). Dentre as propriedades dos cimentos autoadesivos pode-se citar boa estética, propriedades mecânicas adequadas, estabilidade dimensional e adesão micromecânica semelhante aos cimentos resinosos (12).

Assim, com base em todas essas características, os cimentos autoadesivos vêm demonstrando ser boa opção de material para cimentação de pinos e restaurações diretas em dentina. Além disso, o tipo de cimentação de apenas um passo, proposta para esse tipo de cimento é muito interessante e pioneira, trazendo a vantagem de diminuição do tempo clínico e simplificação de técnica, o que reduz a probabilidade de erros. No entanto, tornam-se necessárias maiores avaliações longitudinais para consolidação desse material e técnica (31).

Preparos das Superfícies Dentárias

Independente do material a ser utilizado na cimentação de próteses indiretas tem-se como protocolo a limpeza do preparo, no sentido de eliminar detritos macro ou microscópicos agregados às paredes dentárias (30).

A indicação do agente de tratamento da superfície dentária dependerá do agente cimentante empregado. Na cimentação com o fosfato de zinco, o tratamento da superfície dentária poderá ser feito com agentes que removam os detritos pela força de irrigação ou por meio de esfregaço, tais como: água oxigenada a 3%, hipoclorito de sódio (a 0,5%-Dakin,ou Milton-1%), soluções à base de clorexidina, detergentes aniônicos (Tergentol) ou soluções à base de hidróxido de cálcio (2).

Para cimentação com ionômero de vidro convencional, aconselha-se um pré-tratamento da dentina, com um agente condicionador específico (ácido poliacrílico a 10%), para aumentar sua adesão à estrutura dentária. O ionômero de vidro modificado por resina exige pré-tratamento da superfície dentária e utilização de adesivo dentinário, enquanto que os outros dispensam este procedimento (8).

Os cimentos resinosos requerem que o remanescente dentário seja condicionado com ácido ortofosfórico de 32 a 36% por 15 segundos para proporcionar retenções micromecânicas no esmalte e formar a camada híbrida na dentina, com posterior aplicação do sistema adesivo (9). Os autores recomendam tempo máximo de condicionamento de 30 segundos para esmalte e 15 segundos para dentina, seguido de lavagem e secagem com cuidado para não desidratar as estruturas dentárias (14).

Preparo da Superfície Interna das Restaurações

Existe uma variedade de tipos de tratamentos de superfície que podem ser realizadas previamente à cimentação do trabalho protético, como: o condicionamento da superfície da restauração com ácido hidrofluorídrico, rugosidades micromecânicas induzidas pela broca, jateamento com óxido de alumínio, jateamento com óxido de sílica, adesivos dentinários ou a combinação desses fatores. Adiante, serão descritos os tratamentos de superfície para cada material restaurador indireto (16,35).

Superfícies Metálicas

Na cimentação de peças metálicas, deve-se realizar o jateamento com óxido de alumínio. Os cimentos de fosfato de zinco e ionômero de vidro têm sua capacidade de embricamento aumentada quando se prepara a superfície interna da restauração metálica através de um jateamento com pó de óxido de alumínio por 4 a 6 segundos, com consequente remoção de detritos e criação de microrretenções (17).

No caso de metais nobres, deve-se realizar eletrodeposição de íons de estanho (estanização), para que haja o processo de oxidação superficial (17).

Superfícies Cerâmicas

O tratamento destas superfícies está na dependência do tipo específico de cerâmica que for aplicada na superfície interna da peça protética (casquete), especificamente o conteúdo de sílica dessa cerâmica. Para as cerâmicas com sílica, os tratamentos como jateamento, aplicação de ácido fluorídrico a 10% (tempo variável de acordo com o material), seguido de aplicação de silano (no mínimo 3 minutos), são capazes de produzir bons resultados. Para as cerâmicas que não possuem sílica, o tratamento da peça indicado é a silicatização (6,30,34).

A aplicação do ácido fluorídrico a 10% deve ser de no mínimo 3 minutos para as cerâmicas feldspáticas (ex.: Biodent, CeramcoII, Noriatake), de 1 a 3 minutos para as cerâmicas feldspáticas reforçadas por cristais de leucita (Optec HSP, Duceram LFC, IPS Empress) e de 20 segundos para as cerâmicas de dissilicato de lítio (IPS Empress2) (30).

Para os sistemas cerâmicos com baixo teor de sílica, o condicionamento com ácido fluorídrico não é indicado, sendo usual a cimentação deste trabalho com cimentos convencionais, como o fosfato de zinco ou o ionômero de vidro. Para uma adequada adesão aos cimentos resinosos, como foi dito anteriormente, será necessário realizar um aumento do conteúdo de sílica na camada superficial do material, através da silicatização com o uso de sistemas como Rocatec e Silicoater (33).

 

Discussão

Atualmente, existe no mercado uma vasta gama de materiais aptos a promover a cimentação. Os materiais cimentantes, como já mencionados, podem ser divididos em cinco classes principais: cimento de fosfato de zinco, cimento de ionômero de vidro, cimento de ionômero de vidro modificado por resina, cimentos resinosos e cimentos autoadesivos. Ainda há dificuldade para se determinar a correta escolha clínica de um material cimentante. Além disso, cada classe requer cuidados e técnicas específicas, muitas vezes sensíveis e detalhadas para sua utilização (7).

Alguns autores ressaltam a importância de um correto planejamento e de preparos adequados para que se obtenha sucesso no emprego de restaurações indiretas (8).

A estética deve ser levada em consideração na escolha do agente cimentante, pois este não deve interferir nas propriedades ópticas demonstradas pelos materiais restauradores cerâmicos e polímeros de vidro. A estabilidade de cor dos cimentos resinosos é outro fator importante e, por esta razão, muitos profissionais preferem o uso de sistemas de cimentação fotopolimerizáveis para facetas laminadas e coroas puras em dentes anteriores, exatamente por essa maior estabilidade de cor. Por outro lado, os cimentos convencionais são limitados no que se refere à seleção criteriosa de cor e à transmissão de luz, devido a sua opacidade, ficando seu uso limitado às restaurações que não sofrem influência da cor do agente cimentante (16).

WHITE et al. (38) relataram que o sucesso histórico do cimento de fosfato de zinco pode resultar de propriedades ainda pouco pesquisadas, como a atividade antimicrobiana. A presa do cimento de fosfato de zinco não envolve qualquer reação com o tecido mineralizado circundante ou outros materiais restauradores. Portanto, a adesão principal ocorre pelo embricamento mecânico nas interfaces e não por meio de interações químicas. Assim, qualquer cobertura aplicada sobre a estrutura dentária para proteção pulpar reduzirá a retenção (27).

Outros fatores que poderão auxiliar na escolha do agente cimentante são os relacionados ao caso clínico propriamente dito. FIGUEIREDO et al. (13) afirmam que os cimentos resinosos, em virtude da sua alta adesividade e resistência ao deslocamento da restauração, podem ser muito úteis quando o desenho geométrico dos preparos não são capazes de proporcionar retenção e estabilidade adequada. Em contrapartida, os cimentos convencionais mostram-se mais dependentes da biomecânica do preparo (4).

Outras variáveis, referentes à técnica de cimentação, tais como o tratamento de superfície dentária e da restauração protética também são consideradas na escolha do agente cimentante. A cimentação convencional, além de requerer um tratamento da superfície dentária mais simples do que para a cimentação adesiva, exige menos passos operatórios, apresentando menor sensibilidade de técnica. Assim, o tratamento das superfícies das restaurações para os cimentos convencionais é menos complexo, com menores variações, consistindo basicamente no jateamento interno e rugosidades induzidas por brocas. Por outro lado, quando o agente cimentante é resinoso, o protocolo de tratamento da superfície da restauração é mais minucioso, exigindo um cuidado maior por parte do profissional, além do domínio das propriedades adesivas dos materiais (37).

De acordo com BLATZ (7), os sistemas cerâmicos podem ser classificados em dois grupos: sistemas condicionáveis e não condicionáveis. Os sistemas condicionáveis compreendem os sistemas passíveis de serem condicionados por ácidos. Como a sílica é a única substância condicionável presente nas cerâmicas, faz parte desse grupo os sistemas cuja composição é baseada principalmente em sílica, com as porcelanas feldspáticas e as cerâmicas vítreas (ex.: IPS Empress, IPS Empress 2, ProCAD, Finesse) (38). Os sistemas não condicionáveis, por sua vez, compreendem os sistemas cuja composição não é baseada em sílica e, consequentemente, não são passíveis de serem condicionados por ácidos. Fazem parte desse grupo os sistemas cerâmicos reforçados, cuja composição é baseada principalmente em óxidos de alumínio e zircônio. Esses sistemas permitem fixação por métodos convencionais de cimentação, porém podemos usar a cimentação adesiva, onde a retenção do preparo esteja comprometida através da técnica de silicatização (ex.: In-Ceram Alumina, In-Zirconia, Procera) (33).

Atualmente, com o intuito de simplificação de técnica, surgiram com bastante força no mercado odontológico os cimentos resinosos autoadesivos. Estes materiais estão sendo considerados materiais promissores, já que são capazes de promover uma cimentação adesiva através de um procedimento clínico bastante simplificado, dispensando os procedimentos no remanescente dental e na peça protética, facilitando, assim, a sua utilização. Em contrapartida, ainda apresenta-se alto o custo desta classe de cimento, além da presença de poucos estudos clínicos longitudinais mostrando a eficácia de sua adesão ao longo do tempo (2).

Assim, considerando apenas o tipo de cimento, ainda hoje, não se pode dizer que há um cimento ideal, ou seja, que possua todas as características ótimas necessárias a este tipo de material (preencher a interface entre dente e restauração, retenção, resistência, vedamento marginal; insolúvel ao meio bucal; ser radiopaco, ter boas propriedades ópticas e comprovação clínica longitudinal).

Devido a isso, para a escolha do agente cimentante, torna-se necessário avaliar o planejamento como um todo, levando em consideração necessidade estética, necessidade de retenção e resistência, tipo de remanescente dental, preparo do profissional para realização de técnicas adesivas mais sensíveis e até viabilidade financeira no uso dos materiais para o tratamento do paciente (18).

 

Conclusão

Os cimentos convencionais, fosfato de zinco e ionômero de vidro ainda são utilizados em cimentações cerâmicas, principalmente em elementos posteriores por não requerer estética. Além disso, apresentam técnica simplificada se comparado à técnica adesiva dos cimentos resinosos.

Os cimentos resinosos, juntamente com a cimentação adesiva, trouxeram uma nova técnica de cimentação, provendo resultados mais estéticos e de alta resistência adesiva, sendo utilizados principalmente em cimentações cerâmicas de elementos anteriores. Porém, sua técnica detalhada limita a sua utilização e sucesso de resultado.

Os cimentos autoadesivos vêm demonstrando ser boa opção de material para cimentação de pinos e restaurações indiretas em dentina por possuírem boa resistência mecânica, comparável a dos cimentos resinosos convencionais, podendo esta estar relacionada à sua capacidade de baixa absorção de água. A sua técnica de cimentação, com apenas um passo, reduz a sensibilidade técnica dos procedimentos adesivos e, também, o tempo clínico.

 

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Endereço para correspondência:
Lucia Regina Namoratto
Rua Barão de Ladário, s/n. Complexo do Primeiro Distrito Naval. Centro/Odontoclínica Central da Marinha
Rio de Janeiro/RJ, Brasil - CEP: 20091-000

e-mail:
lucianamoratto@yahoo.com.br

 

Recebido em 02/05/2013
Aprovado em 31/05/2013