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Revista Brasileira de Odontologia

versão On-line ISSN 1984-3747versão impressa ISSN 0034-7272

Rev. Bras. Odontol. vol.70 no.2 Rio de Janeiro Jul./Dez. 2013

 

RELATO DE CASO CLÍNICO

 

Apicificação com plug apical de MTA em dente traumatizado

 

Apexification with MTA apical plug in traumatized tooth

 

 

Katherynn Crespi Niedermaier I; Danilo Mathias Zanello Guerisoli II

I Mestranda em Odontologia pela UFMS
II Professor Doutor de Endodontia da FO/UFMS

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O tratamento de dentes jovens traumatizados requer atenção especial devido à presença de ápice aberto e paredes dentinárias finas, inviabilizando um tratamento endodôntico convencional. Para tanto, é necessária a realização de um procedimento para induzir a formação de uma barreira mineralizada com o auxílio de materiais biocompatíveis, como o hidróxido de cálcio e o agregado trióxido mineral (MTA). O objetivo deste trabalho é relatar um caso clínico no qual se optou por realizar a apicificação com hidróxido de cálcio, durante dez meses, e após confirmação da existência de uma barreira, realizou-se a obturação com plug apical de MTA e guta percha. A apicificação é uma técnica que apresenta alto índice de sucesso, sendo assim consagrada para o processo de rizogênese incompleta.

Palavras-chave: apicificação; agregado trióxido mineral; hidróxido de cálcio.


ABSTRACT

The treatment of traumatized young teeth requires special attention due to the presence of open apex and thin dentine walls, preventing conventional endodontic treatment. Therefore, it is necessary perform a procedure to induce formation of mineralized barrier with the aid of a biocompatible materials such as calcium hydroxide and mineral trioxide aggregate (MTA). The aim of this study is report a case wich it was decided to perform apexification with calcium hydroxide for ten months, and after confirmation of the existence a barrier, held filling with apical plug of MTA and gutta percha. The apexification is a technique of high success rate, so devoted to the process of incomplete root formation.

Keywords: apexification; mineral trioxide aggregate; calcium hydroxide.


 

 

Introdução

Quando um dente jovem em processo de apicigênese sofre um trauma, a formação de dentina é interrompida, levando a casos que, quando não tratados, permanecem com o ápice aberto. Nestes casos, o dente sofre necrose pulpar e o tratamento endodôntico fica dificultado devido à anatomia do canal radicular (6). O traumatismo dentário é a causa mais frequente de necrose em dente anterior permanente imaturo.

Sabe-se que para o tratamento endodôntico destes dentes, com ápice aberto, faz-se necessário o processo de apicificação, pois a estimulação do desenvolvimento radicular oferece condições para uma adequada obturação do canal radicular (4,18). A apicificação é um procedimento de indução do fechamento apical, no qual é introduzido um material biocompatível no terço apical do canal com o intuito de induzir formação de tecido mineralizado, ou seja, criar uma barreira e induzir o fechamento do forame apical, evitando assim o extravasamento de guta percha da obturação para os tecidos periapicais e osso (9). O procedimento requer o preparo químico-mecânico do canal, seguido pela inserção de uma medicação intracanal, para estimular a formação de uma barreira apical mineralizada, que pode demorar alguns meses (12).

O hidróxido de cálcio tem sido o material de escolha para a apicificação e seu uso se tornou padrão, pois é um material de baixo custo, de fácil manuseio e tem demonstrado grande sucesso tornando-se uma boa alternativa aos procedimentos cirúrgicos (7). Este material exerce um papel de extrema importância na terapia do complexo dentinopulpar e periodonto apical, em virtude de suas propriedades peculiares, como ação antibacteriana e capacidade de formar tecido mineralizado (16).

Outros materiais vêm sendo utilizados para o processo de apicificação, assim como o agregado trióxido mineral (MTA) em vários estudos clínicos (1). O plug apical de MTA pode resultar em uma melhor barreira apical de tecido duro e satisfatórias propriedades de selamento, garantindo com segurança o fechamento do ápice (2), pois como já comprovado em outros estudos, o MTA apresenta excelente biocompatibilidade, boa capacidade de selamento (11), capacidade de induzir formação de células e formar efetiva barreira mineralizada (5).

O uso do MTA como osteocondutor de barreira artificial apical no processo de apicificação torna-se cada vez mais comum e indicado, com sucesso clínico em humanos, visando à conclusão mais rápida do tratamento endodôntico (14). Sendo assim, o objetivo do presente estudo é apresentar um caso clínico no qual, por meio da técnica de apicificação com hidróxido de cálcio e plug apical de MTA, obteve-se sucesso no tratamento de um dente com rizogênese incompleta e necrose pulpar.

 

Relato de Caso Clínico

Paciente do sexo feminino G. S. S., 9 anos, compareceu à Clínica de Odontologia da Associação Brasileira de Odontologia-MS (ABO-MS), em novembro de 2010, para tratamento endodôntico do dente 11, o qual apresentava-se mais escuro que os outros dentes, devido a um trauma no ano anterior.

Foram realizados, na primeira sessão, o exame clínico e os testes de vitalidade pulpar, indicando necrose pulpar. O exame radiográfico digital evi- Apexification with MTA apical plug in traumatized tooth Rev. bras. odontol., Rio de Janeiro, v. 70, n. 2, p. 213-5, jul./dez. 2013 RELATO DE CASO CLÍNICO Revista Brasileira de Odontologia 214 denciou que o dente apresentava rizogênese incompleta, lesão periapical, paredes radiculares divergentes e raiz menor que a do dente 21 (Figura 1). Na mesma sessão foi realizada anestesia infiltrativa com articaína a 4% com epinefrina 1:200.000 (Articaine, DFL, Rio de Janeiro, RJ, Brasil) seguida do isolamento absoluto para a abertura coronária. Em seguida, a câmara pulpar foi irrigada copiosamente com hipoclorito de sódio a 1% e o canal foi explorado com uma lima tipo K #30 (Dentsply, Maillefer, Ballaigues, Suíça). Pela radiografia, foi medido o comprimento aparente do dente, a fim de remover restos pulpares necrosados do interior do canal radicular com uma lima de maior diâmetro. Nessa fase o canal radicular foi irrigado várias vezes com hipoclorito de sódio a 1%. Em seguida, o canal foi seco com cone de papel e preenchido com curativo à base de hidróxido de cálcio Calen® com PMCC (SS White, São Paulo, Brasil), seguido do Coltosol (Vigodent, Rio de Janeiro, Brasil).

Como a paciente não morava na mesma cidade, decidiu-se realizar a próxima troca do curativo em dois meses. Foram realizadas quatro trocas de hidróxido de cálcio (janeiro, março, maio e julho de 2011), até a formação de uma barreira mineralizada e regressão da lesão periapical (setembro de 2011; Figura 2). Todas as trocas de hidróxido de cálcio foram realizadas sob isolamento absoluto e irrigação com hipoclorito de sódio a 1%.

Em setembro de 2011, optou-se por fazer o plug apical de MTA para selar a região apical e em seguida a obturação. O curativo de hidróxido de cálcio foi removido com irrigação e o canal foi seco com cone de papel 80. O MTA (Angelus, Londrina, Brasil) foi manipulado conforme as recomendações do fabricante, levado ao canal radicular em pequenas porções através de um porta MTA, e condensado com calcador de Paiva número 2 e lima K #80 com um algodão na sua ponta até a obtenção de um plug apical de mais ou menos 3 mm. Em seguida, o canal foi preenchido com guta percha pela técnica da moldagem, formando assim um cone único (Figura 3). Em julho de 2013, a paciente retornou à ABO-MS para avaliação clínica e radiográfica do dente 11 (Figura 4), o qual apresentou-se íntegro e sem sensibilidade dolorosa.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Discussão

Dentes com rizogênese incompleta devem ser submetidos inicialmente ao processo de apicificação para depois serem obturados endodonticamente de forma adequada. Esse processo pode dispor de duas a várias sessões, não tendo um protocolo determinado (9,10), pois depende do organismo de cada paciente. Vários fatores estão envolvidos no fechamento do ápice radicular, além da resposta biológica do paciente, tais como a adequada limpeza do canal radicular, a diminuição de micro-organismos presentes, o tipo de material utilizado e o tempo que ele permanecerá dentro do canal, entre outros (6,7,13,15).

O material preconizado para estimular o fechamento apical tem sido o hidróxido de cálcio, por suas propriedades antimicrobianas e sua biocompatibilidade (4,5). Com ele, há a formação de uma barreira mineralizada em longo prazo, que possibilita o tratamento endodôntico sem o risco de extravasamento de material obturador. Porém, muitas vezes esse material não permite que se faça a finalização do tratamento na mesma sessão, ou ainda, faz com que o tratamento se torne muito longo, devido à necessidade de muitas trocas de curativo (1,14,16,17).

Com o desenvolvimento de novos materiais, alguns autores propõem a utilização do MTA em casos de rizogênese incompleta, através de um plug apical, vedando o mais hermeticamente possível os últimos 3 mm do canal radicular (13,14,16). Esse plug apical proporciona maior segurança na obturação, pois forma uma barreira para a condensação do material obturador (2,3), e evita a reinfecção do canal radicular, já que o cimento apresenta ótimas propriedades físico-químicas e biocompatibilidade (5,11,12,15). Além disso, o MTA pode ser utilizado na presença de umidade, como em canais radiculares de dentes com necrose pulpar e lesões periapicais, o que o torna profícuo (1,8,11).

FELIPPE et al. (6) apresentaram um caso de apicificação no qual o MTA foi utilizado com sucesso clínico, assim como outros autores (3,8,13). Mesmo com maiores vantagens sobre o hidróxido de cálcio, alguns autores defendem o uso do hidróxido de cálcio como "padrão-ouro" para o processo de apicificação. Para REYES et al. (16), o hidróxido de cálcio deve ser o material de escolha, pois induz o fechamento do ápice radicular e é utilizado a muitos anos para essa finalidade, mas para CHALA et al. (4), o MTA pode ser utilizado juntamente com o hidróxido de cálcio para garantir o sucesso do tratamento endodôntico, como apresentado neste caso clínico.

 

Conclusão

O MTA também pode ser utilizado para apicificação, isolado ou juntamente com o hidróxido de cálcio, propiciando maior selamento e sucesso clínico em dentes com rizogênese incompleta.

 

Referências Bibliográficas

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Endereço para correspondência:
Katherynn Crespi Niedermaier
Rua Hugo Pereira do Vale, 156 - Mata do Jacinto
Campo Grande/MS, Brasil – CEP: 79033-210

e-mail:
katherynnn@yahoo.com.br

 

Recebido em 03/06/2013
Aprovado em 08/07/2013