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Revista Brasileira de Odontologia

versão On-line ISSN 1984-3747versão impressa ISSN 0034-7272

Rev. Bras. Odontol. vol.72 no.1-2 Rio de Janeiro Jan./Jun. 2015

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Avaliação funcional de implantes por mineralização óssea in vitro

 

Functional evaluation of implants by bone mineralization in vitrot

 

 

José H. Cavalcanti Lima I; Marcelo N. Tanaka II; Fábio J. B. Bezerra III; Vinicius T. G. Maia IV; Patricia C. M. Robbs V

I Mestre em Odontologia Diretor Científico e Professor do Centro Carioca de Reabilitação Oral (Cencro) Membro Titular das Academias Brasileiras de Odontologia e Odontologia Militar
II Doutor em Oncologia do Instituto Nacional de Câncer (INCA) Msc. Biologia Celular e Molecular pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz)
III Msc. Periodontia pela Universidade Paulista (UNIP) Instituto Nacional de Experimentos e Pesquisas Odontológicas (Inepo)
IV Especialista em Periodontia e em Implantodontia Mestrando em Odontologia
V Especialista em Implantodontia Mestranda em Odontologia da UFF




Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A evolução do projeto dos implantes osseointegráveis é resultado do desenvolvimento de diferentes tipos de estruturas em sua superfície. No entanto, ainda existe a necessidade de estudos para definir o tipo de superfície ideal. Esse trabalho discute métodos de avaliação da superfície de implantes que mostram o potencial de determinadas superfícies para induzir mineralização óssea in vitro, partir do uso de células mesenquimais progenitoras. Foram realizadas análises comparativas entre a topografia de implantes com e sem rugosidades nanométricas e o tipo de interação entre pré-osteoblastos semeados diretamente nesses implantes. Características distintas foram observadas em cada superfície.

Palavras-chave: implantes dentários; osseointegração; nano-rugosidade; mineralização óssea; osteoblastos; superfícies de implantes.


ABSTRACT

Improvements in dental implants structure is the result of development of different types of geometrically intelligent surfaces, provided by the emergence of companies interested in innovation of these materials, however, there is still a need for studies to define the type of ideal surface. This work addresses an unprecedented discussion regarding implant surface evaluation methods, able to show the potential of certain areas to induce bone mineralization in vitro. From the use of mesenchymal progenitor cells, which have the capacity to respond to stimuli surface, comparative tests were performed between the topography implants with and without nano-roughness and the type of functional interaction between pre-osteoblasts seeded directly into these implants. Different characteristics of coating cells and mineralization niches on different surfaces were found.

Keywords: dental implants; osseointegration; nano-roughness; bone mineralization; osteoblast cells; implants surfaces.

 


 

Introdução

Na década de cinquenta, o desenvolvimento de implantes osseointegráveis surgiu com dois desenhos distintos: como um cilíndrico com roscas, implantes Nobelpharma, e um cilindro sem roscas com perfurações implantes Strauman, ambos introduzidos no tecido ósseo com técnicas cirúrgicas.

As décadas seguintes, com o sucesso clínico e científico da técnica da substituição de dentes perdidos por implantes osseoitegraveis, proporcionou o surgimento de empresas que desenvolveram diversos projetos de implantes, buscando um maior índice de osseointegração. O conceito ideal do desenho do implante osseointegravel ainda é muito pesquisado principalmente no que diz respeito à superfície do implante.

Hoje diferentes formas de tratamento de superfícies são desenvolvidas buscando permitir uma justa posição do osso a superfície do implante, aumentando assim o fenômeno da osseointegração, definido em 1969 como "conexão direta estrutural entre o osso vivo e ordenado e a superfície de um implante submetido à carga funcional".

As superfícies maquinadas e jateadas foram pioneiras, citando jateamentos com sílica, óxido de alumínio, óxido de titânio, após os tratamentos ácidos, seguidas por superfícies cobertas com plasmas spray de titânio e de hidroxiapatita, técnicas de ativação do óxido de titânio por oxidações iônicas, todos avaliados micrometricamente sempre com o objetivo de potencializar o contato ossoimplante e buscar resultados mais rápidos para o carregamento de implantes osseointegráveis 1.

Estes tratamentos criam microrrugosidades e alteram a tensão e energia superficial, favorecendo a adesão de osteoblastos e consequente formação de grande quantidade de matriz extracelular depositada sobre a superfície, aumentando a área funcional do implante. Modificações químicas também foram implementadas para modular a reação tecidual ao material implantado. Assim, materiais à base fosfato de cálcio (CaP) têm sido amplamente investigados, devido a sua semelhança química com a parte inorgânica do osso, e de potencial de bioatividade. Existem algumas técnicas de preparação de CaP para produzir hidroxiapatita, com uma estrutura em 3D semelhante ao osso. No entanto, quando usado como um revestimento em metais, materiais de CaP com micrômetros de espessura não resistem a níveis de tensão resultantes na superfície do implante 5. Com isso, opções por revestimentos mais finos, em nível nanométrico, podem representar boas alternativas para evitar perdas de revestimento de CaP na superfície do implante.

Com a evolução dos microscópicos eletrônicos de varredura (MEV) e de força atômica (MFT), as superfícies passaram a ser avaliadas tridimensionalmente. Em análise por MEV, a observação de superfícies em aumentos acima de cinquenta mil vezes proporciona a medição de rugosidades nanométricas e a observação da interação da superfície dos implantes com osteoblastos em estudos que permitem avaliar a maior ou menor formação de matriz extracelular e a mineralização óssea in vitro.

O presente estudo apresenta resultados inéditos de avaliação funcional de mineralização óssea a partir do cultivo de pré-osteoblastos em superfícies maquinadas, tratamento com duplo ataque ácido e nanotratamento com cristais de hidroxiapatita pura e cristalina. É possível observar características distintas de recobrimento de células e nichos de mineralização nas diferentes superfícies avaliadas após o período de vinte e oito dias.

 

Material e Método

Para este estudo foram utilizados implantes produzidos em titânio comercialmente puro de grau IV, com macrogeometria híbrida, 3,5 milímetros de diâmetro e 10,0 milímetros de comprimento (Implante Strong SW, S.I.N – Sistema de Implantes Nacionais , São Paulo, Brasil). Estes implantes foram divididos em três grupos: Grupo I: Sem tratamento de superfície; Grupo II: Superfície tratada com duplo ataque ácido térmico e; Grupo III: Superfície tratada com duplo ataque ácido térmico e nanoativada com cristais de hidroxiapatita cristalina pura (Superfície SINactive, S.I.N – Sistema de Implantes,Nacionais, São Paulo, Brasil).

Foi feita uma caracterização nano estrutural das superfícies através de MEV por detecção de elétrons secundários e as rugosidades foram medidas em software do microscópio Jeol JSM 6490-LV.

Os implantes foram acomodados em suportes específicos para permitir o cultivo da linhagem celular de pré-osteoblastos (MC3T3-E1). Estas células foram semeadas nas respectivas superfícies com a mesma quantidade de células e mantidas em estufa sob condições controladas, o meio de cultivo alfa-MEM das amostras foi trocado a cada três dias e no controle positivo foram adicionados os indutores de mineralização óssea (beta-glicerol fosfato, ácido ascórbico e melatonina) e monitoradas durante vinte e oito dias. Após esse período, as amostras foram reveladas com vermelho de alizarina S para detectar matriz de cálcio (kit comercial de osteogênese in vitro – Millipore). As imagens da matriz mineralizada foram obtidas em microscópio digital de alta resolução com fontes de LED (KH 7700 – Hirox-europe).

Caracterização das Superfícies

A superfície das amostras: sem tratamento, com tratamento de duplo ataque ácido e nanoativadas, respectivamente: Grupos 1, 2 e 3 foram caracterizados por MEV em diferentes aumentos. A figura 1 mostra a diferença no padrão de rugosidades entre as amostras 2 e 3 em relação ao grupo controle 1. Os grupos 2 e 3 apresentam similaridades no padrão de acidentes topográficos, no entanto, diferenciam-se na textura das superfícies.

 

 

 

Em maior aumento é possível caracterizar com mais detalhes o padrão de nano-rugosidade entre as amostras, os quais podemos obter em magnificação de 15 mil vezes, a partir de regiões aleatórias da superfície que as amostras do grupo 3 apresentam poros em tamanho manométrico menores que os do grupo 2 (magnificação de 60 mil vezes). Note que o padrão de nano-rugosidade da amostra 3 é levemente mais aveludado, devido à diferença de textura resultante do tratamento com cristais de hidroxiapatita. O tratamento nanoativado (grupo 3) serve para mimetizar a superfície de modo que esta se aproxime ao máximo da textura óssea nativa tridimensional.

Ensaios de Mineralização Óssea in vitro

Pode-se observar na figura 2 que depois de 28 dias, o controle positivo (tratado com indutores de mineralização) apresentou claramente forte mineralização óssea evidenciada pela marcação de alizarina S em vermelho, ao contrário do que se pode observar no controle negativo (sem tratamento de indução). Nas imagens de implantes, não é possível identificar sinais de células mineralizadas tanto no grupo 1 (sem tratamento) quanto nas amostras tratadas com duplo ataque ácido (grupo II). No entanto, manchas de mineralização podem ser observadas nas amostras nanoativadas (grupo III). Para esclarecer tais resultados, foi utilizada microscopia digital 3D em alta resolução para identificar e caracterizar os respectivos resultados.

 

 

 

Seguindo a análise com microscopia digital 3D, pode-se notar que as amostras do grupo 1 apresentam células aderidas em sua superfície com pouco indício de matriz de cálcio, nas amostras do grupo 2 é possível observar que apesar da densidade celular aderida ser baixa as regiões com pequenas colônias celulares apresentam sinais de mineralização. No entanto, nas amostras do grupo 3 é possível observar com nitidez o efeito indutor de mineralização óssea na superfície, que foi caracterizado por evidentes placas vermelhas formadas em regiões de colônias celulares medianas figura 3.

 

 

 

 

 

Em análise com maior aumento, pode-se notar que nas amostras do grupo 1 e 2 é possível observar pequenas colônias celulares marcadas com vermelho de alizarina S, no entanto não caracteriza mineralização. Ao contrário do que se pode notar nas amostras do grupo 3 que forma uma superfície estratificada com evidente formação de matriz de cálcio (mineralizada) figura 4.

 

Discussão

Ensaios de mineralização óssea são cruciais para confirmar efeitos osseoindutores de substâncias ou em superfícies de biomateriais. Apesar de ser um método conhecido na literatura 6, não há relatos de trabalhos que apontem a formação de matriz mineralizada diretamente sobre implantes. Usualmente são utilizadas superfícies regulares em formado de discos, com a mesma constituição e tratamento, simulando a superfície do implante comercial. No entanto, a capacidade de verificar esses efeitos de interação célula-implante em longo prazo mimetiza ao máximo as condições observadas em procedimentos in vivo, ao considerar os acidentes geométricos (rosca média, cervical e apical) do implante.

O efeito evidente de indução de mineralização observada nas superfícies com tratamento nanocristais de hidroxiapatita ratifica a importância de oferecer uma superfície com microrrugosidade ideal e osteoindutores, corroborando com outros trabalhos realizados em discos de titânio 1, o que facilita não só a interação célula-implante como também a capacidade de induzir a formação óssea com maior rapidez.

 

Conclusão

Esses resultados confirmam a importância do teste de mineralização óssea in vitro diretamente sobre o implante utilizado clinicamente como sugestivo de padrão de análise funcional inteligente para seleção de biomateriais osseointegráveis. Ao mesmo tempo, dentro dos limites deste trabalho, podemos concluir que as superfícies microrrugosas e ativadas com nano-cristais de hidroxiapatita apresentaram melhores resultados para a mineralização óssea, quando comparadas às superfícies sem tratamento ou tratadas com duplo ataque ácido.

 

Referências

1. MEIRELLES, L, ARVIDSSON, A, ANDERSSON, M, et al. Nano hydroxyapatite structures influence early bone formation. J Biomed Mater Res 2008;87(2 Part A.):299-307.         [ Links ]

2. MENDONÇA, G, MENDONÇA D, ARAGÃO, FJL, et al. Advancing dental implant surface technology: From micronto nanotopography. Biomaterials 2008;29:3822-35.

3. YOO, D, MARIN, C, FREITAS, G, et al. Surface Characterization and In Vivo Evaluation of Dual Acid-Etched and Grit-Blasted/Acid-Etched Implants in Sheep. Implant dentistry 2015; 24 (3): 257.

4. ELIAS, CN, ROCHA, FA, NASCIMENTO, AL, et al. Influence of implant shape, surface morphology, surgical technique and bone quality on the primary stability of dental implants. Journal of the mechanical behavior of biomedical materials 2012;16:169-80.

5. BLOEBAUM, RD, BEEKS, D, DORR, LD, et al. Complications with hydroxyapatite particulate separation in total hip arthroplasty. Clin Orthop Relat Res 1994;298:19-26.

6. KIM, E-J, BU, S-Y, SUNG, M-K, et al. Effects of silicon on osteoblast activity and bone mineralization of MC3T3-E1 cells. Biological Trace Element Research 2013;152(1):105-12.

7. ALBREKTSSON, T. A multicenter report on osseointegrated oral implants. Journal of Prostetic Dentristry 1988;60(1).

 

Endereço para correspondência:
José Henrique Cavalcanti Lima
Rua Gavião Peixoto, 70, sala 1207
Icaraí Niterói/RJ, Brasil – CEP: 24230-100
e-mail:
josehenriquecavalcanti@yahoo.com.br

 

Recebido em 30/07/2014
Aprovado em 02/09/2014