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RPG. Revista de Pós-Graduação

Print version ISSN 0104-5695

RPG, Rev. pós-grad. vol.17 n.3 São Paulo Jul./Sep. 2010

 

ARTIGOS ORIGINAIS ORIGINAL ARTICLES

 

Impacto do Programa de Educação Tutorial da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal da Bahia na formação profissional dos seus ex-bolsistas

 

Impact of Tutorial Education Program of the Federal University of Bahia (UFBA), Scholl of Dentistry in the vocational training of its ex-grant holders

 

 

Felipe Fagundes SoaresI; Candice Belchior DuplatI; Luiza Palma Luz FerreiraI; Marcos Ribeiro de Souza RégisI; Silvia Regina de Almeida ReisII; Mariângela Silva de MatosIII

IGraduado em Odontologia pela Faculdade de Odontologia da Universidade Federal da Bahia (FOUFBA) – Salvador/BA
IIProfessora Adjunta do Departamento de Propedêutica e Clínica Integrada da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal da Bahia (FOUFBA) – Salvador/BA
IIIProfessora Adjunta do Departamento de Odontologia Social e Pediátrica da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal da Bahia (FOUFBA) – Salvador/BA

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O Programa de Educação Tutorial (PET) foi criado para melhorar o ensino superior brasileiro por meio do tripé ensino, pesquisa e extensão. O PET visa formar profissionais mais capacitados à inserção no mundo do trabalho. Este estudo analisou a inserção do ex-bolsista do grupo PET-Odontologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) no mundo do trabalho, bem como a percepção deles acerca do programa. Um questionário autoaplicável foi respondido por 35 ex-bolsistas, dentre 44 participantes do grupo no período de 1993 a 2007. Analisaram-se os dados segundo uma abordagem qualiquantitativa. Dentre os egressos, 77,1% cursaram/cursam uma pós-graduação. As atividades profissionais mais citadas foram clínica privada (60,0%) e docência (37,1%). Todos os entrevistados atribuíram ao programa valores profissionais positivos, de modo que a experiência no PET colaborou para a inserção dos egressos no mundo do trabalho, evidenciando a eficácia do programa.

Descritores: Educação superior. Odontologia. Política de educação superior.


ABSTRACT

The Tutorial Education Program (PET) was created to improve the Brazilian higher education through the teaching, research and extension tripod. The PET aims to educate professionals more able to get in the world of work. This study examined the insertion of PET ex-grant holders of the Faculty of Dentistry of the Federal University of Bahia (UFBA) in the job market. A self-administered questionnaire was answered by 35 of 44 participants of the group during the period 1993 to 2007. The data were analyzed according to a qualitative-quantitative method. Among the egresses, 77,1% finished/are finishing a post-graduation. The professional activities more cited were private clinic (60.0%) and teaching (37.1%). All interviewees attributed positive professional values, to the program in a way that the PET experience contributed to their insertion in the job market, showing the program effectiveness.

Descriptors: Education, higher. Dentistry. Higher education policy.


 

 

Introdução

No contexto da globalização, para destacar-se em um mundo do trabalho cada vez mais exigente e competitivo, torna-se imprescindível que o indivíduo detenha criatividade, versatilidade, flexibilidade, liderança, capacidade de relacionar-se, comunicar-se, argumentar e resolver problemas. Uma formação acadêmica de qualidade seria capaz de suprir essas necessidades do mercado21.

Nesse sentido, as diretrizes curriculares dos cursos de Odontologia preconizam que as faculdades devem basear suas atividades no tripé ensino, pesquisa e extensão5,15.

Corroborando essa perspectiva de formação, os modelos de educação tutorial têm o objetivo de propiciar uma formação de excelência, melhorando o processo de ensino e aprendizado junto à graduação. Essa atividade de tutoria é intrínseca a um modelo de educação acompanhada e continuada, de modo que grupos de acadêmicos são orientados por profissionais experientes, idealizados na figura de um tutor. Esse deve ser um guia e facilitador do aprendizado, orientando os participantes a desenvolverem a habilidade de trabalhar em grupo e torná-los seres sociais, críticos e criativos, além de aprimorar a capacidade para a pesquisa científica18,25.

Em 1979, o Diretor Geral da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), professor doutor Cláudio de Moura Castro implantou o Programa Especial de Treinamento, atualmente denominado Programa de Educação Tutorial (PET), preocupado com a qualidade da graduação e tendo como base a própria experiência como bolsista de um programa tutorial da Faculdade de Ciências Econômicas (FACE), em Minas Gerais10,11. Somente em 2005 o programa foi oficialmente instituído pela lei nº 11.180/2005, sendo destinado ao fomento de grupos de aprendizagem tutorial mediante a concessão de bolsas de iniciação científica6. Existem 400 grupos PET em instituições de ensino superior públicas e privadas, beneficiando 4.274 alunos bolsistas e 400 tutores, 1 para cada grupo de pesquisa1,8,17.

O PET-Odontologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) foi implantado em novembro de 1991 e desde então vem desenvolvendo uma grande quantidade de atividades, buscando aumentar cada vez mais sua interação com a graduação, com a sociedade científica e com as comunidades nas quais atua.

Desse modo, conhecer o impacto do PET-Odontologia na formação e carreira profissional de seus ex-bolsistas mostra-se relevante, tanto pela escassez de estudos que discutam o programa, como para avali-lo, buscando assim, a melhoria da qualidade das suas ações.

Com essa perspectiva e acreditando-se que os ex-bolsistas do PET têm, de fato, uma formação diferenciada que os prepara para um mundo do trabalho cada vez mais exigente e competitivo, a proposta desta pesquisa foi verificar a inserção dos egressos do PET-Odontologia da UFBA no mundo do trabalho e se, na percepção deles, a formação complementar proporcionada pelo programa contribuiu efetivamente para a sua formação e para essa inserção.

 

Material e método

Com base nos arquivos do programa, relacionou-se os ex-bolsistas e voluntários que constavam nos registros do PET-Odontologia da UFBA, no período de 1993 a 2007, totalizando 44. Desse total, 40 foram localizados. Aqueles que participaram do grupo desde a sua criação, em 1991 até 1993, não puderam ser incluídos na amostra devido à ausência de registros.

Em seguida, procurou-se o Conselho Regional de Odontologia da Bahia (CRO-BA), que forneceu as informações que possibilitaram a localização e o contato com esses profissionais. Por meio da rede interpessoal de relacionamento (amigos, tutor e bolsistas antigos), foi possível confirmar os dados e acrescentar informações necessárias.

Mediante endereço eletrônico criado para a pesquisa, foram enviadas mensagens para os ex-bolsistas solicitando a participação na pesquisa e informações acerca dos objetivos e relevância do trabalho. Havia anexo um questionário a ser respondido e um termo de consentimento livre e esclarecido que deveria ser autorizado e reenviado para o endereço eletrônico da pesquisa.

A coleta dos dados ocorreu por meio de um questionário autoaplicável com perguntas abertas e fechadas. De posse dos dados coletados, os questionários foram estruturados em uma planilha do Microsoft® Excel 2003 para permitir uma leitura vertical e horizontal das respostas e, assim, analisar melhor os dados tanto descritiva quanto qualitativamente.

Com base em uma abordagem qualiquantitativa, procedeu-se a uma análise descritiva (frequência e proporção) dos dados tabulados no Excel. A análise qualitativa das questões abertas teve como referência a análise de conteúdo temática proposta por Bardin3.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital Universitário Professor Edgar Santos – Maternidade Climério de Oliveira, conforme o número 47/2008.

 

Resultados

Do total de 40 questionários encaminhados, 35 foram respondidos, de modo que a porcentagem de recusa (12,5%) foi considerada baixa. A amostra, composta por 62,9% de mulheres e 37,1% de homens, registrou 7,4 anos como média de tempo de formado.

Dentre os egressos do programa, 77,1% já cursaram ou estão cursando um programa de pós-graduação, sendo 37,1% em nível de mestrado, 25,7% especialização e 14,3% em nível de doutorado (Tabela 1). Quanto ao nível de escolaridade pretendido, destaca-se o doutorado para 60% do grupo, chamando a atenção que nenhum dos participantes planeja continuar apenas com o nível de graduação.

 

 

O depoimento abaixo enfatiza a procura da pós-graduação como uma consequência dos estímulos recebidos por meio das experiências vivenciadas no programa. Não houve respostas que relacionassem essa procura a um possível despreparo profissional.

O programa ampliou minha visão profissional muito antes do final da vida acadêmica, interferindo muito positivamente nas minhas escolhas. As diversas experiências vivenciadas só serviram para facilitar minha integração ao mercado profissional e minha inserção em programas de pós-graduação (mestre em Imunologia, bolsista do PET Odontologia UFBA por seis semestres).

Na categoria outros (22,9%), os objetivos registrados foram, principalmente, seguir outra carreira profissional e o desejo de cursar o pós-doutorado.

Dentre as atividades profissionais dos ex-bolsistas, as mais citadas foram clínica privada e docência, sendo estas exercidas com dedicação exclusiva ou associadas a outras atividades (Tabela 2). A atuação em pesquisa é mencionada pela maioria dos profissionais que exerce a docência e aparece como atividade praticada por três profissionais que não desenvolvem atividade docente.

 

 

Do total de egressos, 60% estão na clínica privada, sendo que 40% destes atuam apenas nessa atividade. Os demais a associam à docência (11,4%), à docência e ao serviço público (2,9%) e ao emprego na função de dentista (5,7%).

Com relação à visão que os ex-bolsistas têm sobre o PET, a categorização das respostas subjetivas possibilitou identificar as dimensões mais valorizadas no programa, conforme a Tabela 3.

 

 

As dimensões destacadas na Tabela 3 demonstram que o PET tem estimulado uma formação mais integral, que concorda com a proposta das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para o ensino superior, conforme é ratificado pelo depoimento abaixo:

Minha experiência no grupo PET contribuiu não apenas para o meu amadurecimento profissional, mas principalmente para o meu crescimento pessoal. As atividades em grupo mostram o valor da responsabilidade de nossas ações, do respeito ao espaço e ao limite dos colegas. Adicionalmente, recebi estímulos culturais que mudaram completamente o meu gosto por cinema, música, livros e teatro (doutora em Histologia e Embriologia, bolsista do PET Odontologia - UFBA por seis semestres).

Alguns aspectos negativos do grupo e do programa foram identificados por 12 dos egressos. Dentre esses aspectos, destaca-se, principalmente, a baixa abrangência do programa entre os alunos do curso de graduação. Outros aspectos levantados foram: as relações interpessoais com o tutor ou com o grupo; a falta de incentivo dos órgãos competentes, incluindo a carência de recursos financeiros para o desenvolvimento de todas as atividades propostas pelo programa; o processo de seleção, que supervaloriza o rendimento escolar e por vezes aprova bolsista sem o perfil geral para o programa; a inclusão de alguns professores sem perfil para a orientação dos bolsistas e o excesso de atividades desenvolvidas no programa que restringe o tempo para os estágios práticos extracurriculares. Este último aspecto pode caracterizar uma deficiência na formação em nível de graduação para aqueles que optam pela atividade clínica, considerando que esta representou a maior porcentagem das atividades do grupo.

A despeito dessas manifestações, 100% dos entrevistados atribuíram valores positivos ao programa. Como demonstra o relato a seguir, o egresso se refere ao programa como um espaço que os preparou, de uma forma diferenciada, para a profissão e para a vida pessoal.

Compreendo o PET como uma importante experiência profissional e pessoal. No PET experimentamos o trabalho em equipe, aprendemos a lidar com as diferenças, exercitamos o olhar crítico, ganhamos responsabilidade, autonomia e confiança. Por estar baseado no tripé ensino, pesquisa e extensão, o PET garante a formação de um profissional diferenciado e bem preparado para a vida e o mercado de trabalho, seja no âmbito acadêmico ou clínico (mestre em Clínica Odontológica, bolsista do PET Odontologia - UFBA por oito semestres).

Por meio de questões objetivas, os egressos atribuíram um grau de importância para cada atividade do tripé pesquisa, ensino e extensão, conforme descrito na Tabela 4. A atividade de ensino foi classificada como muito importante por 87,9% dos ex-bolsistas, sendo que ninguém a classificou como pouco importante, o que confirma o caráter formador de docentes que o programa estima. A atividade de pesquisa foi considerada muito importante por 85,7% e relativamente importante por 11,4% dos egressos. A extensão foi a atividade de menor importância quando comparada às duas anteriores e foi classificada como muito importante por 67,6%.

Quando questionados quanto à influência do PET em suas escolhas profissionais, dentre os 33 (94,3%) que justificaram, apenas 2 (6,1%) ex-bolsistas acreditam que o PET não guiou as suas escolhas.

A maioria das respostas (41,9%) correspondeu à contribuição para a escolha e desenvolvimento da carreira acadêmica, sendo esta apenas docência ou pesquisa associada à docência. Em seguida relacionou-se o desenvolvimento de uma visão ampla e crítica da profissão (12,9%), o interesse pela pesquisa desvinculada da docência (6,45%) e o estímulo à busca pela pós-graduação (6,45%).

A categoria "Outros" (32,3%) se refere aos ex-bolsistas que descreveram as suas intenções profissionais, mas sem associá-las à experiência do PET ou, ao contrário, evidenciavam tais experiências sem comentar a relação com a profissão. Essa categoria também foi composta por algumas respostas pontuais que não justificavam uma categorização em destaque. O relato a seguir exemplifica como o ex-bolsista interpreta a influência que o PET exerceu em sua carreira:

Como optei pela carreira acadêmica, a minha experiência no PET tem me orientado bastante nas minhas ações profissionais e escolhas. No mestrado, por exemplo, as minhas atividades de ensino, pesquisa e extensão têm sido balizadas pelas práticas que tive no programa em termos de dedicação, rigor e compromisso (mestre em Saúde Comunitária, bolsista do PET Odontologia – UFBA por oito semestres).

Os relatos seguintes destacam também as fragilidades do programa nos primeiros anos da sua implantação. Estes, quando comparados aos depoimentos dos ex-petianos mais jovens, retratam uma evolução histórica positiva do programa.

Naquele momento, por ser um programa recente, os objetivos não estavam bem claros. Em minha opinião, o PET não foi capaz de estimular o espírito crítico, bem como a atuação profissional pautada pela ética, pela cidadania e pela função social da educação superior. No entanto, sem o programa eu não teria despertado para a docência e para a pesquisa científica (doutor em Biologia Celular e Tecidual, bolsista do PET Odontologia - UFBA por oito semestres).

No PET tive a oportunidade de participar do segundo grupo, bem no início... as dificuldades físicas (sala própria, computadores etc.) impediam uma rotina sistemática de trabalho. Por outro lado, instigava a luta por espaço dentro da FOUFBA e projeção em encontros científicos em todos os níveis (regionais e nacionais). Contamos sempre com o estímulo de docentes da referida instituição e desenvolvemos habilidades e competências que ajudam as nossas atividades até hoje (mestre em Odontologia, bolsista do PET Odontologia - UFBA por sete semestres).

Apesar da atividade de extensão ter sido menos referenciada que o ensino e a pesquisa, os ex-bolsistas explicitavam a vivência dessa indissociabilidade e a sua importância para a sua formação.

Em relação ao cumprimento dos objetivos do PET, propostos pela portaria 3.385/200519 (Tabela 5), os egressos responderam, em sua maioria, que grande parte dos objetivos é alcançada, contribuindo para a elevação da qualidade da formação acadêmica dos seus participantes.

Para o objetivo de "formular novas estratégias de desenvolvimento e modernização do ensino superior no país" foi atribuído um valor negativo por 60% dos ex-bolsistas, como indica também os depoimentos seguintes.

O PET apresenta-se como uma estratégia importante de desenvolvimento e modernização do ensino superior no país, contudo restrita a um determinado número de alunos. Acho que se todos os alunos pudessem passar por essa experiência, estaríamos revolucionando o ensino superior no país, mas no momento ainda considero o PET um privilégio de poucos (mestre em Clínica Odontológica, bolsista do PET Odontologia - UFBA por oito semestres).

Não me recordo de qualquer experiência no sentido de desenvolver ou modernizar o ensino superior no país, a não ser a própria experiência "intra-PET", no que se refere ao aprendizado construtivista, e o próprio programa como exemplo a ser implantado e expandido em todo o país (cirurgião-dentista, bolsista do PET Odontologia - UFBA por seis semestres).

 

Discussão

O presente artigo apresentou o impacto do PET na formação profissional dos seus ex-bolsistas por meio da inserção deles no mundo do trabalho, suas perspectivas profissionais, sua percepção acerca da participação e influência do programa na orientação das suas escolhas profissionais. Assim, foi possível realizar também uma avaliação do programa e verificar sua evolução ao longo do tempo e eficácia das suas ações.

Ao analisar o nível de escolaridade atual e pretendido pelos ex-bolsistas, destaca-se que 77,1% estão inseridos em programas de pós-graduação e 60% pretendem realizar doutorado. Matos19, analisando os planos profissionais dos alunos da graduação em dois cursos de Odontologia da Bahia, um público e um privado, registrou que 43,8% dos alunos do curso público vislumbravam cursar o mestrado e/ou o doutorado e 75,4% pretendiam cursar uma especialização. Envolvendo uma amostra nacional, um estudo conduzido pelo Instituto Brasileiro de Estudos e Pesquisas Socioeconômicas – INBRAPE13 verificou que 42,0% dos dentistas têm o título de especialista.

Esses dados confirmam que a educação continuada e a busca por titulação têm se configurado como uma das maiores demandas do mercado de trabalho e, desse modo, estimulada durante a graduação24. Neste estudo, o fato de os profissionais terem participado do PET parece ter elevado o nível de titulação alcançado e almejado, possibilitado, também, de acordo com alguns participantes, uma maior facilidade de acesso aos programas de pós-graduação. Entretanto, o intuito de ingressar nesses programas não parece ser uma prerrogativa dos egressos do PET quando comparado aos planos profissionais de alunos e profissionais de outros estudos.

Bastos4 confirma essa tendência de busca pela pós-graduação, registrando que 47,7% dos dentistas graduados entre 1996 e 2000 pela Faculdade de Odontologia de Bauru cursaram ou estavam cursando o mestrado e 7,7% o doutorado. Ressalta-se que os resultados do presente estudo referente ao acesso à pós-graduação em nível de mestrado e doutorado pelos ex-bolsistas (51,4%) é muito próximo daquele obtido por Bastos (55,4%) em um curso reconhecido como de excelência.

Gondim12 afirma que a busca dos formandos pela pós-graduação é pautada pela insegurança e despreparo profissional para atender ao perfil requerido pelo mundo do trabalho. Em seus depoimentos, os entrevistados não relataram a realização de pós-graduação como um meio de superação da insegurança ou pelo despreparo, mas sim como um resultado da experiência vivenciada no programa.

Dentre as atividades profissionais exercidas, atualmente as mais citadas foram a clínica privada e a docência, sendo que a atuação em pesquisa também apareceu praticada mesmo por profissionais que não atuam na docência. Isso sinaliza para o fato de que a aquisição de habilidade em pesquisa é um diferencial na formação, quando se analisam as transformações que vêm ocorrendo no mundo do trabalho brasileiro. Nesse caso, há a evidência de que a atividade de pesquisa já não é tão intrinsecamente associada à docência, como no passado.

A inserção dos egressos no mundo do trabalho se aproxima dos dados encontrados por Matos19, nos quais a maioria (75,4%) dos alunos da graduação do curso público pretende, em médio/longo prazo, trabalhar em clínica privada. No mesmo trabalho, a autora observou que atuar no serviço público tem sido um objetivo destacado entre os alunos, mas apenas nos primeiros anos de formado. No presente estudo, a inserção no setor público foi citada por apenas um participante.

Isso demonstra que, apesar do aumento das oportunidades de trabalho no setor público, do mercado saturado e da sua crescente monopolização pelos planos de saúde14, a clínica privada prevalece, para esse grupo, como a principal fonte de renda. O elevado percentual que atua na clínica privada em contraste ao baixo percentual que possui emprego na função de dentista revela notoriamente a inserção dos ex-bolsistas na esfera privada.

A categorização das dimensões mais valorizadas no programa está de acordo com o que as DCNs preconizam para o ensino de Odontologia no Brasil.

Segundo as DCNs, o curso de Odontologia deve obrigatoriamente incentivar a pesquisa e investigação científica, difundir os conhecimentos técnicos, científicos e culturais, promover a extensão a partir dos benefícios obtidos pela pesquisa e estimular o desejo de aperfeiçoamento. Desse modo, os indivíduos devem desenvolver habilidades cognitivas, afetivas e psicomotoras5.

O estímulo à pesquisa científica aparece como um dos pontos fortes do programa, juntamente com o estímulo à carreira docente. A respeito dessa última, Matos19 registrou que, entre os professores de cursos universitários odontológicos, o desejo de lecionar, para muitos deles, foi construído durante a graduação, estimulado pelas experiências em monitorias, participação em pesquisa e apresentações de trabalhos em congressos. A docência é incentivada entre os participantes do PET também por meio dessas atividades, além das apresentações semanais de artigos, estimulando o senso crítico e a comunicação, atributos fundamentais para a docência. De um modo geral, a graduação vem propiciando esse incentivo à carreira docente. Tal incentivo parece ser maior entre os participantes do PET, uma vez que 37,1% dos egressos estão inseridos como docentes. Ainda segundo Matos19, 20,8% dos alunos do curso público almejam ingressar na docência.

Quando questionados com relação à importância atribuída a cada tipo de atividade desenvolvida pelo PET, a atividade de extensão recebeu o menor percentual (67,6%). Justifica-se esse resultado pelo baixo valor acadêmico atribuído à extensão quando comparado com a pesquisa e o ensino e pelo fato de a extensão, muitas vezes, ser colocada em segundo plano no próprio programa23.

Moita e Andrade20 relataram a ocorrência de uma desvalorização generalizada das atividades de extensão decorrente da permanência de modelos universitários ultrapassados, típicos do momento de afirmação e consolidação do saber científico. A preponderância desse modelo universitário demonstra uma ruptura do princípio constitucional da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão (art. 207 da Constituição de 1988) proposta pelo decreto nº 3.860/0122.

Esse resultado não reflete a situação atual do grupo quanto às atividades de extensão. As novas diretrizes do programa8 propõem a realização de atividades integradas de ensino, pesquisa e extensão, fazendo com que os bolsistas do PET vivenciem, de fato, a indissociabilidade. Muitas vezes, torna-se difícil estabelecer limites que caracterizem cada atividade separadamente.

Segundo Barbosa2, o modelo de ensino adotado influencia efetivamente na postura e formação acadêmica, caracterizando a abrangência conferida por metodologias diferentes de ensino. Dessa forma, 94,3% dos ex-bolsistas responderam que a experiência vivida no PET influenciou suas escolhas profissionais.

A avaliação do cumprimento dos objetivos do programa feita pelos ex-bolsistas foi positiva, de modo geral, destacando-se negativamente por 60% dos entrevistados o objetivo de "formular novas estratégias de desenvolvimento e modernização do ensino superior no país".

Essa baixa percepção de seu cumprimento pelo programa pode estar relacionada ao fato de que os respondentes o interpretaram como um objetivo a ser alcançado durante a sua experiência como bolsista. É possível que uma das perspectivas do Ministério da Educação (MEC) seja que isso ocorra em longo prazo, à medida que os novos docentes, oriundos do programa, com formação diferenciada, ingressem na carreira docente.

Segundo o Relatório Geral da Avaliação Nacional dos Grupos PET9, o MEC julga que 87% dos grupos atendem aos objetivos do programa por meio de atividades fundamentadas em suas doutrinas.

 

Conclusões

Os egressos do grupo PET-Odontologia da UFBA demonstraram ter alcançado um bom nível de inserção no mundo do trabalho, de modo que a maioria deles atribuiu essa inserção às competências adquiridas no programa, como a habilidade de trabalhar em grupo, amadurecimento, organização, autonomia, autoconfiança, conhecimento técnico-científico e habilidade em pesquisa.

Todos os entrevistados atribuíram valores positivos ao programa, declarando que por meio das vivências envolvendo o tripé ensino, pesquisa e extensão, eles foram preparados de forma diferenciada não só para a profissão, mas também para a vida.

 

Referências

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Endereço para correspondência:
Mariângela Silva de Matos
Avenida Araújo Pinho, 62 – Canela
CEP 40110-150 – Salvador (BA), Brasil
Fone: (71) 3358-1347/9198-4862
E-mail: marismatos@yahoo.com.br

Recebido:03/08/10
Aceito: 28/09/10