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RFO UPF

versão impressa ISSN 1413-4012

RFO UPF vol.15 no.2 Passo Fundo Mai./Ago. 2010

 

Principais aspectos da cirurgia bucomaxilofacial no paciente sob terapia com bifosfonatos

 

Aspects main of the oral and maxillofacial surgery in patient under therapy bisphosphonate

 

 

Paulo Sérgio Perri de CarvalhoI; Herikson Fernandes SantosII; Bruno Gomes DuarteIII; Fábio Astolphi CarvalhoIII; Eduardo Dias-RibeiroIV; Julierme Ferreira RochaIV

IProfessor titular do Departamento de Estomatologia da Faculdade de Odontologia de Bauru, FOB-USP, Bauru, São Paulo, Brasil
IICirurgião-dentista, Departamento de Estomatologia da Faculdade de Odontologia de Bauru, FOB-USP, Bauru, São Paulo, Brasil
IIIAlunos do Programa de Prática Profissionalizante em Cirurgia Bucal, Departamento de Estomatologia da Faculdade de Odontologia de Bauru, FOB-USP, Bauru, São Paulo, Brasil
IVAlunos do curso de mestrado em Estomatologia, Departamento de Estomatologia da Faculdade de Odontologia de Bauru, FOB-USP, Bauru, São Paulo, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: O objetivo deste trabalho é revisar a literatura sobre a ação farmacológica dos bifosfonatos e sua atuação sobre as estruturas ósseas faciais, correlacionando com as diferentes áreas da cirurgia bucomaxilofacial.
REVISÃO DE LITERATURA E CONSIDERAÇÕES FINAIS: Os medicamentos bifosfonatos são utilizados para o tratamento e prevenção de diversas patologias ósseas, atuando diretamente sobre a remodelação e vascularização óssea. Esses medicamentos afetam a remodelação óssea por meio da diminuição da reabsorção óssea, via diferentes mecanismos, agindo principalmente sobre os osteoclastos, inibindo e reduzindo sua atividade. Os bifosfonatos apresentam uma alta afinidade pela hidroxiapatita da superfície óssea, o que causa maior acúmulo desse mineral em regiões com alta atividade óssea. O uso de determinadas formulações dessas drogas tem sido relacionado com o desenvolvimento de necrose óssea tanto em maxila quanto em mandíbula. Estudos recentes demonstram que o uso dos bifosfonatos pode atuar como coadjuvante no tratamento de pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos bucais e maxilofaciais, como distração osteogênica, enxertos ósseos e na implantodontia.

Palavras-chave: Osteoporose. Osseointegração. Implante dentário. Bifosfonatos. Osteonecrose.


ABSTRACT

OBJECTIVE: The aim of this paper is to review the literature on the pharmacological action of bisphosphonates and their performance on the facial bone structures, correlating them with different areas of the maxillofacial surgery.
LITERATURE REVIEW AND FINAL CONSIDERATIONS: Bisphosphonate drugs are used for the treatment and prevention of various diseases by acting directly on bone remodeling and vascularization. These drugs affect the bone remodeling by means of bone decreasing resorption by different mechanisms, acting on osteoclasts mainly, inhibiting and reducing its activity. Bisphosphonates have a high affinity for hydroxyapatite bone surface, which causes greater accumulation of mineral on regions with high bone activity. The use of certain formulations of these drugs has been associated with the development of bone necrosis in maxilla and mandible. Recent studies show that the use of bisphosphonates can perform as an adjunct in the treatment of patients undergoing oral and maxillofacial surgical procedures such as distraction osteogenesis, bone grafts and implantology.

Key words: Osteoporosis. Osseointegration. Dental implantation. Bisphosphonates. Osteonecrosis.


 

 

Introdução

Os bifosfonatos são drogas de eficácia comprovada na prevenção e tratamento de diversas patologias ósseas, como a doença de Paget, hipercalcemia maligna, lesões osteolíticas decorrentes de mieloma múltiplo, fraturas patológicas, compressão da medula espinhal, osteoporose induzida por esteroides ou pós-menopausa e metástases ósseas associadas a tumores de tecidos moles (mama, próstata ou pulmões)1-5.

Esses medicamentos, em geral, atuam na remodelação óssea por meio da diminuição da reabsorção óssea, via diferentes mecanismos, agindo principalmente sobre os osteoclastos, inibindo e reduzindo sua atividade. Além disso, os bifosfonatos apresentam uma alta afinidade com a hidroxiapatita da superfície óssea, o que causa maior acúmulo desse mineral em regiões com alta atividade óssea4,6,7.

Nos últimos anos essa classe de medicamentos passou a ser alvo de inúmeros estudos no que diz respeito à cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial. Isso se deve, inicialmente, à publicação de Marx8 (2003) e, posteriormente, Ruggiero et al.9 (2004), que comprovaram a relação entre a administração dessas drogas e o desenvolvimento de necrose óssea avascular, tanto em maxila quanto em mandíbula.

Estudos recentes demonstram que o uso dos bifosfonatos pode atuar como coadjuvante no tratamento de pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos bucais e maxilofaciais, como distração osteogênica, enxertos ósseos e na implantodontia6,7,10,11.

O objetivo deste trabalho é realizar uma revisão de literatura sobre a ação farmacológica dos bifosfonatos e sua atuação sobre as estruturas ósseas faciais, correlacionando com as diferentes áreas da cirurgia bucomaxilofacial.

 

Revisão de literatura

Ação farmacológica dos bifosfonatos

O tecido ósseo é formado por osteoblastos e reabsorvido por osteoclastos, num processo homeostático constante. Embora a regulação dos osteoblastos pelos bifosfonatos ainda seja controversa, o processo de regulação da função dos osteoclastos já é conhecido12.

Os bifosfonatos, em geral, afetam a remodelação óssea por meio da diminuição da reabsorção óssea via diferentes mecanismos, atuando principalmente sobre os osteoclastos, inibindo seu desenvolvimento desde suas células precursoras, aumentando sua taxa de apoptose, estimulando seus fatores de inibição e reduzindo sua atividade4,6,7. Além disso, essas drogas são análogos sintéticos do pirofosfato, que se liga fortemente à hidroxiapatita e se deposita em locais onde esse mineral se encontra em abundância, especialmente onde existe acentuada atividade de formação e reabsorção óssea10,13.

Essas drogas são divididas em duas classes: bifosfonatos nitrogenados e não nitrogenados14. Os bifosfonatos não nitrogenados atuam competindo com a adenosina trifosfato (ATP) nos osteoclastos e ativando o processo de apoptose dessas células. Por serem rapidamente metabolizadas, seu potencial de ação é reduzido7,14,15. Os bifosfonatos nitrogenados, por sua vez, além de induzir o processo de apoptose, inibem a ação da farnesil difosfato sintase, uma enzima necessária à síntese de lipídios isoprenólicos, interrompendo a cadeia de ligações proteicas necessárias para a função osteoclástica7,12,16. Por apresentarem nitrogênio em sua estrutura molecular, essas drogas não são metabolizadas e se acumulam no tecido ósseo agindo por longos períodos; portanto, são mais potentes que os compostos não nitrogenados12,14,17.

De acordo com a sua indicação, essas drogas podem ser administradas por via oral, principalmente quando prescritas para o tratamento de osteoporose, ou por via endovenosa em pacientes oncológicos sob tratamento quimioterápico5,12,14,18 (Quadro 1).

Bifosnonatos versus osteonecrose

Os primeiros relatos sobre a associação do uso dos medicamentos bifosfonatos e o desenvolvimento de osteonecrose foram publicados por Marx8 (2003) e Ruggiero et al.9 (2004). Desde então, inúmeros trabalhos vêm sendo realizados com o intuito de avaliar esta relação no que diz respeito à sua incidência, etiopatogenia e às possíveis formas de tratamento2-4,19.

Alguns estudos demonstraram relação significativa entre a administração dessas drogas e os quadros de osteonecrose4,19; geralmente em pacientes submetidos a essa terapêutica medicamentosa com doses regulares semanais por longo período, não inferior a três anos2. A maior incidência está associada a pacientes oncológicos que recebem, concomitantemente, agentes quimioterápicos, sendo, consequentemente, imunodeprimidos3. Geralmente, a frequência dessa complicação em pacientes que fazem uso constante desses medicamentos parece ser rara, variando de 1 a 10% dos casos, sendo mais baixa em pacientes que fazem uso dessa droga para o combate da osteoporose. Apesar de a causa ainda não ser totalmente compreendida, existe maior predileção para o desenvolvimento de osteonecrose em pacientes que fazem uso dos bifosfonatos para o tratamento do mieloma múltiplo, com incidência significativamente superior quando comparados a pacientes portadores, por exemplo, de câncer de mama ou próstata2,20.

Os mecanismos de ação pelos quais os bisfosfonados induzem o processo de osteonecrose ainda não são completamente compreendidos, sendo relatada a sua associação a um ou mais fatores21. Segundo alguns autores, sua ação sobre o turnover ósseo afeta a relação osteoblasto/osteoclasto, resultando em comprometimento da quantidade e da qualidade do tecido ósseo neoformado; consequentemente, afeta a adaptação e remodelação, causando danos à sua microestrutura, alterando as suas características mecânicas e tornando-o mais vulnerável à atividade de bactérias existentes na cavidade bucal12,13.

Além disso, sugere-se na hipótese de que a necrose óssea seja decorrente do comprometimento do fluxo sanguíneo e da falta de oxigenação do tecido ósseo decorrente das propriedades antiangiogênicas dos bifosfonatos, que, associadas sinergicamente às ações de outros quimioterápicos sobre o endotélio vascular, dificultam a perfusão óssea3,4,12,13.

Especula-se que a razão pela qual os ossos maxilares apresentam uma maior incidência de osteonecrose quando comparados a outros ossos, deve-se ao possível contato entre o tecido ósseo e o meio bucal, de modo que qualquer lesão, trauma (exodontias, trauma por próteses) ou doenças periodontais pode permitir o contato de diversos tipos de micro-organismos com o tecido ósseo, desencadeando processos infecciosos, em especial por colônias de Actinomyces spp9,21,22.

Ainda que o desenvolvimento da osteonecrose esteja associado, na maioria dos casos, a lesões traumáticas, o surgimento espontâneo pode ocorrer em até de 30% dos pacientes, principalmente em áreas que são facilmente lesadas e recobertas por mucosa muito fina, como, por exemplo, na região da linha milo-hioideia2,3.

Na maioria dos casos, o fator desencadeante do processo de necrose óssea são as exodontias. Isso ocorre sobretudo pelo fato de a remodelação óssea ser de suma importância para o processo de cicatrização após extração dentária. Desse modo, a exposição óssea alveolar pós-operatória, que normalmente é de curta duração em pacientes saudáveis, não regride em pacientes tratados por bifosfonatos, tornando-se infectada e evoluindo para necrose23.

O tratamento dos pacientes portadores de osteonecrose induzida por bifosfonatos (ONIB) é difícil e as opções terapêuticas são escassas19,20. Via de regra, o tratamento é proposto de acordo com os sinais clínicos e sintomas apresentados durante o exame clínico (Quadro 2).

 

 

Em casos de exposições ósseas pequenas e indolores, bochechos com clorexidina 0,12% devem ser prescritos inicialmente. À presença de quadro álgico e/ou evidência clínica de infecção, terapia antibiótica sistêmica deve ser associada ao uso do colutório4,18,24. Entretanto, a eficácia é comprometida pelas alterações vasculares, que impedem sua distribuição, diminuindo seu potencial de ação13,22. Quando necessário, tratamento cirúrgico para debridamento e remoção de sequestros ósseos infectados ou necróticos deve ser realizado. Em casos severos, com lesões de grande extensão, a ressecção de segmentos ósseos pode ser indicada4,24.

O oxigênio hiperbárico e a laserterapia vêm sendo estudados como opções terapêuticas no tratamento da ONIB, porém os resultados obtidos ainda são pobres e inconclusivos4,20,25.

Existem dúvidas sobre a eficácia da suspensão do uso dos bifosfonatos no tratamento da osteonecrose, em virtude de sua ação no longo prazo. Estudos demonstram que a interrupção de seu uso não é relevante no tratamento da osteonecrose12.

Bifosfonatos versus implantodontia

A reabilitação dentária por meio da instalação de implantes osseointegráveis vem sendo, nos últimos anos, cada vez mais executada. Atualmente, grande parte da população que busca esta alternativa de tratamento apresenta idade superior a sessenta anos, enquadrando-se num grupo de maior probabilidade de incidência de patologias metabólicas, como a osteoporose, que pode atingir até um terço desses pacientes6.

O desenvolvimento da osteoporose resulta na diminuição da matriz mineral óssea, necessária à instalação dos implantes e obtenção da estabilidade primária requerida para o processo da osseointegração, que teoricamente inviabilizaria essa modalidade de tratamento para os pacientes portadores dessa enfermidade24. Entretanto, estudos demonstram que a implantodontia não é contraindicada nesses casos6,15,26-28. Pesquisa laboratorial comprovou a formação de tecido ósseo ao redor dos implantes instalados em tíbia e fêmur de coelhos portadores de osteoporose induzida, ainda que os processos de osteocondução e neoformação óssea sejam até 30% mais lentos do que em espécimes sadios, sendo, portanto, necessário um maior período para a total osseointegração26.

Nos últimos anos, a ação dos medicamentos bifosfonatos para o controle do desenvolvimento da osteoporose por meio do processo de aumento da densidade do tecido ósseo e diminuição de sua reabsorção passou a ser vista como opção terapêutica coadjuvante no processo de osseointegração de implantes odontológicos6,15,27.

Diversos trabalhos realizados com diferentes drogas desse grupo demonstram o aumento de até 8% da densidade óssea em pacientes que fazem uso sistêmico desses medicamentos nos primeiros três anos de tratamento6. O sucesso desse tratamento, porém, ainda é contraditório. Grande parte dos estudos sobre a efetividade dos bifosfonatos associada à instalação de implantes osseointegráveis foi realizada em laboratório, não apresentando resultados fiéis para seu uso clínico.

Segundo Chacon et al.6 (2006), a administração de alendronato uma semana antes do procedimento cirúrgico, estendendo-se pelo período de osseointegração em implantes instalados em tíbia e fêmur de coelhos, não interfere na mineralização e osseointegração num período de seis semanas.

Meraw et al.28 (1999) avaliaram a influência do revestimento de implantes com alendronato sobre o tecido ósseo peri-implantar em cães, concluindo que o bifosfonato aumentou significativamente a neoformação e a densidade óssea.

O risco de desencadeamento de um processo de ONIB devido ao trauma decorrente do procedimento cirúrgico deixa dúvidas sobre a segurança da instalação dos implantes. Até a publicação dos primeiros trabalhos associando o uso de bifosfonatos com o desenvolvimento de osteonecrose, as cirurgias para instalação de implantes osseointegráveis em pacientes fazendo uso desses medicamentos eram realizadas sem alterações de protocolos cirúrgicos27.

Grant et al.27 (2008) avaliaram 115 pacientes que faziam uso de bifosfonatos orais e foram submetidos à instalação de implantes. Verificando a incidência de ONIB pós-operatória, não sendo encontradas lesões em nenhum paciente, concluíram que o uso do medicamento não interfere no sucesso do tratamento. Esse resultado foi confirmado pelo estudo de Bell e Bell15 (2008), que avaliaram 101 implantes instalados em 42 pacientes. Entretanto, Marx et al.18 (2007), ao avaliarem trinta pacientes que desenvolveram quadros de ONIB, verificaram que em dois casos (6,7%) o processo foi desencadeado pela instalação de implantes osseointegráveis.

De qualquer modo, ainda que não existam evidências suficientes para a contraindicação de cirurgias eletivas dentoalveolares em pacientes que fazem uso de bifosfonatos via oral por um período inferior a três anos, todos os pacientes devem ser questionados sobre seu uso e alertados sobre os possíveis riscos e benefícios inerentes aos procedimentos6,24,27,29.

Em 2006, a American Dental Association (ADA) publicou diretrizes para a realização de tratamentos cirúrgicos em pacientes que fazem uso constante de bifosfonatos orais. De acordo com o documento, planejamentos cirúrgicos que envolvam periósteo ou osso medular em múltiplos sextantes devem ser realizados em etapas, atuando sobre um sextante ou dente por vez, associado ao uso de colutórios e antimicrobianos. Os demais sextantes só devem ser manipulados após um período de dois meses de acompanhamento, sem a incidência de qualquer alteração patológica da área previamente operada29.

Apesar da controvérsia sobre a suspensão ou manutenção da medicação durante o período pré e pós-operatório, a ADA sugere a descontinuidade do tratamento por um período mínimo de três meses para pacientes que fazem uso de bifosfonatos orais por mais de três anos, ou que façam uso concomitante de corticosteroides29.

É necessário chamar atenção para o fato de que os estudos relativos à implantodontia se referem ao uso de bifosfonatos orais, que, segundo a literatura, apresentam menor incidência de osteonecrose.

Os protocolos cirúrgicos para pacientes que fazem uso de bifosfonatos endovenosos devem ser diferenciados, uma vez que não existem relatos associando a instalação de implantes com os medicamentos administrados via endovenosa27.

Bifosfonatos versus distração osteogênica

Desde 1992, quando o primeiro trabalho foi publicado por McCarthy et al. 30; a distração osteogênica vem sendo constantemente utilizada como método de tratamento para correções de defeitos esqueléticos na região maxilofacial10.

Para que o processo de neoformação óssea durante o tratamento seja adequado, alguns estudos relatam que a taxa de distração deve ser, em média, de 1 mm por dia, ainda que esses valores possam variar entre diversos autores7,10. Taxas inferiores podem resultar em consolidação prematura e o aumento na dimensão óssea planejada pode não ser obtido, ao passo que valores superiores podem gerar danos à região da distração, impedindo a correta consolidação do tecido ósseo7.

Novos estudos têm sido realizados com o intuito de promover a aceleração da formação e maturação óssea. Com esse objetivo, células autógenas, fatores de crescimento, hormônio, matriz óssea desmineralizada, sulfato de cálcio e estimulação elétrica ou ultrassônica vêm sendo utilizados com resultados contraditórios e inexpressivos7,10.

Assim como na implantodontia, poucos são os estudos referentes ao uso dessas drogas em associação com esse método terapêutico; na sua maior parte, são estudos laboratoriais com eficácia clínica ainda a ser comprovada.

Pampu et al.10 (2006) avaliaram os efeitos da administração sistêmica de 0,1 mg/kg de zolendronato na densidade mineral em distrações osteogênicas com ativação de 0,5 mm a cada 12h em mandíbulas de coelhos, demonstrando que o uso do bifosfonato aumentou significativamente a densidade óssea do osso neoformado após a distração.

O estudo de Tekin et al.7 (2008) comparou o efeito da administração pós-operatória de alendronato em distrações osteogênicas em coelhos com ativação de 1 mm ou 2 mm ao dia, avaliando os resultados radiográfica e histologicamente. Foi constatado nesse estudo que a administração de alendronato durante o período de distração osteogênica foi efetiva na aceleração da neoformação óssea em ambos os grupos, sugerindo que o uso da medicação permite a ativação de até 2 mm diários.

Garcia-Moreno et al.31 (1998) constataram que altas doses de alendronato inibem a proliferação dos osteoblastos, o que prejudicaria o resultado pós-operatório.

Como não existem protocolos de administração, novos estudos sobre a administração de bifosfonatos em pacientes submetidos à distração osteogênica ainda são necessários para a obtenção da dose adequada para o uso clínico. Entretanto, os estudos prévios demonstram que o uso desses medicamentos é promissor na aceleração da neoformação óssea em distrações osteogênicas.

Bifosfonatos versus enxertos ósseos

Na cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial, a utilização de enxertos ósseos é frequentemente necessária para diversos fins, como a reconstrução de defeitos ósseos, correção de fissuras palatinas e viabilização de rebordos alveolares para instalação de implantes osseointegráveis. Seu uso, porém, pode ser prejudicado pelo processo de reabsorção do enxerto com o passar do tempo, levando a resultados instisfatórios11. Com o intuito de minimizar o processo de reabsorção dos enxertos, estudos com inibidores da atividade osteoclástica, como os bifosfonatos, vêm sendo realizados com resultados promissores11,15.

Altundal et al.11 (2007) avaliaram a ação da administração subcutânea diária de alendronato (0,25 mg/Kg) sobre enxertos ósseos realizados em ratos por um período de 12 semanas. A análise histológica revelou uma redução significativa da quantidade e do tamanho dos osteoclastos, assim como das lacunas na periferia do enxerto, quando comparadas ao grupo de controle, que recebeu a administração de solução salina.

Bell e Bell15 (2008) reavaliaram trinta pacientes que faziam uso de bifosfonatos orais e foram submetidos à enxertia óssea para posterior instalação de implantes osseointegráveis, totalizando 68 enxertos, tendo observado falha em apenas um caso. Os enxertos foram realizados com osso autógeno, membranas de colágeno e materiais xenógenos, não tendo sido relatadas deiscências ou processos infecciosos.

De particular importância, o quadro de ONIB merece especial atenção. Ainda que estudos demonstrem que as lesões tendem a ser limitadas em sua extensão, casos de grandes lesões já foram reportados, sendo a opção terapêutica de escolha nesses casos a ressecção óssea e a reconstrução por meio de enxertos4,19.

Em virtude da atividade a longo prazo da maioria dos bifosfonatos utilizados atualmente, a reconstrução dos defeitos provenientes da ressecção da peça patológica num leito com vascularização comprometida pode ser inviável. Desse modo, a utilização de enxertos microvascularizados tem sido indicada com resultados satisfatórios4,19.

De acordo com Ferrari et al.4 (2008), o enxerto de fíbula é a opção mais indicada, uma vez que proporciona quantidade de osso satisfatória para a reconstrução mandibular, devolvendo o contorno facial e permitindo a instalação de implantes osseointegráveis para a reabilitação protética. Nesse estudo, os autores apresentam um caso clínico de reconstrução total de mandíbula após mandibulectomia, em virtude da extensa área de osteonecrose em paciente portador de mieloma múltiplo tratado com bifosfonatos. Implantes dentários foram instalados no tecido ósseo do enxerto no mesmo procedimento e a prótese foi instalada 12 meses após a cirurgia, não havendo complicações pós-operatórias.

Segundo Engroff e Kim19 (2007), o sucesso dos enxertos num leito comprometido pelo uso dos bifosfonatos se deve a três fatores: 1) o processo de necrose ocorre exclusivamente em tecido ósseo, uma vez que os tecidos moles da cavidade bucal não são afetados pela medicação; portanto, uma vez que o tecido necrótico é removido e substituído por tecido ósseo sadio, o tecido mole cicatrizará normalmente; 2) o tecido ósseo tanto da mandíbula quanto da maxila apresenta alta concentração de bifosfonatos em razão do processo crônico de inflamação e da intensa atividade de remodelação óssea pela presença dos dentes, o que não ocorre com o tecido ósseo do enxerto, minimizando os riscos de necrose; 3) os bifosfonatos atuam inibindo a ação osteoclástica e diminuindo a reabsorção óssea, porém a atividade dos osteoblastos não é afetada, proporcionando neoformação óssea e integração do enxerto.

 

Considerações finais

Os medicamentos bifosfonatos são utilizados para o tratamento e prevenção de diversas enfermidades ósseas, atuando diretamente sobre a remodelação e vascularização óssea. O uso de determinadas formulações dessas drogas tem sido relacionado com o desenvolvimento de necrose óssea tanto em maxila quanto em mandíbula, sendo esta, geralmente, mais afetada.

Por outro lado, sua ação sobre a atividade dos osteoclastos vem sendo estudada com o intuito de proporcionar melhores resultados em procedimentos cirúrgicos como a instalação de implantes osseointegráveis, distração osteogênica ou reconstruções ósseas por meio de enxertos. Ainda que os resultados desses estudos sejam promissores, os protocolos para a indicação clínica dessa terapêutica ainda não estão estabelecidos. Novos estudos devem ser realizados para adequação da prescrição e dosagem dessas drogas para sua utilização efetiva como coadjuvantes nos tratamentos cirúrgicos maxilofaciais.

 

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Endereço para correspondência:
Eduardo Dias Ribeiro
Departamento de Estomatologia
Disciplina de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofaciais
Al. Dr. Octávio Pinheiro Brisola, 9-75
17012-901 Bauru - SP
Fone: (14) 3235 8258
E-mail: eduardodonto@yahoo.com.br

Recebido: 14.10.2009
Aceito: 12.04.2010