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RFO UPF

versão impressa ISSN 1413-4012

RFO UPF vol.16 no.1 Passo Fundo Jan./Abr. 2011

 

 

Análise da anatomia apical do canal radicular de pré-molares inferiores em microscopia eletrônica de varredura

 

SEM analysis of apical anatomy of mandibular premolars

 

 

Marília Ostermann Bürgel*; Maristela Gutiérrez de Borba**

* Especialista em Endodontia pela PUCRS; mestranda em Endodontia pela PUCRS – Programa de Pós-Graduação em Odontologia, Porto Alegre, RS, Brasil.
** Doutora em Estomatologia Clínica pela PUCRS; professora Titular das disciplinas de Endodontia I, II e III do curso de Odontologia da PUCRS e coordenadora do curso de especialização em Endodontia da PUCRS, Porto Alegre, RS, Brasil.

Endereço para correspondência

 

 


 

RESUMO

Objetivos: Determinar, por meio de MEV, o diâmetro médio do forame principal do canal radicular de prémolares inferiores, a distância entre o forame principal e o vértice do ápice radicular, e determinar a localização do forame principal. Métodos: Foram utilizados 45 pré-molares inferiores humanos extraídos. Com dispositivo próprio do microscópio eletrônico de varredura, foram realizadas as mensurações do diâmetro do forame e da distância deste até o vértice do ápice radicular. Foi anotada a face em que se exteriorizam as aberturas foraminais. Os dados coletados foram passados para planilhas do programa Excel® (Microsoft) e analisados por meio de tabelas, gráficos e estatística descritiva. Resultados e conclusões: 56% e 75% dos primeiros e segundos pré-molares inferiores analisados tiveram apenas uma abertura foraminal, sendo o diâmetro médio dessas equivalente a 332,6 μm e 335,6 μm para esses dentes, respectivamente. Em 24,2% dos casos o forame principal exteriorizava-se para distal e, em 21,2%, para mesial. Apenas em 9,1% dos casos o forame principal terminava exatamente no vértice apical, sendo a distância média até esse ponto nos pré-molares inferiores de 1,1 mm para os primeiros e 1,0 mm para os segundos.

Palavras-chave: Cavidade pulpar. Raiz dentária. Ápice dentário.


 

ABSTRACT

Objectives: To determine, by means of SEM, the average diameter of the root canal main foramen lower premolars, the distance between the main foramen and the vertex of the root apex and determine the location of the main foramen. Methods: Were used 45 human lower pre-molars extracted. The device itself of the scanning electron microscope, there were measurements of the diameter of the foramen and the distance of up to the apex of the root apex. It was noted that in the face if externalize. Results and Conclusions: 56% and 75% of the first and second lower pre-molars examined had only one opening foraminal, and the average diameter of these was equivalent to 332,6 μm and 335,6 μm for these teeth, respectively. In 24,2% of the cases were particularly if output to distal and mesial to 21,2%. Only in 9,1% of the cases were mainly ended exactly at the apex apical, and the average distance to that point in lower pre-molars was 1,1 mm for the first and 1,0 mm for the second.

Keywords: Dental pulp cavity. Tooth root. Tooth apex.


 

 

Introdução

O conhecimento da anatomia do canal radicular, especialmente da região apical, e a habilidade de determinar corretamente o comprimento do canal radicular podem ter um importante efeito no prognóstico da terapia endodôntica1.

A contaminação bacteriana pode atingir a parte mais apical do canal radicular e, ocasionalmente, o periápice. O melhor prognóstico para o tratamento do canal radicular é a instrumentação e obturação homogênea da constrição apical e o pior prognóstico é a instrumentação e obturação, além da constrição apical, seguido da obturação mais do que 2 mm aquém da constrição apical, combinada com pobre instrumentação e obturação2,3. A instrumentação realizada no limite ideal não somente assegurará a manutenção da "abertura apical mínima" do preparo ideal, mas também limitará a passagem de instrumentos e produtos nocivos do interior do canal radicular para os tecidos periapicais4. Há quem preconize, além da realização de patência apical, a limpeza do forame apical, o que implica a instrumentação do canal radicular em toda a sua extensão5, porém em mais de 60% dos canais radiculares o forame principal não está localizado no ápice, e a distância entre o forame principal e o ápice radiográfico varia de 0 a 3 mm3.

Esta pesquisa teve por objetivo determinar, por meio de microscopia eletrônica de varredura, o diâmetro médio do forame principal do canal radicular de pré-molares inferiores humanos, mensurando a distância entre o forame principal e o vértice do ápice radicular, além de determinar a localização do forame principal. Justifica-se esta investigação científica, uma vez que esse conhecimento propicia menores erros durante a odontometria, instrumentação e obturação do canal radicular, evitando danos ao periodonto apical.

 

Material e métodos

Foram utilizados 45 pré-molares inferiores humanos extraídos, doados pelo banco de dentes da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, sendo 25 primeiros pré-molares inferiores (n = 25) e 20 segundos pré-molares inferiores (n = 20). Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUCRS, sob o registro CEP 08/04174.

Seguindo o protocolo de Gutierrez e Aguayo6 (1995), as superfícies dentárias foram limpadas das utilizando-se curetas para remover o cálculo e tecidos periodontais. Os dentes foram imersos em hipoclorito de sódio (5,25%) por períodos variados de tempo, dependendo da decomposição completa das fibras do ligamento periodontal; após foram lavados com solução salina. Para facilitar a manipulação das amostras na câmara a vácuo do microscópio eletrônico as coroas foram removidas a uma distância de 10 mm do ápice com discos de carburundum montados em peça de mão.

Com uma broca esférica (diamantada KG-Sorensen nº 1014, São Paulo, SP, Brasil) e com um broca cilíndrica (diamantada KG-Sorensen nº 3069, São Paulo, SP, Brasil) em alta-rotação, foram feitas marcações para que as faces vestibular e mesial de cada ápice fossem respectivamente identificadas.

Os ápices foram desidratados de acordo com o protocolo do Centro de Microscopia e Microanálises da PUCRS numa sequência de soluções de álcool (50, 60 e 70%) por 10min cada em banho ultrassônico. Após, foram colocados em solução de álcool 95% durante 20min; secados com jatos de ar e colocados nos stubs; as faces vestibulares, linguais, mesiais e distais de cada amostra foram identificadas com caneta no próprio stub. Foi realizada secagem em dessecadores durante duas semanas.

Realizou-se a metalização com ouro puro das amostras, as quais foram analisadas em microscopia eletrônica de varredura (Philips - modelo XL30®, Eindhoven, North-Brabant, Holanda). Esta etapa foi realizada no Centro de Microscopia e Microanálises da PUCRS e todos os procedimentos foram realizados de acordo com o protocolo desse centro. Com dispositivo próprio do microscópio eletrônico, foram realizadas as mensurações do diâmetro do forame (Fig. 1). Foram consideradas as aberturas foraminais que possuíam diâmetro maior que 0,10 mm e as medidas realizadas no sentido do maior eixo do forame e a distância dessas até o vértice do ápice radicular (Fig. 2). Ainda, foi anotada a face em que se exteriorizam as aberturas foraminais. As fotomicrografias foram realizadas com magnificações variáveis de 40 a 500x.

Os dados coletados foram passados para planilhas do programa Excel® (Microsoft) e analisados por meio de tabelas, gráficos e estatísticas descritivas: médias, desvios-padrão.

 

 

 

 

 

Resultados

Um total de 66 aberturas foraminais foi analisado, sendo 40 de primeiros pré-molares inferiores e 26 de segundos pré-molares inferiores. Os resultados das fotomicrografias são mostrados nas Tabelas 1 a 4. As Figuras 3 e 4 mostram algumas das características anatômicas desses dentes, como aberturas foraminais e constrição apical.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Discussão

O presente estudo utilizou primeiros e segundos pré-molares inferiores do banco de dentes humanos da Faculdade de Odontologia da PUCRS. Portanto, não foi possível estabelecer a idade dos pacientes. O critério para a inclusão no estudo foi o completo fechamento do ápice radicular.

O diâmetro médio do forame principal de primeiros pré-molares foi de 332,6 μm e dos segundos pré-molares inferiores, de 335,6 μm. Esses resultados são similares aos encontrados por Morfis et al.1 (1994), com diâmetro médio de 368,25 μm para esse grupo de dentes, e também por Wu et al.7 (2000), em que o diâmetro dos canais a 1 mm do ápice foi de 370 μm. Entretanto, Kuttler8 (1955), avaliando o diâmetro do forame apical de dentes jovens e dentes adultos, constatou que o diâmetro médio do forame, considerando todos os grupos de dentes, no grupo jovem (18 a 25 anos) foi 502 μm e, no grupo idoso (55 anos ou mais), 681 μm.

Considerando o grupo de dentes utilizado nesse estudo, instrumentos de calibre 30 não agiriam em todas as paredes dessa estrutura anatômica, visto os forames terem diâmetros superiores a este calibre. Instrumentos justapostos ao forame promovem uma limpeza apical mais eficiente5,9, o que é importante principalmente nos casos de necrose pulpar com lesão periapical. Porém, esse é um estudo laboratorial, e clinicamente é necessário considerar a curvatura das raízes.

De acordo com Morfis et al. (1994)1, a presença de forames acessórios, ou seja, aqueles com diâmetros menores que 100 μm, é alta em pré-molares inferiores (85%), indicando que esse grupo de dentes apresenta variações na anatomia apical, o que pode ser uma das razões para o insucesso dos tratamentos endodônticos nesse grupo de dentes. Segundo os mesmos autores, os pré-molares inferiores apresentaram em 22,6% dos casos mais de um forame principal. No presente estudo, entretanto, foi utilizado o termo "abertura foraminal" para todos os forames com mais de 100 μm, uma vez que é difícil estabelecer qual forame deve ser considerado como principal. Assim, primeiros e segundos pré-molares inferiores apresentaram mais de uma abertura foraminal, em 44 e 25%, respectivamente.

A presença de um forame anatômico não é, necessariamente, um indicativo da existência de um canal radicular, porque dois ou mais canais radiculares podem terminar em um único forame apical. Entretanto, a presença de dois forames anatômicos pode indicar a presença de dois canais radiculares separados, um único canal radicular que se divide em dois ou um delta apical10.

No presente estudo foi feita uma linha paralela do centro do forame ao ponto mais apical do vértice radicular para mensurar a distância entre o forame e o vértice apical. A média obtida para primeiros e segundos pré-molares inferiores foi de 1,1 a 1,0 mm, respectivamente.

Gutierrez e Aguayo6 (1995) encontraram uma distância de 0,33-2,0 mm para os primeiros pré-molares e de 0,60 a 2,00 mm para os segundos pré-molares inferiores, considerando o ponto mais apical da abertura foraminal a uma linha horizontal traçada perpendicularmente ao topo do ápice. Outros autores encontraram uma distância média de 0,61 mm, sendo a mensuração feita do centro do forame anatômico ao vértice radicular1. Considerando todos os grupos de dentes, a distância foi de 0,495 mm para o grupo jovem e de 0,607 mm para o grupo idoso8.

As diferenças entre vários estudos podem ser explicadas pelos diferentes métodos de mensuração e pelo fato de que as medidas podem ter sido realizadas diagonalmente do centro do forame apical ao centro do vértice radicular8, do ponto mais apical do ápice anatômico ao ponto mais oclusal do forame anatômico11, do ponto médio do forame anatômico ao ponto mais alto do ápice anatômico12 e do ponto mais cervical do forame anatômico ao ponto mais apical do vértice radicular13.

No presente estudo, em 92,5% e 90,9% dos casos as aberturas foraminais não terminaram exatamente no vértice apical em primeiros e segundos pré-molares inferiores, respectivamente. Além disso, 24,2% das aberturas foraminais se exteriorizaram para distal e 21,2%, para mesial no mesmo grupo de dentes. Esses achados coincidem com os valores encontrados por Burch e Hulen11 (1972), que avaliaram a localização do maior forame apical em cada grupo de dentes, constatando que em 87% dos casos houve desvio do forame principal ao ápice anatômico. Em 25,3% dos casos esse desvio foi para vestibular; em 13,8%, para lingual; em 27,6%, para mesial e, em 33,3% dos casos, para distal. Já em outro estudo14, utilizando microscópio óptico para avaliar limite CDC, forame apical e constrição apical de dentes anteriores superiores, observou-se que em apenas 27,7% dos casos o forame foi localizado no vértice apical, na maior parte dos casos exteriorizando- se para o lado distal da raiz (44,4%).

O fato de as aberturas foraminais não terminarem exatamente no vértice apical contraindica o comprimento de trabalho obtido por meio do vértice radiográfico. Também deve ser considerado o fato de que as radiografias convencionais fornecem uma imagem bidimensional de uma estrutura tridimensional, além de existir sobreposição de estruturas anatômicas adjacentes. Dessa forma, os localizadores foraminais são recursos importantes na determinação correta do comprimento de trabalho15,16.

 

Conclusão

Baseado nos resultados obtidos foi constatado que:

• o diâmetro médio do diâmetro principal de primeiros pré-molares inferiores foi de 332,6 μm e para os segundos pré-molares inferiores de 335,6 μm;

• a distância média do centro do forame até o vértice apical foi de 1,1 mm para primeiros e de 1,0 mm para segundos pré-molares inferiores;

• as aberturas foraminais, na maioria das vezes, não terminaram no vértice apical, visto que em 24,2% das aberturas foraminais se exteriorizaram para distal e em 21,2% se exteriorizaram para mesial.

 

Referências

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Endereço para correspondência:
Marília Ostermann Bürgel
Rua Emílio Lucio Esteves, 1180/404
95600-000 Taquara - RS

e-mail:
mariliaburgel@hotmail.com

Recebido: 22/01/2010
Aceito: 13/10/2010