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RFO UPF

versão impressa ISSN 1413-4012

RFO UPF vol.16 no.1 Passo Fundo Jan./Abr. 2011

 

 

Evidências clínicas da técnica de apicificação utilizando barreira apical com agregado trióxido mineral – uma revisão crítica

 

Clinical evidence of the apexification technique using apical barrier with mineral trioxide aggregate – a critical review

 

 

Manoel Brito-Júnior*; Atília Ferreira**; Gabriel Lima de Oliveira**; Larissa Rodrigues Xavier**; Luis Antônio Xavier**; Patrícia Nunis de Souza Guerra**; André Luis Faria-e-Silva***

* Mestre, curso de Odontologia, Universidade Estadual de Montes Claros, Unimontes, Montes Claros, Minas Gerais, Brasil.
** Acadêmico(a), curso de Odontologia, Universidade Estadual de Montes Claros, Unimontes, Montes Claros, Minas Gerais, Brasil.
*** Doutor, curso de Odontologia, Universidade Federal de Sergipe, Aracaju, Sergipe, Brasil.

Endereço para correspondência

 

 


 

RESUMO

Objetivo: Avaliar a técnica da apicificação utilizando barreira apical com agregado trióxido mineral (MTA) por meio de estudos clínicos retrospectivos e prospectivos publicados na literatura especializada. Revisão de literatura: Fontes de catalogação bibliográfica identificadas eletronicamente por PUBMED/MEDLINE (http:// www.pubmed.gov) foram utilizadas. Os termos apexification MTA, apexification mineral trioxide agreggate, apical closure MTA, apexification immature teeth MTA foram utilizados na busca. Os artigos foram selecionados no período de fevereiro de 2005 até abril de 2010, nos seguintes periódicos: Dental Traumatology, International Endodontic Journal, Journal of Endodontics e Oral Surgery, Oral Medicine, Oral Pathology, Oral Radiology and Endodontics. A busca resultou em 28 artigos, reduzidos a cinco após aplicação dos critérios de exclusão: estudos em animais e laboratoriais, relatos de caso, estudo série de casos, estudo epidemiológico descritivo, além de revisão de literatura narrativa. Considerações finais: Os estudos clínicos analisados indicaram que o MTA é apropriado para o manejo clínico endodôntico no processo de apicificação ou quando há reabsorção apical ou amplificação mecânica excessiva da região apical dentária. Esse material promove o reparo biológico e a regeneração do ligamento periodontal e tem boa capacidade de selamento. Porém, estudos clínicos mais conclusivos sobre o uso do MTA como barreira apical nos procedimentos de apicificação são necessários.

Palavras-chave: Endodontia. Necrose da polpa dental. Ápice dentário.


 

ABSTRACT

Objective: Evaluate the apexification technique using apical barrier with mineral trioxide aggregate (MTA) by retrospective and prospective clinical studies published at specialized literature. Literature review: Sources of bibliographic cataloging identified electronically by PUBMED/ MEDLINE (http://www.pubmed.gov) were used. The terms Apexification MTA, Apexification mineral trioxide agreggate, apical closure MTA, Apexification immature teeth were used in the search. The articles were selected for the period from February 2005 until April 2010, in the following journals: Dental Traumatology, International Endodontic Journal; Journal of Endodontics e Oral Surgery, Oral Medicine, Oral Pathology, Oral Radiology and Endodontics. The search resulted in 28 articles, which were reduced to 5 after applying the exclusion criteria: laboratory and animal studies, case reports, case series study, descriptive epidemiological study, in addition to narrative literature review. Final considerations: Clinical studies reviewed indicated that the MTA is appropriate for the clinical management of endodontic apexification in the process or when there is apical resorption or excessive mechanical amplification of the apical tooth. This material promotes biological repair and regeneration of the periodontal ligament and has good sealing ability. However, more conclusive clinical studies on the use of MTA as apical barrier in apexification procedures are needed.

Keywords: Endodontics. Dental pulp necrosis. Tooth apex.


 

 

Introdução

Quando dentes com rizogênese incompleta sofrem necrose pulpar, a formação dentinária cessa e o crescimento da raiz é interrompido. Consequentemente, o canal permanece amplo, com paredes finas e frágeis, a raiz curta e o ápice aberto1. Nesses casos, é necessário que se crie uma barreira apical artificial ou que se promova a indução do fechamento apical mediante a formação de um tecido mineralizado, processo conhecido como "apicificação"1,2. Esse procedimento impede a passagem de toxinas e bactérias para os tecidos periapicais1, além de permitir a compactação da obturação no canal radicular.

O método tradicional para induzir a apicificação é o uso de pastas de hidróxido de cálcio veiculado em diferentes substâncias3,4. Apesar de sua eficácia ser comprovada por vários estudos, essa técnica clássica apresenta algumas desvantagens, tais como a variabilidade de duração da terapia e a necessidade de sucessivas trocas da medicação intracanal por longos períodos, o que aumenta a suscetibilidade à reinfecção, já que o dente durante a terapia é preenchido por selamento temporário1,2. Vale salientar ainda que o uso estendido de pastas de hidróxido de cálcio no interior dos canais radiculares favorece a maior suscetibilidade à fratura dentária5,6.

Buscando atenuar os problemas encontrados com a terapia a base de hidróxido de cálcio, alguns estudos têm indicado o agregado trióxido mineral (MTA, do inglês mineral trioxide aggregate) como alternativa promissora em apicificações7-10. O MTA apresenta-se como um pó branco ou cinza, composto por partículas hidrófilas finas de silicato tricálcico, aluminato tricálcico, óxido tricálcico e óxido de silicato, que endurece em presença de umidade11,12. Pó de óxido de bismuto tem sido adicionado ao agregado a fim de lhe conferir maior radiopacidade. Apresentando boa biocompatibilidade13,14, o MTA não promove inflamação tecidual significativa. Adicionalmente, esse material tem boa capacidade de selamento e permite o processo de reparo em diversas situações, induzindo a deposição de tecido dentinário, cementário e/ou ósseo15. Outros aspectos positivos do MTA é que não possui potencial carcinogênico16, não interfere na resposta imune mediada por macrófagos17 e tem atividade antimicrobiana18.

As vantagens do MTA sobre o hidróxido de cálcio no processo de apicificação têm sido relatadas, como a redução no tempo de tratamento, a possibilidade de restaurar o dente definitivamente de forma precoce, menor chance de fratura radicular, como também evita alterações das propriedades mecânicas da dentina em razão do uso prolongado do hidróxido de cálcio5,8,10. Além disso, melhor resposta histológica com o MTA já foi observada na apicificação em um modelo animal7. Assim, torna-se importante o conhecimento sobre o comportamento clínico desta técnica. Este estudo revisa a literatura acerca da técnica de apicificação com MTA, enfatizando seu emprego em estudos clínicos.

 

Materiais e método

Planejamento do estudo

Foi desenvolvido um planejamento de estudo a partir de uma revisão crítica de investigações publicadas na literatura especializada. Fontes de catalogação bibliográfica identificadas eletronicamente no PUBMED/MEDLINE (http://www.pubmed.gov) foram utilizadas a partir dos termos: apexification MTA, apexification mineral trioxide agreggate apexification apical closure MTA, apexification imature teeth MTA. Os artigos foram selecionados considerando- se somente aqueles publicados em periódicos na área de endodontia que apresentam elevado fator de impacto. Assim, a revisão compreendeu artigos publicados no período de fevereiro de 2005 a abril de 2010, nos periódicos Dental Traumatology, International Endodontic Journal, Journal of Endodontics e Oral Surgery, Oral Medicine, Oral Pathology, Oral Radiology and Endodontics.

Critérios de inclusão e exclusão dos estudos avaliados

Foram examinados todos os estudos publicados sobre o tema nos quatro periódicos. O acesso aos artigos completos foi realizado por meio do portal da Capes (www.periodicos.capes.gov.br). A partir disso, conforme os critérios de inclusão determinados, foram selecionados estudos clínicos prospectivos e retrospectivos que abordaram o tema "apicificação" utilizando o MTA. Os critérios de exclusão foram: estudos em animais e laboratoriais, relatos de caso, estudo série de casos, estudo epidemiológico descritivo, além de revisão de literatura narrativa.

Agrupamento das características dos estudos selecionados

As principais características dos estudos clínicos selecionados foram agrupadas, enfatizando o número de pacientes e de dentes tratados, espessura da barreira apical do MTA, uso prévio de medicação intracanal, tempo de controle e o percentual de sucesso averiguado no período de observação (Tab. 1).

 

 

 

Resultados

Do total de 28 artigos relacionados, oito envolviam relato de casos clínicos; sete, estudos laboratoriais; um, estudo epidemiológico descritivo; dois, estudos em animais; três, estudos série de casos; um, estudo clínico prospectivo; quatro, estudos clínicos retrospectivos e dois, artigos de revisão de literatura narrativa.

Assim, apenas seis estudos satisfizeram aos critérios de inclusão (Tab. 2). Na Tabela 3 estão descritas as principais características desses estudos.

 

 

 

 

 

Discussão

Considerando que dados obtidos com seres humanos constituem as melhores evidências para fundamentar determinada conduta terapêutica, a atual revisão foi norteada pela apreciação de estudos clínicos recentes que focalizaram a técnica da apicificação com MTA. Cinco estudos8,10,19-21 satisfizeram aos critérios de inclusão, reunindo o acompanhamento de 316 dentes tratados. De modo geral, foi possível verificar nesses estudos elevados índices de sucesso obtidos com a técnica da barreira apical com MTA em dentes com ápice aberto.

Entretanto, considerando as principais características dos estudos selecionados, merecem destaque análises de variáveis como número de casos avaliados, tempo de controle instituído, interpretação radiográfica da cicatrização periapical, número de sessões do tratamento e tipo de estudo conduzido. Nesta revisão, o número de casos clínicos avaliados variou de 17 a 144 e os períodos médios de observação, de um a quatro anos. É evidente que a análise de maior número de casos em tempo maior de controle permite uma avaliação mais confiável, como verificado em algumas investigações8,20.

No tocante à cicatrização periapical, medidas para diminuir a subjetividade da interpretação radiográfica, tais como índices previamente estabelecidos para registro da reparação periapical e calibração dos examinadores, preferencialmente independentes, oferecem maior credibilidade aos resultados. Nos estudos de Simon et al.8 (2007) e Holden et al.21 (2008), o índice periapical (PAI), método validado para avaliação de cicatrização apical, foi utilizado por examinadores calibrados e independentes, que avaliaram as radiografias (pré-operatórias e de controle) aleatoriamente. No trabalho de Mente et al.10 (2009), o PAI também foi utilizado, mas por único examinador participante do estudo. Nas investigações conduzidas por Sarris et al.19 (2008) e Wisterpoon et al.20 (2008), critérios menos objetivos foram utilizados para a classificação da cicatrização periapical, não ficando claro como foram realizadas a calibração e a concordância intra ou interexaminadores.

Outro aspecto a ser salientado diz respeito ao número de sessões operatórias para conclusão da apicificação com MTA. Protocolos terapêuticos utilizando aplicação tópica de medicação intracanal a base de hidróxido de cálcio no interior dos canais radiculares por períodos que variaram de uma a três semanas foram empregados previamente à confecção da barreira apical com MTA. Altos índices de sucesso foram alcançados independentemente do número de sessões utilizadas para finalizar o tratamento8,20.

Em relação à natureza dos estudos incluídos nesta revisão, três foram retrospectivos10,20,21. Este tipo de estudo geralmente apresenta limitações pela falta de padronização da conduta adotada e pela inexistência de grupo controle. Isso prejudica a comparação entre o grupo tratado e o não tratado, podendo o resultado positivo de determinada intervenção ser decorrente, por exemplo, de uma melhora espontânea, o que poderia ser atribuído erroneamente ao tipo de tratamento utilizado. Por outro lado, esse tipo de avaliação se aproxima mais da prática clínica. Similarmente, nos dois estudos prospectivos8,19 encontrados também não foram identificados grupos de controle, sendo todos os casos relatados referentes aos procedimentos de apicificação com MTA.

Trabalhos prospectivos com grupos de controle randomizados, considerados "padrão ouro" quando se tenta definir a eficácia de uma determinada conduta, não foram encontrados na literatura consultada. Assim, conforme critérios propostos por Olssom et al.22, as evidências clínicas encontradas nesta revisão sobre a técnica da apicificação com MTA deveriam ser consideradas de níveis baixo a moderado.

 

Conclusão

Com base nessa revisão pode-se dizer que:

• nos estudos clínicos selecionados, a utilização do MTA como barreira apical mostrou-se ser um procedimento clinicamente eficaz durante a apicificação;

• não foram identificados estudos clínicos controlados, que poderiam contribuir com resultados mais conclusivos para validação desta técnica.

 

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Endereço para correspondência:
André Luis Faria e Silva
Departamento de Odontologia, Campus da
Saúde "Prof. João Cardoso Nascimento Júnior",
Rua Cláudio Batista S/N – Bairro Sanatório
49060-100 Aracaju - SE

e-mail:
faria_silva@ufs.br

Recebido: 08.08.2010
Aceito: 03.11.2010