SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.17 número1 índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

RFO UPF

versão impressa ISSN 1413-4012

RFO UPF vol.17 no.1 Passo Fundo Jan./Abr. 2012

 

 

Influência do ângulo de corte radicular na microinfiltração apical, comparando duas técnicas de apicetomia na cirurgia paraendodôntica

 

Influence of the cutting angle in root apical microleakage, comparing two techniques of apicectomy in paraendodontic surgery

 

 

Gaspar Vinicius GirardiI; Mateus Silveira Martins HartmannII; José Roberto VanniIII; Volmir João FornariIV

IEspecialista em Endodontia, mestre em Odontologia pela Universidade de Passo Fundo, Brasil.
IIMestre em Endodontia pela Ulbra, professor de Endodontia da Faculdade Meridional, IMED, Brasil.
IIIDoutor em Endodontia pela UPE, professor de Endodontia da Faculdade Meriodonal, IMED, Brasil.
IVMestre em Endodontia Unaerp, professor de Endodontia da Faculdade Meridional, IMED, Brasil.

Endereço para correspondência

 

 


 

RESUMO

Introdução: a apicetomia é uma modalidade de cirurgia paraendodôntica que consiste na seção da porção apical da raiz. É realizada quando não há a regressão da lesão apical depois de esgotadas as alternativas da terapêutica endodôntica convencional, numa tentativa de eliminação dos micro-organismos apicais e seus produtos tóxicos. Objetivos: o objetivo deste estudo foi verificar a influência do ângulo de corte da raiz na apicetomia em relação à microinfiltração apical, comparando as técnicas de corte do ápice radicular em 90o e 45o. Métodos: utilizaram-se vinte incisivos centrais superiores instrumentados e obturados, divididos aleatoriamente em dois grupos. No grupo A foi realizada a seção da porção apical em 90o e no grupo B, em 45o. Para todos os grupos foi confeccionada retrocavidade com ultrassom e retrobturação com mineral trióxido agregado (MTA). Resultados: os dados obtidos por meio da medida de infiltração linear do corante foram submetidos ao teste Kolmogorov-Smirnov e ao teste de Lavene, que apresentaram distribuição normal e homogeneidade (p > 0,05). Realizou-se, então, a análise inferencial, verificando se existe diferença entre as médias dos grupos através do teste de Anova. Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa (p = 0,344) entre os grupos. Conclusão: o ângulo de corte da raiz não influenciou a microinfiltração, pois ambos os cortes avaliados permitiram infiltração apical.

Palavras-chave: Ápice dentário. Cirurgia. Endodontia. Odontologia.


 

ABSTRACT

Introduction: Apicectomy is a modality of paraendodontic surgery which consists of sectioning the root apical portion. It is done when there is no regression of the apical lesion after all endodontic therapeutic options have been tried, in an attempt of eliminating apical microorganisms as well as their toxic products. Objective: The aim of this study was to assess the influence of the root cutting angle in apicetomy, regarding apical microleakage, by comparing techniques of root apex cutting in 90o and 45o. Methods: Twenty upper central incisors were instrumented and filled, being randomly divided into two groups. In Group A, a section was performed in a 90o angle in the apical region and in Group B in 45o. For All groups, retrocavity with ultrasound and retrofilling with Mineral Trioxide Aggregate (MTA) were performed. Results: Data obtained through the linear leakage measure of the stain were submitted to Kolmogorov-Smirnov and Lavene's tests, which showed normal distribution and homogeneity (p>0.05). Inferential analysis was conducted, by verifying the differences between the means of the groups with Anova. There was no significant statistical difference (p=0.344) between the groups. Conclusion: The root cutting angle did not influence microleakage since both cuts evaluated showed apical leakage.

Keywords: Tooth apex. Surgery. Dentistry Endodontics.


 

 

Introdução

O índice de sucesso da terapêutica endodôntica pode ultrapassar os 90% em dentes biopulpectomizados e chegar a 80% nos casos de necrose pulpar1. Substâncias empregadas para a irrigação do sistema de canais radiculares, os instrumentos de níquel-titânio, as técnicas de preparo dos canais radiculares, o uso do ultrassom e do microscópio operatório são apenas alguns exemplos dos avanços que permitiram o aprimoramento das técnicas endodônticas. Entretanto, a endodontia está sujeita a falhas durante sua realização, normalmente ocasionada pela permanência e pela sobrevivência de micro-organismos no interior do canal ou do ápice radicular, nem sempre a resolução desse problema ocorre com o retratamento endodôntico.

A cirurgia paraendodôntica é o procedimento de escolha que visa à resolução dos problemas relacionados aos tecidos periapicais2 e deve ser utilizada quando não for possível a eliminação do agente etiológico pela endodontia convencional3. A cirurgia é considerada, em muitos casos, como o último recurso para a manutenção de um elemento dentário na cavidade bucal. É realizada diante da comprovaçãodo insucesso da terapia endodôntica convencional, associado com a persistência ou evolução de um processo patológico apical4.

A apicetomia é uma modalidade de cirurgia na qual se realiza a ressecção da porção apical da raiz e dos tecidos moles associados3. Dessa forma, a eliminação de micro-organismos e zonas de imperfeições apicais e o fechamento adequado dos túbulos dentinários expostos com o corte radicular configuram-se como manobras de fundamental importância para o sucesso do procedimento.

A prevalência de apicetomias decresceu ao longo dos anos. Observou-se que os incisivos centrais e laterais superiores foram os de maior incidência, tendo como principal indicação cirúrgica a impossibilidade da remoção de pino intrarradicular5.

Uma vez realizada a apicetomia, é necessário que o condicionamento da região, a retrocavidade e o material retrobturador de eleição ofereçam condições biológicas para a cicatrização e conservação do elemento dental.

Tradicionalmente preconizava-se a técnica de ressecção apical da raiz com corte em 45o, porém alguns autores observaram que realizando o corte nessa angulação uma porção palatina ou lingual é deixada sem tratamento e que o corte em 90o preserva mais a estrutura dental e melhora a relação coroa/ápice6. Vários estudos ao longo dos anos mostraram diferenças quanto à infiltração apical, quando realizado o corte do ápice radicular em 45o ou 90o em relação ao longo eixo da raiz, em razão de uma maior ou menor exposição de túbulos dentinários. Conforme o tipo de corte, poderá haver infiltração e colonização bacteriana em razão da exposição de uma maior quantidade de túbulos dentinários15,16,17, provocando muitas vezes o insucesso da cirurgia paraendodôntica.

O presente trabalho objetivou investigar a influência do ângulo de corte radicular na microinfiltração apical, comparando o nível de infiltração linear do corante rodamina B 0,2%, testando a hipótese de que a técnica de corte da raiz de 90o em relação ao seu longo eixo é mais adequada, por apresentar menor índice de infiltração de corante do que quando o corte é realizado em 45o.

 

Materiais e método

Para a realização do presente estudo, previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Uningá (parecer nº 0020/09), foram selecionados 22 incisivos centrais superiores humanos, com rizogênese completa, raízes íntegras, extraídos em razão de cárie ou de doença periodontal, obtidos em postos de saúde.

Todos os procedimentos e passos operatórios foram realizados pelo mesmo operador. Os dentes foram mantidos em solução de soro fisiológico até o início do experimento, tiveram as suas superfícies radiculares raspadas, foram lavados e esterilizados em autoclave. Para verificar se não apresentavam calcificações, reabsorções ou tratamento endodôntico prévio, radiografias periapicais foram executadas. O instrumento apical inicial não poderia ser menor do que 35 em nenhum dos dentes que foram tratados endodonticamente utilizando o sistema HERO 642® (Micro Mega, França). A cada troca de instrumento, 2 mL de hipoclorito de sódio (NaOCl) 2,5% foram utilizados para irrigação. Padronizou-se o preparo apical com o instrumento nº 45 do sistema HERO 642®, 1 mm aquém do ápice. A obturação dos canais radiculares foi realizada utilizando-se a técnica híbrida (cone principal e acessórios de gutapercha, compressão lateral e termocopactador de McSpadden). O cimento endodôntico utilizado foi o AH Plus® (Dentsply, USA).

Em seguida, os espécimes foram divididos aleatoriamente em dois grupos, A e B. Com auxílio de uma régua milimetrada, mediam-se 3 mm apicais para proceder à seção apical. No grupo A, dez dentes tiveram seus ápices radiculares cortados 3 mm aquém do ápice radicular em ângulo de 90o com o longo eixo da raiz, com o auxílio de uma broca multilaminada Zekrya® (Dentsply Millefer, Suíça), em alta rotação e sob refrigeração constante, iniciandose o corte na face mesial e terminando-se na face distal. No grupo B, dez dentes tiveram os seus ápices radiculares cortados 3 mm aquém do ápice em ângulo de 45o com o longo eixo da raiz, da mesma maneira citada no grupo A, porém com ângulo de corte apical de 45o.

Após a apicetomia confeccionaram-se as retrocavidades com o auxílio de uma ponta ultrassônica especial (S12.90) (Gnatus, Ribeirão Preto, Brasil) adaptada em um aparelho de ultrassom (Jet Sonic Gnatus) (Gnatus, Ribeirão Preto, Brasil), na potência de 60%, com irrigação de spray de água do próprio aparelho. As amostras tiveram suas superfícies radicular e coronária impermeabilizadas, recebendo, para tanto, duas camadas de esmalte para unhas, com intervalo de 24 horas para secagem, deixando-se livre apenas 2 mm do extremo apical seccionado. Depois disso, a retrocavidade recebeu um condicionamento de sua superfície com ácido etilenodiamino tetracético (EDTA) 24% gel durante três minutos. Após, os espécimes foram lavados abundantemente com água para a remoção do excesso de EDTA 24%. O material retrobturador de escolha foi o MTA (Ângelus, Londrina, Brasil), que fora manipulado conforme as orientações do fabricante e inserido nas retrocavidades com o auxílio de um porta-amálgama infantil.

Na sequência, as amostras foram imersas no corante rodamina B 0,2% e ficaram acondicionadas em uma estufa microbiológica a 37 oC durante 48 horas, com 100% de umidade. Posteriormente, as amostras foram removidas do corante e colocadas sobre compressa cirúrgica para remoção do excesso,acondicionadas em temperatura ambiente por 24h para fixação do corante e posterior clivagem.

Com um disco diamantado de dupla face KG Sorensen® (São Paulo, Brasil), montado em uma peça de mão reta, fez-se um sulco de 1 mm nas faces vestibular e palatina, em toda a extensão do dente. Após, com o auxílio de uma espátula Lecron e um martelo, os dentes foram divididos em duas metades. Depois disso, as metades foram fotografadas com uma câmera digital Nikon D-40 (USA) acoplada no microscópio ótico DF Vasconcelos – M 900 (Santos, SP), com aumento padronizado em dez vezes para todas as amostras e paralelas a uma régua milimetrada (Figuras 1 e 2), servindo de referência para a calibração do software utilizado.

 

 

 

 

 

Dois dentes foram utilizados como controle, um positivo e um negativo. No grupo de controle positivo foi realizada a endodontia e o corte apical 3 mm aquém do ápice, não sendo executado mais nenhum procedimento, com o objetivo de avaliar se o corante rodamina B 0,2% tem a capacidade de penetração na interface dentina – obturação. Já no grupo de controle negativo realizou-se a endodontia e o corte apical 3 mm aquém do ápice, porém toda a estrutura dentária foi impermeabilizada com duas camadas de esmalte, objetivando avaliar se a barreira física imposta pelo esmalte de unhas funciona, não permitindo a infiltração do corante rodamina B 0,2% na superfície do dente.

A leitura dos resultados da infiltração linear do corante, em milímetros, foi realizada com o auxílio do software Image Tool. Um operador cego e calibrado media a infiltração a partir da base do corte apical até o seu ponto mais distante, linearmente e paralelo ao longo eixo do dente, onde pudesse observar a presença do corante rodamina B 0,2%. Como durante a realização dos procedimentos dois espécimes, um de cada grupo, foram perdidos, obtiveram-se, então, 18 valores, dois de cada dente, um de cada metade, os quais foram transferidos para uma tabela no Microsoft Office Excel® (Microsoft Corporation, USA). Para a obtenção da média de infiltração linear, comparavam-se as medidas de cada metade dos dentes e utilizava-se a medida da metade que obtivera maior valor. Então, nove medidas foram obtidas, somadas e divididas por nove, que neste caso é o número total de amostras utilizadas, obtendo-se, assim, a média da infiltração linear por grupo.

Os dados originais foram inicialmente digitados em uma planilha do Excel e posteriormente exportados para o programa SPSS 15.0 para análise estatística.

Foram realizados testes para conhecer os dados de infiltração apical dos dois grupos. Os dados apresentaram-se com distribuição normal (p > 0,05), segundo o teste Kolmogorov-Smirnov. As variâncias apresentaram-se com homogeneidade (p > 0,05), segundo o teste de Lavene.

 

Resultados

Realizou-se a análise descritiva dos dados de infiltração apical dos dentes obturados com MTA com ângulos de corte apical de 45o ou de 90o, a qual se encontra na Tabela 1.

 

 

 

Após, foi realizada análise inferencial para verificar possíveis diferenças entre as médias dos grupos, utilizando o teste de análise de variâncias (Anova). Não houve diferença estatisticamente significante (p > 0,05) entre o grupo com ângulo de corte de 90o e o de 45o (Figura 3). Os valores da análise de variância encontram-se na Tabela 2.

 

 

 

 

 

Discussão

O avanço das técnicas endodônticas convencionais tem proporcionado altos índices de sucesso na resolução de problemas endodônticos, refletindo diretamente na diminuição dos casos de cirurgia paraendodôntica. Porém, a técnica é crítica, devendo ser seguida criteriosamente para a obtenção de um bom resultado. Sabe-se ainda que, como todo procedimento, a técnica é passível de erros e está sujeita a insucessos em razão de fatores microbiológicos e de ordem extrínseca ou intrínseca, que nem sempre podem ser resolvidos apenas com o retratamento endodôntico do canal radicular.

Diante do exposto, nota-se a importância da cirurgia paraendodôntica nos casos em que, mesmo com a utilização de todas as alternativas de tratamento da endodontia convencional, não há a regressão de lesões periapicais7. Nesses casos, é necessária a indicação da cirurgia paraendodôntica objetivando a manutenção do elemento dentário4.

A ressecção apical pode ou não estar associada à retrobturação do canal, procedimento que busca vedar o ápice radicular quando a obturação convencional não atingiu o selamento esperado. Nesse sentido, a cirurgia apical deve ser considerada uma extensão do tratamento endodôntico, não uma manobra independente, uma vez que não substitui um tratamento endodôntico deficiente2.

Para a realização de trabalhos de pesquisa in vitro, há a necessidade da padronização dos espécimes a fim de minimizar interferências. Neste trabalho, os dentes de eleição foram incisivos centrais superiores, com rizogênese completa, uma vez que apresentam pouca variação anatômica, contendo geralmente apenas um canal radicular. Foram selecionados 22 espécimes para o experimento. Vinte espécimes para a execução dos cortes, quantidade suficiente e com valor científico, conforme sugerem alguns autores em seus trabalhos8,9,10,11, e dois para controle, um positivo – em que o corante penetrou completamente na massa obturadora e na dentina, e outro negativo – em que o impermeabilizante não permitiu a infiltração do corante.

Durante a realização do experimento, dois espécimes, um de cada grupo, foram perdidos por problemas na execução da técnica, que levou à infiltração de corante rodamina B 0,2% por outras vias que não a apical, deixando a amostra sem condições de análise. Todavia, esse fato não influenciou nos resultados estatísticos, uma vez que o número de espécimes analisados foi suficiente para o fim pretendido. O corte apical nas amostras foi padronizado em 3 mm aquém do ápice, já que esta é a área com maior probabilidade de se encontrar deltas apicais e saídas de canais laterais, os quais devem ser englobados na área de ressecção objetivando a eliminação total de nichos de acúmulo6, com o que concordamos. Alguns autores obtiveram melhores resultados de selabilidade quando eliminados 3 mm apicais em ângulo de corte de 90o em relação ao longo eixo da raiz12. Do mesmo modo, os estudos, avaliando o selamento apical de diferentes materiais retrobturadores utilizando um corte apical de 2 mm aquém do ápice, obtiveram resultados semelhantes às pesquisas em que o corte apical foi feito 3 mm aquém do ápice dentário8,13.

A angulação do corte apical é uma das questões mais discutidas. As primeiras pesquisas, ainda na década de 1970, enfatizavam que a ressecção apical deveria ser realizada com angulação de 45o em relação ao longo eixo do dente, com bisel voltado para o operador, possibilitando melhor visualização do ápice radicular14. Contudo, essa afirmação foi contestada anos mais tarde, quando autores relataram que, com o aumento da angulação, aumenta-se também a área da superfície dos túbulos dentinários expostos, tornando-os, assim, mais alongados na direção vestibulolingual, podendo ocasionar infiltração e levar ao insucesso do procedimento15. Estudos mais recentes também discordam do ângulo de corte em 45o, afirmando que a seção apical realizada nessa angulação produz irregularidades propícias à contaminação bacteriana16, ressaltando ainda que quanto mais se cortar a raiz de um dente no sentido cervicoapical, mais estarão sendo expostos túbulos dentinários17.

Estudos afirmam que a eliminação ou a minimização do ângulo de corte apical é o benefício mais importante da técnica de cirurgia paraendodôntica atual, já que quanto menor o ângulo de corte, menor será a infiltração, em virtude da menor exposição de túbulos dentinários, menor osteotomia e menor perigo de comunicação18. O corte realizado em 90o em relação ao longo eixo do dente melhora a relação coroa/raiz, preserva a estrutura dental e elimina maior quantidade de defeitos apicais6. Clinicamente, pode-se observar cicatrização apical em mais de 90% de casos submetidos à técnica cirúrgica com ressecção apical em ângulo de 90o, quando comparada às cirurgias que realizaram corte apical em 45o, nas quais menos da metade dos casos obtém sucesso19.

A técnica de corte apical em 90o requer a utilização de pontas ultrassônicas para a confecção das cavidades retrógradas, permitindo, dessa forma, uma profundidade padrão de preparo de 3 mm em todas as paredes da raiz. Com o corte em 45o também pode ser realizada a confecção da retrocavidade com ponta ultrassônica, porém sem admitir igual profundidade em razão de a parede lingual e/ou palatina do preparo ser maior.

O corte da porção apical da raiz pode ser realizado com brocas de aço tronco cônicas, brocas diamantadas, broca tronco cônica diamantada ou Zecrya, objetivando prover uma superfície regular e uniforme, diminuindo, assim, a probabilidade de contaminação bacteriana nas irregularidades remanescentes16. Ancorados pelos conceitos atuais de cirurgia paraendodôntica e instigados pela diferença de metodologia dos trabalhos que investigam a infiltração apical, os quais não concordam no que diz respeito ao ângulo de corte apical, o presente estudo realizou o experimento avaliando apenas a variável do corte da raiz em relação à microinfiltração apical, padronizando a confecção da retrocavidade e o material retrobturador.

A incorporação do uso do ultrassom na endodontia permitiu um avanço na técnica de retrocavitação. Pontas ultrassônicas foram desenvolvidas especialmente para este fim. Nesse trabalho, as retrocavidades foram realizadas utilizando a ponta ultrassônica S12.90 (Gnatus), adaptada a um aparelho de ultrassom, conforme alguns autores indicaram em seus estudos10,11,20,21,22.

Inúmeros estudos visam avaliar a capacidade e a qualidade do selamento apical dos materiais utilizados para retrobturação, por meio de testes de infiltração de corante entre as paredes do canal radicular e o material obturador. Porém, não há padronização do corte apical nem da confecção de retrocavidades nas metodologias encontradas. Os trabalhos apresentam uma variedade de combinações entre as técnicas. Experimentos são realizados com cortes apicais em 90o ou em 45o em relação ao longo eixo da raiz, 2 mm ou 3 mm aquém do ápice, retrocavidades são confeccionadas com pontas de ultrassom ou brocas esféricas, com profundidades variando entre 2 mm ou 3 mm8,18,20,21,25,26.

No entanto, a maior parte desses trabalhos já rea lizados concorda quanto aos materiais que apresentam melhor qualidade de selamento apical, que são os cimentos à base de MTA, ionômero de vidro fotopolimerizável e o Sealer 262,8,23,26. Neste trabalho, a escolha do material retrobturador levou em consideração os requisitos de impermeabilidade, biocompatibilidade, atividade antimicrobiana, bem como o fato de serem atóxicos, bem tolerados pelos tecidos apicais, proporcionarem reparo, não serem reabsorvidos e não mancharem os tecidos subjacentes. Optou-se, então, por realizar as retrobturações com o MTA (Ângelus), por entender que o mesmo não é sensível à umidade, é de fácil manipulação e, segundo a revisão de literatura, apesar de apresentar resultados um pouco menos satisfatórios quando comparado ao Vitremer®, ainda pode ser considerado satisfatório como material retrobturador apical8,13,21,23,24,25,26. Histologicamente, o MTA apresenta uma cicatrização tecidual mais favorável quando comparado a outros materiais, mas sem diferença estatística quando comparado ao IRM27.

A opção em utilizar a rodamina B 0,2% tamponada foi baseada em trabalhos realizados, nos quais os resultados demonstraram o comportamento mais estável desse corante quanto à densidade ótica até o período de avaliação de 48 horas, sugerindo, assim, uma melhor capacidade de evidenciar falhas no selamento marginal20. Outra justificativa para a referida escolha é que esse material não sofre interação química com o material retrobturador, já que a presença de óxido de cálcio na constituição do MTA pode apresentar interação com o azul de metileno, promovendo resultados não confiáveis28.

A utilização do microscópio ótico na endodontia é uma realidade, e sua utilização nas cirurgias apicais é de fundamental importância em face das técnicas disponíveis6. Para a aferição dos resultados da microinfiltração, a presente pesquisa utilizou o microscópio para visualizar e fotografar os espécimes objetivando a medição da infiltração linear do corante por meio da morfometria computadorizada do software Image Tool24.

Baseados na metodologia aplicada, os resultados demonstraram não haver diferença estatisticamente significante entre os dois grupos de cortes apicais 90o ou 45o. Assim, a realização deste trabalho prevê novas perspectivas de investigação da influência do ângulo de corte na microinfiltração apical, utilizando-se outros materiais retrobturadores com o objetivo de verificar qual oferece menor nível de infiltração apical e, consequentemente, melhor selamento apical após as cirurgias paraendodônticas com ressecção apical.

 

Conclusão

A análise dos resultados obtidos, de acordo com a metodologia e as condições experimentais desta pesquisa, permitiu concluir que em ambos os cortes houve infiltração apical, em maior ou menor quantidade, não havendo diferença estatisticamente significante entre os níveis de infiltração dos grupos, não comprovando, dessa maneira, a hipótese de que os espécimes com corte apical em 90o apresentariam menor infiltração de corante.

 

Referências

1. Trope M. Implant or root canal therapy: an endodontist view. J Esthet Restor Dent 2005; 17(3):139-40.         [ Links ]

2. Costa Filho JC. Estudo" in vitro" do selamento apical de materiais retrobturadores em função da profundidade dos retropreparos. [Dissertação de Mestrado]. Natal: Universidade Potiguar; 2006.         [ Links ]

3. Orso VA, Sant'ana Filho M. Cirurgia paraendodôntica: quando e como fazer. Rev Fac Odontol Porto Alegre 2006; 47(1):20-3.         [ Links ]

4. Azambuja TWF, Bercini F, Alano F. Cirurgia paraendodôntica: revisão da literatura e apresentação de dois casos clínico – cirúrgicos. Rev Fac Odontol Porto Alegre 2006; 47(1):24-9.

5. Volkweis M, Silveira M, Thorell S,Wagner JCB. Estudo da prevalência de apicetomias. BCI Curitiba 2001; 9(32):287-93.         [ Links ]

6. Stropko JJ, Doyon GE, Gutmann JL. Root-end management : resection, cavity preparation, and material placement. Endod Topics 2005; 11:131-51.         [ Links ]

7. Peters CI, Peters OA, Barbakow F. An in vitro study comparing root-end cavities prepared by diamond-coated and stainless steel ultrasonic retrotips. Int Endod J 2001; 34:142-8.         [ Links ]

8. Bernabé PFE Holland R, Morandi R, de Souza V, Nery MJ, Otoboni Filho JA et al. Comparative study of MTA and other materials in retrofilling of pulpless dog's teeth. Braz Dent J 2005; 16(2):149-55.         [ Links ]

9. Bramante CM, Torres M, Morais IG, Bernadineli N. Avaliação da superfície apical após apicetomia e alisamento com instrumentos manuais e mecanizados. J Bras Endod 2003; 4(13):105-9.         [ Links ]

10. Peters CI, Peters OA, Barbakow F. An in vitro study comparing root-end cavities prepared by diamond-coated and stainless steel ultrasonic retrotips. Int Endod J 2001; 34:142-8.         [ Links ]

11. Pozza, DH, Woitchunas GP, Cunha Filho JJ, Xavier CB, Pinheiro ALB, Oliveira MG. Análise comparativa entre duas técnicas de cirurgia paraendodôntica. RFO. 2006; 11(2):60-3.         [ Links ]

12. Taschieri S, Del Fabbro M, Francetti L, Testori T. Effect of root-end resection and root-end filling on apical leakage in the presence of core-carrier root canal obturation. Int Endod J 2004; 37:477-28.         [ Links ]

13. Tanomaru Filho M, Tanomaru JMG, Ishikawa TM. Capacidade de selamento apical de materiais retrobturadores à base de Agregado Trióxido Mineral. J Bras Endod 2003; 4(12):20-3.         [ Links ]

14. Ingle JI & Beveridge EE. Cirurgia Endodôntica. In: Ingle JI. Endodontia. 2a ed. Rio de Janeiro: Interamericana Ltda; 1979. p. 546-626.         [ Links ]

15. Carr GB. Cirurgia em Endodontia. In: Cohen S, Burns RC. Caminhos da Polpa. 6a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Kogan; 1994. p. 533-69.         [ Links ]

16. Lin S, Platner O, Metzger Z, Tsesis I. Residual bacteria in root apices removed by a diagonal root-end resection: a histopatological evoluation. Int Endod J 2008; 41:469-75.         [ Links ]

17. Marques AMC. Analise "in vitro" da presença de infiltração apical em dentes apicetomizados com técnica convencional e com o Laser de Er:YAG. [Tese de Doutorado]. Salvador: Universidade Federal da Paraíba e Universidade Federal da Bahia; 2004.         [ Links ]

18. Kim S, Kratchman S. Modern endodontic surgery concepts and pratice: a review. J Endod 2006; 32(7):601-21.         [ Links ]

19. Tsesis I, Rosen E, Schwartz-Arad D, Fussz. Retrospective evaluation of surgical endodontic treatment: traditional versus modern technique. J Endod 2006; 32(5):412-5.         [ Links ]

20. Souza SNG, Bramante CM, Bernardeli N. Preparo cavitário apical – comparação entre duas técnicas. Rev Odont Univ São Paulo1995; 9(4):259-64.

21. Assis NMSP, Gomes APM, Visconti Filho RF, Valera MC, Indefonso PRE. Avaliação do selamento de ápices radiculares preparados com ultra-som e brocas e retrobturados com diferente materiais mediante infiltração marginal por corante. Rev Odontol UNESP. 2003; 32(1):1-8.         [ Links ]

22. Bernardes RA, de Moraes IG, Garcia RB, Bernardinei N, Baldi JV, Victorino FR et al. Evoluation of apical cavity preparation with a new type of ultrasonic diamond tip. J Endod 2007; 33(4):484-7.         [ Links ]

23. Araújo RA, Delboni MG, Bueno CES, Miguita KB, Cunha RS. Avaliação do selamento apical após retrobturações com a utilização de diferentes marcas de MTA. J Bras Endod 2004; 5(17):150-6.         [ Links ]

24. Hellwig I, Cancino CMH, Vanzin ACM, Weber JBB, Oliveira MG. Analise comparativa da microinfiltração marginal em retrobturações com MTA e cimento de Ionomero de Vidro. Stomatos 2007; 13(25):103-12.         [ Links ]

25. Pozza DH, Moreira CC, Post LK, Xavier CB, Oliveira MG. Avaliação de técnica cirúrgica paraendodôntica: apicetomia em 90º, retrocavitação com ultra-som e retrobturação com MTA. Revista Odonto Ciência. 2005; 20(50):308-12.         [ Links ]

26. Silva Neto UX, Brochado VHD, Gonçalves Jr. JF, Westphalen VPD, de Moraes IG. Infiltração marginal em obturações retrogradas realizadas com Pro Root – MTA, MTA – Angelus e Super – EBA. J Bras Endod 2003; 4(13):149-52.

27. Tawil PZ, Trope M, Curran AE, Caplan DJ, Kirakozova A, Duggan DJ et al. Periapical microsurgery: an in vivo evalua tion of endodontic root-end filling materials. J Endod 2009; 35(3):357-62.         [ Links ]

28. Brandão CG. Confiabilidade dos testes de infiltração apical com azul de metileno, rodamina B e sistema de transporte de fluidos em obturações de canais após uso de curativo com hidróxido de cálcio [Tese de Doutorado]. Bauru: Faculdade de Odontologia de Bauru, USP; 2005.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
Gaspar Vinicius Girardi
Rua Ivo Pio Brum, 83, Bairro São Cristóvão
99064-010 Passo Fundo - RS

e-mail:
dentista_girardi@yahoo.com.br

Recebido: 09/08/2010
Aceito: 01/03/2012