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RFO UPF

versão impressa ISSN 1413-4012

RFO UPF vol.21 no.1 Passo Fundo Jan./Abr. 2016

 

 

Resistência de união e degradação de um compósito fluido autoaderente em substratos dentais e um compósito restaurador

 

Bond strength and degradation of a self-adhesive flowable composite in dental substrates and a restorative composite

 

Rubens Nazareno Garcia I; Ana Paula de Lucca Werlich II; Bárbara Pamela Siqueira da Costa II; Flávia Carvalho Gonçalves II; Juliani Rafaeli II; Priscila Carla Dambros II

 

I Professor doutor do curso de Odontologia, Universidade do Vale do Itajaí, SC, Brasil – Grupo de Pesquisa Biomateriais em Odontologia e departamento de Odontologia, Universidade da Região de Joinville, SC, Brasil
II Acadêmica do curso de Odontologia, Universidade do Vale do Itajaí, SC, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


 

Resumo

Objetivo: avaliar a resistência de união (RU) de um compósito autoaderente em quatro substratos usados na técnica direta, nos períodos de uma semana e de um ano de armazenamento em água destilada. Materiais e método: foram utilizadas 96 amostras (5 mm largura / 15 mm comprimento / 2 mm espessura) de dentes bovinos – esmalte hígido (EH), esmalte desgastado (ED), dentina média (DM) – e do compósito restaurador direto (CD) Filtek Z350 XTR (3M ESPE), sendo 24 amostras por substrato. As amostras foram divididas em dois grupos, conforme o período de armazenamento. Foram utilizados dois compósitos fluidos: o controle Filtek Z350XT FlowR (3M ESPE) (FF) e o autoaderente Dyad FlowR/Kerr (DF), aplicados aos quatro substratos (n=6). Em cada amostra, foram posicionadas quatro matrizes cilíndricas transparentes, preenchidas com os compósitos FF/DF, e fotopolimerizadas por vinte segundos. As matrizes foram removidas para expor os corpos de prova (24 por grupo) e armazenadas em água destilada 37±2oC por dois períodos, uma semana e um ano. Após cada período, os corpos de prova foram submetidos ao ensaio de resistência de união ao cisalhamento (velocidade de 1,0 mm/min). Os resultados foram analisados pelo ANOVA/teste de Tukey (p < 0,05). Resultados: nos ensaios de uma semana, o DF, o ED e o CD apresentaram maior RU, não diferindo entre si. O EH e o DM apresentaram menor RU, sem diferença significativa. Nos ensaios de um ano, com o DF, o comportamento foi similar, porém com menor RU para o EH e o DM. Conclusão: os resultados mostram que o compósito Dyad FlowR, após um ano de armazenamento em água destilada, apresentou resistência de união superior ao cisalhamento nos substratos esmalte desgastado e compósito direto.

Palavras-chave: Dentina. Esmalte dentário. Resinas compostas. Resistência ao cisalhamento.

 

Abstract

Objective: This study aimed to assess the shear bond strength (SBS) of a self-adhesive flowable composite in four substrates used in the direct technique, with one week and one year of storage in distilled water. Materials and method: Ninety-six samples (5-mm wide / 15-mm long / 2-mm thick) of bovine teeth - uncut enamel, cut enamel, medium dentin - and direct restorative composite/CD Filtek Z350XT™ (3M ESPE) were used; there were 24 samples per substrate. The samples were divided into two groups according to storage time. Two flowable composites (Control/FF - Filtek Z350 XT Flow™/3M ESPE, and the self-adhesive/DF - Dyad Flow™/Kerr) were bonded to the four substrates (n=6). Four tubings were positioned on each sample, filled with FF/DF composites, and light-cured for 20 s. The tubings were removed to expose the specimens (24 per group) and stored in distilled water at 37±2°C for one week and one year. After each period, the specimens were subjected to the Shear Bond Strength (SBS) test (speed of 1.0 mm/min). The results were analyzed by Anova and Tukey's test (p<0.05). Results: For the one-week tests with DF composite, cut enamel and direct restorative composite showed higher SBS, with no difference between themselves. Uncut enamel and medium dentin presented lower SBS, with no significant difference. For the one-year test with DF composite, the behavior was similar, however uncut enamel and medium dentin showed lower SBS. Conclusion: The results show that Dyad Flow™ composite, after one year of storage in distilled water, showed higher shear bond strength in cut enamel and direct composite substrates.

Keywords: Composite resins. Dental enamel. Dentin. Shear strength.

 


 

Introdução

A introdução da técnica do condicionamento ácido do esmalte por Buonocore1, em 1955, criou nova perspectiva nos procedimentos restauradores, dando início à Odontologia Adesiva. Ainda que os sistemas adesivos convencionais sejam largamente utilizados2, os adesivos autocondicionantes permitem procedimentos clínicos mais simples, rápidos e com menor sensibilidade envolvendo a técnica3. A ação desses produtos no substrato dental envolve a simultânea desmineralização da estrutura dental e a infiltração na mesma profundidade, garantindo a completa penetração do adesivo4, além da interação química entre os monômeros funcionais e a hidroxapatita residual5.

Os compósitos fluidos foram, primeiramente, introduzidos no mercado em 1995, para restaurações de lesões Classe V. De acordo com Bayne et al.6 (1998), eles apresentam excelentes propriedades de manuseio por terem baixa viscosidade e reduzem o tempo de trabalho dos clínicos. Seguindo as mesmas características, foi, recentemente, introduzido no mercado o compósito autoaderente Vertise FlowR (Kerr, Orange, CA, USA – chamado Dyad Flow na América Latina), assim como o Fusio (Pentron Clinical, Orange, CA, USA) e o ConsticR (DMG America, Englewood, NJ, USA). Esses compósitos não necessitam da aplicação prévia de um sistema adesivo e são requeridos por contar com a interação química e micromecânica entre o material e a estrutura dental ou outros substratos, alcançadas com a incorporação de um monômero ácido7-9.

O objetivo deste estudo foi avaliar a resistência de união (RU) de um compósito autoaderente em quatro substratos usados na técnica direta, com uma semana e com um ano de armazenamento em água destilada. A hipótese nula testada foi de que as resistências de união do compósito fluido autoaderente seriam estatisticamente similares quando comparados os tempos de armazenamento.

 

Materiais e método

Foram utilizadas 96 amostras (5 mm largura, 15 mm comprimento e 2 mm espessura) de dentes bovinos. As raízes dos dentes bovinos foram removidas com o auxílio de um disco flexível diamantado (KG SorensenR, Cotia, SP, Brazil) sob refrigeração. As coroas foram seccionadas, utilizando o mesmo disco diamantado e também sob refrigeração, para obter 24 amostras de esmalte hígido/EH, 24 amostras de esmalte desgastado/ED (abrasionados com lixa d'água, granulações 200 e 600) e 24 amostras de superfícies planas de dentina média DM (1 mm abaixo da junção amelodentinária). Anteriormente aos procedimentos adesivos, as amostras de dentina foram abrasionadas com lixa d'água 600 para criar lama dentinária. Ainda, 24 blocos do compósito restaurador direto Filtek Z350 XTR/CD (3M ESPE) foram preparados na mesma dimensão das amostras dos dentes bovinos.

As amostras de cada substrato foram divididas em dois grupos para cada período de armazenamento (n=6), e os produtos foram utilizados de acordo com as instruções dos fabricantes. Dois compósitos fluidos foram aplicados aos quatro substratos: o controle Filtek Z350 XT FlowR (3M ESPE) (FF) e o autoaderente Dyad FlowR / Kerr (DF) (Quadro 1). Para o Filtek Z350 XT FlowR, o protocolo adesivo envolveu a aplicação do ácido fosfórico por 30 segundos no esmalte hígido e desgastado (e também nos blocos do compósito Filtek Z350 XTR) e 15 segundos na dentina, lavagem, secagem 5 segundos, aplicação do adesivo, ar 5 segundos e fotopolimerização por 10 segundos. No Dyad FlowR, o protocolo adesivo envolveu a aplicação do ácido fosfórico por 30 segundos no esmalte hígido e desgastado e no compósito Filtek Z350 XTR. Esse tratamento não ocorreu na dentina, conforme recomendações do fabricante.

 

 

 

De acordo com Shimada et al.10 (2002), para todos os grupos e em cada amostra, quatro matrizes cilíndricas (Tygon tubing – TYG-030, Saint-Gobain Performance Plastic, Maime Lakes, FL, USA) foram posicionadas, as quais foram preenchidas com os compósitos FF e DF e fotopolimerizadas por 20 segundos (LED BluephaseR – 1.200 mW/cm2 – Ivoclar Vivadent, Schaan, Principado de Liechtenstein). As matrizes cilíndricas foram removidas para expor os corpos de prova (24 cilindros por grupo com área de 0,38 mm2 pela fórmula πR2) e as amostras armazenadas em água destilada a 37±2oC por uma semana e por um ano (com trocas semanais de água). Após cada período, as amostras foram acopladas a uma máquina de ensaios universal (EMIC DL 1000R, São José dos Pinhais, PR, Brasil) e os corpos de prova submetidos ao ensaio de resistência de união ao cisalhamento, aplicado na base dos corpos de prova com um fio ortodôntico fino/0,25mm – a uma velocidade de 1,0 mm/min – até o rompimento da união (Figura 1).

 

 

 

Foi utilizada microscopia óptica para avaliação das fraturas/falhas, que foram classificadas em adesivas, mistas (adesivas e coesivas) e coesivas nos substratos. Os resultados foram analisados pela Análise de Variância/ANOVA multifatorial (dois compósitos fluidos, quatro substratos e dois tempos) e pelo teste de Tukey (p < 0,05).

 

Resultados

A análise de variância ANOVA multifatorial mostrou diferenças significativas entre os compósitos fluidos, substratos e tempos (p < 0,05). Para identificar as diferenças foi aplicado o teste de Tukey (p < 0,05).

Nos ensaios de uma semana com o produto controle Filtek FlowR, somente o esmalte hígido resultou em menor resistência de união, ainda que sem diferença significativa para o esmalte desgastado. Para o Dyad FlowR, o esmalte desgastado e o compósito direto apresentaram maior resistência de união, não diferindo entre si. Comparando os compósitos Flow em cada substrato, não houve diferença estatística para o esmalte hígido e para o compósito direto, porém, o Dyad FlowR apresentou maior resistência de união em esmalte desgastado. O mesmo não ocorreu na dentina média, pois o Filtek FlowR resultou em maior resistência de união (Tabela 1).

 

 

 

Nos ensaios de um ano com o produto controle Filtek FlowR, somente o compósito direto resultou em maior resistência de união, e a dentina média mostrou a menor resistência de união entre todos os substratos, com diferença estatística. Para o Dyad FlowR, o esmalte desgastado e o compósito direto apresentaram maior resistência de união, não diferindo entre si. Comparando os dois compósitos Flow em cada substrato, somente o substrato esmalte desgastado não apresentou decréscimo na resistência de união após um ano de armazenamento em água (Tabelas 2 e 3).

 

 

Comparando os resultados para os tempos de uma semana e de um ano, para o Filtek FlowR, não houve diferença estatística na resistência de união para todos os substratos. No entanto, para o Dyad FlowR, houve um decréscimo na resistência de união nos substratos esmalte hígido e dentina média, com diferença significativa para o esmalte desgastado e o compósito direto, que apresentaram maior resistência de união (Tabela 3).

 

 

 

Na microscopia óptica, foram observadas falhas mistas para todos os grupos, incluindo, principalmente, falhas coesivas nos substratos, na transição da falha adesiva para coesiva. Esse tipo de fratura é, habitualmente, observada nos ensaios de cisalhamento.

 

Discussão

Com base nos achados do presente estudo, a hipótese nula formulada não deve ser rejeitada para o esmalte desgastado e o compósito direto. No entanto, deve ser rejeitada para o esmalte hígido e para a dentina média, porque os resultados mostraram diferenças estatisticamente significativas nas resis tências de união ao cisalhamento, com um ano de armazenamento em água destilada.

Embora ensaios clínicos produzam evidências mais confiáveis e a tradução dos resultados in vitro para as condições bucais apresentem limitações, os testes laboratoriais são úteis em produzir informações mais rápidas que norteiam o uso clínico dos materiais odontológicos. Especificamente, ensaios de resistência de união têm sido considerados por fornecer uma avaliação quantitativa da união e/ ou adesão dos materiais, baseados no conceito de que quanto maior a união e/ou adesão, mais o material irá resistir ao estresse de contração e funcional. Dentre eles, os mais efetivos são os ensaios de microtração, largamente utilizados e responsáveis pelos resultados mais confiáveis em termos de resistência de união. No entanto, pela facilidade de obtenção dos corpos de prova nos ensaios de cisalhamento e microcisalhamento, eles têm sido também muito utilizados para testes mecânicos dos materiais adesivos3,11.

A presente pesquisa avaliou a resistência de união ao microcisalhamento de dois compósitos fluidos, o controle Filtek FlowR e o autoaderente Dyad FlowR, com foco nesse último, por ser uma nova classe de material adesivo. Os compósitos fluidos foram aderidos a quatro substratos utilizados na técnica direta, utilizando a metodologia do microcisalhamento proposta por Shimada et al.10 (2002), em dois períodos de tempo: uma semana e um ano. Esse tipo de ensaio mecânico soluciona problemas relacionados à propagação das tensões na interface de união em áreas maiores. Apresenta a vantagem de que vários corpos de prova podem ser obtidos a partir de uma amostra, sendo mais fácil e mais barato do que os testes de microtração8,9, nos quais as amostras devem ser cortadas para que sejam obtidos os corpos de prova12.

Como o mecanismo de ação dos sistemas adesivos autocondicionantes é similar aos compósitos fluidos autoaderentes, ou seja, ocorre pela ação simultânea dos monômeros mais ácidos nos substratos, parece pertinente discutir os resultados obtidos com os compósitos aderentes na mesma linha de raciocínio. A adesão à superfície do esmalte é baseada na infiltração dos monômeros resinosos ao esmalte condicionado, e um ótimo padrão de condicionamento é observado quando se utiliza a técnica convencional de condicionamento utilizando o ácido fosfórico. Adicionalmente, os sistemas adesivos autocondicionantes também têm sido preconizados para esse tipo de procedimento como um substituto adequado para os sistemas convencionais13.

Contudo, ainda existe alguma preocupação com relação à habilidade desses adesivos autocondicionantes em condicionar o esmalte. Muitos estudos mostraram que a resistência de união do compósito ao esmalte, fornecida por adesivos ultrassuaves, suaves ou intermediários, é menor quando comparada aos sistemas convencionais14-17. Porém, os sistemas autocondicionantes parecem ter um bom desempenho em estudos clínicos18, e o condicionamento seletivo do esmalte com ácido fosfórico demonstrou ser uma técnica de excelência se utilizada com os sistemas autocondicionantes, melhorando a união ao esmalte19-21.

Para este estudo, de acordo com as instruções dos fabricantes, o esmalte hígido e o esmalte desgastado foram condicionados com ácido fosfórico nas amostras do grupo controle e, adicionalmente, condicionados com ácido fosfórico nos grupos DF. De acordo com Van Meerbeek et al.3 (2003), o condicionamento ácido prévio do esmalte melhora significativamente a efetividade da união, uma vez que o ácido fosfórico aumenta a energia de superfície do esmalte e proporciona mais microrretenção22.

Conforme pode ser observado nas Tabelas 1 e 2, para o produto DF, houve diferença estatística entre o esmalte hígido e o esmalte desgastado, com maior resistência de união para o esmalte desgastado, para ambos os tempos. Di Hipólito23 (2005) descreve o mecanismo de ação dos monômeros resinosos com o esmalte, que é devido a uma sequência de fenômenos interdependentes. Possivelmente, fatores como o aumento dos espaços inter e intraprismáticos para a infiltração dos monômeros resinosos, quebrando a tensão superficial do monômero líquido e a formação de um ângulo de contato menor com a superfície do esmalte, são responsáveis pela maior resistência de união ao esmalte desgastado. Ainda, a exposição da camada prismática pode ter favorecido a qualidade do processo de desmineralização e a infiltração do compósito fluido DF. A Tabela 3 mostra que não houve significativo decréscimo de união para o esmalte desgastado com um ano de armazenamento em água destilada.

Baseado no pH 1,9 declarado pelo fabricante (antes da fotopolimerização), é possível dizer que o Dyad FlowR pode interagir de forma semelhante a um sistema adesivo autocondicionante suave, sendo suficiente para desmineralizar, principalmente, o esmalte desgastado e interagir de forma similar também com o compósito restaurador Filtek Z350 XTR (para ensaios de uma semana, de um ano e para a comparação dos tempos). O Dyad Flow tem um elemento em comum com todos os agentes de união do fabricante Kerr, que é o monômero adesivo GPDM (glicerol fosfato dimetacrilato), um grupo fosfato funcional que cria uma interação química com os íons de cálcio da estrutura dental.

Os monômeros GPDM garantem uma união efetiva ao esmalte e à dentina, evidenciada pela força conhecida de todas as gerações dos adesivos Opti- Bond/Kerr. Atuando como um agente de união, de um lado, há um grupo fosfato acidulado para condicionar a estrutura dental e, ainda, interagir quimicamente com os íons de cálcio presentes na estrutura dental; de outro, há dois grupos funcionais de metacrilato para a copolimerização com outro monômero metacrilato, para promover uma densidade de ligações cruzadas aumentada e uma maior resistência mecânica para o adesivo polimerizado, mesma razão para a maior resistência de união apresentada para o substrato nanocompósito direto.

A dentina, por sua vez, é um substrato muito mais heterogêneo e fisiologicamente mais dinâmico do que o esmalte. Garberoglio e Brännström24 (1976) mostraram que o número e o diâmetro dos túbulos dentinários aumentam com a profundidade. Na dentina superficial, 96% da área é ocupada pela dentina intertubular, 3% pela dentina peritubular e apenas 1% pelo fluido dentinário. Existe uma relação inversa, no entanto, para a área mais próxima da polpa, de modo que 66% da área é ocupada por dentina peritubular, 12% por dentina intertubular e 22% por fluido dentinário. De acordo com Swift Junior et al.25 (1995), diferenças na composição e morfologia com relação à profundidade podem influenciar diretamente no comportamento e nas propriedades mecânicas da dentina contra agentes químicos e físicos aos quais a dentina é submetida durante os procedimentos operatórios, assim como a aplicação do compósito autoaderente utilizado no presente estudo.

O Dyad FlowR apresentou menor resistência de união à dentina média com um ano de armazenamento em água destilada. Entre as possíveis razões para tal resultado, a molhabilidade do material deve ser considerada. A adequada molhabilidade de um material adesivo em um substrato permite uma interação mais próxima entre o adesivo e o substrato. Possivelmente, essa propriedade não ocorreu de forma tão eficiente entre o DF e a dentina média7.

Para alguns autores8,26,27, como os componentes dos adesivos autocondicionantes de um frasco apresentam propriedades de hidrofilicidade e hidrofobicidade antagônicas, eles formam uma camada híbrida com infiltração incompleta no substrato dentinário, e isso, provavelmente, também ocorre, de forma mais pronunciada, em moléculas tão complexas como as do produto DF – que ao mesmo tempo funcionam como ácido, primer, adesivo e compósito fluido propriamente dito. Esses autores relataram que as camadas híbridas de alguns materiais exibiam canais microscópicos preenchidos por água, que permitiam o movimento dessa água na interface dentina-compósito. A redução da resistência de união à dentina, enfim, pode ser atribuída à degradação das fibrilas colágenas e/ou da resina adesiva, pelo processo de cisão da cadeia polimérica durante o qual essa cadeia é quebrada em segmentos menores, chamados de oligômeros.

Apesar da descrição do fabricante (Kerr), não existem dados disponíveis sobre a análise química do potencial de união do GPDM. Isso indica que o GPDM condiciona, ao invés de se unir a hidroxiapatita5. Para alcançar a autoaderência, especula-se que um compósito relativamente viscoso (fluido) deva conter um monômero funcional que possua um potencial efetivo de interação química, já que não pode penetrar profundamente no substrato23, como ocorre com os sistemas adesivos. De qualquer forma, os achados do presente estudo estão de acordo com o que foi encontrado por Bektas et al.28 (2013), em relação à dentina e à metodologia da resistência de união ao microcisalhamento. Para Bektas et al., o Vertise FlowR (similar ao Dyad Flow) também apresentou menor resistência de união, quando comparado ao grupo controle.

De acordo com os achados de Teixeira et al.29 (2005), três mecanismos de interação química são possíveis para a resistência de união dos compósitos fluidos ao compósito restaurador direto, a saber: 1) a adesão entre as matrizes poliméricas, dos compósitos fluidos e do compósito restaurador; 2) a adesão entre as partículas de carga expostas de ambos os compósitos; 3) a formação de um microentrelaçamento das cadeias poliméricas e das partículas de carga de ambos os compósitos. Esse último mecanismo, provavelmente, domina e produz maior contribuição com relação a uma RU aceitável, como foi possível observar dentro do grupo controle e do grupo do compósito autoaderente DF e, ainda, entre os grupos, sem diferenças estatísticas entre eles.

Utilizando microscopia óptica, foi observado que os ensaios de RU ao cisalhamento tendem a produzir falhas coesivas do substrato8,9,26,27. A melhora nas propriedades dos materiais restauradores tem aumentado a RU e modificado os padrões de falhas30. Essa transição está relacionada à mudança no padrão de estresse à medida que a falha progride ao longo da interface. A maior parte de fraturas coesivas foi observada no substrato (quando o substrato é puxado para fora), na transição de falha adesiva para coesiva11. Pela microscopia óptica, em acordo com os autores citados, também foram observadas falhas mistas para todos os grupos, incluindo, principalmente, falhas coesivas nos substratos.

 

Conclusão

Os resultados mostraram que o Filtek FlowR, após um ano de armazenamento em água destilada, apresentou resistências de união similares em todos os substratos estudados. Para o Dyad FlowR, houve um decréscimo nas resistências de união dos substratos esmalte hígido e dentina média, com diferenças significativas para o esmalte desgastado e o compósito direto. Mais estudos são necessários para o entendimento sobre o mecanismo de ação e longevidade dos compósitos fluidos autoaderentes.

 

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Endereço para correspondência:
Rubens Nazareno Garcia
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Recebido: 21/01/16
Aceito: 20/06/2016