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Arquivos em Odontologia

versão impressa ISSN 1516-0939

Arq. Odontol. vol.47  supl.2 Belo Horizonte Dez. 2011

 

 

Tratamento endodôntico de molares e retratamentos

 

Endodontic treatment of molars and retreatment

 

 

Luiz Carlos Feitosa Henriques I; Ana Cecília Diniz Viana de Castro II; Fabiano Pereira Cardoso III; Warley Luciano Fonseca Tavares III; Caroline Christine Santa Rosa IV

I Departamento de Odontologia Restauradora, Faculdade de Odontologia, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Belo Horizonte, MG, Brasil
II Cirurgião-dentista
III Programa de Pós-Graduação em Odontologia, Faculdade de Odontologia, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Belo Horizonte, MG, Brasil
IV Faculdade de Odontologia, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Belo Horizonte, MG, Brasil

Contato: henriqueslc@hotmail.com, acdviana@yahoo.com.br, fabiano@agnusodonto.com.br, warleyt@hotmail.com, carolinesantarosa@yahoo.com.br

Autor correspondente

 

 


 

RESUMO

O retratamento endodôntico é caracterizado pela reintervenção em um tratamento previamente realizado. Tal procedimento é executado em dentes que habitualmente apresentam patologias associadas às suas estruturas de sustentação. O projeto de extensão Tratamento Endodôntico de Molares e Retratamentos, criado em 1993, se propõe a viabilizar e ampliar o acesso a esse tipo de tratamento à comunidade assistida pela FO-UFMG. Através de edital, são selecionados 15 voluntários, prioritariamente do 8o e 9o períodos do curso de Odontologia da UFMG, dentre os quais são selecionados dois bolsistas. Além do atendimento clínico semanal, o projeto oferece ainda aulas expositivas específicas para tornar apto o voluntário na elaboração de planejamentos de diagnósticos e execuções dos tratamentos. São atendidos em média 60 pacientes/ano em que se pode constatar, após a proservação dos casos tratados, um índice de sucesso de aproximadamente 80%, tornando-se uma alternativa eficaz para os casos de insucessos endodônticos. O projeto possui importância de caráter assistencial para a comunidade, pois é a única oferta desse tratamento na faculdade. Além disso, atua como suporte às demais disciplinas, permitindo a sequência clínica do tratamento proposto ao paciente. Prioritariamente visa resgatar uma lacuna existente no ensino e na prestação de serviços na área de endodôntia da FO-UFMG, atrelado a um amplo projeto de pesquisa de infecções refratárias ao tratamento endodôntico inicial.

Descritores: Endodontia. Tratamento do canal radicular.


 

ABSTRACT

Endodontic retreatment is characterized by a second intervention in previously performed treatments. This procedure is regularly performed on teeth that commonly present pathologies associated with its supporting structures. The endodontic treatment of molars and retreatment, extension project, created in 1993, aims to facilitate and expand access to such treatment for the community attended to by the School of Dentistry of Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Approximately 15 volunteers are selected primarily from the 8th and 9th semesters of the Dentistry course offered at the UFMG School of Dentistry, of which two grant recipients are selected. In addition to the weekly clinical care, the project also offers special lectures capableof training the volunteer in the preparation of diagnostic planning and the execution of treatments. On average, 60 patients are treated every year. After the proservation of treated cases, a success rate of approximately 80% could be observed, rendering it an effective alternative for cases of endodontic treatment failures. The project's importance lies in aiding the community, as it is the only treatment offered at the dental school. In addition, it acts as a support to other disciplines, allowing for the clinical response to the treatment proposed to the patient. Although primarily aimed at filling a gap in education and the rendering of services in the field of endodontics at the UFMG School of Dentistry, the project is also linked to a larger research project on endodontic infections that are resistant to initial treatment.

Uniterms: Endodontics. Root canal treatment.


 

 

INTRODUÇÃO

O sucesso de um tratamento endodôntico depende de vários fatores que vão desde a seleção e diagnóstico do caso a ser tratado, bem como da sua terapia e prognóstico, passando por criteriosa execução da técnica de preparo mecânico-químico atentando para morfologia complexa do sistema de canais radiculares, obturação tridimensional, manutenção da cadeia asséptica, entre outros passos operatórios até a proservação do caso tratado. Mesmo diante do crescente avanço científico e tecnológico na endodontia existe ainda uma significância no número de fracassos que estão relacionados à microbiologia, morfologia e técnica empregada no tratamento endodôntico de rotina. Frente ao insucesso, a alternativa de escolha é o retratamento endodôntico.

O retratamento endodôntico é executado em dentes que, já tendo sofrido algum tipo de intervenção endodôntica, apresentam patologias associadas às suas estruturas de sustentação, ou se esse não for possível, pela cirurgia paraendodôntica. Critérios e índices de sucesso devem ser rotineiramente avaliados em qualquer especialidade da Odontologia1. A Sociedade Europeia de Endodontia em 1994 considerou como sucesso os critérios clínicos como a ausência de dor, infecção, tumefação, sintomas à palpação e percussão, fístula, doença periodontal associada ao endodonto, dente em função na arcada, ausência de sintomas subjetivos relatados pelo paciente e radiográficos como espaço do ligamento periodontal normal ou espessamento insignificante (menor que 1 mm),eliminação de uma prévia rarefação perirradicular,lâmina dura normal em relação ao osso adjacente,ausência de reabsorção quando comparado com a radiografia original e obturação tridimensional do espaço visível do canal, respeitando os limites do seu espaço até aproximadamente 0,5 mm aquém do ápice radicular são sugestivos de sucesso quando se considera um período de proservação de aproximadamente dois anos.

A etiologia das falhas endodônticas pode estar nos casos de persistência ou reintrodução de microrganismos no sistema de canais radiculares por causa de um preparo mecânico-químico insatisfatório e quebra da cadeia asséptica, em casos de infecções extra radiculares em que microrganismos conseguem evadir das defesas do organismo e sobreviver no espaço perirradicular e acidentes ou iatrogenias causadas pelo profissional durante o tratamento inicial.

Os índices de sucesso e fracasso para os tratamentos de canal radicular têm sido exaustivamente pesquisado ao longo dos anos. Em diferentes estudos esses índices sofrem uma variação de 53% a 95%2. Esta variação é atribuída a pesquisas realizadas em diferentes épocas, caracterizandose as mais recentes por valores próximos entre 90% e 95%,3-5 pode ser entendido pela execução de uma terapia moderna e cientificamente melhor embasada como as atualmente realizadas. Em casos de retratamento endodôntico o índice de sucesso se aproxima de 80% tornado-se uma alternativa eficaz para os casos de insucesso endodôntico.

DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DE EXTENSÃO

O projeto de extensão Tratamento endodôntico de molares e retratamentos tem como objetivo geral resgatar uma lacuna existente no ensino e na prestação de serviço na área de retratamentos endodônticos na Faculdade de Odontologia da UFMG, acenando com a possibilidade de realização de pesquisas, produção e divulgação de conhecimentos cientificamente embasados, além do desenvolvimento de técnicas e capacitação de recursos humanos. Diante disso, temos como principais objetivos específicos do projeto de extensão tratamento endodôntico de molares e retratamentos:

• Viabilizar o atendimento odontológico específico de insucessos endodônticos aos pacientes que procuram atendimento na FO-UFMG;
• Realizar atividades de capacitação para acadêmicos e reciclagem para profissionais, na área de retratamento endodôntico;
• Permitir o monitoramento e coleta de dados relativos às causas dos insucessos endodônticos nos casos atendidos;
• Desenvolver e divulgar técnicas para a solução dos insucessos endodôntico.

Através de edital, são selecionados 15 voluntários, prioritariamente do 8o e 9o períodos do curso de Odontologia da UFMG, dentre os quais são selecionados dois bolsistas. Além do atendimento clínico semanal, o projeto oferece ainda aulas expositivas de capacitação para tornar apto o voluntário na elaboração de planejamentos de diagnósticos e execuções dos tratamentos. São atendidos em média 60 pacientes, semestralmente. O retratamento endodôntico envolve etapas distintas6. São elas:

• Remoção da restauração coronária;
• Remoção de retentores intrarradiculares;
• Remoção do material obturador do canal radicular;
• Reinstrumentação do canal radicular;
• Medicação intracanal;
• Obturação do canal radicular.
• Dentre as técnicas de que dispomos para instrumentação em Endodontia, não existe nenhuma que tenha uma indicação precisa para ser utilizada em casos de retratamento. Tratamentos iniciais ou retratamentos não sofrem nenhum tipo de distinção ou restrição em relação às técnicas de instrumentação preconizadas.

A instrumentação é um processo mecânico que deverá7:

• Moldar e dar forma ao canal;
• Alisar suas parede, removendo irregularidades, fendas e ranhuras;
• Remover bactérias, tecido pulpar e produtos metabólicos e anabólicos, além de material que serve como substrato bacteriano.

É claro que os objetivos da fase de instrumentação só podem ser atingidos quando o canal possibilita ser explorado em comprimento real. Quando isso não é possível, o comprimento de patência não é trabalhado, não é recapitulado e por consequência não sofre oxigenação, descompressão e debridamento, pois estas áreas devem apresentar duas condições essenciais, diâmetro e comprimento para que seja atingida.

O comprimento de trabalho não podendo ser estabelecido, é aleatório e o nível da obturação é que irá defini-lo, e quanto mais distante, menos envolvimento da região apical na instrumentação, que poderá tornar-se um excelente ambiente para o desenvolvimento e proliferação de microrganismos, comprometendo o processo de reparo ou originando lesões periapicais, definindo o insucesso do retratamento.

Diante de tais fatos, a irrigação, a medicação intra canal e principalmente a obturação passam a ter uma importância ainda maior. Áreas inacessíveis à instrumentação poderão sofrer a ação da irrigação e da medicação intra canal. O fluxo e refluxo do líquido irrigador desde o terço apical, o uso de soluções anti-sépticas mais concentradas e com baixa tensão superficial, desempenham papel fundamental nessas situações. A medicação empregada deverá propiciar um íntimo contato com as paredes dos canais e sua ocupação em extensão máxima possível.

A obturação com cimentos de qualidades físicas e biológicas ótimas deverá ocupar o máximo de espaço da luz do canal e preencher idealmente o seguimento que não sofreu ação da instrumentação. Este objetivo poderá ser melhor alcançado utilizando a condensação lateral complementada por técnicas termomecânicas e termoplásticas.

A proservação, principalmente nos casos de retratamentos, assume a rigor uma inequívoca condição de ser imprescindível. Se constatada, ao final desta, o insucesso, a cirurgia paraendodôntica bem indicada deve então ser executada. Um período de dois anos a cinco anos de proservação se faz necessário que haja tempo de completo reparo8. Dessa maneira, alguns autores sugerem que seja realizada uma radiografia para controle pós-operatório, a cada seis meses durante dois anos, que permitirá observar a normalidade quanto ao reparo da lesão pregressa, indicará o sucesso ou detectará alterações teciduais sugestivas do insucesso. Entretanto, destaca-se a dificuldade de realização do exame de controle clínico e radiográfico devido à relutância do paciente em seu retorno9. Diante de tal fato, é de suma importância comunicar e explicitar ao paciente a necessidade de um acompanhamento pós-operatório bem executado.

Há relatos de taxas de sucesso de 96% em dentes que não apresentavam lesão periradicular e 86% em dentes que apresentavam um estado de necrose pulpar mas sem área radiolúcida radiográfica sugestiva de lesão periradicular após um período de 8 a 10 anos do tratamento endodôntico8. O sucesso obtido foi de 94,44% em dentes que permaneciam em função por um período de proservação de 3,5 anos10. Desse total, 2,47% precisavam ser submetido ao retratamento e 1,41% deveriam ser submetidos à cirurgia paraendodôntica.

Alguns autores relatam que a segunda intervenção endodôntica possui menores índices de êxito que a primeira2,8,9,11-13. Os relatos de índices de sucesso do retratamento endodôntico entre 40% e 100%, encontrados na literatura,3,13-15 estão de acordo com os índices encontrados na clínica de Tratamento endodôntico e retratamento da Faculdade de Odontologia da UFMG, que atinge níveis de 80% em casos com proservação de dois anos.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A clínica de Retratamentos e tratamentos endodônticos de molares funciona semanalmente na Faculdade de Odontologia da UFMG. O recurso humano que atua no projeto é composto por alunos graduandos, bolsistas, e alunos vinculados à Pósgraduação. Sob a orientação do coordenador e participantes, os alunos realizam atendimentos clínicos em pacientes previamente triados,portadores de situações clínicas pertinentes aos objetivos do projeto, oportunizando a estes, vivenciar situações de graus elevados de atipicidades, assim como a resolução das necessidades dos pacientes em endodontia.

 

REFERÊNCIAS

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11. Lopes HP, Siqueira Jr. JF, Elias CN. Retratamento endodôntico. In: Lopes HP, Siqueira Jr JF, editors. Endodontia: Biologia e Técnica. Rio de Janeiro: Medsi; 2004. p.497-538.

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14. Sundqvist G, Figdor D, Persson S, Sjogren U. Microbiologic analysis of teeth with failed endodontic treatment and the outcome of conservative re-treatment. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 1998; 85:86-93.

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Autor correspondente:
Luiz Carlos Feitosa Henriques
Rua Penafiel, 420 -Anchieta
CEP: 30310-420 - Belo Horizonte – MG – Brasil

E-mail: henriqueslc@hotmail.com