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Arquivos em Odontologia

versão impressa ISSN 1516-0939

Arq. Odontol. vol.48 no.1 Belo Horizonte Jan./Mar. 2012

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Impacto de programas educativos sobre condições bucais de escolares de 6 e 7 anos em duas escolas municipais do interior do Estado de São Paulo/Brasil

 

Impact of educational programs on oral conditions in schoolchildren of 6 and 7 years of age in two public schools in the state of São Paulo, Brazil

 

 

Marcelo de Castro MeneghimI; Cláudia Elisa de Campos EsmerizII; Patrícia Vilas-BoasIII; Zuleica Maria Pedroso MeneghimII; Antonio Carlos PereiraI

IDepartamento de Odontologia Social, Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Piracicaba, SP, Brasil
IIPrograma de Pós-Graduação em Odontologia Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Piracicaba, SP, Brasil
IIIFaculdade de Odontologia de Piracicaba, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Piracicaba, SP, Brasil

 

Contato: meneghim@fop.unicamp.br, claudiaesmeriz@fop.unicamp.br, pati1199@hotmail.com, zuca.meneghim@terra.com.br, apereira@fop.unicamp.br

Autor correspondente

 

 


 

RESUMO

Objetivo: Avaliar e comparar as condições de saúde bucal em escolares de dois municípios de diferentes portes populacionais, sob mesmas condições de acesso a flúor e diferentes programas educativos em saúde bucal.
Materias e Métodos: O cálculo amostral baseou-se na experiência de cárie, com margem de erro de 10%, perda amostral de 20% e nível de confiabilidade de 95%, totalizando 95 voluntários. Os critérios utilizados para a avaliação clínica da cárie foram os preconizados pela OMS (1999), bem como o registro clínico de lesões ativas em esmalte (lesões de mancha branca) baseado nos critérios propostos por Nyvad e Fyfee. A avaliação das condições para a presença de placa bacteriana foi verificada pelo Índice de Placa, proposto por Loe. O estudo foi do tipo randomizado, pareado e cego. A análise dos dados foi por meio de estatística descritiva do índice CPO, lesão de cárie inicial em esmalte e níveis de placa, utilizando-se Kruskal-Wallis, análise univariada (Qui-Quadrado) e Odds Ratio, todos ao nível de significância α=0,05.
Resultados: O índice ceo-d (desvio-padrão) para os escolares foi de 1,6 (2,27) no município de Iracemápolis e 1,9 (2,4) em Piracicaba, com um Odds Ratio de 0,84 (0,37-1,92), apresentando 47,4% livres de cáries e 71,5% com placa presente na cavidade bucal. Não houve diferença estatisticamente significativa na gravidade de cárie entre os municípios no presente estudo.
Conclusão: Os resultados demonstram necessidade de avaliar melhor os programas educativos e num maior espaço de tempo da sua aplicabilidade.

Descritores: Epidemiologia. Cárie dentária. Educação em saúde bucal.


 

ABSTRACT

Aim: To evaluate and compare the oral health status of schoolchildren in two municipalities of different population sizes, under the same conditions of access to fluoride and various educational programs in oral health.
Materials and Methods: The sample size calculation was based on the patients' experience sample loss of 20%, and a confidence level of 95% in 95 volunteers. The criteria used for the clinical with caries, considering a margin of error of 10%, a evaluation of caries were those recommended by WHO (1999), as well as the clinical record of active lesions in enamel (white spot lesions), based on the criteria proposed by the Nyvad and Fyfe. The evaluation of the conditions for the presence of bacterial plaque was measured by the Plaque Index, proposed by Loe. The study type was randomized, paired, and blind. Data analysis was performed by means of descriptive statistics of the dmft, initial caries lesions in enamel, and plaque levels, using the Kruskal-Wallis test, univariate analysis (chi-square), and Odds Ratio, all at a significance level α=0,05.
Results: The DMFT (standard deviation) for the schoolchildren was 1.6 (2.27) in the municipality of Iracemápolis and 1.9 (2.4) in Piracicaba, with an odds ratio of 0.84 (0.37 to 1.92), with 47.4% cariesfree and 71.5% with plaque present in the oral cavity. There was no statistically significant difference in the severity of dental caries among the municipalities in this study.
Conclusion: The results demonstrate the need for a better evaluation of educational programs and a greater time for their applicability.

Uniterms: Epidemiology. Dental caries. Dental health education.


 

 

INTRODUÇÃO

A alta prevalência da cárie dentária e sua distribuição praticamente uniforme na população, aliada à escassez de dados provenientes de estudos epidemiológicos, foi entendida, durante muito tempo, como um conceito estático, cuja solução seria a odontologia curativa. A partir das últimas três décadas, a expressiva redução na prevalência da cárie dentária na população da maioria dos países desenvolvidos e Brasil é fato1-6. Vários fatores podem estar associados a esta redução da prevalência da doença, como a fluoretação da água de abastecimento público e o desenvolvimento de projetos coletivos pelo SUS (Sistema Único de Saúde), além da implementação e a disseminação dos dentifrícios fluoretados7-10.

Outro importante elemento na redução da cárie na população foi a fluoretação da água de abastecimento público, embora sua universalização ainda não seja a desejada11. Isso, geralmente ocorre quando não há planejamento estratégico para universalizar benefícios ou direcionar recursos a grupos que necessitam maiores cuidados e atenção, o que culmina em desigualdades em saúde11. Outro fato, que complementa essa redução da doença cárie, são os programas em saúde e o fato de o SUS ter implementado o atendimento público com serviços odontológicos.

A incorporação da Equipe de saúde bucal na Estratégia de Saúde da Família, a partir de 2000, além do estabelecimento de CEOs (Centro de Especialidade Odontológicas) em 2004, ampliaram o atendimento odontológico no país11. Essa estratégia possibilitou maior atenção em saúde bucal que, assim como, o Brasil Sorridente (Ações em saúde bucal, criadas pelo Governos Federal/Ministério da Saúde na prevenção e controle da cárie e problemas gengivais a cidadãos de todas as idades), ampliaram as ofertas por serviços em níveis de atenção além do básico, como Endodontia, Prótese, Radiologia e outras especialidades. Também se viu, desde então, uma maior atuação na comunidade, incluindo levantamentos epidemiológicos, ações coletivas de prevenção e educação em saúde, atendimento a necessidades diferenciadas, compreendidas no campo da promoção de saúde bucal11.

O maior conhecimento em relação aos fatores responsáveis pelo processo de início e progressão de doenças relacionadas à estagnação da placa bacteriana tem valorizado a implementação de programas educativos, aplicados prioritariamente a grupos de maior risco ao desenvolvimento das mesmas12. Considerando uma Odontologia voltada para a promoção de saúde, a educação desempenha um papel fundamental no sucesso de qualquer programa odontológico12. Diversos estudos e autores vêm enfatizando essa necessidade em saúde bucal e revelando que estudos bem realizados demonstraram não só mudança de hábitos como redução nos índices e progressão de doenças como cárie e doenças gengivais em crianças13-17.

Portanto, este estudo teve como objetivo avaliar o impacto de programas educativos na redução e controle da cárie e índice de placa na faixa etária de 6 – 7 anos, em escolares de municípios vizinhos, ambos com água de abastecimento público fluoretada há mais de 15 anos, analisando as condições clínicas de saúde bucal dessa população.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Odontologia de Piracicaba – FOP-UNICAMP, de acordo com a resolução 196 de 10/10/96 do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde, sob número de processo 093/2008.

Para a sua realização foram selecionadas duas escolas municipais, uma de Piracicaba/SP e outra de Iracemápolis/SP, da rede municipal de ensino, sob mesmas características de água de abastecimento público fluoretada, infra-estrutura e condições sócioeconômicas. Piracicaba apresenta uma população de aproximadamente 365 mil habitantes, um IDH-m (índice de desenvolvimento humano por município) de 0,836 (PNUD/2000 – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e PIB (produto interno bruto) per capita de R$ 24.226,05 (IBGE–Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2008). Iracemápolis conta com uma população aproximada de 20 mil habitantes, um IDH-m de 0,828 (PNUD/2000) e PIB per capita de R$ 24.162,59 (IBGE, 2008).

Os escolares avaliados da escola do município de Piracicaba, além da água de abastecimento fluoretada, recebem escovação supervisionada, avaliação de risco semestral, com sete sessões de aplicação tópica de fluorfosfato acidulado (FFA) em gel na escova a 1,23% nas crianças que apresentam alto risco de cárie: riscos D (presença de placa, gengivite ou mancha branca), E (cárie aguda) e F (urgência< dor abscesso) Alto risco de cárie - Diretrizes para a Atenção em Saúde Bucal/Ministério da Saúde 2004), atividade que diferencia os programas em saúde bucal aplicados aos escolares dos municípios avaliados. Já os escolares examinados na escola municipal de Iracemápolis, além da água de abastecimento fluoretada, recebem escovação supervisionada semanalmente.

A amostra de ambos municípios foi composta por um total de 95 crianças do primeiro anos do ensino fundamental (39 em Iracemápolis e 56 em Piracicaba), sendo 46,3% e 53,7% do gênero feminino. A média (desvio-padrão) para a faixa etária avaliada foi de 6,6 anos (0,5). As condições sociodemográficas foram semelhantes em ambos municípios.

Anterior à fase experimental, os dois examinadores que participaram dos levantamentos receberam um treinamento prévio, e posteriormente foi realizada uma calibração intra-examinadores, tendo como finalidade se obter uma estimativa da extensão e da natureza diagnóstica. Para tal, foi estabelecido um Kappa=0,8, havendo ao final uma concordância de 90% inter-examinadores.

As seguintes variáveis clínicas foram analisadas: avaliação clínica de cárie (ceo-d/CPO-D) conforme os critérios utilizados pela Organização Mundial de Saúde (OMS, 1999)18; presença de lesões ativas em esmalte (lesões de mancha branca baseado em Nyvad et al.19 e Fyfee et al.20); índice de placa dental bacteriana (Índice de Placa Löe)22.

O exame epidemiológico foi realizado no pátio da escola, sob iluminação natural, com o uso de espelhos bucais planos e sondas periodontais CPI, como preconizado pela OMS. O examinador se posicionou em frente ao voluntário, ambos acomodados em cadeiras. Anteriormente ao exame clínico, todas as crianças avaliadas realizaram escovação, sob supervisão de um dos examinadores.

A análise dos dados foi constituída pela estatística descritiva do índice de cárie e de placa. O nível de significância estatística foi de 5%. Foram utilizados os testes de Kruskal-Wallis para a análise de ceo/CPO em função do município e as análises de Qui-quadrado e Odds Ratio.

 

RESULTADOS

A análise dos dados teve as escolas como a variável dependente do estudo, sendo que a escola do município de Iracemapólis apresentou um ceo-d (dp) de 1,53 (2,27) e Piracicaba um ceo-d (dp) de 1,9 (2,24). As variáveis: ceo-d/CPO-D, lesão de mancha branca, índice de placa e o índice de cárie (avaliado isoladamente) foram considerados variáveis independentes do estudo e associadas a essa variável dependente. Dos 103 matriculados em ambas as escolas, participaram do estudo 93% delas.

As médias (desvio-padrão) dos índices ceo-d/CPO-D foram de 1,77 (1,15) e 0,16(0,92), respectivamente, sendo que 44,2% estavam livres de cáries. Quando computada lesão por mancha branca aos dados, as médias foram de 1,79 (1,41) para o ceo-de de 0,27 (0,55) para o CPO-D, com 42% das crianças livres de cárie. Dados que podem ser observados na Tabela 1:

 

 

 

Nesta Tabela, pode-se observar que em torno de 20% apresentou presença de mancha branca nos dentes, com um OR de 1,12 (IC95%; 0,35-3,63; p=0,95), melhor visualizados na Tabela 2, concluindose que não houve diferença estatisticamente significativa da associação entre lesão por mancha branca e escolas (municípios).

 

 

 

Associando-se a cárie em função das escolas, observou-se ausência de associação estatística entre essas variáveis OR=1,18 (IC95%; 0,48-2,90; p=0,85), o que pode ser mais bem observado na Tabela 3.

 

 

 

Para a presença ou ausência de placa, obtevese um total de 71,5% aproximadamente, de presença de placa, independente do índice apresentado. Não houve associação estatística entre escolas (municípios) e placa OR=1,21 (IC95%; 0,45-3,28; p=0,84), resultados que podem ser observados na Tabela 4.

 

 

 

DISCUSSÃO

Nos levantamentos realizados pelo SB/BRASIL 20036 demonstrou-se que 73% das crianças de 18 a 36 meses e 40% das crianças de 5 anos de idade apresentaram livres de experiência de cárie. Segundo dados do SB Brasil 2010, para a idade de 5 anos houve redução de 17% dos dentes com experiência de cárie. Pelo presente estudo, observouse que a média nas escolas municipais avaliadas de Piracicaba e Iracemápolis se encontram em 46% livres de cáries aos 6 e 7 anos de idade. O ceo-d para 5 anos de idade, no SB Brasil 2003, foi de 2,8, caindo para 2,1 no SB Brasil 201023. A média de dentes afetados por cárie aos 5 anos caiu de 2,8 (SB Brasil 2003)6 para 2,3 (SB Brasil 2010)23 podendose dizer que as crianças avaliadas no presente estudo apresentaram índice menor (1,8) que os apresentados a nível nacional. Para 2010, a meta da OMS é de 90% das crianças de 5 a 6 anos livres de cáries. No caso do presente estudo, foram encontradas apenas 46% com seus dentes livres de cáries, sendo que, observando individualmente os municípios, Iracemápolis apresentou aproximadamente 49% isentos da doença, enquanto Piracicaba cerca de 45%.

A idade de pré-escolares normalmente avaliada em estudos epidemiológicos é de 5 anos. No entanto, este estudo avaliou crianças de 1º ano escolar (antigo pré-primário), com faixa etária compreendida entre 6 e 7 anos de idade, porém, faixa etária com menor referência na literatura. A importância em se avaliar as condições dessa faixa etária está no fato dessas crianças, em sua maioria, serem provenientes de creches municipais, onde o cuidado com higiene e hábitos saudáveis é bem maior se comparada aos cuidados demandados em escolas a partir do primeiro ano escolar, além do fato de ser o início das trocas dentárias, passando de uma dentição decídua para uma dentição mista, com erupção dos primeiros molares permanentes, cuja face oclusal é facilmente envolvida por cárie, pela própria dificuldade e falta de coordenação motora da criança durante a escovação. Em outro estudo, realizado no município de Piracicaba, com pré-escolares de 5 anos, foram apresentados índices, comparativamente, bastante inferiores de ceo-d, lesão de mancha branca21, de onde obtevese um ceo-d de 1,3 (2,4) e 59% das crianças livres de cáries. Associando-se mancha branca à doença cárie, somente 48,5% das crianças estiveram livres, o que ainda está abaixo da proposta da Organização Mundial de Saúde para 2000, estabelecida em pelo menos 50% das crianças sem experiência de cárie aos 5 anos.

Quanto ao índice de placa dental bacteriana, 27 crianças (28,4%) não apresentavam placa, enquanto a maioria apresentou (71,6%), independente do índice, o que demonstra necessidade em se motivar os escolares na higienização bucal e cuidados enquanto presentes na escola e também fora dela. O controle da placa bacteriana, a higienização adequada, promoção de saúde por meio da fluoretação da água de abastecimento público são o primeiro passo na tentativa de diminuir índices em populações de maiores risco à problema periodontal e cárie. Na idade em que a criança vai para o primeiro ano (antigo pré-primário), mudam-se as escolas e também seus hábitos, tanto alimentares, quanto de higiene. Geralmente, há cantinas, que vendem grande quantidade de alimentos contendo açúcares, e a higiene é mais negligenciada, observando-se que na etiologia microbiana da cárie está a forte associação àfreqüente ingestão de açúcar24,25.

É preciso ressaltar que o efeito positivo dessa medida é visto através da redução da cárie, a partir de dados obtidos de levantamentos como SB Brasil, 20036 e 201023. O que se vê nas últimas três décadas é declínio nos indicadores de cárie, CPO-D, com queda de 6,7 em 1986 para 2,8 em 2003 aos 12 anos6. Fato similar ocorreu na idade de 5 anos, onde se percebe que aos 5 anos, 46,2% das crianças apresentaram um ceo-d=0 em municípios com água fluoretada e apenas 33,1% das crianças dessa idade apresentaram o mesmo ceo-d em municípios sem fluoretação (SB Brasil 2003)6.

Narvai et al.26 estudaram esses indicadores e associaram sua redução à fluoretação da água e a outras mudanças que ocorreram nesse tempo, como o atendimento odontológico na rede pública do SUS e a incorporação da equipe de saúde bucal na Estratégia Saúde da Família. Fluoretar a água de abastecimento público vem sendo uma medida interventiva sobre determinantes da cárie na população, sendo um dos meios mais importantes na sua redução11.

Também é importante ressaltar que o fenômeno da polarização é menos visto em municípios das regiões Sul e Sudeste, independentemente do porte e diversidade populacional. Vê-se fluoretação da água de abastecimento público, heterocontrole dessa fluoretação, na maioria dos municípios, como o caso dos municípios deste estudo, ao contrário de regiões como Norte e Nordeste, onde apenas municípios de grande porte populacional tendem a receber água de abastecimento público fluoretada11.

Alguns trabalhos27,28 tiveram como propostas programas educativos e avaliaram seus efeitos em escolares da rede pública de ensino, como o realizado no presente estudo, na faixa etária de 5-7 anos, num período de até 24 meses, através de instrução de higiene oral e palestras realizadas pelo menos uma vez por ano, com duração em média de 1 hora e análise das variáveis ceo, CPOS e índice de placa. Os resultados porém, foram divergentes entre si, já que nos estudos realizados por Carvalho et al.28, foi possível constatar uma diminuição significativa da cárie em esmalte e da presença de placa nas superfícies de esmalte.

Embora os municípios de Piracicaba e Iracemápolis tenham populações muito diferentes em número, as características dos escolares avaliados foram bastante similares, porém os programas educativos aplicados pelos municípios são diferenciados em alguns pontos, pois em Piracicaba, algumas escolas municipais contam com alunos do 4º ano de graduação da Faculdade de Odontologia de Piracicaba, FOP-UNICAMP, que, em parceria com a Prefeitura Municipal, realizam estágio extra-muro em algumas Unidades de Saúde da Família, tendo a oportunidade de dar continuidade ao programa educativo. Assim, as crianças recebem além de escovação supervisionada, instruções de higiene, seguem a proposta do dentista da USF na aplicação de palestras aos grupos de escolares, além das avaliações de risco semestrais e aplicações tópicas de flúor nas crianças avaliadas como alto risco, programa realizado apenas no município de Piracicaba.

Apesar dessa diversidade educativa, nem todos tópicos do programa educativo são realizados nas escolas municipais de Iracemápolis (que não realiza atividades interativas como as palestras proferidas por graduandos do quarto ano de Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba/UNICAMP, nem a aplicação tópica de flúor em grupos de alto risco à cárie), porém, as diferenças entre os resultados não foram estatisticamente significativas, remetendo ao questionamento sobre o tempo de aplicação dos programas educativos, necessidades dos escolares, forma de abordagem e participantes (pais, professores, cuidadores) do programa, intervalos entre avaliações, entre outros pontos questionáveis15,28.

Em estudo de metanálise, realizado por Marinho et al.29, observou-se que o uso de gel de FFA, independente da concentração, está associado à redução na prevalência de cárie em dentes permanentes, em torno de 28%. Em média, géis são responsáveis por uma redução de 21% da cárie. Um aspecto importante é o fato de o uso freqüente de dentifrício fluoretado associado a uma técnica de aplicação tópica de flúor gel não revelarem potencial anticariogênico em crianças com baixo índice de cárie, embora os efeitos isolados de ambos revelarem esse potencial. Cangussu et al.30 avaliando a ação de fluoretos em adolescentes, concluíram que mesmo com redução dos índices de cárie, o uso tópico de flúor (géis ou bochechos) não foram relevantes para detectar diferenças na prevalência de cárie, do grupo avaliado.

Em geral, os programas tem se mostrado mais efetivos se aplicados conforme a avaliação das necessidades da população do estudo, segundo índices de exclusão/inclusão social, condições sociodemográficas, avaliação de risco da população em estudo, durante toda a fase escolar da criança, o que implica num longo tempo de aplicação dos programas e avaliações freqüentes dos mesmos, com repetições a cada 3 ou 4 meses, inicialmente e com intervalos maiores conforme houver redução dos índices de cárie, placa, ou outros índices a serem avaliados. Conhecer a verdadeira influência de cada item utilizado na prevenção e controle de doenças bucais, em especial a cárie, indicam que uma melhor avaliação é feita por meio de estudos com destaque para os programas educativos em saúde bucal, que apesar de não impedirem completamente o aparecimento dessas doenças bucais, tem seu papel positivo na redução e paralisação de processos infecciosos28.

Não se pode negligenciar o fato de que a cárie ainda é presente, bem como lesões de mancha branca e presença de placa. A diferença entre os índices dos municípios avaliados foi pequena e o uso tópico do flúor como parte do programa não esteve associado à menor prevalência ou redução no índice de cárie. No entanto, um maior tempo de aplicação e avaliação de seu uso são necessários para verificar a real eficácia e o custo-benefício trazido pelo uso tópico do flúor na redução da cárie. A proposta da Organização Mundial de Saúde para 2000, com 50% das crianças com 5 e 6 anos livres de cárie, não foi alcançada em 2010, porém esteve bem próxima já que os municípios apresentaram 48,7% e 44,6% das crianças, livres de cárie em Iracemápolis e Piracicaba, respectivamente.

 

CONCLUSÃO

Os programas educativos, realizados nos municípios do estudo, não apresentaram diferenças de impacto na saúde bucal dos escolares avaliados, demonstrando a necessidade de novos estudos sobre a aplicabilidade e tempo dos programas.

 

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Autor correspondente:
Marcelo de Castro Meneghim
Av. Limeira, 901 – Bairro Areião
CEP: 13.414-903 – Piracicaba - SP – Brasil

e-mail:meneghim@fop.unicamp.br

Recebido em 11/08/2011 – Aceito em 21/11/2011