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Arquivos em Odontologia

versão impressa ISSN 1516-0939

Arq. Odontol. vol.50 no.1 Belo Horizonte Jan./Mar. 2014

 

 

Inclusão da Odontologia no cenário hospitalar da região metropolitana de Belo Horizonte, MG

 

Inclusion of dental services within the hospital context of the metropolitan region of Belo Horizonte, MG

 

 

Paula Vitali Miclos I; Manoelito Ferreira Silva Junior II; Cecília Maria Soares Carvalho Oliveira III; Maria Aparecida de Oliveira III

I Programa de pós-graduação em Saúde Coletiva, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil
II Curso de Odontologia, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, Espírito Santo, Brasil
III Faculdade São Camilo, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil

Contatos: pvmiclos@gmail.com, manoelito_fsjunior@hotmail.com, ceciliamoliveira@hotmail.com, cidademel@globo.com

 

 


 

RESUMO

Objetivo: Verificar a inclusão da Odontologia no contexto hospitalar dos hospitais de grande porte da região metropolitana de Belo Horizonte – MG (RMBH) através dos insumos odontológicos e a inter-relação de profissionais de saúde no cenário da odontologia hospitalar. Materiais e Métodos: Estudo quantitativo, descritivo e transversal realizado por meio de entrevista, conduzida por apenas uma entrevistadora, com o cirurgião-dentista responsável pelo setor odontológico dos hospitais de grande porte da RMBH que tinham atendimento odontológico. Os dados coletados foram tabulados no Excel 2003 (Microsoft®) em frequências absolutas e relativas. Resultados: 66,67% dos hospitais de grande porte da RMBH prestam assistência odontológica sendo que 64,28% destes hospitais com serviços odontológicos existem há mais de 16 anos. Os jogos de instrumentais mais fornecidos pelos hospitais são respectivamente os de emergência/urgência, exame clínico e cirúrgico ambulatorial. Os atendimentos são realizados dentro das dependências do hospital em 85,71%. Conclusão: Constatou-se a existência da odontologia na maioria dos hospitais de grande porte da RMBH, com presença de equipes odontológicas fortes, que trabalham em interdisciplinaridade, mostrando um reconhecimento e valorização do cirurgião-dentista também neste campo de trabalho.

Descritores: Unidade hospitalar de odontologia. Equipe hospitalar de odontologia. Área de atuação profissional. Odontologia.


 

ABSTRACT

Aim: To investigate the inclusion of dental services within the hospital context of large hospitals in the metropolitan region of Belo Horizonte (MRBH), Brazil by analyzing dental supplies and the interconnection of healthcare professionals in the hospital dental services context. Materials and Methods: This work was a quantitative, descriptive, correlational study conducted through interviews, carried out by a single researcher, with the head dentist in charge of the dental department of large hospitals within MRBH. The collected data were placed in an Excel 2003 database (Microsoft) in absolute and relative frequencies. Results: This study found that 66.67% of the large hospitals of MRBH provide dental care and that 64.28% of these hospitals have had dental services for more than 16 years. The dental services most commonly performed by these hospitals include the emergency/ urgency, clinical examination, and outpatient surgery services, respectively. Dental services are offered on hospital premises at 85.71% of the hospitals. Conclusion: This study identified the existence of dental services in most large hospitals of MRBH, with strong interdisciplinary dental teams, as well as a recognition and appreciation of the dentist in this field of work.

Uniterms: Dental service, hospital. Dental staff, hospital. Location of professional practice. Dentistry.


 

 

INTRODUÇÃO

A Organização Mundial de Saúde (OMS) a partir da década de 1950 passou a disciplinar e orientar a atividade hospitalar e, em 1957 estabeleceu o conceito de hospital como uma parte integrante de um sistema coordenado de saúde, cuja função é dispensar à comunidade uma completa assistência à saúde, tanto curativa, quanto preventiva, incluindo serviços extensivos à família em seu domicílio e ainda um centro de formação para os que trabalham no campo da saúde e para pesquisas biossociais1.

De acordo com Foucault2 a organização hospitalar desenvolveu-se articulada com as formas de produções sociais e materiais no tempo e no espaço, influenciando a conformação das bases conceituais, instrumentais, pedagógicas e espaciais da prática médica, onde a organização do ambiente de trabalho hospitalar é vista como produto da evolução do contexto socioeconômico e também cultural.

É nesta configuração que surge o espaço para a atuação de outras profissões no intuito de colaborar para a redução da permanência dos internos, estimular o controle dos mesmos nas redes de assistência básica e empoderá-los no sentido de adotarem cuidados básicos para que não voltem a necessitar de novas internações3.

Às mudanças na concepção tradicional do ambiente hospitalar somam-se as novas descobertas científicas que comprovam a grande inter-relação entre o cuidado bucal com a condição sistêmica dos pacientes4. Por isso, recentemente foi aprovado pela Câmara de Deputados o Projeto de Lei 2776/2008, que prevê a obrigatoriedade da presença do cirurgiãodentista nas Unidades Terapia Intensiva (UTI), também em clínicas ou hospitais públicos e privados em que haja pacientes internados, para que possam receber cuidados referentes à saúde bucal5.

A implantação da Odontologia se faz necessária no cenário hospitalar, embora para sua consolidação seja necessário uma infraestrutura que contemple tanto a parte física, material e intelectual. Por isso, este trabalho teve como objetivo verificar a inclusão da odontologia no contexto hospitalar dos hospitais de grande porte da região metropolitana de Belo Horizonte – MG (RMBH) através dos insumos odontológicos e a inter-relação de profissionais de saúde no cenário da odontologia hospitalar.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Este é um estudo quantitativo, descritivo e transversal. Reproduziu-se a metodologia adotada por Oliveira, Guimarães e Costa3. O universo eleito para o estudo foi constituído por hospitais de grande porte, localizados na região RMBH, utilizando como critérios de inclusão: estar localizado na RMBH, ser categorizado como hospital de grande porte, oferecerem assistência odontológica de qualquer especialidade e qualquer vínculo empregatício. A escolha dos hospitais de grande porte como universo eleito para estudo tomou como base as perspectivas legais previstas no Projeto de Lei nº3504/006.

Para determinação da amostra foram utilizados dados secundários obtidos no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde – CNES7 para o levantamento da relação de hospitais existentes na RMBH assim como para a coleta de informações (nome da instituição, razão social; leitos existentes e dados sobre a presença de cirurgiões-dentistas a partir do cadastro de profissionais). Outros dados complementares foram fornecidos pela Associação dos Hospitais de Minas Gerais, além de terem sido feitos contatos diretos com as instituições.

A categorização quanto ao porte dos hospitais tomou-se como referência a classificação do Ministério da Saúde8, aplicada no Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde - DATASUS, cujo critério está relacionado com o número de leitos existentes, na seguinte proporção: abaixo de 50 leitos (pequeno porte), entre 50 e 150 (médio porte), entre 150 e 500 (grande porte) e acima de 500 leitos (extra porte).

Apesar de existirem 21 hospitais de grande porte na RMBH, após a utilização dos critérios de inclusão, a amostra foi constituída por 14 hospitais. A pesquisa direta por meio de entrevista estruturada foi realizada nos próprios hospitais pesquisados, através de agendamento prévio, realizada apenas por um entrevistador responsável e dirigida ao cirurgiãodentista responsável pelo serviço odontológico dos hospitais incluídos na pesquisa. O questionário continha questões sobre ao tempo de implantação da odontologia no contexto hospitalar, se há integração com outras áreas da saúde, qual o tipo de público alvo atendido, qual o tipo de material fornecido pelo hospitalar para os procedimentos odontológicos, como se dá o fluxo de atendimento, dentre outros aspectos.

A análise dos dados foi realizada através do banco de dados Excel 2003 e tabulados através de frequências absolutas e relativas para a formatação das tabelas para melhor elucidação dos resultados.

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética de Pesquisa em Seres Humanos da Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte sob o registro 063/2007, seguindo todas as normas da resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Os participantes foram entrevistados após receberam esclarecimentos sobre o tema, instrumentos e propósitos da pesquisa e, por livre decisão, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

RESULTADOS

O universo da pesquisa constituiu-se de 14 (66,67%) dos 21 hospitais categorizados como de grande porte da RMBH. Sobre a natureza de financiamento dos hospitais que continham cirurgiãodentista, encontrou-se respectivamente: 6 (42,86%) filantrópicos, 6 (42,86%) públicos e 2 (14,28%) privados.

Apesar de não pertencerem aos critérios de inclusão deste estudo encontrou-se também na RMBH a existência de serviços odontológicos em hospitais de outros portes: dois de pequeno porte, sete de médio porte e nos dois hospitais de extra-porte existentes.

A tabela 1 mostra há quanto tempo houve a implantação dos serviços odontológicos nos hospitais de grande porte da RMBH.

 

 

 

No intuito de verificar o espaço físico cedido pelos hospitais à odontologia, na tabela 2 verificou-se a localização e infraestrutura a ela destinada. A tabela 3 apresenta a relação aos materiais disponibilizados para os cirurgiões-dentistas nos hospitais pesquisados.

 

 

 

 

 

Verificou-se que em todos os casos o cirurgiãodentista está presente no próprio ambiente hospitalar, com maior proximidade dos pacientes internados e de outros profissionais de saúde com infraestrutura localizada nas dependências dos hospitais em 100% dos casos.

Para avaliar o comportamento do modelo assistencial adotado pela odontologia hospitalar, procurou-se identificar como é o fluxo de atendimento de pacientes, no ano de 2008, conforme expressos na Tabela 4.

 

 

 

Quando perguntados sobre o número total de cirurgiões-dentistas que prestam serviços em hospitais, encontrou-se um número absoluto de 60 profissionais, sem contabilizar os residentes e estagiários acadêmicos.

Em relação à forma de ingresso dos profissionais nos hospitais que contam com serviços odontológicos, 64,29% das vagas são ocupadas por meio de concursos para os cirurgiões-dentistas. Apesar disto, dos 60 odontólogos que prestam serviço aos hospitais pesquisados, a grande maioria (71,44%), foi contratada ou não tem vínculo empregatício com o hospital. O serviço pró-labore é oferecido por 14,29% dos hospitais da RMBH.

Em 100% dos hospitais pesquisados, houve o relato de existir integração multidisciplinar, podendo estas ser rotineiras ou esporádicas. As inter-relações ocorreram em 85,72% dos hospitais de forma frequente ou sempre e não houve qualquer referência à ausência de interações interdisciplinares. Apenas dois hospitais (14,28%) têm-se comportado como cenário para inter-relações menos frequentes. Nos estabelecimentos em que a atuação inter/ multidisciplinar ocorre rotineiramente (85,72%) observou-se o desenvolvimento de programas para gestantes, crianças, idosos, respirador bucal, cardiopatas, pacientes com cefaléia, portadores de necessidades especiais e portadores de Síndrome da Deficiência Imunodeficiência Adquirida (AIDS), além de tratamento especializado e multiprofissional para o atendimento de traumatologia, cirurgia bucomaxilo- facial, urgências e emergências e cirurgia ortognática.

Os dados demonstram o percentual de hospitais que abrigam processos formais de trabalho com a odontologia, sendo 78,57% na forma de constituição de equipes multi ou interdisciplinares e 35,71% na forma de solicitações formais de interconsultas.

 

DISCUSSÃO

Quanto a natureza dos hospitais que fornecem serviços odontológicos, os achados desta pesquisa diferem dos resultados encontrados por Silva-Junior et al.9, na região metropolitana da Grande Vitória e de Silva e Lebrão10 na cidade de São Paulo, pois ambos os estudos encontraram maior oferta em hospitais públicos, seguidos de particulares, e por último filantrópicos.

Verificou-se um aumento da oferta de serviços odontológicos em hospitais de grande porte na RMBH, uma vez que no estudo de Oliveira, Guimarães e Costa3 no ano de 2003 existia um percentual de 57,57% e neste estudo de 2008, foi encontrada assistência odontológica em 66,67% dos hospitais de grande porte da RMBH.

Na RMBH encontrou-se serviços odontológicos oferecidos em hospitais que não fizeram parte do critério de inclusão da pesquisa e foi possível concluir que a disponibilidade de cirurgiões-dentistas não se condiciona ao seu porte, mas segue: nível de complexidade de atendimento, as especialidades oferecidas e a resolutividade do atendimento.

A tabela 1 evidencia que mais da metade dos serviços odontológicos (64,28%) foram implantados há mais de 16 anos. Este dado é importante, visto que os esforços governamentais e legislativos para incorporação do cirurgião-dentista ao hospital sejam recentes. Na RMBH, a inserção do cirurgião-dentista aconteceu precocemente em relação a grande maioria das cidades do Brasil, consolidando como uma prática necessária.

Poucos hospitais de grande porte (21,14%) incorporaram a odontologia nos últimos 10 anos, fato que também foi visto por Oliveira, Guimarães e Costa3 onde se detectou um decréscimo há 15 anos da abertura de novos serviços odontológicos em hospitais da RMBH, com maior redução de 10 anos até a atualidade.

No intuito de verificar o espaço físico cedido pelos hospitais para os procedimentos odontológicos, a tabela 2 mostra a localização e infraestrutura oferecida. Em todos os casos o cirurgião-dentista está presente no próprio ambiente hospitalar, com maior proximidade dos pacientes internados e de outros profissionais de saúde, sendo a infraestrutura localizada nas dependências dos hospitais presentes em 100% dos casos. No estudo de Silva-Junior et al.9, também em hospitais de grande porte na região metropolitana da Grande Vitória, 14,29% do espaço cedido a Odontologia era fora das dependências dos hospitais, 57,14% dentro e 28,57% em ambos. A presença de consultórios dentro das dependências dos hospitais facilita o auxílio do profissional, em ocasiões da necessidade esporádica de intervenção de outros profissionais de saúde. Nos casos de existência de serviços fora (14,29%) ou além das dependências hospitalares, constatou-se serem unidades odontológicas adicionais para os quais os pacientes são contra referenciados e atendidos em várias especialidades odontológicas que complementam o atendimento realizado no interior do hospital.

Foi visto neste estudo que o público beneficiário do atendimento odontológico pode diferir em cada estabelecimento hospitalar. De forma diferente dos estudos de Oliveira, Guimarães e Costa3 que encontraram uma maioria de hospitais (51,62%) oferecendo serviços odontológicos exclusivamente á população em geral, sem se ocupar com os internos; em 2008 os dados mostraram uma valiosa inversão, que é exatamente a incorporação do público interno, representado pelos acamados e pacientes ambulatoriais. Isto demonstra que a prevenção e a promoção de saúde bucal podem fazer parte da rotina da odontologia hospitalar11,12.

A dinâmica do acesso dos pacientes aos procedimentos odontológicos no ambiente hospitalar sofreu mudanças importantes do estudo de Oliveira, Guimarães e Costa3 em 2003 para este estudo de 2008, no que se refere ao fluxo para o atendimento. A questão observada relacionou-se com os mecanismos criados e implantados no ambiente hospitalar para fazer chegar aos pacientes os benefícios da promoção de saúde em Odontologia. Se no estudo de Oliveira, Guimarães e Costa3 o principal sentido do fluxo era por iniciativa dos pacientes se direcionarem aos serviços (84,21%), em 2008 já ocorre um equilíbrio de esforços por parte dos pacientes e profissionais, onde o sentido do fluxo se dá por iniciativa também dos profissionais se dirigirem ao paciente em 50% dos casos.

Ainda que o crescimento expansivo da odontologia hospitalar na RMBH tenha sido pequena, constatou-se que no interior dos hospitais houve crescimento das equipes odontológicas, variando de 28 profissionais no estudo de Oliveira, Guimarães e Costa3 em 2003 para 60 em 2008, sem acrescer o número de cirurgiões-dentistas residentes e acadêmicos de Odontologia. Esta é uma forma de constatar o fortalecimento da Odontologia na região.

O instrumental mais disponibilizado (Tabela 3) nos hospitais de grande porte da RMBH é aquele empregado nos atendimentos de urgência/emergência (85,71%) e nos exames clínicos (78,57%). Considerouse reduzido o percentual de jogos clínicos, isto pelo entendimento de serem instrumentos básicos no atendimento odontológico, além de ampla utilização e de baixo custo quando comparado à tecnologia médica intra-hospitalar. Compõe este grupo de instrumentos a pinça de algodão, o espelho bucal, sonda exploradora, podendo ou não estar acompanhado da sonda milimetrada.

Uma diferença marcante encontrada em 2003 por Oliveira, Guimarães e Costa3 foi que quase a totalidade dos hospitais oferecem instrumentais, apenas dois hospitais não oferecem, pois são terceirizados.

Dentre os instrumentos odontológicos encontrados no ambiente hospitalar destacam-se aqueles que são usados para atendimentos de cirurgia ambulatorial (71,43%), sendo que os instrumentos periodontais ultrapassaram em 2008 aqueles destinados a cirurgia buco-maxilo-facial (57,14%), o que pode representar uma preocupação com a interferência da condição periodontal nos pacientes com patologias sistêmicas, tais como: problemas renais, em especial nos transplantados13, nos pacientes portadores do Vírus da Imunodeficiência Humana14, nos pacientes com problemas cardiovasculares15, nos diabéticos16, nos pacientes internados em UTI17 e na prevenção da pneumonia hospitalar17,18. No trabalho de Oliveira, Guimarães e Costa3, somente 5,26% dos hospitais contavam com instrumentos periodontais.

Conforme interpretação da Organização Pan Americana de Saúde19, o hospital moderno está perdendo suas fronteiras tradicionais e mudando sua posição nos sistemas de saúde, abrindo espaços para maiores discussões científicos entre os diversos profissionais de diferentes áreas que atuam em conjunto nessa unidade de saúde. Nessa perspectiva, o presente estudo buscou saber sobre a existência de integração da Odontologia com outras áreas na atenção à saúde. Em 2003, Oliveira, Guimarães e Costa3 encontraram uma proporção de 63,15% dos hospitais com algum tipo de inter e/ou multidisciplinariedade, sendo que, em 2008, os 100% entrevistados confirmam a existência desta integração.

Compreendendo-se que a forma de contrato do profissional de saúde relaciona-se com a valorização da sua categoria e de seu trabalho, foram questionados os tipos de vínculos empregatícios utilizados pelos hospitais de grande porte da RMBH para garantir a oferta de serviços odontológicos. Na maioria dos hospitais que contam com serviços odontológicos (64,29%) há cargos concursados para os cirurgiõesdentistas, os quais convivem com colegas de profissão contratados ou sem vínculo empregatício que não possuem a mesma estabilidade empregatícia dos primeiros, conforme foi observado em 71,44% dos hospitais pesquisados. Na RMBH encontrou-se um número menor de hospitais com cirurgiões-dentistas concursados (57,14%), 28,57% não concursados e 14,28% em contrato para seleção de serviços (pró labore). O que mostra a necessidade real de valorização da profissão e do profissional através da extinção desta situação observada em 42,86% dos hospitais que ainda contam com dentistas sem qualquer vínculo empregatício, sem direitos de férias, décimo terceiro salário, fundo de garantia, tempo para aposentadoria e outras vantagens trabalhistas. O serviço pró-labore, oferecido por 14,29% dos hospitais pode representar mais um recurso para que a odontologia estabilize sua relação de trabalho em hospitais da RMBH.

De forma muito diversa dos achados de Oliveira, Guimarães e Costa3, quando seis cirurgiõesdentistas entrevistados revelaram nunca haver interrelacionamento das especialidades de saúde nos hospitais em que trabalhavam, em 2008 as interrelações ocorreram em 85,72% dos hospitais de forma frequente ou sempre e não houve qualquer referência a ausência de interações interdisciplinares. Apenas dois hospitais (14,28%) têm se comportado como cenário para inter-relações menos frequentes. Assim como no estudo de Oliveira, Guimarães e Costa3, o conhecimento sobre a frequência da interrelação mantida entre a odontologia e especialidades presentes no ambiente hospitalar foi compreendido como um meio de se mensurar o caráter usual ou eventual do contato interdisciplinar. Infere-se que os contatos esporádicos e a falta de contato não trazem ao paciente os mesmos benefícios de um relacionamento contínuo e frequente entre os profissionais.

Considerando as inúmeras possibilidades nas formas de inter-relacionamento dos profissionais de saúde no ambiente hospitalar, avançou-se a pesquisa na busca do entendimento da dimensão em que se dá esta relação, com o propósito, inclusive, de verificar se há preocupação em formalizá-la. Entendeu-se como formais, neste estudo, as relações de atendimento multi e interdisciplinar e/ou as solicitações formais de interconsultas. Portanto, foram compreendidos como informais os encaminhamentos verbais e as trocas de orientações técnicas.

São dados que demonstram um avanço em relação à configuração do trabalho odontológico detectado na pesquisa de Oliveira, Guimarães e Costa3, onde as formas das relações formais não ultrapassaram 56,31% respectivamente. Sendo que os resultados podem ultrapassar os 100% pois mais de uma opção pode ser assinalada. Ao contrário dos dados de Oliveira, Guimarães e Costa3, quando foi detectada a falta de qualquer tipo de integração em uma representativa parcela dos hospitais (47,37%), em 2008 não houve relato de falta de integração, o que nos leva a comentar que não mais existe o isolamento vivido pela odontologia no ambiente hospitalar, que refletia na dificuldade de integração interdisciplinar em um ambiente onde as ações se confundem, apesar da área de cirurgia buco-maxilo-facial ser legalmente restrita ao cirurgião-dentista e são realizadas em local onde já se consagrou a presença de profissionais médicos.

Para avaliar o nível de participação e valorização do cirurgião-dentista no ambiente hospitalar foi avaliado seu poder de decisão na rotina hospitalar. A participação dos profissionais da odontologia nos processos decisórios implica ao mesmo tempo no emprego de um modelo democrático de gestão, como também no grau de respeitabilidade da gerência pelo trabalho odontológico desenvolvido no local. Foi visível o avanço da categoria nos últimos cinco anos em que, a princípio, apenas 5,26% dos hospitais ofereciam condições para a participação ativa dos dentistas nas decisões internas, passando no ano de 2008 para 35,71% dos hospitais. Em um ambiente em que a classe odontológica continua sendo minoria e com reduzido impacto na condição de vida e morte do paciente, podem-se considerar tais percentuais como uma conquista dos profissionais, provavelmente alcançada mediante a comprovação diária de sua importância nesse local.

Vale ressaltar que poucos são os estudos que trazem dados do cenário da odontologia hospitalar no Brasil e no mundo. Esta premissa trouxe limitações para execução do estudo, principalmente em relação à comparação de dados que poderiam valorizar os achados entre pesquisas similares. Deve-se assim, haver mais estudos que contemplem a inserção da odontologia hospitalar, para uma maior evidência científica dos dados publicados.

 

CONCLUSÃO

A maioria dos hospitais de grande porte na RMBH apresenta cirurgiões-dentistas e essa presença oferece aos pacientes um atendimento mais amplo e integral.

Verificou-se a integração entre especialidades médicas e odontológicas em todos os hospitais pesquisados o que indica a possibilidade de uma atuação interdisciplinar que seja eficaz no tratamento do paciente.

Os recursos odontológicos, compreendidos por infraestrutura e instrumentais específicos oferecidos pelos hospitais para realização dos tratamentos odontológicos podem ser aumentados em quantidade e diversidade, para um atendimento que contemple um maior número de especialidades odontológicas que possam interferir na saúde sistêmica do paciente hospitalizado.

 

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