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Arquivos em Odontologia

versão impressa ISSN 1516-0939

Arq. Odontol. vol.50 no.3 Belo Horizonte Jul./Set. 2014

 

 

Acurácia do diâmetro de ponta de cones de gutapercha com diferentes conicidades

 

Accuracy of the tip diameter on gutta-percha cones of different tapers

 

 

Eloísa Higashi Castilho I; Maria Leticia Borges Britto II; Manoel Eduardo de Lima Machado III; Cleber Keiti Nabeshima IV

 

I Cirurgiã-dentista, São Paulo, SP, Brasil
II Departamento de Endodontia, Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, SP, Brasil
III Departamento de Dentística, Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo, USP, São Paulo, SP, Brasil
IV Programa de Pós-Graduação em Endodontia, Faculdade de Odontologia, USP, São Paulo, SP, Brasil

Contatos: elo.hig@hotmail.com, m.leticiabritto@globo.com, professormachado@hotmail.com, cleberkn@hotmail.com

 

 


 

RESUMO

Objetivo: O objetivo deste estudo foi analisar o diâmetro da ponta de cones de guta-percha com diferentes conicidades, considerando a especificação do fabricante. Materiais e Métodos: Cento e quarenta cones de guta percha (Dentsply Maillefer): F2, F3, e 25, 30, 35 e 40 de conicidade .02, .04 e .06 (n = 10) foram utilizados neste estudo. Os cones foram presos em uma régua calibradora, e observados em microscópio ótico com aumento de 40x. Então, o diâmetro da ponta de cada cone foi medido com paquímetro digital. Os dados foram categorizados como corretos ou incorretos utilizando margem de erro de ±0,01 mm e submetidos ao teste Exato de Fisher (p ≤ 0,05). Resultados: Somente 4 cones de guta percha estavam incorretos, porém não houve diferença estatisticamente significativa entre os cones em relação ao padrão estabelecido pelo fabricante. Conclusão: Conclui-se que os cones principais da marca Dentsply Maillefer, independente de sua conicidade (.02, .04, .06, F2 e F3), possuem o diâmetro da ponta calibrado de acordo com a especificação do fabricante.

Descritores: Guta-percha. Obturação do canal radicular. Endodontia.


 

ABSTRACT

Aim: This study was aimed to analyze the tip diameter of gutta-percha cones of different tapers regarding manufacturer specifications. One hundred forty gutta-percha cones (Dentsply Maillefer): F2 and F3, as well as 25, 30, 35, and 40 of taper .02, .04, and .06 (n = 10) were used for this study. The cones were fitted into a calibrator ruler and observed by optical microscopy at a magnification of 40X. Next, the tip diameter was measured using a digital pachymeter. The data were classified as correct or incorrect considering ±0.01 mm of error, and the Fisher Exact test was applied (p ≤ 0.05). Results: Four gutta percha cones proved to be incorrect; however no significant differences could be observed among the groups regarding manufacturer standards. Conclusion: It could therefore be concluded that Dentsply Maillefer gutta percha cones, regardless of the tapers (.02, .04, .06, F2 and F3), possess a tip diameter that is calibrated according to manufacturer specifications.

Uniterms: Gutta-percha. Root canal obturation. Endodontics.


 

 

INTRODUÇÃO

O tratamento endodôntico é composto por diversas etapas e, dentre elas, a obturação que propõe o selamento do sistema de canais radiculares a fim de evitar o acesso de bactérias e fluídos à região periapical. Este é um fato que exige muita atenção, pois a qualidade de obturação caracterizada como insatisfatória tem sido relacionada ao alto índice de insucesso de dentes tratados endodonticamente1.

A guta-percha associada ao cimento é o material sólido mais utilizado para a obturação e a literatura tem mencionado a importância de sua adaptação à parede do canal radicular2-7, onde a quantidade de cimento deverá ser mínima8,9, pois o excesso de cimento pode se solubilizar quando em contato com os fluidos periapicais, resultando na perda de selamento10.

Com o desenvolvimento dos instrumentos rotatórios, além dos cones de guta-percha convencionais .02, surgiram os de conicidade .04 e .06, além de específicos como o cone ProTaper, atualmente intitulado de ProTaper Universal. Estes cones possibilitam a obturação pela técnica de cone único, que é rápida e de simples execução. No entanto, tem sido observado que tais cones não se adaptam bem às paredes do canal após o preparo mecanizado, principalmente no terço apical, sendo necessário o uso de cones mais calibrosos para a obturação4-9. O travamento apical do cone tem sido utilizado como referência clínica de boa adaptação, todavia, o contato efetivo do cone às paredes circundantes do canal radicular não está relacionado com a sensação tátil de travamento3 e isto não garante o total selamento do canal11. Além disso, tem sido observado que os cones de guta percha não são padronizados12-16, o que poderia também resultar em uma má adaptação do cone às paredes do canal.

Assim, diante do exposto, a proposta do presente estudo foi analisar a confiabilidade das características dimensionais da ponta dos cones ProTaper Universal F2 e F3, e cones 25, 30, 35 e 40 de conicidade .02, . 04 e .06 tomando-se como referência o padrão estipulado pelo fabricante.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Para o presente estudo foram utilizados 140 cones principais de guta-percha (Dentsply Maillefer, Ballaigues, Switzerland) tamanhos 25, 30, 35 e 40 de conicidade .02, .04 e .06, e cones ProTaper Universal F2 e F3 (10 de cada).

Cada cone foi retirado aleatoriamente de diferentes caixas como é vendido comercialmente, e introduzido num orifício de maior calibre de uma régua calibradora (Dentsply Maillefer, Ballaigues, Switzerland), de modo que 3 mm da ponta do cone transpassasse o orifício, e ficasse livre para medição do diâmetro em D0.

Com o cone bem preso no orifício, a régua foi colocada sobre um copo descartável, que serviu de suporte para a régua.

Assim, a ponta do cone foi focalizada no microscópio óptico (DFVasconcelos, São Paulo, Brasil) com aumento de 40x, e com um paquímetro digital calibrado (Lee Tools, Hong Kong, China), o diâmetro em D0 de cada cone foi medido. Todas as medições foram conferidas três vezes, e realizadas por um único operador calibrado previamente.

Todas as medidas adquiridas foram tabuladas e classificadas como correta ou incorreta a partir da referência padrão estipulada pelo fabricante (pontas de diâmetro 0,25 mm, 0,30 mm, 0,35 mm, 0,40 mm, 0,25 mm para ProTaper Universal F2 e 0,30 mm para ProTaper Universal F3), levando-se em consideração a margem de erro de ±0,01 mm. Assim, os dados foram submetidos ao teste Exato de Fisher, com nível de significância de 5%.

 

RESULTADOS

Levando-se em consideração a variação de ±0.01 mm, somente quatro cones principais não estavam na medida correta: um cone 25.04, um 30.02, um 35.04 e um 35.06. O teste Exato de Fisher não apresentou diferença estatisticamente significativa entre os cones principais testados (p>0,05), mostrando-se que a maioria dos cones estavam calibrados ou muito próximos do diâmetro referência padrão estipulada pelo fabricante.

 

DISCUSSÃO

Cada vez mais há uma maior exigência por parte dos pacientes por tratamentos endodônticos com tempo reduzido; logo, a instrumentação mecanizada e a técnica de obturação por cone único vêm facilitar e contribuir de maneira significava neste conceito. Contudo, a qualidade do tratamento deve ser quesito obrigatório e muito bem avaliado para que o sucesso não seja comprometido. Dentro deste conceito, podese observar que o diâmetro dos cones estandardizados é incompatível aos preparos produzidos pelos sistemas rotatórios4-9. A literatura mostra que muitos cones não correspondem às especificações dos fabricantes12,15,16,17, e estudos avaliando os cones ProTaper Universal são escassos. Por este motivo, a proposta deste estudo foi verificar a confiabilidade de cones .02, .04, .06 e ProTaper Universal. Neste particular, a avaliação especificamente dos cones 25, 30, 35 e 40 foi utilizada por serem as pontas mais utilizadas pela técnica de cone único, com referência aos cones ProTaper Universal F2 e F3 que possuem respectivamente ponta 25 e 30. Os cones 35 e 40 são importantes nesta avaliação porque muitas vezes se adaptam adequadamente aos preparos finalizados com ProTaper Universal F3.

Os resultados do presente estudo demonstraram alto índice de confiabilidade dos cones testados. Outros autores avaliaram esta mesma marca em estudos prévios com cones .02, e encontraram resultados insatisfatórios com falta de padronização. A discordância com nossos resultados poderia ser justificada pelo modelo metodológico adotado em cada estudo. Cunha et al.12 (2003) analisaram o diâmetro do cone através de uma régua calibradora, no entanto, Cagol et al.18 (2009) demonstram que tais réguas também não são eficazes para medição do diâmetro do cone. Outros autores optaram pela medição do diâmetro através de um paquímetro digital15,16,18. No entanto, esta medição era realizada a olho nu. No presente estudo utilizou-se de um microscópio óptico num aumento de 40x, pois a guta-percha é um material maleável e extremamente sensível, e a ponta do paquímetro poderia deformála no momento de sua adaptação ao cone, e assim resultar numa medida incorreta; a visualização pelo microscópio nos dá maior precisão nesta adaptação. Borges et al.19 (2011) analisaram a confiabilidade dos cones de diferentes conicidades (.02 ,.04 e .06), e também encontraram falta de padronização em todos eles. No entanto os autores também realizaram a análise a olho nu. Vale mencionar que a medição em duas casas decimais é tão sensível que o próprio paquímetro oscilava ± 0,01mm durante a medição. Por esta razão esta margem de erro foi considerada correta para a realização da análise estatística. Nesse particular, Borges et al.19 (2011) menciona que os níveis de tolerância aceitos pela especificação ANSI/ ADA n° 28 para o diâmetro variam 0,05 a 0,07 mm, dependendo do tamanho do cone, no entanto, esta tolerância não foi seguida no presente estudo por se tratar de uma variação muito grande para as medidas utilizadas. A exemplo, se a variação de 0,05 a 0,07 fosse considerada como tolerante, um cone #30 poderia chegar ao diâmetro #37 e seria classificado como correto, o que não parece aceitável desde que a variação entre os cones principais disponíveis para uso é de 0,05, ou seja, os cones seguintes seriam de diâmetro #35, #40, e assim por diante. A importância principal da confiabilidade do diâmetro de D0 do cone com o mínimo de variação possível está relacionada ao selamento e ao acesso aos tecidos periapicais. Sob o aspecto microbiológico, estudos têm demonstrado que bactérias ainda podem ficar alojadas nos túbulos dentinários e ramificações após o tratamento endodôntico, assim, as mesmas devem ser isoladas no endodonto sem acesso à região periapical20,21. Embora a guta-percha não possua adesão à parede dentinária, a mesma é de extrema importância para o preenchimento do canal devido à sua insolubilidade, porém a boa adaptação ao D0 é importante para que a quantidade de cimento endodôntico seja o mínimo possível.

É notória a modernização dos instrumentos e seus acessórios, porém a padronização de alguns produtos parece não terem evoluído simultaneamente, visto que as próprias réguas calibradoras não estão disponíveis para conicidades maiores. Além disso, deve-se levar em consideração que maior parte de estudos sobre confiabilidade de cones que afirmam falta de padronização são estudos antigos. A fabricação destes cones era feita de forma artesanal, ou seja, eles eram rolados a mão, e atualmente passam por um processo de industrialização, o que também seria uma explicação para a diferença de resultados anteriores. Este fator já era mencionado quando se observava a falta de equivalência dos cones estandardizados com os instrumentos manuais de mesmo calibre22. Sendo assim, novos estudos deverão ser realizados para se verificar também a confiabilidade de cones na atualidade com outras marcas comerciais.

De acordo com os resultados obtidos e a metodologia aplicada, é licito concluir que os cones principais da marca Dentsply Maillefer, independente de sua conicidade (.02, .04, .06, F2 e F3), possuem o diâmetro do D0 calibrados de acordo com a especificação do fabricante.

 

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