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Arquivos em Odontologia

versão impressa ISSN 1516-0939

Arq. Odontol. vol.51 no.2 Belo Horizonte Abr./Jun. 2015

 

 

Análise do perfil de encaminhamentos realizados pela Atenção Básica/Saúde da Família do município de Belo Horizonte ao serviço de Estomatologia do Hospital Municipal Odilon Behrens

 

Profile analysis of referrals made by primary care/ family health program to the stomatology service of the Odilon Behrens Municipal Hospital

 

 

Nayara Roberta de Andrade BarbosaI; Aline Fernanda CruzII; Júlio César Tanos de LacerdaIII; Renata Gonçalves ResendeIV

 

I Programa de Residência Multiprofissional em Saúde, Hospital Municipal Odilon Behrens, Belo Horizonte, MG
II Curso de Odontologia, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG
III Cirurgião-buco-maxilo-facial, Hospital Municipal Odilon Behrens, Belo Horizonte, MG
IV Estomatologista, Hospital Municipal Odilon Behrens, Belo Horizonte, MG

Contatos: nayara.roberta.ab@gmail.com, alinecruzz16@gmail.com, jctlacerda@uol.com.br, renatagresende@yahoo.com.br

 

 


 

RESUMO

Objetivo: Avaliar o tipo e a relevância dos encaminhamentos feitos pela Atenção Básica/ Saúde da Família, do município de Belo Horizonte (BH), ao serviço de Estomatologia do Hospital Municipal Odilon Behrens (HOB) e analisar os critérios do Protocolo de Regulação da Saúde Bucal de BH. Material e Métodos: Para isso, realizou-se estudo epidemiológico transversal, fundamentado na análise retrospectiva e descritiva dos livros de registro do HOB e das listagens de marcação de consulta especializada de todos os pacientes encaminhados ao serviço de Estomatologia do HOB do período de janeiro de 2013 a junho de 2014. Resultados: Foram avaliados os encaminhamentos de 1992 pacientes, dos quais 71% (1414) compareceram às consultas agendadas. Houve predominância feminina entre os participantes e idade média de 54 anos. Quanto à prioridade dos encaminhamentos, foram encontrados: 513 (37%) prioridades alta, 422 (30%) prioridades média e 231 (16%) prioridades baixa. 75 (5%) dos encaminhamentos recebidos apresentavam alterações cujas características não estão descritas nos critérios do protocolo. 62 (4%) foram encaminhados erroneamente e 105 (8%) não possuíam alterações no momento da consulta. Assim, os encaminhamentos realizados pela atenção básica estão em conformidade com os critérios estabelecidos pelo Protocolo de Regulação. Mas, ao se comparar as alterações encontradas com o protocolo, observou-se critérios pouco objetivos, ocasionando discrepância entre a orientação do Ministério da Saúde e os atendimentos realizados pelo serviço de Estomatologia no município de BH. Conclusão: Sendo assim, ainda há a necessidade de revisão do protocolo atual, além da necessidade de instituir uma política de educação permanente na atenção básica.

Descritores: Serviços de saúde. Atenção básica à saúde. Atenção secundária de saúde. Diagnóstico bucal.


 

ABSTRACT

Aim: This study aimed to evaluate the type and relevance of referrals by Primary Care / Family Health Program to the Stomatology Department of Odilon Behrens Municipal Hospital (HOB) and analyzed the criteria of the Belo Horizonte Oral Health Regulation Protocol. Methods: The authors conducted a cross-sectional epidemiological study, based on retrospective and descriptive analysis of the HOB’s logs and specialized consultation appointment listings of all patients referred to the HOB’s Stomatology Department from January 2013 to June 2014. Results: This study evaluated 1,992 patient referrals, of which 71% (1414) attended the scheduled visits. There was a predominance of female participants and the average age was 54 years. Regarding the prioritization of referrals, the following data were found: 513 (37%) high priorities, 422 (30%) average priorities, and 231 (16%) low priorities; 75 (5 %) of the received referrals presented changes, whose characteristics are not described in the protocol criteria; 62 (4%) were wrongly referred to the stomatology department, and 105 (8%) presented no change at the time of the doctor’s appointment. Thus, the referrals made by primary care are in accordance with the criteria established by the oral health regulation protocol. However, upon comparing the changes found through the protocol, what could be observed was that the criteria presented little objectivity, resulting in adiscrepancy between the advice provided by the Ministério da Saúde and the services performed by the stomatology services in Belo Horizonte. Conclusion: Therefore, the results indicate the need to revise the current protocol and reveal the need to establish a permanent education policy in primary care.

Uniterms: Health services. Primary healthcare. Secondary healthcare. Oral diagnosis.


 

 

INTRODUÇÃO

Os serviços de saúde bucal no Brasil apresentam-se como um dos grandes desafios a serem equacionados pelo sistema público de atenção à saúde pela demanda acumulada nas últimas décadas. O Ministério da Saúde (MS) promoveu a ampliação dos serviços, principalmente por meio das equipes de Saúde Bucal na Estratégia Saúde da Família e de Atenção Especializada em Saúde Bucal1. A Estomatologia, especialidade que faz a prevenção, diagnóstico e tratamento das alterações da cavidade bucal, foi uma das especialidades contempladas por essa ampliação2.

A Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte (SMSA – BH), Minas Gerais, trabalha na perspectiva de construção de Rede de Atenção à Saúde buscando organização contínua e integral, com aposta na coordenação pela atenção básica3. Atenção Básica é a terminologia utilizada no país e internacionalmente para denominar Atenção Primária à Saúde (APS)4. Logo, a APS funciona como elemento de ordenamento dos fluxos e contra-fluxos de pessoas, produtos e informações nas redes, dialogando com as atenções secundárias e terciárias através da regulação assistencial.

A regulação assistencial é aqui entendida como o conjunto de ações realizadas ou desenvolvidas em todas as etapas do processo de atendimento do usuário, da solicitação da consulta especializada e ou exame até seu atendimento e retorno à unidade solicitante5.

O sistema informatizado de marcação de consultas especializadas na SMSA – BH utiliza o software disponibilizado pelo Ministério da Saúde (SISREG) sendo que este foi adaptado à realidade do município. As vagas para esse nível de complexidade são finitas e, portanto, o encaminhamento para consultas e a solicitação dos exames complementares devem ser uma conduta reservada apenas àqueles pacientes com boa indicação clínica, baseada nos critérios estabelecidos pelo protocolo de encaminhamentos6.

No município de Belo Horizonte, o serviço de Estomatologia do Hospital Municipal Odilon Behrens (HOB) é responsável pela maioria das consultas desta especialidade na rede SUS/BH7. Os profissionais da atenção básica ficam responsáveis pelo primeiro atendimento ao paciente e ocorre o encaminhamento desses usuários aos centros especializados apenas em casos mais complexos8.

Diante deste cenário, o objetivo deste estudo foi avaliar o tipo e a relevância dos encaminhamentos feitos pela Atenção Básica/ Saúde da Família ao serviço de Estomatologia do HOB e verificar se os critérios do Protocolo de Regulação atual estão em concordância com o Manual de Especialidades em Saúde Bucal do MS.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Este trabalho foi submetido à avaliação dos Comitês de Ética em Pesquisa do HOB e da SMSABH, sendo aprovado com os números 830.894 e 857.425, respectivamente.

Efetuou-se uma pesquisa retrospectiva por meio da análise dos livros de registro do HOB e das listagens de marcação de consulta especializada da SMSA - BH de todos os pacientes encaminhados via SISREG ao serviço de Estomatologia do HOB do período de janeiro de 2013 a junho de 2014.

Para a classificação das lesões e atribuição da prioridade dos encaminhamentos foram obedecidos os critérios estabelecidos pelo Protocolo de Regulação da Saúde Bucal do município de Belo Horizonte9. O protocolo estabelece critérios para referência entre a atenção básica e os pontos de atenção especializada. Em relação à Estomatologia, o protocolo estabelece como prioridade alta: lesões proliferativas de tecido mole sem associação com próteses; úlceras, manchas brancas e/ou vermelhas com mais de 15 dias de evolução; nódulos ou tumores; lesões radiolúcidas de limites imprecisos; dificuldade de abertura de boca associada a lesões; lesões pigmentadas com história de crescimento recente; usuário portador do HIV, com CD4 maior que 350 que apresentar lesões bucais sugestivas de doenças oportunistas. Prioridade média: remoção de cistos em tecidos moles; lesões radiolúcidas com limites precisos; xerostomia; hiperplasias em região de atrito, associadas ao uso de prótese removível. E como prioridade baixa: lesões pigmentadas com imagem radiográfica compatível com tatuagem por amálgama; úlceras com período de evolução inferior a 15 dias; variações da normalidade.

As variáveis sexo, idade, hipótese diagnóstica e prioridade do encaminhamento foram examinadas e armazenadas em planilhas do Excel. A análise estatística descritiva foi utilizada para interpretação dos dados.

 

RESULTADOS

Através do SISREG, no período compreendido entre janeiro de 2013 e junho de 2014, foram encaminhados 1992 pacientes ao serviço de Estomatologia do HOB. 1420 pacientes (71%) compareceram às consultas agendadas, sendo que seis pacientes desistiram da consulta antes de serem atendidos. Após a análise descritiva dos livros de registro do HOB e das listagens de marcação de consulta especializada da SMSA – BH verificou-se que foram realizadas 5067 consultas pela Estomatologia no HOB. Desse total, 1414 (28%) consultas foram agendadas através do SISREG, sendo que 893 (63%) pacientes eram do sexo feminino com idade média de 55 anos e 521 (37%) eram do sexo masculino com idade média de 53 anos. Foram desconsiderados no estudo os registros de pacientes que desistiram da consulta após darem entrada no hospital e registros com hipótese diagnóstica a definir, reduzindo nossa amostra a 1408 pacientes.

Quanto à prioridade dos encaminhamentos, foram encontrados: 513 (37%) prioridades alta (Tabela 1), 422 (30%) prioridades média (Tabela 2) e 231 (16%) prioridades baixa (Tabela 3). Os demais encaminhamentos foram assim classificados: 75 (5%) não se enquadram ao protocolo (Tabela 4), 62 (4%) constituem encaminhamentos errôneos (Tabela 5) e 105 (8%) não apresentavam alteração no momento da consulta. A classificação das hipóteses diagnósticas e a atribuição de prioridade aos encaminhamentos seguiram os critérios estabelecidos pelo Protocolo de Regulação da Saúde Bucal da SMSA - BH (SISREG – Saúde Bucal 2014).

Dentre os encaminhamentos classificados como prioridade alta (Tabela 1) destacam-se em maior proporção úlceras, manchas brancas e/ou vermelhas com mais de 15 dias de evolução (53%) e lesões proliferativas de tecido mole sem associação com próteses (31%).

 

 

 

Nos encaminhamentos classificados como prioridade média (Tabela 2) sobressaíram hiperplasias em região de atrito, associadas ao uso de prótese removível (67%) e remoção de cistos em tecidos moles (20%).

 

 

 

Os encaminhamentos prioridade baixa (Tabela 3) eram compostos em sua maioria por variações da normalidade (54%) e úlceras com período de evolução inferior a 15 dias (40%).

 

 

 

Dos encaminhamentos recebidos setenta e cinco (5%) apresentavam alterações cujas características não estão descritas nos critérios do protocolo (Tabela 4).

 

 

 

Dentre os pacientes atendidos 62 (4%) foram encaminhados erroneamente à Estomatologia (Tabela 5) e 105 (8%) não possuíam alterações no momento da consulta.

 

 

 

DISCUSSÃO

Este trabalho mostrou, após a análise descritiva dos livros de registro do HOB e das listagens de marcação de consulta especializada da SMSA – BH, que apenas uma pequena parcela do total de consultas realizadas pela Estomatologia no HOB, dentro do período avaliado, corresponde a primeiras consultas agendadas através do SISREG. Esse dado mostra que somente parte das consultas segue o fluxo de encaminhamento determinado pela SMSA - BH. As demais consultas são compostas por retorno de pacientes em tratamento e pacientes oriundos de outros mecanismos de acesso (Pronto Socorro do HOB e via demanda espontânea vinda de outros municípios e do próprio município de Belo Horizonte).

Observou-se ainda uma taxa de absenteísmo de aproximadamente 30%. Isso pode sugerir o fato de encaminhamentos à atenção secundária serem realizados precocemente por parte da atenção básica. Sendo assim, no momento em que a vaga para a consulta especializada é liberada, a alteração que gerou o encaminhamento pode já ter apresentado remissão espontânea e o paciente não comparece ao atendimento. Outra possibilidade é a de que o paciente tenha optado por não comparecer à consulta, por motivos diversos, mesmo com a lesão ainda presente. Apesar de não terem sido encontrados relatos na literatura de absenteísmo em consultas iniciais, há registros de abandono do tratamento por parte dos pacientes mesmo após terem suas lesões diagnosticadas. Estudos realizados na clínica de Estomatologia da Universidade Paulista (UNIP) estimam que aproximadamente 8% dos pacientes desistiram do tratamento.

A predominância feminina encontrada na amostra analisada também é vista em outros estudos10-16 e pode indicar, em parte, uma maior sensibilização e preocupação das mulheres em relação ao cuidado da boca, quando comparado aos homens11,12,15.

Quanto à prioridade dos encaminhamentos, os dados encontrados sugerem que a atenção básica tem encaminhado os pacientes em conformidade com os critérios estabelecidos pelo Protocolo de Regulação da Saúde Bucal da SMSA – BH9. Todavia, ao se realizar uma análise dos tipos de lesões que se enquadram aos critérios atualmente estabelecidos pelo protocolo, observa-se que o mesmo apresenta critérios pouco objetivos, ocasionando encaminhamentos nos quais lesões graves acabam inseridas em prioridade média e baixa, enquanto lesões sem grande importância são inseridas em prioridade alta.

A análise dos encaminhamentos de prioridade alta, segundo o Protocolo de Regulação da Saúde Bucal do município de Belo Horizonte, revela que boa parte destes encaminhamentos eram compostos por lesões de baixa gravidade, tais como granuloma, lipoma, fibromas e lesões verrucosas. Mas que se encaixavam no critério "lesões proliferativas de tecido mole sem associação com próteses", estabelecido pelo protocolo para determinar prioridade alta. O mesmo acontece para os casos de candidose, que encontram no critério "úlceras, manchas brancas e/ ou vermelhas com mais de 15 dias de evolução" uma justificativa para ser encaminhados à atenção especializada. A candidose é uma doença comum, de tratamento simples e que na maioria dos casos não requer tratamento especializado. O encaminhamento destes casos sobrecarrega a atenção secundária/ terciária e gera custos desnecessários. Uma vez que o tratamento de primeira escolha consiste em terapia tópica com medicação antifúngica de distribuição gratuita nos centros de saúde, acompanhada de orientações relacionada à higiene e supervisão semanal do quadro2, sendo passível de execução na atenção básica.

Enquanto isso, lesões que requerem maior atenção como, por exemplo: ameloblastoma, cisto dentígero, tumor odontogênico queratocístico, que podem ser enquadradas no critério "lesões radiográficas com limites precisos", acabam sendo encaminhadas como prioridade média. E há ainda aquelas que requerem um cuidado diferenciado como o eritema multiforme e as doenças autoimunes, que acabam classificadas como prioridade baixa, pois se enquadram no critério úlceras "com período de evolução inferior a 15 dias". Muitas dessas lesões apresentam outras características clínicas como: aparecimento rápido, são múltiplas (acometendo às vezes toda a cavidade bucal), podem causar assimetria facial, dificuldade de abertura bucal e disfagia, que justificariam o seu enquadramento como prioridade alta.

Outro fator que deve ser destacado em relação ao Protocolo de Regulação atual é a ausência de critérios para se classificar alguns grupos de lesões. Alguns encaminhamentos apresentavam lesões (lesões de origem vascular, alterações linfonodais, lesões vesiculosas, nevralgias, aumentos de volume/ abscessos de origem não odontogênica e condições infecciosas de glândulas salivares) cujas características não estão descritas no protocolo.

Sob o ponto de vista do fluxo de pacientes, em parte dos casos houve desaparecimento da alteração inicialmente observada pelo cirugião-dentista da atenção básica entre o agendamento da consulta e o atendimento especializado, refletindo certa ansiedade na condução dos casos por parte destes profissionais. Da mesma forma, alguns dos pacientes atendidos foram encaminhados erroneamente à Estomatologia. Estes deveriam ter sido direcionados a outras especialidades da odontologia (endodontia, periodontia, cirurgia buco-maxilo-facial, dor orofacial ou disfunção temporomandibular) e à clínica médica. Também houve casos de lesões reacionais (úlceras traumáticas) classificadas como prioridade baixa, onde a remoção do agente causal e acompanhamento da evolução do caso poderiam ser realizados na atenção básica. A soma destes grupos representou 16% dos casos (224 pacientes), demonstrando que a rede de atendimento nem sempre funciona em sintonia com os critérios estabelecidos.

O Manual de Especialidades em Saúde Bucal, lançado pelo MS, visa colaborar com o estabelecimento de critérios de referência e contrareferência entre a atenção básica e os pontos de atendimento secundários. De acordo com o manual, a preservação dos casos mais complexos deve ser realizada no nível secundário, sem que se perca a continuidade do cuidado na atenção básica. Em relação à Estomatologia, o manual define o papel do dentista na atenção básica e na secundária frente às lesões bucais. Compete à atenção especializada o diagnóstico e tratamento das lesões bucais, por meio de exames clínicos e complementares, biópsia, terapêutica cirúrgica (nível ambulatorial) e medicamentosa, quando pertinente. Cabe à atenção básica a avaliação do usuário com queixa de alteração bucal em tecidos moles e/ou duros, identificando as alterações não compatíveis com a normalidade. E é de responsabilidade do cirurgião-dentista da equipe da Unidade Básica de Saúde/ Saúde da Família (UBS/ SF) realizar o diagnóstico e tratamento de lesões prevalentes da mucosa bucal tais como: hiperplasia fibrosa inflamatória, estomatite protética, herpes recorrente, gengivo-estomatite herpética primária, estomatite aftosa recorrente, candidíase e queilite angular, tratamento e remoção de fatores traumáticos da mucosa bucal tais como próteses mal-adaptadas, dentes ou restaurações fraturadas e raízes residuais, hábitos para-funcionais, triagem de pacientes com mais de 40 anos, fumantes e etilistas, ou pacientes de pele clara com histórico de exposição solar excessiva2.

Se comparados os dados do presente estudo com as orientações do MS, verifica-se que há uma discrepância entre a orientação governamental e os atendimentos realizados pelo serviço de Estomatologia no município de Belo Horizonte. Quando somadas, as condições atribuídas como responsabilidade da atenção básica pelo MS e que foram encaminhadas à Estomatologia representam 39% (n = 548) dos casos. Se acrescentado a esse valor os encaminhados erroneamente e os que não possuíam alterações no momento da consulta, observa-se que mais da metade destes atendimentos seriam passíveis de resolução na atenção básica, o que diminuiria custos hospitalares e o ônus de encaminhamentos desnecessários aos pacientes. Além disso, canalizaria o atendimento especializado para os casos mais graves, que necessitam de uma maior atenção, seja pela dificuldade do diagnóstico, pela necessidade de exames complementares não disponíveis na atenção básica, ou pela complexidade do tratamento, que muitas vezes requer recursos disponíveis em ambiente hospitalar.

Os dados do presente estudo sugerem que há necessidade de uma revisão do Protocolo de Regulação atual, a fim de tornar os critérios de encaminhamentos menos genéricos e facilitar sua compreensão pelos cirurgiões-dentistas da atenção básica. Encaminhamentos equivocados e dispensáveis sobrecarregam os serviços de atenção especializada e geram um ônus desnecessário à saúde pública, pois as consultas nas atenções secundárias e terciárias têm um custo maior que as da atenção básica.

Finalmente deve ficar claro que o tratamento oferecido nos serviços de atenção secundária em saúde é uma continuidade do trabalho realizado pela rede de atenção básica. Os profissionais da atenção básica são responsáveis pelo primeiro atendimento ao paciente, pelo encaminhamento aos centros especializados apenas de casos mais complexos8 e, muitas vezes, no auxílio ao controle ambulatorial desse paciente, no intuito de se detectar precocemente possíveis recidivas da doença após o tratamento.

 

CONCLUSÃO

O presente trabalho mostrou uma abordagem diferenciada dentro da Odontologia e da Saúde Pública, no sentido de compreender e melhorar a estrutura do serviço público em relação à Estomatologia. Foi possível identificar a relevância entre os encaminhamentos feitos pela atenção básica à Estomatologia, em vez de identificar a prevalência de alterações bucais.

Observou-se, ao comparar as alterações encontradas nos encaminhamentos com o protocolo de regulação, que há necessidades de ajustes no fluxo atual. Há uma sobrecarga da atenção especializada e discrepâncias entre a orientação governamental e os atendimentos realizados no município, visto que 51% dos atendimentos realizados seriam passíveis de resolução na atenção básica. Os resultados encontrados indicam ainda a necessidade de revisão do protocolo atual, que apresenta critérios pouco objetivos e de educação permanente na atenção básica, para que a mesma possa se tornar mais resolutiva na condução de seus casos.

 

REFERÊNCIAS

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