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Arquivos em Odontologia

versão impressa ISSN 1516-0939

Arq. Odontol. vol.51 no.2 Belo Horizonte Abr./Jun. 2015

 

 

Resíduos dos serviços de saúde: conhecimento sobre a geração e responsabilidade dos formandos em Odontologia das faculdades de Santa Catarina

 

Health service waste: knowledge on the generation and responsibility of trainees in dentistry of Santa Catarina faculties

 

 

Keila Cristina Rausch PereiraI; Kym Westphal LocksII; Luana May SquizattoII; Manoelito Ferreira Silva JuniorIII; Paula Vitali MiclosIV

 

I Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva, Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, SC
II Cirurgiã-dentista, Tubarão, SC
III Programa de Pós-graduação em Odontologia (Saúde Coletiva), Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Universidade Estadual de Campinas (FOP/ UNICAMP), Piracicaba, SP
IV Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva, UFSC, Florianópolis, SC

Contatos: keila.pereira@unisul.br, kymwes@gmail.com, luanamay@hotmail.com, manoelito_fsjunior@hotmail.com, pvmiclos@gmail.com

 

 


 

RESUMO

Objetivo: Avaliar o conhecimento dos formandos em Odontologia sobre Resíduos dos Serviços de Saúde (RSS) gerados em consultórios odontológicos. Material e Métodos: Estudo descritivo e transversal com abordagem quantitativa. O universo eleito foram os alunos concluintes do curso de Odontologia das faculdades do estado de Santa Catarina, Brasil. O cálculo amostral foi determinando em 198 alunos. Os dados coletados foram digitados em Excel 2010 (Microsoft) e os resultados expressos por frequências absolutas e relativas. Resultados: Embora existam oito faculdades de Odontologia no estado de Santa Catarina, duas não aceitaram participar do estudo e uma não havia turma concluinte. Houve participação de 138 (73,0%) formandos. Dentre os alunos participantes, 92,2% afirmaram saber o que são resíduos de serviços de saúde. Sobre a forma de descarte, 76,8% estavam cientes do correto descarte da liga de amálgama, 77,5% do hipoclorito de sódio, 82,6% sobre os líquidos utilizados no processamento de radiografias, 95,7% dos materiais perfuro-cortantes, 20,3% do invólucro da película radiográfica, 68,1% sobre o descarte dos Equipamentos de Proteção Individual, 77,5% dos papéis de receituário e 33,3% dos resíduos de gesso. Sobre acondicionamento, 83,3% sabiam como proceder com o mercúrio residual e 95,7% com o líquido residual de revelador e fixador. Quanto às legislações vigentes para os profissionais da saúde, cirurgiões-dentistas e consultórios odontológicos, o conhecimento dos acadêmicos foi insuficiente sobre o assunto. Conclusão: Embora os formandos de Odontologia de Santa Catarina saibam sobre o que é e como devem acondicionar e descartar os RSS, o conhecimento foi insatisfatório sobre as legislações vigentes no Brasil sobre a temática, sendo necessária maior atenção durante a formação acadêmica.

Descritores: Gerenciamento de resíduos. Resíduos odontológicos. Resíduos de serviço de saúde.


 

ABSTRACT

Aim: To evaluate the knowledge of dental students regarding Health Service Waste (HSW). Methods: This is cross-sectional study with a quantitative approach. The defined realm was of all final year dental schools students from state colleges in Santa Catarina, Brazil. The sample calculation was determined in 198 students. The collected data were entered into Excel 2010 (Microsoft), and the results were expressed as absolute and relative frequencies. Results: Although there are eight dentistry colleges in the state of Santa Catarina, two refused to participate in the study and one did not have final year class. This study counted on the participation of 138 (73.0%) dental students. Among the participants, 92.2% reported that they knew what health service wastes were. Regarding how to dispose of these wastes, 76.8% reported being aware of the correct disposal of dental amalgam, 77.5% of sodium hypochlorite, 82.6% of the liquids used in the processing of radiographs, 95.7% of perforating-cutting materials, 20.3% of radiographic film wrappers, 68.1% of the disposal of Personal Protective Equipment, 77.5% of prescription papers, and 33.3% of plaster waste. Regarding packaging, 83.3% reported knowing how to proceed with the proper disposal of residual mercury and 95.7% with the residual liquid from developers and fixers. As for the existing laws for health professionals, dentists, and dental offices, knowledge of academians proved to be inadequate on the subject. Conclusion: Although the final year dental students in Santa Catarina knew about what it is and how they should package and dispose of HSW, knowledge was unsatisfactory as regards the applicable Brazilian laws on the subject, requiring greater attention during academic education.

Uniterms: Waste management. Dental waste. Medical waste.


 

 

INTRODUÇÃO

Os Resíduos de Serviços de Saúde (RSS) são resíduos sépticos que possuem, ou potencialmente podem conter micro-organismos patogênicos, produzidos em serviços de saúde, tais como: hospitais, clínicas odontológicas, laboratórios, farmácias, clínicas veterinárias e unidades de saúde1. Sendo o termo mais apropriado e abrangente para os diversos resíduos de estabelecimentos de assistência à saúde2,3.

Os RSS são um problema de saúde pública, pois ao longo do tempo tem trazido problemas aos profissionais, meio ambiente e população, mesmo havendo meios seguros e de redução de riscos durante a produção, manipulação e acondicionamento dos resíduos de saúde3,4. A grande produção e mau gerenciamento de resíduos tem agredido a natureza e provocado modificações no meio ambiente, trazendo grande risco de degradação dos recursos hídricos, do solo, do ar3.

Um dos grandes desafios atualmente é a existência de uma ferramenta que possibilite a redução drástica da dispersão de resíduos diretamente ao meio ambiente sem tratamento. Embora a reciclagem seja uma forma sustentável de gerenciar e renovar grande parte dos resíduos, infelizmente não pode ser aplicada a todos os tipos de resíduos existentes5,6.

A tipologia dos resíduos define sua consequência e maleficência ao meio ambiente. Existe uma classificação dos resíduos, considerando a natureza principal do resíduo e o seu potencial de risco, sendo subdivididos em cinco grupos: A - biológico; B - químico; C - qualquer material resultante de atividades humanas que contenham radionuclídeos em quantidades superiores aos limites de isenção especificados nas normas da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e para os quais a reutilização é imprópria ou não prevista; D - resíduos domiciliares; e E - material perfurocortantes e escarificantes7 (ANVISA, 2006).

No Brasil, segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), são gerados, aproximadamente, 120 mil toneladas de resíduos sólidos por dia, sendo que 1 a 3% desses são produzidos pelos serviços de saúde e, destes, 10% a 25% representam risco ao meio ambiente e a saúde coletiva7. Park e Jeong8 verificaram que resíduos comuns exigem menos despesas para sua eliminação, sendo tal despesa uma a 20 vezes menor do que a de resíduos clínicos.

A ANVISA estabeleceu por meio da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº. 33, de 25 de fevereiro de 2003, a regulamentação técnica para o gerenciamento de resíduos gerados pelos serviços de saúde, determinando também, as responsabilidades legais no que se refere ao manuseio, tratamento e destinação final destes resíduos, revogada depois pela RDC nº. 306, de 07 de dezembro de 20049. O comprometimento de todos, aliado ao planejamento e a instrumentos de gestão adequados, são fundamentais para superar os desafios citados6.

Os consultórios odontológicos são coparticipantes da produção de RSS, sendo estes, infectantes ou não infectantes10. E sua insalubridade está na diversidade de causas que levam danos à saúde, desde agentes infecciosos, até substâncias químicas, tóxicas radioativas ou objetos perfuro-cortantes10,11. Todo resíduo produzido em ambientes não residenciais, devem estar sobre a responsabilidade de um profissional habilitado ou entidades prestadora de serviço para proceder com o resíduo produzido, em caso de pequenas empresas ou consultórios que realizam procedimentos de saúde, a responsabilidade recai sobre o profissional que presta serviço neste ambiente12.

Nos consultórios odontológicos, o cirurgiãodentista é o profissional responsável para gerir os RSS. Desta forma, é necessário que ele tenha conhecimentos sobre gerenciamento de resíduos e conheça desde os regimentos legais até as normas de biossegurança13, sendo necessário também discutir questões de cidadania nas instituições para que os profissionais saibam de seus deveres perante aos RSS. Embora muitas vezes o problema não seja a inexistência de informação e planejamento, mas a falta da execução4.

Como futuro profissional e potencial gerador de resíduos, o formando em Odontologia deve estar consciente sobre uma prática profissional responsável com o meio ambiente e com a sociedade11. Sendo o tema de extrema relevância durante sua formação acadêmica, o que torna imperativo a presença deste conteúdo nos projetos pedagógicos dos cursos de graduação. Com base nestes pressupostos, esta pesquisa buscou verificar o conhecimento dos formandos de Odontologia do Estado de Santa Catarina sobre os RSS gerados em consultórios odontológicos.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de uma pesquisa descritiva, transversal, com abordagem quantitativa. Para buscar as informações necessárias, o universo eleito foi os formandos do curso de Odontologia das universidades públicas e privadas do Estado de Santa Catarina no ano de 2013. Esta pesquisa foi previamente aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Sul de Santa Catarina (CEP/UNISUL) sob o número 252.997.

Para o cálculo amostral, foi realizado um levantamento do número de acadêmicos matriculados no último período dos cinco cursos de Odontologia das faculdades de Santa Catarina que aceitaram participar do estudo, sendo um universo de 189 alunos. Foram utilizados como parâmetros para o cálculo amostral uma prevalência de 50%, nível de confiança de 95% e margem de erro de 5%. A amostra mínima calculada foi de 127 alunos.

Para coleta de dados foi utilizado um questionário semiestruturado desenvolvido e testado por Fernandes12 contento 36 questões abertas e fechadas, sobre o processo de produção, manuseio e descarte dos resíduos sólidos de saúde, no que concerne ao gerenciamento, legislação, biossegurança e ecologia. A coleta de dados foi realizada no período de março a maio de 2013 pelos pesquisadores nas universidades participantes. O critério de inclusão no estudo era estar matriculado no último semestre do curso de Odontologia no semestre letivo de 2013 de alguma universidade de Santa Catarina, e assinar o termo de consentimento livre e esclarecido.

Os questionários foram entregues a 189 formandos do curso de Odontologia das universidades de Santa Catarina no primeiro semestre letivo de 2013. Os dados coletados na pesquisa foram digitados em uma planilha Excel 2010 (Microsoft) e exportados para o software SPSS 20.0. A análise descritiva foi realizada através de frequências absolutas e relativas.

 

RESULTADOS

O estado de Santa Catarina, Brasil, possui oito faculdades que apresentam o curso de Odontologia, sendo uma pública e sete privadas. Neste estudo, houve participação de cinco faculdades, constituído por quatro instituições privadas e uma pública. A não participação das demais faculdades elegíveis foi devido a falta de autorização da diretoria em duas instituições e a outra por não possuir turma de concluintes no semestre do estudo.

Houve a participação de 138 formandos do curso de Odontologia, 73 % de respondentes, sendo 26,8% (n = 37) eram do gênero masculino e 73,2 (n = 101) do sexo feminino. Foi encontrada uma faixa etária de 81,9% (n = 113) na entre 20 a 24 anos, 16,0% (n = 22) entre 24 a 29 anos e 2,1% (n = 3) entre 30 e 34 anos (Tabela 1).

 

 

 

Dentre os acadêmicos egressos, observou-se pouco conhecimento em relação aos aspectos legais vigentes no Brasil em relação às infrações geradas pela falta de gerenciamento dos RSS (Tabela 2). Encontrouse que 59,4% (n = 82) não tem conhecimento no que se refere aos riscos ligados à prestação de serviços contidos no Código de Defesa do Consumidor, 74,7% (n = 103) desconhece às lesões corporais contra a saúde pública presentes no Código Penal, 75,4% (n = 104) não conhece os atos ilícitos e reparação de danos do Código Civil. De todos os pesquisados apenas 26,1% (n = 36) conhecem a redação da Portaria nº 485-NR32 do Ministério do Trabalho que diz respeito à segurança e saúde do trabalho em estabelecimento de saúde e 69,5% (n = 96) desconhecem a Resolução nº358 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) que diz respeito ao tratamento e disposição final dos resíduos dos serviços de saúde.

 

 

 

Com relação ao descarte dos RSS dentre os entrevistados (Tabela 3), 76,8% (n = 106) são cientes do correto descarte da liga de amálgama, 77,5% (n = 107) sabe sobre o hipoclorito, 82,6% (n = 114) sabe como descartar líquidos utilizados no processamento de radiografias. Dos materiais perfuro-cortantes 95,7% (n = 132) referem-se positivamente quanto ao descarte e 20,3% (n = 28) o correto descarte do invólucro da película radiográfica. E o descarte das luvas/EPI, papéis de receituário e resíduos de gesso proveniente de assistência à saúde, 68,1% (n = 94), 77,5% (n = 107) e 33,3 (n = 46), respectivamente, responderam conhecer a correta forma de descarte.

 

 

 

Outra questão importante para os RSS é sua forma de acondicionamento (Tabela 4), quanto perguntados sobre isto: 83,3% (n = 115) sabem onde acondicionar o mercúrio residual, 95,7% (n = 132) tem conhecimento sobre o armazenamento de líquidos residuais de revelador e fixador. No que se refere à norma Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT-NBR) 7500/00, 80,4% (n = 111) conhecem seu conteúdo, 76,8% (n = 106) sabem sobre o tratamento, aplicação dos métodos, técnica ou processo dos resíduos, 83,3% (n = 115) tem conhecimento sobre o armazenamento interno e 73,9% (n = 102) sobre o armazenamento externo.

 

 

 

Dos acadêmicos participantes 80,4% (n = 111) desconhece a redação da RDC nº 306 da ANVISA. Onde 54,7% (n = 75) não têm conhecimento sobre a redação nº42, que foi alterada pela Resolução nº71 do Conselho Federal de Odontologia (CFO). Sendo também que 57,9% (n = 80) não sabem do que dizem respeito às normas da ABNT.

Dentre os concluintes 92,2% (n = 127) sabem o que são resíduos de serviços de saúde. Já 95,8% (n = 133) acreditam que os resíduos gerados pelos serviços de saúde possam fazer mal aos seres humanos. Dos participantes, souberam responder sobre os tipos de agentes nocivos à saúde existentes no consultório odontológico: 80,6% (n = 112) afirmam que agentes biológicos estão presentes em consultórios odontológicos, já 86,4% (n = 120) dizem ter agentes químicos em consultórios, e 64,80% (n = 90) afirmam ter agentes físicos presentes em consultórios odontológicos. A grande maioria 95,0% (n = 132) respondeu saber que resíduos devem ser manipulados com EPI.

 

 

 

A grande maioria dos formandos 95,7% (n=133) acredita que o lixo contaminado deve ser coletado por um serviço especializado. Já 54,7% (n = 76) conhecem alguma empresa de reciclagem de lixo. Outros 97,92% (n = 136) acreditam que o tratamento e a disposição final correta dos resíduos dos serviços de saúde preservam a saúde pública e a qualidade do meio ambiente. Dos alunos participantes 96,5% (n = 134) entendem que o tratamento e a disposição final podem minimizar riscos nos ambientes de trabalho e proteger a saúde do trabalhador e da população de modo geral.

Grande parte dos alunos (92,2%) (n = 128) afirma que a minimização da geração de resíduos, a redução e a reciclagem contribuem para a diminuição dos danos ambientais. E 92,2% (n = 128) afirmaram que os danos causados a saúde pública e ao meio ambiente é maior que o custo da prevenção.

Das perguntas abertas, sobre o que eles achavam sobre a legislação vigente em Odontologia 81,4% (n = 113) não responderam. Já sobre o conteúdo ministrado sobre vigilância sanitária durante a graduação, 79% (n = 110) não souberam responder ou não foi ministrada. Um total de 70,5% (n = 98) não sabe como é realizado o descarte do lixo em sua universidade e 69,8% (n = 97) disseram não ter conhecimentos sobre o correto descarte dos resíduos hospitalares produzidos em sua universidade.

 

DISCUSSÃO

A falha no gerenciamento dos critérios básicos dos resíduos pode causar riscos e danos à saúde humana e ao meio ambiente3,4. Desse modo, todo estabelecimento prestador de serviço de saúde que gera o RSS deve elaborar seu plano de gerenciamento. A ANVISA determina a necessidade de um Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (PGRSS) de acordo com bases científicas, técnicas, normativas e legais, a fim de minimizar danos causados pelos diversos tipos de materiais e resíduos gerados7. O PGRSS incuta a necessidade de planejamento, antes mesmo de sua geração, ou seja, estar bem definido cada etapa subsequente à sua produção: destino, armazenamento, tipo de transporte de coleta e destino final, onde será realizado o tratamento específico14.

O cirurgião-dentista tem em seu consultório uma considerável produção de resíduos, que vai desde resíduo comum, como: copos plásticos, guardanapos, restos de alimentos, papéis de escritórios, entre tantos outros e devem receber o mesmo tipo de manejo que o residencial, devendo ser separado e devidamente encaminhado para a reciclagem ou estação de tratamento.

A legislação em vigor imputa que cada estabelecimento de serviço de saúde à responsabilidade pelo descarte adequado do material residual, no intuito de minimizar os impactos ambientais e riscos a saúde7. Nesta pesquisa com os formandos de Santa Catarina, dentre as questões referentes às leis em vigor, 40,6% dos acadêmicos tem conhecimento sobre o Código de Defesa do Consumidor, 25,3% conhecem o Código Penal, em torno de 24,6% sabem sobre segurança e saúde do trabalho em estabelecimento de saúde da Redação da Portaria do Ministério do Trabalho, e 30,5% tem o conhecimento necessário sobre o tratamento e disposição final dos resíduos dos serviços de saúde. Cavalcante et al.15 em sua revisão bibliográfica reportam-se as leis vigentes e a necessidades dos profissionais conhecê-las. Esta pesquisa revelou que a os acadêmicos catarinenses não possuem informações suficientes das leis que se referem ao correto descarte de resíduos de serviços de saúde. Achados semelhantes foram encontrados por Fernandes12 onde a grande maioria dos formandos de Odontologia das Faculdades da cidade de Porto Alegre/RS não tinha conhecimento das leis regentes sobre os RSS.

A questão da forma de descarte de tipo de resíduo tem sido objeto de grande discussão. No que se refere à classificação dos resíduos, dos graduandos de Santa Catarina, 80,4% desconhece a RDC nº 306, que dispõe sobre o Regulamento Técnico para o gerenciamento de resíduos de serviços de saúde9. A falta de conhecimento das características dos resíduos, cinco grupos de acordo com suas características, é preocupante, pois a classificação objetiva o correto manejo como tratamento prévio e sua disposição final.

Pesquisando sobre o conhecimento dos estudantes, sobre qual conduta tomar em relação aos resíduos de serviço de saúde Pedrosa et al.11 apontavam que o descarte de resíduos contaminados gerados pelos consultórios e clínicas odontológicas quando não planejado seu destino, podem ser descartados em aterros sanitários ou lixões a céu aberto sem qualquer cuidado, colocando em risco a vida de pessoas que possam ter contato com esse tipo de material. Dentre os participantes desta pesquisa, 92,2% de acadêmicos sabem identificar resíduos de serviços de saúde e 96% acreditam que os resíduos gerados pelos serviços de saúde possam fazer mal aos seres humanos. Mesmo sendo alta a porcentagem do conhecimento do formando sobre a identificação dos resíduos de serviços de saúde e identificam os malefícios perante o ambiente, o fato de não relatarem o conhecimento das normas, hipoteticamente poderia identificar este conhecimento como empírico.

Este fato preocupa quanto às responsabilidades sociais do futuro profissional que muitas vezes tem seus conhecimentos sem evidências científicas. Os resíduos químicos, como, mercúrio, glutaraldeído, hipoclorito de sódio, revelador e fixador de radiografias, nem sempre estão presentes em outros tipos de estabelecimentos de saúde e podem oferecer riscos à saúde, como por exemplo, dos perfurocortantes contaminados16, liga de amálgama13,17,18,19, hipoclorito20, material biológicos21 e radioativos22.

Dos participantes da pesquisa, 96% acreditam ter um serviço de coleta especial para o resíduo gerado em consultórios. Mas, 45,3% desconhecem qualquer empresa de coleta de resíduo. Sendo eles futuros responsáveis pelo descarte do lixo gerado. O PGRSS quando gerado por grandes estabelecimentos devem ter um responsável de nível superior, que deva ser habilitado pelo conselho da classe e apresentar a Anotação de Responsabilidade Técnica, Certificado de Responsabilidade Técnica ou documento que comprove sua capacitação para exercer o trabalho5.

Em pequenos estabelecimentos, o responsável pelo armazenamento e pelo planejamento do RSS deve ser feito pelo técnico responsável, no caso do consultório odontológico, o cirurgião-dentista. O planejamento deve seguir alguns aspectos técnicos para evitar doenças infecciosas em virtude do gerenciamento inadequado, tais como: acondicionamento, coleta e transporte interno, armazenamento, coleta e transporte externo, tratamento e disposição final23.

Os resíduos produzidos em consultórios odontológicos vão desde resíduos não contaminados, tais como: copo descartável, restos de alimentos, papéis de escritório, que podem ser reciclados ou colocados junto com resíduo comum24. Até resíduos infectantes, por exemplo: materiais resultantes de cirurgia, agulhas, bisturi e resíduos especiais, como: rejeitos radioativos e medicamentos7.

Saber identificar os resíduos para o correto acondicionamento, armazenamento e descarte é responsabilidade do profissional. Esses materiais devem ser separados em recipientes adequados para cada tipo de resíduo, seguindo a classificação estabelecida26. Quando perguntados sobre o descarte dos diversos tipos de resíduos, os graduandos tiveram dificuldade em identificar o correto descarte dos resíduos de gesso provenientes de assistência à saúde.

Segundo Mota et al.26, a quantidade de resíduos potencialmente infectantes gerados pela atividade do cirurgião-dentista nos consultórios odontológicos é menor se comparada aos hospitais, porém há uma diversidade de resíduos químicos, como: mercúrio, glutaraldeído, hipoclorito de sódio, revelador e fixador de radiografias, os quais nem sempre estão presentes em outros tipos de estabelecimentos de atenção à saúde. Mostra-se uma atitude preocupante a falta de identificação dos grupos de resíduos pelos acadêmicos, futuros geradores de resíduos.

Neste estudo, para os resíduos de liga de amálgama e hipoclorito, as respostas da forma correta de descarte foram maiores. O descarte da liga de amálgama apenas 23,2% não tem conhecimento sobre o correto descarte, já 22,5% não sabem sobre o descarte do hipoclorito, o questionamento sobre eliminação dos líquidos de revelador e fixador 17,4% não sabem sobre sua correta eliminação. Mesmo que em pequena proporção, é preocupante o desconhecimento do correto descarte, uma vez que estes tipos de materiais quando inadvertidamente descartados, provocam danos ecológicos13,17,18,19,20.

Embora pareça ser um problema entre os acadêmicos, Hildago et al.25 constataram várias falhas no que tange o gerenciamento de resíduos de saúde bucal nos serviços públicos, ou seja, o desconhecimento chega à vida profissional dos cirurgiões-dentistas. O plano de gerenciamento de resíduos e serviços de saúde ainda não é uma realidade nas unidades odontológicas públicas e essa conjuntura de vulnerabilidade demanda atenção e responsabilização dos órgãos públicos. O mais preocupante são os impactos negativos causados pelo manuseio incorreto dos resíduos de serviços de saúde na saúde pública e o meio ambiente3,4.

Sobre os resíduos biológicos, tais como: algodão e gaze contaminados com sangue, houve desconhecimento da forma de descarte por 18,1% dos participantes desta pesquisa. E até mesmo instrumentos perfuro-cortantes como: agulhas, lâminas de bisturi e limas, 4,3% dos entrevistados não sabem sua forma correta de descarte. Os materiais perfuro-cortantes devem ser descartados separadamente, no local de sua geração, imediatamente após o uso ou necessidade de descarte, em recipientes de paredes rígidas, resistentes à punctura, ruptura e vazamento, resistentes ao processo de esterilização, com tampa, devidamente identificados com o símbolo internacional de risco biológico, acrescido da inscrição de pérfuro-cortante.

Este estudo mostrou que os formandos de Odontologia em Santa Catarina conhecem a normatização do descarte do grupo E. Os acadêmicos foram questionados sobre o correto descarte do invólucro da película radiográfica e 79,9% desconhece a técnica de descarte correta. Apesar de importante auxiliar no diagnóstico clínico, os resíduos radiográficos provocam grandes impactos ambientais causados pela geração de emissões e efluentes contendo substâncias tóxicas22.

Para o descarte de material de consumo, como luvas e EPI, 31,9% não tiveram o conhecimento correto de onde depositar. As luvas de procedimentos são classificadas no grupo Grupo A – Resíduos com possível presença de agentes biológicos. Diferente dos achados de Fernandes12, esta pesquisa mostrou um percentual de 63,1% de acadêmicos com conhecimento correto do descarte das luvas e EPI, pois encontraram conhecimento em 85,1% dos alunos. No quesito lixo domiciliar como papéis de receituário 22,5% não sabem o correto descarte sobre esses resíduos. Os acadêmicos também não sabem o correto descarte dos resíduos de gesso provenientes de assistência à saúde, tendo em vista que 66,7% disseram não saber sobre seu correto descarte.

Freitas e Pestana4 em seu estudo com profissionais que trabalhavam em hospitais, mostrou que embora todos os profissionais pesquisados afirmaram utilizar os EPI durante a manipulação dos RSS, em sua observação viu que os equipamentos é parcialmente utilizados, havendo uma preocupação apenas em não encostar em materiais que contenham sangue e secreções, utilizando na maioria das vezes as luvas de borracha e as botas de plástico, mas não se preocupam em inalar substancias, negligenciando o uso de máscara, óculos, gorro e avental de borracha. Freitas e Pestana4 ainda reforçam que a supervisão da utilização dos EPI é responsabilidade do empregador. Em Odontologia, o cirurgião-dentista como empregador deve ter ciência do seu papel no fornecimento dos equipamentos como também da sua supervisão de uso.

 

CONCLUSÃO

Embora os formandos dos cursos de Odontologia do estado de Santa Catarina saibam sobre a geração e do que se trata os RSS, o conhecimento é insatisfatório sobre a responsabilidade ética e legal. Tornando necessária uma atenção maior desse tema nos conteúdos de graduação. A prática profissional da Odontologia gera diariamente resíduos comuns e contaminados, sendo responsabilidade do cirurgiãodentista o acondicionamento e descarte de uma maneira segura para si, sua equipe e a sociedade. Porém, a falta de conhecimento científico e as bases legais que permeiam as questões de gerenciamento de resíduos expõem os futuros dentistas a uma atividade sem evidências científicas. Estas atitudes, sem evidências comprovadas, fragilizam as tomadas de decisões e deixa-os suscetíveis a ações legais advindas da infração ecológicas do mau gerenciamento de resíduos.

 

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