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Stomatos

versão impressa ISSN 1519-4442

Stomatos vol.17 no.32 Canoas Jan./Jun. 2011

 

ARTIGOS CIENTÍFICOS

 

Aplicações clínicas e vantagens da placa labioativa: uma revisão da literatura

 

Clinical applications and benefits of lip bumper: A literature review

 

 

Darlene Ribeiro dos Santos Gerzson1; Daniela Frantz Nobre2

1Especialista em Ortodontia e Mestranda em Odontologia (ULBRA Canoas/RS).
2Mestre em Ortodontia (PUCRS). Professora Adjunta de Ortodontia (ULBRA Canoas/RS).

Corresponding Author:

 

 


RESUMO

A placa labioativa faz parte dos muitos aparelhos usados pelos Ortodontistas para o tratamento de pequenos apinhamentos dentários na arcada inferior. É de fácil confecção, bem aceita e utilizada pelo paciente. Pode ser considerado um recuperador de espaço, sendo usado na dentição mista e/ou decídua. Seu ganho de espaço é devido à projeção dos incisivos inferiores e inclinação distal dos molares. A época oportuna para a instalação deste aparelho é de grande importância no planejamento futuro do caso, sendo decisivo para extrações de dentes permanentes ou não. Este artigo visa enfatizar a importância da Ortodontia interceptativa, que tem por objetivo minimizar ou solucionar alguns problemas ortodônticos, assim como reduzir o tempo de tratamento da Ortodontia corretiva, caso seja necessária. Após uma breve revisão de literatura sobre a confecção e utilização da placa labioativa, será apresentada uma das muitas aplicações deste aparelho.

Palavras-chave: apinhamento, ortodontia interceptiva, placa labioativa.


ABSTRACT

The lip bumper is removable appliance which is one of many used by orthodontics for treatment of minor crowding in lower jaw. It is easy to manufacture and well accepted and used by the patient. It can be considered a hearth space being used in the mixed dentition and/or deciduous. Its space saving is due to projection of lower incisors and distal tipping of the molars. The opportune time for the installation of this device is of great importance in future planning of the event, being decisive for extraction of permanent teeth or not. This article aims to emphasize the importance of early orthodontics treatments, which aims to minimize or resolve some orthodontic problems and minimize the treatment time with orthodontic corrective if it is necessary. After a brief review of literature on the manufacture and use of lip bumper, we will present one of the many applications of this device.

Keywords: crowding, interceptive orthodontic, lip bumper.


 

 

INTRODUÇÃO

O apinhamento dentário é um problema constante nos consultórios ortodônticos. Dependendo da sua severidade, há uma diversidade de tratamentos que podem ser indicados para solucionar este problema; alguns incluem extrações dentárias, expansão dos arcos, desgaste interproximal, inclinação vestibular de incisivos (Murphy et al., 2003).

O grau de apinhamento na arcada inferior é, provavelmente, o fator isolado de maior importância na determinação do tipo de tratamento para má oclusão com apinhamento dentário (Dall’Igna et al., 2005).

A maioria das más oclusões é resultado da discrepância entre tamanho de dentes e perímetro de arcos disponível para acomodá-los. Entretanto, a extração de dentes permanentes para o tratamento destas más oclusões tem sido objeto constante de debate (Solomon et al., 2006).

Nas última duas décadas, têm aumentado o número de tratamentos ortodônticos sem extrações dentárias e a popularidade do tratamento precoce (interceptativo) (O’Donnell et al., 1998). Mudanças de conceito e avanços na mecanoterapia têm reduzido a necessidade de extrações em casos de severas discrepâncias. Técnicas para tratar os apinhamentos leves e moderados e protrusões dentárias em más oclusões de Classe I e Classe II são desenvolvidas por uma série de autores (Davidovitch et al., 1997).

A diferença entre tamanho dos dentes inferiores e o comprimento do arco mandibular é um importante fator para determinar o tratamento ortodôntico. A restrição do arco mandibular faz com que a correção do apinhamento dentário inferior se torne mais difícil que a correção da maxila. Estas restrições incluem o aumento da densidade óssea deixando mais lento todo o movimento dentário, bem como a quantidade de expansão e distalização que podem ser realizadas (Solomon et al., 2006).

Um método de tratamento que tem sido usado para resolver este problema de discrepância no arco inferior é a utilização da placa labioativa.

A placa labioativa mandibular é um aparelho funcional simples, removível, facilmente confeccionado e bem tolerado pelo paciente. É inserida nos tubos vestibulares soldados às bandas dos molares permanentes e consiste de um escudo labial de acrílico que afasta o lábio inferior dos incisivos inferiores (Soo, Moore,1991). Confeccionada com um fio de aço maleável de 0,40” com loops verticais pré-confeccionados e ajustado em bandas posteriores (Korn, Shapiro,1994), a placa labioativa é tipicamente posicionada de 2 a 5mm da face vestibular dos dentes, alterando o equilíbrio entre lábios, bochechas e língua, causando movimento anterior e transversal dos dentes com o resultado de ganho na circunferência do arco (O’Donnell et al.,1998).

Diante da importância do tratamento interceptivo nos casos com problemas de espaço na dentição mista, este artigo visa enfatizar a importância da Ortodontia interceptativa, que tem por objetivo minimizar ou solucionar alguns problemas ortodônticos, assim como reduzir o tempo de tratamento da Ortodontia corretiva, caso seja necessária. Após uma breve revisão de literatura sobre a confecção e utilização da placa labioativa, será apresentada uma das diversas aplicações deste aparelho.

 

REVISÃO DE LITERATURA

É fato bem conhecido que o perímetro do arco é reduzido durante a transição da dentição mista para permanente, particularmente no arco mandibular. Uma estimativaé que a perda, em média, do arco mandibular é de 1,8mm. Esta redução, bilateralmente, representa uma perda de 3,6mm de perímetro de arco (Gianelly, 2002).

O apinhamento e a discrepância negativa podem ser oriundos de perdas precoces de dentes decíduos com conseqüente inclinação mesial dos 1os. molares, ou mesmo micrognatia associada à macrodontia herdadas geneticamente. A retroinclinação de incisivos inferiores geralmente está associada à hipertonicidade da musculatura labial ou hábitos de deglutição atípica com interposição do lábio inferior, o que gera quebra do equilíbrio peribucal (forças externas e internas) (Gianelly, 2002).

A Ortodontia contemporânea tem buscado cada vez mais a prevenção das más oclusões. Para este fim, são utilizados inúmeros aparelhos interceptativos que buscam reduzir a gravidade do problema em questão ou até mesmo resolvê-lo. Por isso, o tratamento precoce tem muito valor, visto que se consegue trabalhar numa fase de crescimento do paciente e ao mesmo tempo alterar as dimensões das bases ósseas. Dentre os vários tipos de aparelhos interceptativos, há a placa labioativa.

A placa labioativa, também conhecida como lip bumper, foi criado por Renfroe, em 1956, com o objetivo primário de impedir uma força excessiva do lábio inferior sobre os incisivos inferiores, ou seja, para o tratamento de alterações funcionais. É utilizada em pacientes na fase da dentadura mista, que necessitem aumentar o perímetro do arco inferior devido ao apinhamento leve a moderado, discrepância de modelo negativa e retroinclinação dos incisivos. A placa labioativa pode ser usada tanto na mandíbula quanto na maxila.

Alguns autores descrevem sua utilização não somente para aumentar o perímetro do arco mandibular pela pressão do lábio inferior, causando inclinação de molares, mas também para eliminar a pressão da musculatura das bochechas, resultando em um movimento anterior dos incisivos permanentes e expansão do arco dental (Hodge et al., 1997).

A placa labioativa tem com ação principal a verticalização dos primeiros molares e a vestibularização dos incisivos inferiores, que são os maiores responsáveis pelo aumento do perímetro do arco inferior. O aumento do perímetro do arco inferior obtido com o uso deste aparelho determina, muitas vezes, um tratamento ortodôntico futuro corretivo sem necessidade de exodontia de dentes permanentes (Davidovitch et al., 1997).

Em 2006, Solomon et al. acrescentaram que a placa labioativa também pode ser usada para ancoragem, enquanto usam-se elásticos de Classe II ou III; manutenção da posição dos primeiros molares e preservação do Leeway space; prevenção de hábitos labiais; controle vertical de molares ou para produzir rotação destes últimos.

O modo de ação da placa labioativa tem sido explicado como uma alteração do padrão funcional causando um estiramento da musculatura labial inferior, resultando em vestibularização dos incisivos inferiores, aumento transversal na região de pré-molares, e inclinação dos molares de ancoragem, e aumento no comprimento do arco. Em oposição às técnicas convencionais de expansão, a placa labioativa introduz uma alteração do padrão funcional (Drmeddent et al., 2000).

As forças do músculo mentoniano são transmitidas para os molares inferiores, fazendo com que estes sofram um deslocamento distal com leve extrusão. Ao mesmo tempo, a língua pode causar uma inclinação vestibular dos incisivos inferiores e os caninos e pré-molares movem-se vestibularmente (Osborn et al.,1991).

Nanda et al. (1998) observaram um maior aumento no comprimento do arco causado pela vestibularização e protrusão dos incisivos inferiores, combinado com uma distalização de molares. Este aumento foi maior na região de caninos, primeiros e segundo pré-molares e primeiros molares. Numa amostra de 25 pacientes, os autores observaram que 22 deles (88%) apresentaram inclinação anterior dos incisivos (4,37°); em 18 (72%) os molares moveram-se distalmente e 20 (81%) exibiram uma inclinação distal destes primeiros molares. Clinicamente, os melhores resultados foram vistos em pacientes na fase de transição da dentição mista para permanente, ou seja, no segundo período transitório da dentição mista (O’Donnell et al., 1998).

Davidovitch et al. (1997) avaliaram uma amostra de 34 pacientes com apinhamento leve a moderado na fase de dentição mista que foram divididos em dois grupos (1: tratado com placa labioativa e 2: sem tratamento). A redução do apinhamento dental vista no grupo com uso da placa labioativa foi causada pelo aumento no perímetro e comprimento do arco. Este ganho pode ser atribuído por 45 a 55% de vestibularização dos incisivos; 35 a 50% distalização e inclinação de molares; e 5 a 10% aumento transversal na distância intercaninos e molar decíduo/pré-molar (Davidovitch et al.,1997).

Em 2009, Hashish e Mostafa (2009) fizeram uma revisão sistemática de literatura incluindo 52 artigos entre dezembro de 1968 e janeiro de 2007, que avaliaram os efeitos do tratamento com a placa labioativa. Nestes artigos selecionados, a conclusão dos autores foi que o tratamento com a placa labioativa gera um aumento na dimensão do arco, com consequente ganho em seu comprimento.

Poucos estudos têm demonstrado a estabilidade dos casos tratados com a placa labioativa. Solomon et al. (2006) avaliaram 51 pacientes durante as fases de pré-tratamento, após instalação da placa labioativa e pós-tratamento, sendo medidos comprimento, profundidade e largura do arco inferior. Durante o tratamento houve uma diminuição na irregularidade dos incisivos inferiores de 3,73mm, com um aumento de 0,76mm pós-tratamento. Isto significou um ganho no comprimento do arco, o qual se manteve por longo período de tempo.

O tempo de tratamento também é um fator discutido nos estudos. Murphy et al., em 2003, constataram que é desnecessário o uso da placa labioativa por mais de 300 dias. A expansão devida ao uso da placa labioativa é distribuída durante o período de tratamento. Entretanto, os resultados de seu estudo mostraram que a expansão ocorreu, inevitavelmente, diminuindo com o tempo. O maior ganho, cerca de 50% do total, ocorreu nos primeiros 100 dias de tratamento. O conhecimento de como a placa labioativa altera o equilíbrio entre as forças lingual e vestibular sobre os dentes explica o resultado deste estudo. Com o tempo a dentição adapta-se a um novo sistema de forças, agora produzido pela placa labioativa, e restabelece o equilíbrio; sendo assim, não há mais alteração no comprimento do arco (Murphy et al.,2003).

Segundo o estudo de Hodge et al., em 1997, o posicionamento da placa labioativa no sentido vertical pode afetar a força que o lábio realiza sobre os molares. Eles utilizaram duas posições do aparelho e avaliaram a força produzida por eles. Em um dos grupos, a placa labioativa foi posicionada no meio da coroa dos incisivos inferiores e no outro grupo, 4mm para gengival. As forças foram maiores na placa labioativa posicionada 4mm mais gengivalmante quando comparado com aquela posicionado no meio da face vestibular dos incisivos. Ainda neste trabalho, encontraram uma assimetria de forças entre os lados direito e esquerdo, sendo esta última maior; porém isto não foi visto em todos os pacientes.

 

APLICABILIDADE CLÍNICA DA PLACA LABIOATIVA

Paciente R.S.S. do gênero masculino, oito anos, apresentou-se para consulta de avaliação ortodôntica acompanhado pela mãe com a queixa principal de “colocar aparelho.

Após estudo do caso, foi planejada uma disjunção maxilar e o uso da placa labioativa inferior para aumento dos perímetros dos arcos; visto que as discrepâncias de modelo foram de -6mm superior e de -6mm inferior (Figura 1-5).

A instalação da placa labioativa inferior foi feita em novembro de 2003 e em junho de 2004 o tratamento inferior foi concluído.

O tratamento foi concluído com sucesso nesta primeira fase interceptativa. Tempo total de tratamento 11meses (Figura 6).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após a análise dos vários artigos, todos os autores concordaram que o tratamento com a placa labioativa promoveu um aumento do perímetro do arco proporcionando a correção de apinhamentos leves a moderados, sendo, portanto, o tratamento precoce de suma importância para uma ortodontia corretiva futura de maior sucesso e com menor tempo de tratamento.

Em 2006, Solomon et al. enfatizaram que o tratamento com a placa labioativa resulta em ganho significativo do comprimento do arco, com maior aumento na região de pré-molares e por último na região de caninos. Por fim, White (1998) concluiu que o tratamento precoce (interceptativo) oferece muitas vantagens tanto para os pacientes quanto para os ortodontistas.

 

REFERÊNCIAS

Dall’Igna C, Baumgarten A, Dall’Igna S. Considerações do aparelho lip bumper no tratamento de discrepâncias negativas do arco inferior na dentadura mista. Ortodontia gaúcha. 2005;9(1):1.

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Corresponding Author:
Darlene Ribeiro dos Santos Gerzson
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