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Odontologia Clínico-Científica (Online)

versão On-line ISSN 1677-3888

Odontol. Clín.-Cient. (Online) vol.9 no.3 Recife Set. 2010

 

ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICIE

 

Relação entre mastócitos e células T na inflamação

 

Relationship between mast cells and T cells in infammation

 

 

Pedro Paulo de Andrade SantosI; Valéria Souza FreitasI; Roseana de Almeida FreitasII; Leão Pereira PintoII; Lélia Batista de SouzaII

IDoutorando(a) do Programa de Pós-graduação em Patologia Oral, Departamento de Odontologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, UFRN, 59.056-000, Natal-RN, Brasil
IIProfessor(a) do Programa de Pós-graduação em Patologia Oral, Departamento de Odontologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, UFRN, 59.056-000, Natal-RN, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Os mastócitos são tipos celulares que executam uma série de funções através da liberação de mediadores químicos quando devidamente estimulados, interagindo com várias células das mais diferentes origens. Sabe-se ainda que as interações entre mastócitos e células T existem, porém ainda não são muito claras. O objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão de literatura dos aspectos atuais a respeito desta possível relação entre mastócitos e células T em processos inflamatórios.

Descritores: Mastócitos. Linfócitos T. Células Th1. Células Th2.


ABSTRACT

The mast cells are cellular types that execute a series of functions through the release of chemical mediators when duly stimulated, interacting with some cells of the most different origins. It is known despite the interactions between mast cells and cells T exist, however not yet are very clear. The objective of this work was to carry through a literary revision of the related current aspects of this possible relationship between mast cells and T cells in inflammatory process.

Keywords: Glass Ionomer Cements - Physical Properties. Biocompatible Materials.


 

 

INTRODUÇÃO

Sabe-se, a um certo tempo que os mastócitos participam do processo inflamatório. E este conhecimento, é baseado no fato, de que os mastócitos estão presentes e são recrutados para os locais de inflamação. Por exemplo, estes tipos celulares têm sido observados, por um longo tempo, em lesões de pacientes com Doença de Crohn e artrite reumatóide. Entretanto, o nível de participação dos mastócitos em processos inflamatórios e a importância do seu papel, ainda não foram completamente elucidados até hoje1.

O principal produto de secreção dos mastócitos é a triptase, verificada em todos os mastócitos humanos, sendo que sua presença é desconhecida em qualquer outro tipo celular. Conseqüentemente, a constatação de triptase em fluidos humanos biológicos é interpretada como um indicador da ativação dos mastócitos2,3.

Verifica-se que os mastócitos expressam moléculas de superfície com atividade co-estimulatória ou co-inibitória, produzindo uma série de mediadores que podem direcionar as células dendríticas ou diferenciação e função das células T. O fato é que as interações entre mastócitos e células T existem, e constituem um componente normal da maioria das respostas imunes adaptativas, sendo uma das melhores ilustrações para afirmar que as respostas imune adaptativa e inata, não são entidades completamente independentes4.

Uma das proteínas do sistema imunológico que controla a diferenciação das células T, é a proteína T-bet, que atua estimulando a diferenciação em células Th1, e reprimindo a resposta Th2. O T-bet é requerido para expressão de um potente mediador inflamatório, o (IFN-γ) interferon-γ5,6.

O GATA-3 é uma outra proteína, homóloga ao T-bet, que juntamente com a interleucina-4 (IL-4), são mais expressas em células direcionadas a uma diferenciação Th27.

Frente a importância dos mastócitos a partir das inúmeras funções que os mesmos executam, e baseado na constatação das interações ainda não muito claras, entre mastócitos e células T, em processos inflamatórios. A presente revisão de literatura tem por objetivo esclarecer o papel dos mastócitos em processos inflamatórios, bem como verificar possíveis relações entre mastócitos e células T.

 

REVISÃO DE LITERATURA

MASTÓCITOS

Os mastócitos são células secretoras multifuncionais do sistema imune que participam da regulação da resposta imunológica, pela liberação de mediadores químicos, frente a um estímulo apropriado8.

São considerados filogeneticamente como células velhas, que aparentemente ocorrem em todas as espécies na circulação sanguínea. Em mamíferos, os mastócitos são habitantes normais do tecido conjuntivo, exceto em tecidos avasculares, como: osso mineralizado, cartilagem e córnea, congregando assim um destacado padrão ao redor de pequenos vasos sanguíneos, vasos linfáticos, terminações nervosas e glândulas produtoras de muco9,10.

A origem dos mastócitos tem sido motivo de muitas discussões, questiona-se que estes tipos celulares são produtos finais da transformação de outras células, ou sejam, resultado de divisão mitótica em suas variadas formas granulares. Asboe-Hansen (1968) concluiu que a maioria dos mastócitos, são divididos mitóticamente na fase de desenvolvimento de células precursoras fibroblásticas não granulares11.

Observamos a presença de mastócitos tanto na reação inflamatória aguda quanto na crônica, expressando em sua superfície o receptor que liga a porção Fc da IgE (FcεRI). Nas reações agudas, a IgE ligada aos receptores Fc das células, reconhece os antígenos de maneira específica e as células sofrem degranulação, liberando mediadores, como a histamina e os produtos da oxidação do ácido aracdônico. Esse tipo de resposta ocorre durante as reações anafiláticas a alimentos, picada de insetos ou drogas, freqüentemente com resultados catastróficos. Quando apropriadamente reguladas, as respostas podem beneficiar o hospedeiro. Os mastócitos também estão presentes nas reações inflamatórias crônicas e podem produzir citocinas que contribuem para a fibrose12.

Vale destacar que esta ativação dos mastócitos se dá pela ligação cruzada de moléculas do FcεRI, que ocorre pela ligação de antígenos multivalentes às moléculas de IgE anexas, e como conseqüência desta ativação, temos três tipos de respostas biológicas: secreção do conteúdo pré-formado de seus grânulos por um processo regulado de exocitose, síntese e secreção de mediadores de lipídios, além de síntese e secreção de citocinas2.

Em adição a imunoglobulina E (IgE), associada a resposta imune, a ativação e degranulação dos mastócitos pode ser realizada também por múltiplos mecanismos, incluindo a sinalização via receptores Fcγ, que são necessários para ativação associada a imunoglobulina G (IgG). A habilidade da IgG na ativação de mastócitos, indica a promoção da ligação celular entre IgG e a progressão das doenças inflamatórias auto-imunes13.

A respeito das interações entre mastócitos e células T, verifica-se que os mastócitos podem secretar citocinas, influenciando na diferenciação das células T, nas respostas tipo Th1 e Th2, sendo capazes de modular a proliferação e a produção de citocinas nas respostas de células T CD8+14.

Células T

Os linfócitos T se originam de precursores do fígado fetal ou da medula óssea de adultos e amadurecem no timo. As células T em desenvolvimento no timo são chamadas de timócitos e a maioria dos timócitos imaturos não expressam o receptor para o antígeno (TCR) ou os co-receptores CD4 e CD8. A ativação da resposta imune adaptativa, mediada por células T, é acionada através do reconhecimento do antígeno pelos linfócitos T juntamente com outros estímulos. A resposta dos linfócitos T, reconhecem o antígeno, propiciam a co-estimulação e outros sinais como secreção de citocinas, proliferação e diferenciação2.

Quando uma célula indiferenciada "naive" CD4+, precursora de linfócitos T, encontra os antígenos, inúmeras cascatas de sinalização são ativadas e um programa complexo de desenvolvimento é iniciado, resultando em uma diferenciação destas células em distintos efetores T auxiliares (T helper =Th). As diferenças entre sub-sítios de células T são explicadas pelas citocinas que eles secretam. As células Th1 produzem interferon-γ (IFN-γ), interleucina-2 (IL-2) e o fator de necrose tumoral β (TNF- β), sγo responsáveis pelas células mediadoras da inflamação e da imunidade, já as células Th2 secretam IL-4, IL-5, IL-6, IL-10 e IL-13, e são responsáveis pela resposta humoral. As citocinas também são importantes nos papéis de regulação e diferenciação15.

O subgrupo T auxiliar-1 (Th1) sintetiza e secreta IL-2 e interferon-γ (IFN- γ), mas nγo produz IL-4 ou IL-5, enquanto as células Th2 sintetizam IL-4, IL-5 e IL-13, mas não produzem IL-2 ou IFN- γ. Essa diferença é significativa porque as citocinas secretadas por estes subgrupos possuem efeitos distintos em outras células imunes12.

A importância das células Th1 na resposta imune a patógenos é destacada pelo fato do seu desenvolvimento ser o mesmo em mamíferos. Para as células T CD4+, a sinalização pela IL-12 e ativação do gene STAT4 (Sinal de transdução e ativação de transcrição) é uma trajetória que regula os primeiros passos da expressão do IFN-γ. Entretanto, em humanos, em adição a IL-12, o IFN-αβ (tipo 1) também emite sinal através do STAT4 e promove secreção de IFN- γ em células T CD4+16.

Por outro lado a diferenciação das células Th2 é caracterizada pela ativação STAT6 induzida pela IL-4 6.

Estudos realizados em ratos, demonstraram que o TGF-β1 pode suprimir a hiperresponsividade das vias aéreas e inflamação associada com asma. Entretanto os genes que o TGF-β podem reprimir, atuam na diferenciação Th2, podendo ser alvos importantes na modulação do equilíbrio Th1 e Th2. Sabe-se que o TGF- β inibe a diferenciação nos subtipos Th1 e Th27.

A especificação de uma certa linhagem celular, depende tanto da ativação gênica quanto do silenciamento genético. E na diferenciação das células T progenitoras em células auxiliares Th1 e Th2, há a necessidade da ação de dois fatores de transcrição opostos, o T-bet que é essencial para o desenvolvimento das células Th1, e o GATA-3 que exibe papel semelhante ao T-bet, porém está relacionado com o desenvolvimento de células Th25.

Sabendo-se que um tipo de células T, as células Tγδ estγo associadas em várias doenças inflamatórias humanas, e que as lesões periapicais são causadas por uma inflamação crônica, e que somente uma parte dos pacientes que receberam tratamento endodôntico exibem radiolucidez periapical. A razão pela qual pacientes continuam a desenvolver resposta inflamatória pós-tratamento endodôntico, ainda não é muito bem entendida, sendo a presença de células Tγδ uma possνvel explicação, verificando neste estudo a presença destes tipos celulares em 36 dos 37 casos de lesões periapicais analisadas, entretanto não se sabe que citocinas são liberadas pelas células Tγδ, mais estudos sγo necessários e se houver a confirmação que estas células atuem no desenvolvimento das lesões periapicais, teríamos como instituir uma terapia para eliminar estes tipos celulares, permitindo a resolução destas lesões sem a necessidade de intervenção cirúrgica17.

Em várias revisões recentes sobre inflamação e doenças inflamatórias, os mastócitos nem sempre são mencionados, ou quando se referem a eles, apenas são listados como simples participantes. Talvez essa ausência no reconhecimento seja em parte, pelo papel já estabelecido dos mastócitos em doenças alérgicas, o que de uma certa forma, obscureceu os demais papéis dos mastócitos em outros contextos. Essa omissão pode ocorrer simplesmente, pelo fato dos mastócitos estarem em menor quantidade em lesões inflamatórias, quando comparadas com número de linfócitos e neutrófilos nestas lesões. Entretanto, os mastócitos apesar de se apresentarem em menor quantidade, são essenciais na promoção da resposta inflamatória1.

Verifica-se que os mastócitos raramente são vistos degranulando em doenças auto-imunes ou em processos inflamatórios. A única maneira de explicar, como esta versatilidade celular pode regular a resposta imune ou como eles podem ser envolvidos em doenças inflamatórias, sem causar choque anafilático, se dá justamente através da liberação "seletiva" ou "diferencial" de mediadores sem que haja degranulação18.

A proximidade entre mastócitos e células T, pode fazer com que os mastócitos atuem diretamente, influenciando as células T "naive". As citocinas produzidas por estes mastócitos, sob uma ativação independente de FcεRI, pode contribuir no microambiente das células T "naive", para sua polarização. Em alguns locais, a IL-4 derivada dos mastócitos, pode diretamente direcionar a resposta Th2, entretanto áreas onde há a presença de IL-12, pode agir promovendo a diferenciação Th14.

Estudos em ratos para verificar a polarização de células T, resposta Th1 ou Th2, na presença de mastócitos, constataram os dois tipos de respostas, porém os mastócitos estavam mais associados com a resposta Th219.

Os mastócitos podem desempenhar um papel protetor na imunidade inata, e um papel pró-inflamatório em certas circunstâncias. Este papel protetor e pró-inflamatório, parece ser contraditório. No entanto, esta aparente contradição é um importante fator a ser levado em conta, se levarmos em consideração que os mastócitos podem ser um bom alvo terapêutico1.

 

CONCLUSÃO

Os dados obtidos na literatura atual suportam uma possível relação entre mastócitos e células T;

Os autores sugerem que a proximidade entre mastócitos e células T, pode fazer com que os mastócitos atuem diretamente sobre as células T;

A interleucina-12 (IL-12) proveniente dos mastócitos polarizam as células T para a resposta Th1;

Entretanto a interleucina-4 (IL-4) derivada dos mastócitos pode polarizar as células T em células Th2.

 

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Endereço para correspondência
Profa. Dra. Lélia Batista de Souza
Programa de Pós-Graduação em Patologia Oral Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Av. Senador Salgado Filho, 1787 - Lagoa Nova - Natal – RN/Brasil
Cep: 59.056-000
Fone/Fax: (84) 3215-4138
e-mail: leliasouza@dod.ufrn.br

Recebido para publicação: 01/06/09
Aceito para publicação: 27/08/09