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Odontologia Clínico-Científica (Online)

versão On-line ISSN 1677-3888

Odontol. Clín.-Cient. (Online) vol.10 no.1 Recife Jan./Mar. 2011

 

ARTIGO DE REVISÃO REVIEW ARTICIE

 

Aspectos importantes na escolha dos adesivos autocondicionantes

 

Important aspects in the choice of autocondicionantes adhesives

 

 

Darcyla Maria de Aguiar BelloI; Déborah Daniella Diniz FonsecaI; Cláudio Heliomar Vicente da SilvaII; Lúcia Carneiro de Souza BeatriceII

IMestranda em Odontologia, área de concentração em Clínica Integrada, da UFPE - Recife/PE
IIProfessores de Dentística da UFPE

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Desde os trabalhos de Buonocore, a adesão resinosa à estrutura dentária trouxe mudanças importantes para a prática odontológica, desenvolvendo alternativas de tratamento restaurador, com preparo cavitário mais conservador, maior preservação de esmalte/dentina sadios e melhoria no aspecto estético das restaurações. Na atualidade, os adesivos autocondicionantes, que excluem a etapa do condicionamento ácido prévio, apresentam um aumento na sua popularidade de uso. Este artigo tem o objetivo de revisar a literatura sobre os adesivos autocondicionantes, avaliando aspectos sobre sua composição e mecanismo de ação.

Descritores: Adesivos autocondicionantes; Dentina; Esmalte.


ABSTRACT

Since the study of Buonocore, resinous adhesion to dental structure brought important changes for dentistry practical, developing alternative of restoring treatment with preparation of cavity more conservative, greater healthy enamel /dentine preservation and improvement in the aesthetic aspect of the restorations. In the present time, the self-etching adhesives which exclude the stage of previous the acid conditioning, present an increase in its popularity of use. This article has the purpose to revise literature on self-etching adhesives, evaluating aspects on its composition and mechanism of action.

Keywords: Self-etching adhesives; Enamel; Dentin


 

 

INTRODUÇÃO

A adesão entre os materiais restauradores e os tecidos duros dentários tem sido um dos grandes objetivos de investigação desde 1955, quando Buonocore observou a utilização do ácido fosfórico para melhorar a adesão de tintas e resinas a superfícies metálicas1. A introdução deste conceito conduziu para uma maior mudança no preparo cavitário, não sendo mais necessários desgastes compensatórios, modificando-se o conceito de prevenção de cárie2, proporcionando-se a expansão de técnicas restauradoras estéticas3 e permitindo-se a maior preservação de estrutura dentária sadia4.

Devido à diferença de composição e estrutura entre esmalte e dentina, verifica-se que o condicionamento com ácido fosfórico de 34-37% do esmalte promove melhor selamento marginal, pois apresenta maior quantidade de matéria inorgânica que a dentina, ocasionando, nesta última, uma menor quantidade de sítios passíveis de serem condicionados, uma união menos efetiva e maior probabilidade de infiltração marginal3.

Abandonando o emprego do condicionamento ácido prévio à aplicação do adesivo, surgiram, nos anos 90, os adesivos autocondicionantes. Neste tipo de adesivo, o primer funciona como condicionador do esmalte e da dentina5. Sua popularidade pode ser atribuída à redução da sensibilidade pós-operatória, facilidade na aplicação e dispersão2. Com os adesivos autocondicionantes, a umidade da dentina torna-se um dos requisitos que permite a penetração desses adesivos entre as fibras colágenas, originando a camada híbrida6 e conseguindo posterior adesão.

Este trabalho tem por objetivo revisar a literatura sobre os adesivos autocondicionantes, abordando a composição e o mecanismo de ação dos adesivos autocondicionantes.

 

DESENVOLVIMENTO

A mais recente inovação na tecnologia dos adesivos dentais envolve a introdução dos adesivos autocondicionantes que foram desenvolvidos na tentativa de se criar uma técnica com menor número de passos clínicos e menos sensível7. Nesta categoria de sistemas adesivos, a desnecessidade da remoção dos ácidos por meio de lavagem e posterior secagem do substrato eximem o operador de decidir sobre a umidade a ser mantida sobre a dentina no momento da aplicação do adesivo, diminuindo a possibilidade de colapso das fibras colágenas8. Com a infiltração do adesivo simultaneamente ao processo de desmineralização da dentina, o risco de discrepância entre esses processos é baixo ou inexistente2,8,9,10. Como não há lavagem, ocorre incorporação dos cristais de hidroxiapatita dissolvidos e do remanescente da smear layer no interior da camada híbrida, podendo este processo, a longo prazo, interferir na adesão com as estruturas dentárias11. Entretanto, alguns autores também especulam que a preservação da hidroxiapatita na camada híbrida submicrométrica pode servir como receptor para interação química adicional12.

Os sistemas autocondicionantes podem ser classificados, de acordo com o número de passos operatórios para sua aplicação, em sistemas autocondicionantes de passo único ou de dois passos. Os sistemas autocondicionantes de dois passos são compostos basicamente por monômeros ácidos ou derivados, monômeros hidrófilos e água, contidos em um frasco (primer ácido); enquanto que um segundo frasco apresenta concentrações balanceadas de monômeros hidrófilos e hidrófobos (Clearfil SE Bond/Kuraray, AdheSE/Ivoclar-Vivadent). Os adesivos de passo único apresentam a união do primer ácido com a resina adesiva dos sistemas autocondicionantes de dois passos, conhecido como "todos em um" (Adper Prompt L-Pop/ 3M ESPE, Xeno III/Dentsply, Optibond All-in-One/Kerr)13. Podem ser subdivididos ainda, de acordo com o potencial de condicionamento ácido, determinado pela presença de um ou mais grupamentos carboxílicos ou fosfato incorporados ao monômero ácido9,14, em sistemas autocondicionantes de agressividade forte, moderado e suave10. Os adesivos autocondicionantes fortes apresentam pH menor ou igual a um como o Xeno III (Dentsply), Adper Prompt L-Pop (3M ESPE). Esta elevada acidez resulta em profunda desmineralização dentinária, semelhante ao condicionamento realizado pelos sistemas convencionais. Os sistemas autocondicionantes moderados apresentam pH acima de um e próximo a dois (AdheSe/Ivoclar-Vivadent, Optibond Solo Plus SE/Kerr). Esses sistemas adesivos alcançam adequada retenção micromecânica e possuem uma interação química entre os cristais residuais de hidroxiapatita com alguns grupos funcionais dos monômeros ácidos15,16. Os adesivos autocondicionantes suaves tem pH em torno de 2. Exemplos desses produtos são o iBond (Heraeus Kulzer), Clearfil SE Bond (Kuraray) e One-Up Bond F (Tokuyama).

Os adesivos autocondicionantes apresentam em sua composição altas concentrações de monômeros mais ácidos nos primers, portanto são capazes de dissolver e/ou modificar a smear layer e a porção superficial da dentina subjacente. Um melhor selamento poderia ocorrer com tais adesivos, já que não haveria discrepância entre a profundidade de condicionamento e a extensão de infiltração dos monômeros resinosos no substrato. Uma vantagem desse tipo de adesivo é que o selamento resultaria em menor ou nenhuma sensibilidade pós-operatória.

Andrade et al.17 avaliaram se o pH do primer poderia influenciar na resistência de união entre os adesivos autocondicionantes (Clearfil SE bond e Adper Prompt L-Pop, AdHeSE) ao esmalte e à dentina, em que o Clearfil SE Bond com ph aproximadamente 2,0, apresentou desempenho superior ao Adper Prompt L-Pop, AdHeSE que apresentam ph 0,85 e 1,4 de seus primers, respectivamente, demonstrando que o desempenho de um sistema adesivo não deve ser creditado apenas ao pH do primer. Os resultados podem ter sido influenciados pelas características dos monômeros funcionais.

Os monômeros funcionais mais comumente empregados na composição dos sistemas autocondicionantes são o 10-MDP, Fenil-P, 4-META. Dentre eles, o 10-MDP apresenta características superiores em promover ligação com hidroxiapatita e estabilidade das ligações, e os sistemas que contêm monômeros 4-META na composição apresentam desempenho superior àqueles que utilizam o Fenil-P. Isso poderia explicar desempenho superior com relação aos valores de resistência adesiva encontrados para o sistema adesivo Clearfil SE bond que contém o monômero 10-MDP em sua composição e os sistemas AdHeSE e o Adper Prompt L-Pop os monômeros funcionais 4-META e Fenil-P, respectivamente.

Com relação à durabilidade, estudos in vitro e in vivo indicam que a resistência de união e a qualidade do selamento produzido pelos sistemas adesivos ao substrato dentinário decrescem com o tempo. O principal mecanismo que contribui para a diminuição dos valores de resistência de união está relacionado à degradação hidrolítica dos polímeros adesivos com o passar do tempo. E essa degradação tem aumentado nas técnicas de união simplificadas, nas quais se inserem os adesivos mais hidrófilos10.

Nos estudos, Garcia et al.12 avaliaram a resistência de união de 2 sistemas adesivos autocondicionantes, Clearfill SE Bond/Kuraray e Clearfill S3 Bond/Kuraray em dentina bovina. O sistema adesivo Clearfil SE Bond de dois passos clínicos resultou em maior média de resistência de união, com diferença estatisticamente significativa em relação ao sistema adesivo Clearfil S3 Bond de um passo clínico. A maior média apresentada pelo Clearfil SE Bond no presente estudo pode se dever ao fato de a resina hidrófoba ter permitido um aumento no grau de polimerização (conversão de monômeros em polímeros) e uma redução das características hidrófilas do adesivo.

De Munck et al.10, em uma revisão, relata que os sistemas adesivos autocondicionantes de 2 passos e os convencionais de 3 passos mostraram-se com melhor desempenho, tanto em termos de resistência de união como de durabilidade, em função de os componentes hidrófilos e hidrófobos desses produtos estarem em frascos separados.

Os adesivos de um passo apresentam menor resistência de união, pois apresentam menos monômeros hidrófobos, consequentemente mais água e solventes na superfície dentinária em relação aos adesivos de dois passos. Portanto, os adesivos de um passo são sistemas mais hidrófilos e formam uma camada híbrida mais permeável à água18. O aumento da concentração de monômeros resinosos hidrófilos na composição dos adesivos autocondicionantes de um passo pode prejudicar e comprometer a resistência de união e a durabilidade da união resina–dentina. Consequentemente, estes tipos de adesivos estão mais susceptíveis ao fenômeno da nanoinfiltracão, que corresponde à infiltração existente em restaurações livres de fendas19.

Reis20, por sua vez, avaliou a habilidade de diferentes adesivos em evitar a nanoinfiltração na interface resina/dente e observou que nenhum adesivo foi capaz de evitá-la. Os adesivos autocondicionantes de passo único foram os mais susceptíveis à degradação após a armazenagem em água, comparado com o adesivo convencional e com o autocondicionante de dois passos; esta degradação da união pode estar relacionada à hidrofilia dos materiais utilizados.

 

CONSIDERACÕES FINAIS

A evolução dos sistemas adesivos é uma das maiores revoluções da Dentística restauradora moderna, a qual traz inúmeros benefícios para o profissional, na sua atuação clínica diária, e para os pacientes, como simplicidade das técnicas, redução do tempo clínico, conforto trans e pós-operatório, saúde e bem-estar.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência
Déborah Daniella Diniz Fonseca
Rua Teles Junior, 122/303 B – Aflitos
Recife-PE
CEP: 52050-040
e-mail: dddfonseca@gmail.com

Recebido para publicação: 07/11/08
Aceito para publicação: 28/05/09