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Odontologia Clínico-Científica (Online)

versão On-line ISSN 1677-3888

Odontol. Clín.-Cient. (Online) vol.12 no.4 Recife Out./Dez. 2013

 

Relato de Casos / Case Report

 

Granuloma gravídico – relato de caso

 

Granuloma gravidarum - case report

 

 

Marta Silveira da Mota Krüger; Denise Paiva da Rosa; Fernanda Geraldo Pappen; Ana Regina Romano; Fernanda de Oliveira Bello Corrêa

 

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O granuloma piogênico é uma das entidades mais frequentemente associadas à expansão dos tecidos moles. Em gestantes, é comumente denominado granuloma gravídico ou tumor gravídico. Acreditase que essa lesão, de natureza não neoplásica, represente uma resposta tecidual exuberante a uma irritação local ou trauma. Hormônios sexuais femininos estão relacionados com a patogênese dessa lesão. Esse relato apresenta o caso de uma paciente de 27 anos, no oitavo mês gestacional, com granuloma gravídico na região de mucosa vestibular do dente 42 que estava interferindo na qualidade de vida da paciente. Foi realizada a biópsia excisional da lesão. Dependendo do volume, o granuloma piogênico tende a regredir por completo, após o término da gestação, no entanto, em alguns casos, deve-se considerar a remoção cirúrgica da lesão, uma vez que ela pode interferir na alimentação, no convívio social e matrimonial, fatores importantes para que a gestação evolua adequadamente. Embora a paciente não tenha retornado para avaliação do pós-operatório imediato e mediato, foi relatado, por contato telefônico, que não houve recidiva da lesão, decorridos 18 meses do procedimento cirúrgico.

PALAVRAS-CHAVE: Gravidez; Diagnóstico; Patologia bucal; Granuloma piogênico.


ABSTRACT

Pyogenic granuloma is an entity often associated with expansion of soft tissues. In pregnant women is commonly called granuloma gravidarum or pregnancy tumor. This lesion, non-neoplastic nature, is considered a represent of an exuberant tissue response to local irritation or trauma. Female sex hormones are related to the pathogenesis of this lesion. This report presents the case of a 27-year-old patient in the eighth month of pregnancy, with granuloma gravidarumon the buccal mucosa, region of tooth 42, that was interfering with quality of life of the patient. Lesion excisional biopsy was performed.Depending on the volume, the pyogenic granuloma tends to regress completely after pregnancy, but in some cases it is necessary to consider the surgical removal of the lesion, because the granuloma could modify the diet, social life and marriage, important factors to adequate pregnancy development. Although the patient has not returned for immediate and mediate postoperative evaluation, it was reported, by telephone, no lesion recurrence after 18 months of the surgery.

Keywords: pregnancy, diagnosis, oral pathology, pyogenic granuloma.


 

 

Introdução

O granuloma piogênico é uma das entidades mais frequentemente associadas à expansão dos tecidos moles1, representando entre 3,8% e 7% de todas as biópsias de lesões realizadas na cavidade bucal2. Semelhante a um tumor, de natureza não neoplásica, considera-se que represente uma resposta tecidual exuberante a uma irritação local ou trauma3. No entanto, a patogênese do granuloma piogênico ainda não se apresenta completamente estabelecida.

Há uma predileção pelo sexo feminino, sendo as pacientes com cor da pele branca as mais afetadas e o sítio mais comum a gengiva4,5. As lesões, em sua maioria, são descritas como nódulos com base pediculada, de consistência macia e superfície avermelhada3,4. O tamanho pode variar de 1 a 6cm, com uma média de 1,3cm4.

Em gestantes, essa patologia é comumente denominada granuloma gravídico ou tumor gravídico, podendo ter início ou ser exacerbada durante a gravidez, sendo normalmente apenas monitorados, pois regridem após o parto, mas, às vezes, eles interferem no desenvolvimento da função mastigatória ou estética, necessitando de intervenção1. O granuloma piogênico pode estar associado com a ingestão de contraceptivos orais, indicando que os hormônios sexuais femininos desempenham um importante papel na patogênese dessa lesão6.

Tendo em vista a prevalência do granuloma piogênico, principalmente em gestantes, o presente estudo objetiva relatar um caso de granuloma gravídico em uma paciente com 8 meses de gestação assim como o impacto dessa lesão na qualidade de vida da gestante.

 

Descrição

Paciente do sexo feminino, 27 anos de idade, foi atendida na Clínica Atenção Odontológica Materno-infantil, durante o terceiro trimestre da segunda gestação, com queixa de crescimento de tecido mole, com seis meses de evolução, causando mobilidade no dente 42 que sangrava ao toque.

A lesão dificultava a higiene bucal e a alimentação, e, segundo relato da paciente, tornava desagradável o convívio social e matrimonial. A paciente informou ainda que durante a primeira gestação também apresentou uma lesão semelhante na mesma região, tendo ela regredido totalmente, após o término da gestação, sem necessidade de intervenção cirúrgica. Ao exame clínico extraoral, a paciente apresentava alteração de volume na região labial inferior direita, sem linfonodos cervicais palpáveis.

Ao exame clínico intraoral, foi verificada uma lesão, pediculada, na região de mucosa vestibular do dente 42, de consistência fibrosa, medindo 23x12x10mm, com coloração avermelhada e com áreas recobertas por membrana necrótica (Figura 1). O dente 42 estava lingualizado em relação aos demais e com mobilidade grau I. Ao exame radiográfico, foi verificada perda da lâmina dura na região do dente 42.

 

 

 

O hemograma, realizado durante o pré-natal na unidade básica de saúde, evidenciou que a paciente não apresentava alterações sanguíneas. Com a suspeita clínica de granuloma gravídico, devido às queixas da paciente, foi realizada a biópsia excisional da lesão.

Foi realizada anestesia do nervo mentoniano utilizando um tubete de lidocaína 2% com vasoconstritor adrenalina 1:100.000. Para a remoção da lesão, foi utilizada lâmina de bisturi n° 15 e incisão na base do pedículo do granuloma. Durante o procedimento cirúrgico, houve o rompimento de um vaso sanguíneo de pequeno calibre que nutria a lesão, causando sangramento contínuo que foi estancado, utilizando-se uma pinça hemostática e pressão da região com gaze esterilizada, embebida em solução hemostática. Após obtenção da hemostasia, foi colocado cimento cirúrgico sobre a área cruenta, e, em seguida, a peça foi encaminhada para o exame histopatológico.

De acordo com o laudo histopatológico, os cortes histológicos revelaram fragmento de epitélio pavimentoso estratificado paraceratinizado o qual se apresentava ora atrófico ora hiperplásico, com extensa área de solução de continuidade recoberta por membrana fibrino-purulenta necrótica. Também foram observadas áreas de espongiose e exocitose. O tecido subjacente exibia marcante proliferação vascular, caracterizada por inúmeros espaços revestidos por células endoteliais de diferentes calibres, estando muitos deles obliterados por hemácias. De permeio, observou-se infiltrado inflamatório predominantemente plasmocitário, sendo também vistos diversos eosinófilos. Dessa forma, através do exame histopatológico, foi confirmado o diagnóstico de granuloma gravídico (Figura 2).

 

 

 

A paciente não retornou à Clínica Atenção Odontológica Materno-infantil para avaliação do pós-operatório imediato e mediato. Informou, apenas, por contato telefônico, que a região apresentava aspecto normal, sem recidiva da lesão, tendo decorrido um período de 18 meses do procedimento cirúrgico, sendo possível perceber uma área cicatricial próxima ao sulco gengival do dente 42 e, embora esse elemento dentário tivesse permanecido lingualizado, não apresentava mais mobilidade.

 

Discussão

Grande parcela dos estudos revela que o granuloma piogênico é mais frequente em adultos jovens, entre a primeira e a terceira década de vida, mostrando predileção pelo sexo feminino e tendo como local preponderante a gengiva1,2,3,7, concordando com este relato de caso no qual a paciente é do sexo feminino, com 27 anos e apresentava lesão na gengiva vestibular, na região do elemento 42.

A paciente encontrava-se no terceiro trimestre da segunda gestação e relatou que, durante a primeira gestação, percebeu a lesão, porém menor, tendo ela regredido após o término da gestação, corroborando a literatura que descreve que a resolução do granuloma gravídico pode ocorrer espontaneamente após a gravidez e a normalização dos níveis hormonais3,6. O seu desenvolvimento em mulheres grávidas pode estar relacionado ao aumento nos níveis de estrogênio e progesterona durante a gravidez3,6.

O diâmetro da lesão descrita está de acordo com os relatos da literatura, podendo variar de poucos milímetros a vários centímetros, raramente excedendo 2,5 cm3,4. Na maioria dos casos, o desenvolvimento clínico da lesão é lento e indolor3, embora também possa haver crescimento rápido da lesão8. A coloração da superfície do granuloma piogênico varia entre rosa, vermelho e violeta, dependendo da idade da lesão. A superfície caracteristicamente ulcerada e friável pode ser coberta por uma membrana amarela fibrinosa3, entretanto raramente causa perda óssea significativa.

O granuloma gravídico geralmente aparece no segundo ou no terceiro mês da gestação5, com tendência a sangramento e uma possível interferência na mastigação assim como no caso relatado. Dependendo do volume, ele tende a regredir por completo, EX VG após o término da gestação, embora, em algumas situações, seja necessária a intervenção, propiciando que a paciente normalize a alimentação, o convívio social e matrimonial, importantes para a evolução adequada da gestação. Quanto ao tratamento, devido ao grande volume e por estar causando desconforto à paciente, a excisão cirúrgica foi realizada, sendo considerado o mais indicado1,3,4,9, embora outras modalidades de tratamento, como a criocirurgia, cirurgia a laser, biópsia incisional com posterior raspagem e curetagem, também sejam citadas por alguns autores4,7.

Durante o período gestacional, a mulher é considerada uma paciente especial para o atendimento odontológico, devendo-se, portanto, ser respeitada sua condição física, psicológica e sistêmica. Com relação à substância anestésica, a escolha foi a lidocaína associada com o vasoconstritor, por ser considerada segura na gestação10, sendo que ela foi administrada com a técnica adequada e o volume controlado.

A satisfação da paciente, observada no acompanhamento imediato, evidenciou que a resolução cirúrgica do granuloma piogênico propiciou a melhora na qualidade de vida, justificando a sua indicação em casos específicos, seguindo-se do seu acompanhamento devido à possibilidade de recidiva da lesão.

 

Referências

1. Kamal R, Dahiya P, Puri A.Oral pyogenic granuloma: various concepts of etiopathogenesis. JOral and Maxillofac- Pathol. 2012; 16, 79-82.         [ Links ]

2. Avelar RL, Antunes AA, Carvalho RWFet al. Granuloma piogênico oral: Um estudo epidemiológico de 191 casos. RGO 2008; 56, 131-35.

3. Neville BW et al. Patologia oral &maxilofacial. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2002. p.429-30.

4. Gordón-núñez MA, Carvalho MV, Benevenuto TG et al.Oral Pyogenic Granuloma: A Retrospective Analysis of 293 Cases in a Brazilian Population. J Oral Maxillofac Surg. 2010; 68, 2185-88.

5. Jafarzadeh H, Sanatkhani M, Mohtasham N. Oral pyogenic granuloma: a review. J Oral Sci. 2006; 48, 167-75.

6. Kanda N, Watanabe S.Regulatory roles of sex hormones in cutaneous biology and immunology. J Dermatol Sci. 2005; 38, 1-7.

7. Chandrashekar B. Minimally Inasive Approach to Eliminate Pyogenic Granuloma: A Case Report. Case Rep Dent, 2012.

8. Parisi E, Glick PH, Glick M.Recurrent intraoral pyogenic granuloma with satellitosis treated with corticosteroids. Oral Dis. 2006; 12, 70-2.

9. Gonçales ES, Damante JH, Fischer Rubira CM, Taveira LAA. Pyogenic granuloma on the upper lip: an unusual Location.J Appl Oral Sci. 2010; 18, 538-541.

10. Mendia J, Cuddy MA, Moore PA. Drug Therapy for the Pregnant Dental Patient. CompendContinEduc Dent, 2012; 33, 568-79.

 

 

Endereço para correspondência:
Marta Silveira da Mota Krüger
Instituição: Universidade Federal de Pelotas
Faculdade de Odontologia
Rua Gonçalves Chaves, 457, Centro Pelotas –RS
96015-560
e-mail: martakruger@gmail.com

 

Recebido para publicação: 28/06/2013
Aceito para publicação: 24/06/2014