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Revista da ABENO

versão impressa ISSN 1679-5954

Rev. ABENO vol.14 no.1 Londrina Jan./Jun. 2014

 

 

 

Recursos utilizados por graduandos de odontologia e Cirurgiões-Dentistas do SUS para estudar e resolver dúvidas surgidas durante o trabalho

 

Study tools used by dentistry students and Dentists to study and to resolve doubts emerged from the work

 

 

Sonia Gomes de LemosI; Maria Celeste MoritaII; Elisa Emi Tanaka CarlotoIII

I Mestre em Odontologia, Universidade Estadual de Londrina
II Professora Associada do Departamento de Medicina Oral e Odontologia Infantil da Universidade Estadual de Londrina
III Professora Associada do Departamento de Medicina Oral e Odontologia Infantil da Universidade Estadual de Londrina

 

 


RESUMO

O objetivo foi identificar ferramentas que um grupo de 45 estudantes e 21 Cirurgiões-Dentistas (CD), atuantes no Sistema Único de Saúde (SUS) e preceptores de alunos, utilizam para estudar e resolver dúvidas surgidas durante o trabalho. Buscou-se também identificar barreiras para a utilização de ambientes virtuais como estratégia de apoio. Aplicou-se um questionário semiestruturado. Os resultados foram analisados por estatística descritiva e Análise de Conteúdo. Estudantes indicaram preferencialmente periódicos eletrônicos (89%) e CD principalmente a participação em congressos (90%). Ambos os grupos dominam ferramentas de informática básica, e-mail e ferramentas digitais de busca. Sites e blogs são utilizados por 14.3% dos CD e 17.8% dos estudantes. Nenhum CD e apenas 1 estudante indicou utilizar sites de Odontologia Baseada em Evidências. A leitura de textos em língua inglesa, fundamental para o acesso a informação científica, é barreira para mais de 50% em ambos os grupos. Na abordagem qualitativa 57% dos CD não relataram estudar para resolver dúvidas surgidas no trabalho, que são solucionadas principalmente com conversas entre colegas e encaminhamentos. Indica-se a Teleconsultoria como estratégia promissora para este grupo. Ainda que o perfil do egresso almejado seja generalista, a intenção de especializar-se é referida por 78% dos estudantes. Embora haja o domínio tecnológico, ressalta-se a barreira referente à falta de uma cultura de busca, que poderá comprometer a adesão a programas de apoio a distância. Indica-se a necessidade de enfatizar a constante busca qualificada da informação, para estudantes e profissionais, visando à resolubilidade e qualidade da atenção ofertada no SUS.

Descritores: Educação continuada. Educação em Odontologia. Educação à Distância. Odontologia Baseada em Evidências. Telessaúde.


ABSTRACT

The objective was to describe tools and means used by a group of 45 students and 21 dentists, working at the Public Health System and student´s tutor, to study and solve questions raised during working. Furthermore, it aimed to identify barriers for virtual environments as support strategy. Semi-structured questionnaire was applied and items were analyzed using descriptive statistics and Content Analysis. The main studying tools for students were electronic journals (89%), for the dentists was attending seminars and conferences (91%). Both groups mastered basic computer tools, e-mail and digital searching tools. Websites and blogs were used by 14.3 % of dentists and 17.8 % of students. None of dentist and only one student indicated using Evidence-Based Dentistry sites. Reading English papers is essential for the access to the scientific knowledge, it was a barrier to over 50% for both groups. The qualitative approach found that 57% of the dentists indicated they are not used to study to resolve questions emerged from the work, solved mainly with conversations between colleagues and referrals. It shows promise for the strategies such as teleconsulting. Although the desired alumni profile is the general practioner, the intention of specializing is reported by 78% students. They mastered the technological field, however the barrier related to the lack of a searching culture, may affect adherence to distance support programs. The research indicates the need to emphasize the constant searching for qualified information, for students and den-tists, leading to the resolution and quality of care offered in the public health services.

Descriptors: Continuing Education. Educa-tion, Dental. Distance Education. Evidence-Based Dentistry, Telemedicine.


 

 

1 INTRODUÇÃO

O trabalho do Cirurgião-dentista na Atenção Primária à Saúde no Sistema Único de Saúde (SUS), apresenta grandes desafios, pois o serviço envolve não apenas práticas pontuais e tecnicistas, mas possui uma abordagem multidisciplinar e de interação individual e coletiva. Há necessidade de se manter um aprendizado constante, motivado pelas dúvidas e problemas arrolados no dia-a-dia do serviço e capaz de transformar as práticas preestabelecidas.1

A resolução de problemas deve preferencialmente acontecer com base no conhecimento científico, na experiência clínica do profissional e nas percepções/necessidades do paciente.2 O uso da Tecnologia de Comunicação e Informação (TIC) foi identificada e percebeu-se o grande proveito que poderia obter-se ao empregá-la como ferramenta de apoio aos profissionais dos serviços, por meio da Telessaúde.3

Para alcançar o público e o efeito que se espera com o programa, faz-se necessário conhecer as características da população a que se destina. O objetivo desta pesquisa foi identificar quais ferramentas um grupo de cirurgiões-dentistas atuantes no SUS e um grupo de graduandos em Odontologia tem lançado mão para estudar e para resolver dúvidas surgidas durante o trabalho, e identificar possíveis barreiras para a expansão e consolidação da Teleodontologia como estratégia de apoio a esses profissionais.

 

2 SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO E INFOCULTURA

A partir do surgimento da imprensa e com a difusão dos recursos eletrônicos e de internet, o uso de TIC culminou no surgimento de uma sociedade da informação, promovendo profundas mudanças sociais, culturais, na produção do conhecimento4, bem como se indicasua capacidade de moldar pensamentos, ações e comportamentos.5,6

Os Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA) e o uso de hipermídias (combinações de recursos de som, vídeo, hipertextos) surgem nesse cenário apontando novas possibilidades para a abordagem pedagógica e consolidação do processo ensino-aprendizagem, devido à diversidade de possibilidades de inovação e interação.7,8

Além disso, o uso das TIC é uma importante ferramenta de educação que permite quebrar barreiras geográficas (muito relevante considerando a extensão territorial brasileira), econômicas/estruturais (cada vez mais se busca a inclusão digital, como o Programa Nacional de Banda Larga – Brasil Conectado),9 barreiras espaciais, de tempo e de interatividade.10

A TIC oferece vantagens tanto como ferramenta regular de ensino em cursos presenciais, como também para profissionais no período pós-formado. Com a acelerada forma com que aparecem novas tecnologias e novos conhecimentos, exige-se do profissional constante atualização. Indica-se a necessidade do sistema educacional contemplar a "formação ao longo da vida" com sinergia ao ambiente de trabalho.11

 

3 EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE E AS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS

O enfoque na educação permanente surge nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para o curso de graduação em Odontologia no ano de 2002,12 como uma das competências gerais para a formação profissional.

A proposta curricular sugere a quebra do modelo de ensino baseado na perspectiva bancária de acúmulo e transmissão do saber13 e do modelo flexneriano14, e implantação de um ensino voltado para a autoaprendizagem, aprender a aprender e busca autônoma do conhecimento. Vê-se um processo baseado no desenvolvimento de competências, ou seja, na capacidade do profissional/estudante mobilizar conhecimentos em diferentes áreas do conhecimento, para a resolução dos problemas concretos encontrados nas atividades diárias.15

A educação continuada do profissional é motivo de atenção pelos órgãos gestores do SUS. Com base na observação de alguns projetos brasileiros em Telessaúde e Telemedicina, o Ministério da Saúde, a partir de 2006, desenvolveu e implantou um projeto-piloto de Telessaúde.3

As ações estão voltadas para a atenção básica (em equipes da Estratégia de Saúde da Família)16 devido ao modelo de atenção, com porta de entrada na Atenção Primária à Saúde (APS). Quando bem estruturado este nível de atenção pode resolver aproximadamente 85% das necessidades em saúde da população e aliviar os níveis secundário e terciário, que demandam tecnologias de alto custo.17,18

Os objetivos são: a otimização dos recursos, redução de custos de deslocamento e tempo referente às ausências no trabalho, tornar o atendimento mais rápido, melhorar a resolubilidade e qualidade do sistema e favorecer a permanência de profissionais em locais de difícil acesso.

Oferta-se apoio processual e científico aos profissionais. Os serviços prestados pelos Núcleos Técnico-científicos, representado pelas instituições formadoras e de gestão, são:19

Teleconsultorias: utiliza-se a forma síncrona (chat, web ou videoconferência) ou assíncrona (mensagens off-line) para estabelecer contato entre o profissional e o teleconsultor, que poderá resolver suas dú-vidas;

Segunda Opinião Formativa: a partir das teleconsultorias realizadas, selecionam-se as perguntas de maior frequência e relevância e disponibiliza-se por meio do site da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), no domínio BVS-APS, o conjunto de pergunta e resposta. Nesse caso, as respostas vêm acompanhadas por referências bibliográficas.

Telediagnóstico: utiliza as TIC para oferecer apoio diagnóstico à distância.

Tele-educação: oferta de cursos, conferências e aulas utilizando ambientes virtuais.

 

4 METODOLOGIA

Esta pesquisa recebeu aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos, protocolo CAAE: 13290713.3.0000.5231, autorização da Se-cretaria Estadual de Saúde do Estado do Paraná e do Colegiado do Curso de Odonto-logia da universidade onde se aplicou a pesquisa.

Realizou-se um estudo exploratório, retrospectivo de abordagem descritiva. A população de estudo foi composta por: vinte e um cirurgiões-dentistas atuantes em unidades básicas de saúde das cidades de Londrina, Cambé e Ibiporã, no estado do Paraná. Teve como critério de inclusão ser preceptor do Programa de Educação pelo Trabalho na saúde (PET-Saúde); e quarenta e cinco estudantes do último semestre da graduação em Odontologia de uma universidade de Londrina, no ano de 2013.

O projeto pedagógico do curso de Odontologia pesquisado possui formação de acordo com as DCN e voltada para o SUS, desde o ano de 2005.20 O PET-Saúde é par-te dessa formação e, assim os CD que são também preceptores de alunos, foram selecionados para participar dessa pesquisa, visto sua importância como extensão do ambiente estudantil e de formação profissional, justifica-se assim a amostra de conveniência obtida.

O instrumento de pesquisa foi adaptado do Formulário Linhas de Base, utilizado pelo programa Telessaúde Brasil – Odontologia.21 Realizou-se um pré-teste com um representante de cada grupo, no qual se pode avaliar o tempo de resposta e a compreensão das perguntas.

Verificou-se a necessidade de melhorar a clareza e objetividade de algumas questões. Os respondentes relataram que o questionário estava muito extenso e cansativo, assim algumas questões foram removidas e/ou reformuladas.

Trata-se de um questionário semiestruturado autoaplicável. Os questionários foram entregues para os CD em seu local de trabalho e estes puderam responder em sua residência.

A aplicação do instrumento aos estudantes ocorreu durante o último semestre do curso, no segundo mês após o retorno das férias, em sala de aula no período da manhã.

Os dados foram transcritos para uma planilha em Microsoft Excel e as medidas de frequência analisadas utilizando-se o programa Epiinfo 3.5.2. Realizou-se um exame qualitativo da questão aberta, por meio da Análise de Conteúdo.22

 

5 RESULTADOS

As informações referentes ao perfil dos estudantes de graduação em Odontologia e dos CD pesquisados estão nas Tabela 1 e 2.

Com relação a habilidades de leitura em língua estrangeira, argumentou-se: "Quão confortável você se sente para ler textos em inglês?" Havia uma escala visual, onde o respondente deveria marcar o rosto correspondente a sua resposta. Entre os CD 57.1% marcaram opções entre "Pouco confortável" e "Incompatível" e 42.9% "Muito confortável" e "Confortável". Entre os estudantes os resultados foram semelhantes, 53.4% marcaram entre "Pouco confortável" e "Incompatível" e 46.6% "Muito confortável" e "Confortável".

 

 

 

Pesquisou-se também as ferramentas que estes utilizam para estudar e se atualizar (Figura 1). Demarcou-se também os meios virtuais utilizados por cada CD respondente. Assim, observou-se que do total de 21 CD pesquisados 17 (81%) utilizam pelo menos um meio virtual para estudar/atualizar. Examinou-se também a utilização de fontes de informação cientifica (periódicos, livros, etc.) e notou-se que 3 (14%) respondentes não utilizam essas fontes, recorrendo apenas às discussão com colegas, grupos de estudo ou palestras.

 

 

 

 

 

Na Figura 2 estão expostos os resul-tados referentes a programas e aplicativos para computador que os pesquisados sabem utilizar.

 

 

 

Fizeram acesso a página do Ministério da Saúde ou do DATASUS, pelo menos uma vez, 95,2% dos CD e 75.6% dos estudantes e realizaram acesso a página da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) da BIREME 76.2% dos CD e 95.6% dos estudantes.

Conforme a proposta da questão aberta: "Durante a prática clínica diária pode surgir dúvidas com relação a diagnósticos e condutas clínicas a serem adotadas para determinados casos. Qual (ais) meio (os) você utiliza para resolver essas dúvidas durante o atendimento e após?" O exame qualitativo foi realizado por meio da técnica de Análise de Conteúdo.21 Para tal, fez-se uma leitura crítica das respostas e com esta, criou-se seis grupos categóricos. As categorias resultantes e a frequência de citações pelos respondentes encontram-se ao final da sentença, situadas no Quadro 1.

 

 

 

Analisando-se individualmente as resposta observou-se que, do total de respondentes, 12 (57%) indivíduos não indicaram estudar ou obter informações mais precisas sobre o assunto em dúvida, buscam alternativas como a discussão com colegas, consulta a manuais ou realiza o encaminhamento para o nível secundário.

Todos os pesquisados em ambos os grupos relataram usar e-mail, com a seguinte frequência para o CD: 57,1% diariamente e 42,9% de 2 a 6 vezes por semana; para os estudantes: 62,2% diariamente, 28,9% de 2 a 6 vezes por semana, 8,8% frequências menores.

 

6 DISCUSSÃO

Observa-se no grupo pesquisado que mais de 75% dos CD graduaram-se numa faixa entre 20 a 29 anos atrás, portanto com formação não direcionada para o atendimento em serviços públicos. Esse fato pode estar relacionado com a superespecialização característica do grupo, no qual 90% possui uma especialidade e 45% possui 2 especialidades, o que não é uma tendência nacional (25% possuem 1 especialidade e apenas 3% possuem 2 especialidades).23

A super especialização pode sugerir a dificuldade do profissional em resolver as dúvidas que vão surgindo no serviço, recorrendo-se a esses cursos como ferramenta de atualização de conhecimentos. Entende-se que há um esforço do profissional em compreender e se integrar ao ambiente de trabalho.

A formação continuada do profissional da saúde tem sido incentivada pelos órgãos gestores do SUS, como na Portaria 2.027 de 25 de agosto de 2011 que reserva, 8h semanais para atividades de especialização na área e para educação permanente24,25 e por meio da Educação a Distância pela Universidade Aberta do SUS (UNA SUS).26

As DCN promovem a quebra do modelo de ensino Flexneriano,14 ao voltar nosso olhar para o estudante de graduação, como visto na Tabela 2, preocupa o fato de que 77.7% pretendem fazer curso de Especialização ou Residência. Contudo, apenas um estudante citou a Saúde Coletiva e um Residência em Saúde da Família, mesmo entre os 29% que foram bolsistas do PET-Saúde (destes, 38.5% foram bolsistas por 2 anos) apenas dois se interessaram pela área.

Apesar dos avanços apresentados com a nova proposta de ensino, com os estágios curriculares no SUS, com o Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró-Saúde) e com o PET-Saúde, os dados indicam que o novo currículo ainda não foi suficiente para mudar o perfil do estudante ao final da graduação, pois ainda continua voltado para o exercício privado da profissão. Especulase que os estudantes pesquisados ainda não reconhecem a saúde pública como a importante área de trabalho que se afirmou nos últimos anos.

O fácil acesso ao conhecimento é um benefício da sociedade da informação, porém ressalta-se a importância de reconhecer e acessar conteúdos com qualidade científica.

Observa-se que nenhum dos CD e um estudante utiliza sites de Odontologia Baseada em Evidências (OBE), os quais possuem revisões sistemáticas e informações baseadas na melhor evidência científica disponível, inclusive com pesquisas clínicas atuais. Porém ao acessar os artigos de OBE e aqueles em periódicos de maior fator de impacto (revistas com alta qualidade científica), estão escritos em inglês.

Dos profissionais pesquisados 57.1% não apresenta proximidade com a leitura de textos em inglês e 53.4% dos es-tudantes. Conclui-se que para superar a barreira da informação de qualidade muitos leitores se deparam com a barreira da linguagem.

Apesar de muitos dos pesquisados marcarem utilizar Periódicos e livros para estudar, questiona-se o limitado alcance da informação que têm acessado, visto o desconhecimento da OBE, a falta de domínio da língua inglesa e o fato de 14.3% dos CD e 17.8% dos estudantes utilizar sites e blogs de CD (que geralmente não fornecem referências bibliográficas).

Ainda, após análise individual das respostas referentes ao Quadro 1, concluiu-se que 3 CD (14.3% dos pesquisados) utilizam como métodos de estudo, exclusivamente: discussão de caso com colegas, grupo de estudo e palestras/congressos. Ou seja, não recorrem à literatura para resolver suas dúvidas (não marcaram periódicos, livros ou sites científicos). Aprofundando o obtido na questão fechada com o resultado da questão aberta direcionada ao CD, obteve-se que 12 (57%) indivíduos não relataram estudar para resolver a dúvida levantada durante o trabalho.

Ainda que se considere as limitações de um estudo baseado na auto percepção, a falta de cultura de busca de informações e conhecimento referenciada pelo grupo de cirurgiões-dentistas é um problema a ser superado. A autonomia é que possibilitará o enfrentamento das situações problema que surgirão no dia-a-dia do trabalho. Resolver as dúvidas que aparecem durante o serviço, por meio da leitura de artigos científicos, é uma premissa para o sucesso de estratégias de apoio ao profissional, tendo grande relação com o retorno em benefícios ao processo de trabalho e à população atendida.

Destaca-se a necessidade de uma contrapartida dos órgãos envolvidos em facilitar o acesso à informação de qualidade e fortalecer estratégias já adotadas, como no site da Biblioteca Virtual em Saúde no domínio da APS,27 no qual se disponibiliza traduções de revisões sistemáticas de bases como a Cochrane, porém ainda há poucas traduções, principalmente referentes à Odontologia. É importante também, que os gestores e a equipe local, busquem alternativas para melhorar o processo de trabalho do CD, de forma a contemplar tempo para atividades de estudo individual, conforme disposto na Portaria 2.027 de 25 de agosto de 2011,25 o tempo para educação do profissional é elemento fundamental da qualidade da atenção no SUS e do compromisso ético em oferecer um tratamento de qualidade.

Tanto para o profissional quanto para o estudante, as estratégias pedagógicas devem favorecer a autonomia do indivíduo e sensibilizá-lo quanto à importância do seu papel proativo na resolução dos problemas de saúde e dos benefícios que a prática qualificada trará para aqueles atendidos. Para isso, as ações devem ser bem planejadas e se deve estabelecer ferramentas de acompanhamento, na forma de apoio às ações já desenvolvidas. Bem como, o professor também precisa renovar seus métodos de ensino, atuar como facilitador no processo ensino-aprendizagem e instigar no estudante o desejo de estudar e resolver suas dúvidas com base em evidências científicas de qualidade.

Considerando que 75% dos CD já acessaram os sites da BVS ou da Biblioteca Virtual em Saúde Pública, indica-se a possibilidade de utilizar dessas fontes como ferramenta de acesso a outras estratégias de apoio que poderão ser desenvolvidas, dado semelhante foi encontrado por Rendeiro et al. (2012)28

Há anos a BVS tem disponibilizado conteúdo científico de qualidade e sua atuação por meio da BVS APS – Atenção Primária à Saúde promove uma importante inovação ao fornecer um conteúdo diferenciado para os profissionais que estão no serviço e necessitam de uma informação mais rápida e concisa,3 bem como, é em um dos domínios da BVS que as produções referentes ao Telessaúde estão disponíveis para consulta.

Expostas as vantagens do uso da educação à distância e das TIC, os grupos pesquisados mostraram-se bem integrados aos principais recursos de informática necessários para a utilização de uma ferramenta de suporte à distância, conforme o revelado na Figura 2. A quase totalidade de sujeitos que possuem e-mail o acessam com frequência, bem como o uso de ferramentas virtuais para estudar e se atualizar corroboram para a presença de um bom perfil info-cultural nos grupos estudados, não se constituindo numa barreira de acesso.

Na pesquisa de Languardia et al. (2010)8 os autores concluíram que não há necessidade de sofisticados conhecimentos de informática para trabalhar em um AVA, as ferramentas básicas são suficientes para os primeiros acessos e a correta e bem estruturada formulação do AVA é que permitirá o melhor aproveitamento dos recursos disponíveis. Contudo, a oferta de treinamento para o uso das TIC foi indicada como muito importante para a implementação do programa em estabelecimentos de saúde, conforme levantamento TIC Saúde 2013.29

Ao observar a Quadro 1, referente aos grupos categóricos resultantes da Análise de Conteúdo, levanta-se a questão dos encaminhamentos ao nível secundário de atenção (Centros de Especialidades Odontológicas-CEO).

Entre os objetivos do programa Telessaúde estão: tornar os atendimentos mais rápidos e melhorar a resolubilidade. A sobrecarga do nível secundário de atenção com encaminhamentos indevidos é um problema a ser resolvido. As características do grupo de CD pesquisados demonstram essa ocorrência, como visto no Quadro 1.

Os resultados obtidos com o Telessaúde chamam atenção devido a grande capacidade de atuar nesse desafio. A experiência do programa no estado do Rio Grande do Sul concluiu que a disponibilização da Segunda Opinião Formativa evitou que 70% dos pacientes fossem referidos a outro serviço (serviço utilizado por médicos). Já no estado de Minas gerais a redução no encaminhamento foi de 78%. Outro resultado importante arrolado pelo programa no estado de Minas Gerais foi a manutenção de profissionais da Equipe de Saúde na Família em regiões de difícil acesso, no qual 67% dos pesquisados considerou que a oferta de capacitação foi um fator de alta importância para a permanência no municí-pio longínquo.3 Com a perspectiva de ex-pansão da Teleodontologia, o potencial de uso dessa estratégia na Odontologia necessita ser mais bem investigado.

Ressalta-se uma característica dos grupos pesquisados: a recorrência aos colegas como método auxiliar na resolução dos problemas levantados. É importante correlacionar essa característica com o desenho do Telessaúde, que disponibiliza apoio qualificado via internet aos profissionais. Ora, se esses recorrem aos colegas, a disponibilidade da Teleconsultoria associada à facilidade com que os pesquisados trabalham com novas tecnologias, apresenta-se como estratégia promissora.

 

7 CONCLUSÕES

Conclui-se que a maior barreira para programas de apoio ao profissional está na falta de uma cultura de busca de informação e de resolução de problemas embasados no conhecimento científico. Bem como, deve haver uma contrapartida dos programas em fornecer conteúdos de mais fácil acesso e com qualidade científica. Também se indica a premissa da graduação em Odontologia enfatizar a busca autônoma e qualificada da informação.

A intenção revelada pelos estudantes em obter uma especialidade, após a conclusão da graduação, mostra que despertar o interesse para o trabalho no SUS ainda é um desafio a ser superado. Apesar dos avanços conseguidos com as mudanças curriculares e com a criação de programas de inserção do estudante no ambiente de trabalho da saúde pública, essas ações ainda não foram suficientes para mudar o perfil do grupo de estudantes, que mostrou-se voltado para o exercício privado da profissão.

 

AGRADECIMENTOS

CAPES- Bolsa de Mestrado concedida à Primeira autora no Edital PróEnsino na Saúde, 2012-2014.

 

REFERÊNCIAS

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