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Revista da ABENO
versão impressa ISSN 1679-5954
Rev. ABENO vol.17 no.1 Londrina Jan./Mar. 2017
E-learning em Diagnóstico Bucal: relato de experiência na Universidade de Brasília
E-learning in Oral Diagnosis: experience report at the University of Brasília
Brendda Juliana Carvalho FeitosaI; Nilce Santos de MeloII; Gláucia Nize Martins SantosIII
I Discente de graduação em Odontologia, Universidade de Brasília
II Professora do Departamento de Odontologia da Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade de Brasília
III Mestre em Ciências da Saúde, Universidade de Brasília
RESUMO
Define-se e-learning como qualquer tipo de situação educacional em que o conteúdo é disponibilizado eletronicamente via Internet quando e onde as pessoas precisam. Usando as possibilidades que o ambiente virtual oferece para o ensino, foi elaborado um e-módulo na Plataforma Moodle. O objetivo desse estudo foi verificar o acesso, desempenho e aceitação de estudantes de graduação em Odontologia frente à utilização do e-módulo nas atividades online da Disciplina de Diagnóstico Bucal na Universidade de Brasília. Avaliações de conteúdo (pré e pós-teste), pré-teste de expectativa e pós-teste de satisfação foram elaborados para avaliar o conteúdo e a aceitação do e-módulo entre os participantes. Dos 25 participantes iniciais, dois concluíram o e-módulo, 11 começaram e não concluíram, nove não acessaram a Plataforma e três não aceitaram responder o pós-teste de satisfação. Pré e pós-teste de conteúdo não apresentaram dados significativos. O pós-teste de satisfação mostrou que dos estudantes que não acessaram o e-módulo, ou acessaram e não concluíram, 80% alegaram "não ter tempo para acessar a Plataforma" e 15% afirmaram não participar, ou não concluir o e-módulo "porque este não trazia acréscimo de crédito ou nota". Em conclusão, apesar de os estudantes serem positivos em relação ao uso de novas metodologias, a participação foi muito baixa. Já o desempenho foi similar àquele das aulas presenciais. Vários fatores influenciam a atitude dos estudantes no e-módulo, incluindo o ganho de recompensas e a forma pedagógica dos conteúdos. Assim, persiste ao professor o papel motivacional e mediador entre aprendizado e mundo virtual.
Descritores: Odontologia. Radiologia. Educação à Distância. Tecnologia da Informação.
ABSTRACT
E-learning can be defined as any type of educational situation in which the content is available electronically via Internet when and where people need it. Using the possibilities that virtual environment provides for education, was developed an e-module in the Moodle Platform. The aim of this study was to verify the access, performance, and acceptance of undergraduate dentistry students to use the e-module in the online activities of Oral Diagnosis Discipline at the University of Brasilia. Evaluations of content (pre and post-test), pre-test of expectation and post-test of satisfaction were designed to evaluate the content and acceptance of e-module among participants. Of the 25 initial participants, 2 completed the e-module, 11 started and did not complete, 9 did not access the platform and three did not accept to answer the post-test of satisfaction. Pre and post-test of content showed no significant data. The post-test of satisfaction showed that the students who have not accessed the e-module, or accessed and did not complete, 80% said they "did not have time to access the Platform" and 15% said they did not participate or did not complete the e-module "because it would not improve GPA or course credit number". In conclusion, although students were positive regarding the use of new methodologies, the participation was very low. The performance was similar to presential classes. Several factors influence the attitude of the students in the emodule, including rewards gain and the pedagogical form of the contents. Thus, it is up to the teacher the motivational and mediating role between learning and the virtual world.
Descriptors: Dentistry. Radiology. Education, Distance. Information Technology.
1 INTRODUÇÃO
O uso dos computadores, smartphones e tablets tem proporcionado fácil acesso à Internet, permitindo diferentes formas de interação, as quais incluem informação e comunicação, por meio de hipertextos, sons e animações1. Diante dessa realidade contemporânea é importante que os métodos educacionais incorporem o uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), buscando uma integração entre ensino, aprendizado e tecnologias.
As TICs fornecem ferramentas que provocam a capacidade de compreensão, avaliação e reflexão do estudante2. Uma possibilidade interessante para enfrentar os desafios da educação atual é a inclusão do e-learning no currículo de graduação, pois possibilita a fusão das atividades do ensino presencial com as experiências da educação online3. Há várias maneiras de definir o e-learning, sendo amplamente referido como "qualquer tipo de situação educacional em que o conteúdo instrucional é disponibilizado eletronicamente via Internet quando e onde as pessoas precisam"4. A Portaria 4.059 de 10 de dezembro de 2004, do Ministério da Educação (MEC), autoriza a introdução de disciplinas no modo semipresencial em até 20% da carga horária total de cursos superiores reconhecidos5.
O modelo tradicional de ensino, centrado na figura do docente, vem sendo discutido e criticado, pelo fato de o estudante ser passivo na aquisição de conhecimento6. O aprendizado mediado pelas TICs tem seu diferencial no envolvimento de estudantes e professores, pois o estudante passa de coadjuvante a protagonista na sua formação. O papel do professor deve ser de participante do processo de ensino como um agente motivador e facilitador6,7. O docente guia seus estudantes por meio de fóruns e discussões. Em contrapartida, é esperado que os discentes correspondam aprofundando seus conhecimentos, com participação ativa e dinâmica8. Metodologias ativas também propiciam a interação entre estudantes em um ambiente de aprendizagem colaborativa, no qual se obtêm ideias mais elaboradas por meio da perspectiva do outro9.
O incentivo e a disponibilidade do professortutor são considerados fatores fundamentais no desempenho dos estudantes. Esclarecer dúvidas quanto ao conteúdo ou quanto à estrutura do módulo, coordenar, orientar e organizar pedagogicamente são ações que vão evitar a sensação de abandono dos acadêmicos10.
Devido à necessidade de ferramentas de suporte pedagógico, surgiram os Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA). Tratam-se de plataformas de ensino criadas na Internet, que usam recursos tecnológicos para criar ambientes propícios ao aprendizado e à interação entre docentes e estudantes, podendo ser comerciais ou gratuitos7,9.
No presente estudo, a Plataforma Moodle (Modular Object Oriented Dynamic Learning Environment) foi escolhida para o desen-volvimento de conteúdos teóricos e práticos em Radiologia Oral. É uma opção gratuita de um AVA de uso bem consolidado em diversos departamentos da Universidade de Brasília. Proporciona educação à distância por meio da aprendizagem colaborativa e permite o bom gerenciamento do conteúdo, dos participantes, das atividades, além de outros recursos disponíveis na plataforma11,12.
O software escolhido permitiu a disponibilização da tecnologia de Realidade Aumentada (RA) para as atividades práticas. Por combinar elementos virtuais com o ambiente real, a RA é interativa e tem processamento em tempo real, além de ser concebida em três dimensões. A opção de RA móvel permite a visualização dos elementos gráficos de computação em aparelhos celulares dotados de conexão com a Internet13. Quando a câmera do aparelho celular é direcionada a um objeto com marcadores, códigos ou formas reconhecidos por RA, tais elementos são substituídos por gráficos tridimensionais integrados ao ambiente real.
Nesta perspectiva, o presente estudo tem como objetivo verificar o acesso, desempenho e aceitação de estudantes de graduação em Odontologia frente à utilização do e-módulo desenvolvido na Plataforma Moodle para a Disciplina de Diagnóstico Bucal na Universidade de Brasília.
2 RELATO DE EXPERIÊNCIA
O presente estudo foi aprovado pelo comitê de ética da Universidade de Brasília sob o número CAAE 42277115.3.0000.0030 e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Criação do módulo online de interpretação radiográfica
O e-módulo de "Princípios de interpretação radiográfica" foi desenvolvido para ser disponibilizado online, com o apoio da Diretoria de Ensino de Graduação a Distância (DEGD), da Universidade de Brasília, no âmbito da disciplina presencial de Diagnóstico Bucal. O módulo foi desenvolvido na Plataforma Moodle (aprender. unb.br), com duração de 11 semanas, por discente de pós-graduação em Ciências da Saúde.
O prazo de uma semana foi estabelecido para resolução dos exercícios a partir do dia em que o módulo era lançado. Foi ainda disponibilizada uma tutora online para esclarecer eventuais dúvidas quanto ao conteúdo e à Plataforma. Cada módulo da disciplina era composto por apresentação teórica do conteúdo, ilustrado por radiografias catalogadas a partir dos arquivos de imagens radiográficas do Hospital Universitário de Brasília, do Hospital de Base do Distrito Federal e de arquivo pessoal, fórum de exercícios e artigos científicos disponíveis para estudo complementar. O enfoque do conteúdo foi sobre aspectos radiográficos de anatomia e alterações patológicas do complexo maxilofacial. A seleção do conteúdo teórico e das imagens foi baseada no roteiro de White & Pharoah14, que expõe a sequência de passos para fechar as hipóteses diagnósticas de lesões ósseas.
Criação de instrumentos pedagógicos usando a Realidade Aumentada
Cinco módulos de atividade prática de interpretação radiográfica foram ofertados, um a cada semana, sendo um sobre anatomia do crânio e os demais de casos clínicos de patologia. Cada atividade prática oferecia o recurso RA como opção de estudo de modelos tridimensionais. Para utilizar esse recurso, o estudante deveria ter um smartphone conectado à Internet e fazer o download do aplicativo gratuito JUNAIO. Ao abrir o aplicativo, deveria apontar a câmera do celular para o marcador, disponibilizado na tela do computador ou em arquivo .pdf para impressão, e assim visualizar os modelos tomográficos em RA. Não haveria prejuízo à compreensão da atividade se o estudante não conseguisse utilizar o recurso da RA, pois os mesmos modelos foram também expostos como fotografias em cada exercício.
Oferta do módulo na Plataforma Moodle
O e-módulo foi oferecido aos estudantes matriculados na disciplina presencial de Diagnóstico Bucal, cuja carga horária era de 36 horas aula/ semestre, ofertada aos estudantes do 4º semestre do curso de Odontologia da Universidade de Brasília. Este serviu como material de apoio ao conteúdo presencial, disponibilizado para participação voluntária e sem acréscimo de nota ou crédito.
Avaliação
Consistiu da aplicação de quatro testes, sendo dois prévios ao uso do e-módulo (pré-teste de conteúdo e teste de expectativa) e os demais após o término da disciplina (pós-teste de conteúdo e teste de satisfação).
Pré-teste (de conteúdo e expectativa)
Desenvolvido para avaliar o conhecimento e o nível de heterogeneidade da turma. Os estudantes responderam a um pré-teste teórico de múltipla escolha, com dez questões sobre conteúdos de Radiologia Geral. O teste, não validado, foi elaborado sob a supervisão dos professores da disciplina de Diagnóstico Bucal. Os estudantes não tiveram acesso ao gabarito.
Os participantes também preencheram o Teste de Expectativa, com questões relativas à facilidade de uso de computadores e celulares e acesso à Internet. O teste buscou avaliar a experiência prévia dos estudantes com o emódulo e com a Plataforma Moodle. Também foram coletadas informações sobre o perfil do estudante: idade e gênero. O teste foi baseado no trabalho de Meckfessel e colaboradores15. Esse teste foi respondido pelos 25 estudantes que aceitaram participar do e-módulo.
Os testes foram aplicados presencialmente com duração média de 30 minutos.
Pós-teste (de conteúdo e de satisfação)
O pós-teste de conteúdo foi aplicado presencialmente ao término da disciplina para os estudantes que participaram da pesquisa. Consistiu de dez questões sobre o conteúdo ministrado no e-módulo com duração média de 30 minutos e os estudantes não tiveram acesso ao gabarito.
O pós-teste de satisfação buscou avaliar a opinião dos estudantes frente ao uso/experiência com o e-módulo. Avaliou o interesse e a aceitação em relação à Plataforma Moodle e ao tema abordado no e-módulo. A elaboração desse teste foi baseada no estudo de Nkenke e colaboradores.16
Os estudantes foram divididos em três grupos, sendo Grupo A aqueles que não acessaram o e-módulo; Grupo B aqueles que iniciaram o e-módulo online, mas não concluíram; e Grupo C aqueles que participaram do e-módulo até o final. Para cada grupo foi elaborado um tipo de teste de satisfação. O objetivo foi obter, através dos questionários personalizados para cada grupo, informações sobre a adesão e as opiniões quanto ao Moodle e ao e-módulo. Ao final do pós-teste de expectativa de cada grupo, os estudantes tinham um espaço para críticas e sugestões a respeito do e-módulo. Os resultados dos testes não computaram para a nota final dos participantes.
Dos 26 estudantes matriculados na disciplina presencial, 25 aceitaram participar do e-módulo. O pré-teste de conteúdo mostrou heterogeneidade da turma, com nota mínima de 3,0 e máxima de 9,0. A média foi de 6,73 e o desvio padrão de 2,089. O pós-teste de conteúdo foi respondido pelos estudantes que chegaram até o final da pesquisa (dois participantes). Um estudante apresentou nota 6,0, e o outro, nota 8,0. Média das notas, 7,0.
O pré-teste de expectativa mostrou o perfil dos estudantes e foi respondido por 25 participantes. Todos afirmaram possuir celular do tipo smartphone, 96% possuíam computador próprio com acesso à Internet e 60% afirmaram gostar de trabalhar em computador. Com relação à Plataforma Moodle, o pré-teste de expectativa mostrou que 96% dos estudantes já a haviam utilizado e 64% classificaram a Plataforma como "boa". Todos afirmaram que gostariam que a universidade ofertasse mais conteúdos via Internet.
Dos 25 estudantes que participaram da pesquisa inicialmente, 22 responderam o pósteste de satisfação e foram divididos em grupos A, B e C segundo o acesso ao e-módulo. Não acessaram o e-módulo no Moodle nove participantes (Grupo A), 11 começaram e não concluíram (Grupo B) e dois participaram até o final (Grupo C).
No pós-teste de satisfação os estudantes poderiam escolher mais de uma afirmativa que justificasse sua não participação no e-módulo.
O pós-teste aplicado ao Grupo A (participantes que não acessaram o e-módulo), mostrou que 88,8% dos estudantes afirmaram não participar do e-módulo porque "não tiveram tempo para acessar a Plataforma Moodle." As demais respostas do pós-teste estão expostas na tabela 1. O pós-teste aplicado aos estudantes do grupo B (começaram a participar do e-módulo, e não terminaram) mostrou que 72% dos participantes não acessaram a Plataforma porque "não tiveram tempo" e 27% afirmaram ter dificuldade de acessar a Plataforma pelo celular. As demais respostas estão elencadas na tabela 2.
Dos 20 participantes que de algum modo não foram até o final da disciplina (Grupo A + Grupo B), 90% afirmaram que gostariam que houvesse maior oferta de conteúdos via Internet pela universidade. Ao avaliar se eles teriam interesse em participar da disciplina em outra Plataforma que não fosse o Moodle, 35% relataram "com certeza", 20% "provavelmente sim". Ao sugerir que outro tema fosse ofertado no e-módulo, 45% dos estudantes afirmaram que provavelmente teriam mais interesse em participar. Quanto à participação no e-módulo, caso a este fosse atribuído nota ou crédito, 35% afirmaram "com certeza" ter maior interesse em participar, 40% afirmaram que "provavelmente sim".
No pós-teste de satisfação, os estudantes do Grupo C afirmaram que participar da disciplina aumentou o interesse sobre o conteúdo de lesões ósseas. Concordaram que a disciplina os encorajou a estudar e que foi uma experiência proveitosa para graduação. Afirmaram que o conteúdo estava bem ilustrado e que acessaram a Plataforma sem maiores problemas. Posicionaram- se "neutros" quanto à afirmação de que a disciplina consumiu muito tempo, e quanto ao e-módulo ser mais efetivo que aprender em sala de aula. Sobre a RA, um estudante concordou que a ferramenta o ajudou a compreender espacialmente as lesões.
Ambos classificaram como "muito boa" a assistência para solução de dúvidas relacionadas ao conteúdo e ao uso da Plataforma Moodle.
Ao final do pós-teste de satisfação dos três grupos, havia um espaço em aberto para os estudantes expressarem críticas e sugestões quanto a sua experiência com o e-módulo.
Contrariamente ao descrito na literatura, observou-se baixa adesão dos estudantes participantes do e-módulo. Somente dois, dos 25 estudantes iniciais, participaram até o final. A que atribuir a baixa participação? Não poderia ser pela plataforma escolhida, já que 96% dos participantes relataram já ter experiência com o Moodle, e 64% classificaram a Plataforma como "boa", na primeira avaliação de expectativa.
Outra variável seria o perfil dos estudantes. Os estudantes responderam que apreciavam trabalhar com computadores (60% dos 25 participantes iniciais) e 19 dos 20 estudantes participantes do pós-teste relataram ter conhecimento moderado em computação. O trabalho de Stein et al17. (2013) relata que é um mito afirmar que os estudantes de Odontologia são especialistas em tecnologia, podendo usar de seus recursos com propriedade e completo domínio. O contraste do perfil dos voluntários com a baixa participação reforça a ideia de que embora esses estudantes sejam "nativos digitais", não empregam a tecnologia de forma estratégica para otimizar a aprendizagem. A facilidade de acesso às ferramentas de pesquisas e a velocidade de busca de informações disfarçam problemas preocupantes como a dificuldade de apropriação de conhecimento pelo estudante através dos meios tecnológicos.
No questionário respondido pelos estudantes que não participaram do e-módulo, 88,8% alegaram não ter tempo para acessar a Plataforma. É importante considerar o fato de que foi decidido implementar o e-módulo paralelamente à disciplina de Diagnóstico Bucal, porém sem diminuir a carga horária do ensino presencial. Portanto, os estudantes teriam que organizar seu horário para disponibilizar parte do tempo ao e-módulo. Porém, os dois estudantes que concluíram o e-módulo se posicionaram "neutros" quanto à disciplina consumir muito tempo.
Assim, concluímos que a carga horária da implementação do e-módulo não gerou sobrecarga para os estudantes. A justificativa de falta de tempo não procede. No mito número dois do trabalho de Stein et al.17(2013) é relatada a dificuldade de os estudantes fazerem pesquisas ou desenvolverem atividades na Internet que exijam mais tempo e que envolvam maior nível de complexidade. Uma justificativa seria por medo de perder tempo com aquela atividade. O autor afirma que os estudantes podem começar uma busca a partir da menor provocação, mas que também desistem facilmente quando envolvido maior grau de dificuldade. Encontramos essa realidade em nosso trabalho quando dos 25 voluntários, oito participaram do primeiro fórum de atividades, e somente dois chegam ao final do e-módulo.
Podemos sugerir, na avaliação dos dados obtidos pelos questionários, a presença do fenômeno da "desejabilidade social". Este pode ser entendido como uma propensão das pessoas a responder aquilo que seria o socialmente mais aceitável e negar sua associação pessoal com opiniões e comportamentos que a sociedade desaprovaria18. Afirmar que não teve tempo para realizar uma atividade é mais aceito socialmente que afirmar que o tema abordado no e-módulo não era do interesse pessoal, já que todo conteúdo oferecido no ambiente universitário deveria de ser de interesse de todos. Outro exemplo ocorre quando, dos 20 estudantes que não participaram da disciplina ou que desistiram ao longo do emódulo, 90% afirmam querer que mais conteúdos fossem disponibilizados via Internet pela universidade. Considerar a ocorrência desse evento é fundamental para avaliar a presença de respostas tendenciosas em dados qualitativos.
Assim, restam as questões pedagógicas relativas à escolha do tema, do software, isto é, sobre os itens apontados no pós-teste de expectativa.
O tema abordado no e-módulo foi escolhido com o objetivo de complementar o conteúdo ministrado em sala de aula, bem como o conteúdo já ensinado em semestres anteriores. Portanto, o conteúdo do e-módulo era complementar, e não estava diretamente relacionado ao conteúdo ministrado semanalmente na disciplina de Diagnóstico Bucal ao longo do semestre. Dos nove participantes que não acessaram o emódulo, nenhum relatou já ter domínio do tema abordado. Com os baixos índices de participação, observamos que o tema, apesar de não ser dominado, não atraiu a atenção dos participantes. Mesmo o tema "Princípios de interpretação radiográfica" sendo de total relevância prática, podemos sugerir que os estudantes tendem a concentrar seus esforços em conteúdos que serão cobrados posteriormente em avaliações. Assim, deixam passar despercebidos conteúdos de extrema importância fornecidos pela Universidade através de outras metodologias de ensino. Esse fato remete a dados apresentados no trabalho de Nkenke et al.16(2012), quando afirmam que os estudantes têm a tendência a não compreenderem a relevância prática dos temas trabalhados nos ensinos online. Nessa pesquisa, o autor também mostra através dos baixos índices encontrados no questionário que os estudantes não se preparam antecipadamente para as aulas através de leituras básicas regulares. Isso sugere um aprendizado passivo, centrado na figura do professor e em memorizações de conteúdo antes das provas.
Galvão e Magalhães19 (2008), em um estudo no curso de medicina na Universidade de Brasília, ofertaram exercícios diretamente relacionados ao conteúdo abordado em sala de aula e utilizaram outro ambiente virtual que não o Moodle. A participação era facultativa. Tiveram 84% de participação nessa ferramenta. Assim, constatou-se a importância dos conteúdos estarem interligados presencialmente e na ferramenta de ensino online. É possível que o fato de os conteúdos não estarem interligados entre a aula presencial e o e-módulo tenha sido um dos fatores determinantes na baixa adesão encontrada em nosso trabalho. Entretanto, dos exercícios disponibilizados no estudo de Galvão e Magalhães (2008)19, 52% foram resolvidos nas 24 horas que antecediam as provas. Esse fato sugere um perfil de estudantes passivos, que concentram seus esforços para o aprendizado nas vésperas das provas, comprometendo a aquisição de conhecimento efetivo e o objetivo da ferramenta.
No presente estudo, a participação era facultativa, não havia acréscimo de nota, nem de crédito ao estudante. Assim, dos nove participantes que não acessaram o Moodle, dois deles afirmaram não ter participado do e-módulo por não ter acréscimo de nota ou crédito. Entre os 11 participantes que começaram e desistiram ao longo do e-módulo, um participante também expressou essa opinião.
Segundo Peixoto et al.20 (2005), apesar de os estudantes se adaptarem facilmente às novas tecnologias, eles ainda são resistentes à efetividade delas. Afirmam que a nota ainda é a forma mais atrativa, mas deve servir apenas como pontapé inicial, sendo responsabilidade do professor utilizar outros fatores motivacionais. Christofoletti et al.6 (2014) também afirmam que mesmo com a boa aceitação das metodologias ativas de aprendizagem, os estudantes relatam dificuldades para se adaptarem a novos métodos de ensino.
Ao avaliar a construção e desenvolvimento do e-módulo dentro do Moodle, na área de Radiologia Odontológica, os professores observaram que se trata de uma ferramenta que limitou a abordagem do tema escolhido, sendo trabalhosa a elaboração principalmente das atividades, e tornou estas também mais difíceis de serem resolvidas pelos estudantes. Esse fato parece se contrapor ao objetivo inicial, que era fornecer uma ferramenta que facilitasse e dinamizasse o aprendizado do estudante.
Oposto às limitações encontradas neste trabalho, um estudo com o uso do Moodle na disciplina de Informática em Enfermagem considerou o Moodle uma ferramenta que permitiu ao docente desenvolver as aulas, atividades, discussões e avaliações de forma simples. Além disso, proporcionou uma forma de comunicação eficaz, fora da sala de aula2.
A tutora e a desenvolvedora das atividades foram as responsáveis pela comunicação com os estudantes, usando o e-mail como ferramenta virtual de incentivo. Essa tentativa não foi bem vista pelos estudantes, como podemos observar no discurso dos estudantes:
"A parte de receber as respostas e correções dos trabalhos é cansativa e desinteressante principalmente pela quantidade de emails".( Estudante 1)
"Também gostaria de sugerir, desabilitar (não sei se essa ferramenta é disponível no Moodle) o recebimento de todos os e-mails. Toda vez que alguém postava algo, todos recebiam e-mail notificando. Isso enche a caixa de entrada e esconde e-mails importantes que ficam entremeados." (Estudante 2)
Peixoto et al.20 (2005), em seu estudo com professores e estudantes de pós-graduação, relatam que 100% dos participantes consideram o modelo híbrido de ensino como ideal, porém a maioria relatou utilizar uma metodologia de ensino mais tradicional. Relataram a dificuldade pela própria faculdade, muito presa às aulas expositivas, e falta de aptidão com recursos tecnológicos.
Em contraste com a ideia apresentada por Peixoto et al.20(2005), no presente trabalho foi proposta a mudança, por meio do e-módulo, do ensino tradicional centrado na aquisição passiva de conhecimento. Os participantes tinham fácil acesso ao computador e à Internet, tinham conhecimento para o uso das ferramentas, mas ainda assim, não aderiram ao ideal proposto.
Percebe-se que apenas a tecnologia não é capaz de transformar o paradigma da educação passiva para a ativa, pois não apresenta, por si só, atrativos suficientes para concretizar mudanças. Apesar da baixa adesão dos estudantes, foi possível constatar uma realidade presente em outros trabalhos: a dificuldade dos estudantes em se adaptarem a novos métodos de ensino. Embora a presente geração tenha acesso e facilidade em utilizar computadores e para comunicação e rápidas pesquisas, ainda necessitam de recompensas, como o acréscimo de nota, para fazer desses dispositivos, ferramentas de educação.
Permanece a necessidade da capacitação dos docentes para esse novo cenário, cabendo a este compreender os desafios embutidos na construção do conhecimento mediado por computadores, a escolha adequada da ferramenta para cada situação e, principalmente, como motivar os estudantes a serem sujeitos ativos do processo educacional.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observou-se que o e-módulo desenvolvido na Plataforma Moodle foi pouco acessado pelos estudantes de graduação em Odontologia, apesar de os participantes se mostrarem positivos à introdução de metodologias baseadas em ambientes virtuais de ensino, conforme constatado em questionário de satisfação. Já o desempenho apenas pôde ser avaliado entre os dois participantes que concluíram o e-módulo, mostrando-se similar ao desempenho geral dos estudantes que acompanharam as aulas presenciais.
Vários fatores podem estar relacionados à participação dos estudantes no ambiente virtual de ensino, incluindo o ganho de recompensas, como nota ou créditos, facilidade no uso de ferramentas online e a forma pedagógica como o e-módulo foi desenvolvido, e que apenas a tecnologia não é suficiente para motivar os estudantes. Portanto, o papel do professor é fundamental no processo de ensino ativo centrado no estudante, abrangendo tanto a função motivacional quanto função mediadora entre o mundo virtual e o aprendizado.
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Correspondência para:
Brendda Juliana Carvalho Feitosa
SGAS 606 Bloco A
Instituto Vicenta Maria
70200-660 Brasília/DF
e-mail: brendda_ju@hotmail.com
Recebido: 21/11/2016
Aceito: 29/12/2016