SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.9 número4 índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

IJD. International Journal of Dentistry

versão On-line ISSN 1806-146X

IJD, Int. j. dent. vol.9 no.4 Recife Out./Dez. 2010

 

ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE

 

Desempenho clínico de restaurações dentárias após um, dois e três anos

 

Clinical performance of dental restorations after one, two and three years

 

 

Maria Carolina Pinto CavalcantiI; José Luiz Correia NetoI; Renata Pedrosa GuimarãesII; Claudio Heliomar Vicente da SilvaIII

ICirurgiões-dentistas pela Universidade Federal de Pernambuco
IIDoutoranda em Odontologia, área de concentração em Clínica Integrada, Universidade Federal de Pernambuco
IIIProfessor Adjunto Doutor de Dentística da Universidade Federal de Pernambuco

Correspondência

 

 


RESUMO

Avaliar, através de análise direta, o desempenho clínico de restaurações em resina composta e amálgama realizadas pelos estudantes do 5º período do Curso de Odontologia da Universidade Federal de Pernambuco, na clínica da discipllna de Dentística 2, no período de três anos entre a inserção e a avaliação. Dois avaliadores examinaram 146 restaurações, utillzando os critérios de adaptação de cor, descoloração marginal, cáries secundárias, desgaste, integridade marginal, corrosão superficial, fratura, e sensibilldade pós-operatória. Das 119 restaurações de resina composta avaliadas, 33,6% receberam escore A para: adaptação de cor; 48,7% para desgaste; 58,8% para descoloração marginal; 81,5% para ausência de cáries; 37,8% para integridade marginal. Das 27 restaurações de amálgama avaliadas, 33,3% receberam escore A para: desgaste; 73,1% para ausência de cáries; 14,8% para integridade marginal. Além disso, 59,3% das restaurações de amálgama não apresentavam fraturas e 48,1% não apresentaram corrosão superficial. Quanto a sensibilldade pós-operatória 94,7% das restaurações de resina composta e 100% das restaurações de amálgama não apresentaram relatos. A maioria das restaurações avaliadas teve desempenho clínico satisfatório para todos os critérios analisados.

Palavras-chave: Restaurações permanentes; Avaliação clínica; Resina composta; Amálgama dentário.


ABSTRACT

To evaluate, by direct analysis, the cllnical performance of anterior and posterior composite resin and amalgam restorations, performed in a period of three years between insertion and evaluation, in patients treated by students of the 5th period of Dentistry School at the Federal University of Pernambuco. 146 restorations were examined by two evaluators using the criteria of color matching, marginal discoloration, secondary caries, wear, marginal integrity, superficial corrosion, fracture and postoperative sensitivity. Among the 119 composite resin restorations evaluated, 33,6% received score A for color matching; 48,7% for wear; 58,8% for marginal descoloration; 81,5% for absence of caries; 37,8% for marginal integrity. Among the 27 restorations of amalgam evaluated, 33.3% had received score A for wear; 73.,1% for caries absence and 14,8% for marginal integrity. Besides, 59.3% of the amalgam restorations did not present fractures and 48.1% had not presented superficial corrosion. Regarding to 94,7% of the composite resin restorations and 100% of the amalgam restorations did not presented any relate. The majority of the evaluated restorations presented satisfactory clinical performance for all the analyzed criteria.

Key words: permanent restorations, clinical evaluation, composite resin, dental amalgam.


 

 

INTRODUÇÃO

A Dentística, nas últimas décadas, sofreu mudanças significativas a partir do entendimento da etiopatogenia da doença cárie1-4. Atualmente, o tratamento restaurador não significa a eliminação da doença, entretanto, contribui para minimizar os seus fatores de retenção cíclicos. Neste caso, a conservação da estrutura dental é fundamental1 e a troca periódica de restaurações deve ser limitada a razões que de fato a justifiquem.

Estes fatos refletiram mudanças nos princípios do tratamento restaurador e na evolução dos materiais restauradores.

Resinas compostas e amálgamas confrontam-se, e a exigência estética tem tornado o amálgama um material de pouca aceitação para grande parte dos pacientes, embora ainda seja o material restaurador mais utilizado no mundo, sendo eficiente e seguro nas cavidades onde a estética não é primordial, em função de suas excelentes qualidades mecânicas5.

A evolução sofrida pelos materiais restauradores, no tocante às suas propriedades físicas, sugere melhor desempenho clínico das restaurações, conseqüentemente, os próprios pacientes tanto da rede pública quanto da rede privada requerem que seus dentes sejam restaurados com produtos de qualidade, e de preferência estéticos. Entretanto, o bom comportamento das restaurações também depende da técnica e do esmero clínico do profissional, o qual exerce papel decisivo no sucesso do tratamento restaurador. Isto não descarta a responsabilidade e o papel do paciente com a adoção de hábitos higiênicos e dietéticos adequados6-8.

Diante desses múltiplos fatores, uma avaliação clínica é capaz de prever o sucesso ou fracasso clínico de restaurações. Este estudo avaliou, através de análise direta, o comportamento clínico de restaurações em resina composta e amálgama com dois anos em função, realizadas pelos estudantes do 5º período do Curso de Odontologia da Universidade Federal de Pernambuco, na Clínica da disciplina de Dentística 2.

 

MÉTODOS

Este trabalho recebeu aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFPE (protocolo nº143/2005 - CEP/CCS).

Foram convocados, através de telefonema ou cartas sociais, todos os pacientes, submetidos a tratamento restaurador na Clínica da Disciplina de Dentística 2 do Curso de Odontologia da Universidade Federal de Pernambuco, no período compreendido entre os anos de 2002 a 2004. Os mesmos foram examinados por dois avaliadores previamente calibrados, sendo identificadas as restaurações de interesse deste estudo, excluindo-se aquelas que mesmo tendo sido realizadas no período estimado sofreram reparos ou trocas em outro serviço, ou quando observada incoerência entre as características clínicas da restauração e informações contidas na ficha clínica.

Foram  obtidas  radiografias interproximais para observação de presença ou ausência de cárie secundária, lesões proximais e também para determinar a profundidade das restaurações de acordo com os critérios definidos pelo Grupo Brasileiro de Professores de Dentística1, a saber: cavidade rasa: 0,5 a 1,0mm além da junção amelodentinária; cavidade média: 1,0 a 2,0mm além da junção amelodentinária; cavidade profunda: ultrapassa a metade da espessura da dentina, com pelo menos 0,5mm de dentina remanescente e cavidade muito profunda: menos de 0,5mm de dentina remanescente.

Para a avaliação clínica direta, foram utilizados os critérios da USPHS (United States Public Health Service) descritos por Cvar e Ryge9 (Tabela 1).

Para as restaurações de amálgama foram utillzados os mesmos critérios, porém não foram considerados os critérios: reprodução de cor e descoloração marginal. As restaurações de amálgama foram avaliadas ainda quanto à presença ou ausência de fraturas no corpo da restauração e à presença ou ausência de corrosão superficial.

Adicionalmente, os pacientes foram questionados a respeito de qualquer sensibilldade associada aos elementos restaurados que, quando existente, foi classificada como espontânea ou provocada e, quantificada através de uma escala analógica graduada de zero a dez. A avaliação de sensibilldade só foi considerada se constatado ao exame clínico intra bucal ausência de recessão gengival ou lesões cervicais não cariosas associadas aos elementos avaliados. Todos os dados obtidos na avaliação foram anotados em ficha específica para posterior análise estatística do tipo inferencial com nível de significância de 5%.

 

RESULTADOS

Dos 43 pacientes participantes deste estudo, 35 eram do gênero feminino (81,4%) e 8 (18,5%) do gênero masculino. A média de idade foi de 33 anos, variando de 17 a 50 anos de idade.

Um total de 146 restaurações foram avaliadas. A Tabela 2 divide a amostra segundo o material restaurador utilizado e as características da cavidade.

As tabelas 3 e 4 revelam a distribuição das freqüências dos escores obtidos para cada critério, considerando o material restaurador utilizado bem como o tempo decorrido até a avaliação.

 

 

 

 

A fim de verificar uma possível relação entre o tempo em função das restaurações e a presença de falhas, o Teste Qui-quadrado foi aplicado para cada critério, individualmente, cruzando-se os dados obtidos de acordo com o tempo em função da restauração. Para um nível de significância de 5%, não houve diferença estatisticamente significante entre o desempenho clínico das restaurações após um, dois ou três anos independentemente do material utilizado para nenhum dos critérios descritos nas Tabelas 3 e 4.

A frequência da sensiblidade pós-operatória associada aos elementos restaurados está apresentada na Tabela 5 a qual também revela a associação entre profundidade da cavidade e a presença de sensibilidade pós operatória.

 

DISCUSSÃO

Uma dificuldade verificada neste estudo retrospectivo foi a mudança de telefone e endereço de alguns pacientes. Dessa forma, dos 120 pacientes contatados, apenas 43 compareceram a avaliação e fizeram parte da amostra.

A maioria dos avaliados foram do gênero feminino. Este é um padrão que se repete em pesquisas epidemiológicas como afirmam Gomes et al.10. Em um estudo qualitativo, os autores destacaram que o imaginário do homem, um ser forte, viril e invulnerável, pode aprisionar o masculino em amarras culturais, dificultando a adoção de práticas de autocuidado. Além disso, o próprio medo da descoberta de uma doença grave e a vergonha em se expor ao profissional de saúde reforça estas diferenças. Outros autores11 justificam estes dados em razão das mulheres se mostrarem mais apreensivas em relação à aparência estética do seu sorriso.

Os dados apresentados na Tabela 2 evidenciam um maior número de restaurações em resina composta (81,5%), incluindo restaurações anteriores e posteriores. De acordo com Fernandes et al.12; Morrow et al. (2002)13; Ozer et al. (2002)14, o amálgama dental tem sido usado como material restaurador por mais de 150 anos pelas suas excelentes propriedades. Apesar disso, a exigência estética de muitos pacientes tem reduzido sua aceitação.

No que diz respeito à adaptação da cor, os baixos índices de escore C das restaurações de resina composta, confirmaram um comportamento satisfatório dos materiais utilizados. As falhas na adaptação de cor (escores B e C) podem resultar de falha técnica, ou seja, inabilidade em selecionar a cor adequada no momento da restauração, por pigmentação intrínseca do material restaurador, ou ainda por pigmentação extrínseca, seja decorrente do fumo, ou hábitos dietéticos15.

Os baixos índices de cárie observados também reafirmam a qualidade das restaurações realizadas bem como sugerem uma melhor assimilação, por parte dos pacientes, das orientações quanto à higiene oral e dieta, além de outros fatores individuais16.

Os altos índices de fratura do corpo da restauração de amálgama (40,7%) podem estar mais associados a falhas na técnica restauradora do que propriamente a características mecânicas do material. Falhas no ajuste da oclusão, na manipulação e/ou condensação do amálgama, ou ainda na sua adaptação às margens da cavidade podem ter predisposto as restaurações a fraturas.

As restaurações de amálgama, com freqüência, sofrem manchas e corrosão no meio bucal. A corrosão é benéfica e desejada quando ocorre na interface dente/restauração, ocasionando um auto-selamento do material contra microinfiltração marginal. Esta corrosão marginal é caracterizada pelo alto índice de escores B e C na integridade marginal das restaurações de amálgama (Tabela 4). No entanto, o critério ora avaliado considera apenas a formação de produtos de corrosão sobre a superfície livre da restauração, ocasionando manchamento e alterações na textura superficial. A maioria das restaurações avaliadas apresentou algum grau de corrosão superficial6, indicando novamente possíveis falhas durante a manipulação, inserção ou ainda acabamento/polimento destas restaurações, associado à própria ação do tempo em função, uma vez que os índices de corrosão aumentaram gradativamente em relação ao tempo (Tabela 4).

A baixa incidência de sensibilidade pós operatória presente nas restaurações avaliadas denota o sucesso do tratamento restaurador realizado (Tabela 5). Adicionalmente, o cruzamento estatístico dos dados não revelou associações entre o tamanho (extensão e profundidade) da cavidade com a ocorrência de sensibilidade. Este achado pode ser explicado pela presença de agentes forradores nas cavidades profundas os quais, além de servirem como uma dentina artificial possuem propriedades terapêuticas que auxiliam na recuperação do tecido pulpar1,3.

Os poucos casos de sensibilidade pós operatória provocada associada aos elementos avaliados neste estudo foram semelhantes aos resultados encontrados por Souza et al.15, que obtiveram apenas 5% das restaurações com presença de sensibilidade pós-operatória transitória ao final de um ano de avaliação. Para Russo et al. (2001)17, uma das principais causas de sensibilidade pós-operatória é a infecção bacteriana, que pode levar ao surgimento de cáries secundárias e diferentes graus de inflamação pulpar.

Ao analisar o comportamento clínico das restaurações avaliadas, considerando os demais critérios de avaliação (Tabelas 3 e 4), observa-se, de uma maneira geral, desempenho satisfatório das restaurações de resina composta e amálgama dentário. É notória a presença de falhas, as quais podem ser causadas por falhas na técnica, deficiências do material ou hábitos deletérios dos pacientes. No entanto, a maioria absoluta das restaurações defeituosas apresentou defeitos em graus passíveis de reparo, ou seja, sem implicações clínicas que justificassem a troca da restauração no momento da avaliação. Resultados semelhantes foram encontrados na literatura no que diz respeito ao desempenho clínico das restaurações18,19.

Considerando o caráter retrospectivo deste estudo, ou seja, a falta do controle de variáveis durante a inserção das restaurações as quais foram realizadas por profissionais distintos, com materiais diversos, somado ainda ao fato de terem sido realizadas por estudantes iniciantes em atividades clínicas, não se pode afirmar que as falhas observadas foram decorrentes de erro técnico ou deficiência dos materiais.

 

CONCLUSÃO

A maioria das restaurações avaliadas teve desempenho clínico satisfatório independente do material e do tempo em função.

 

REFERÊNCIAS

1. Busato et al. Uma nova filosofia em dentística In: Dentística: filosofia, conceitos e prática clínica. Editora Artes médicas, 2005; 01-38.         [ Links ]

2. Weyne SC, Harani SG. Cariologia - implicações e alicações clínicas In: Odontologia restauradora fundamentos e possibilidades. Ed. Santos; p.3-29, 2006.         [ Links ]

3. Alonso RCB, Sinhoreti MAC, Correr Sobrinho L, Goes MF. Effect of resin liners on the microleakage of class V dental composite restorations. J Appl Oral Sci 2004; 12(1):56-61.         [ Links ]

4. Jackson RD, Morgan M. As novas resinas posteriores e uma técnica simplificada de inserção. J Am Dent Assoc 2000; 3: 81-90.         [ Links ]

5. Gomes JC, Gomes OMM, Pereira SKP, Queiroz VAO, Camilotti V. Amálgama adesivo In: BUSATO, et al. Dentística: filosofia, conceitos e prática clínica. Editora Artes médicas, 2005; 237-257.         [ Links ]

6. Pereira WB, Gonini Júnior A, Poli-Frederico R. C.; Sanches, S. F. Avaliação retrospectiva de restaurações de amálgama Classe I. RGO 2007; 55(1): 69-75.         [ Links ]

7. Setcos JC, Staninec M, Wilson NHF. Bonding of amalgam restorations: existing knowlodge and future prospects. Operative dentistry 2000; 25(2):121-129.         [ Links ]

8. Staninec MA, et al. Bonded amalgam sealants and adhesive resin sealants: five years cllnical results. Quintessence Int 2004; 35 (5): 351-357.         [ Links ]

9. Cvar JR, Ryge G. Criteria for the cllnical evaluation of dental materials. US Department of Health Education, and Welfare 1971; 790: 244.         [ Links ]

10. Gomes R, Nascimento EF, Araújo FCA. Por que os homens buscam menos os serviços de saúde que as mulheres? As explicações de homens de baixa escolaridade e homens com ensino superior. Cad Sáude Pública 2007, 23(3): 565-574.         [ Links ]

11. Mauro JM et al. Restabelecimento da estética e função dental por meio de reconstruções anteriores com Resina Composta. Rev. estética contemporânea. Soc Bras Odontol Est 2000:1(2).         [ Links ]

12. Fernandes ETP, Ferreira e Ferreira E. Substitution of amalgam restorations: participative training to standardize criteria. Braz Oral Res, 2004; 18 (3):247-252.         [ Links ]

13. Morrow LA et al. Microleakage of amalgam cavit treatment systems: an in vitro evaluation. Am J Dent 2002; 15(4):262-267.         [ Links ]

14. Ozer F et al. Amalgam repair: evaluation of bond strength and microleakage. Open Dent 2002;27(2):199-203.         [ Links ]

15. Souza, BF, Guimaraes RP. Avaliação clínica de duas resinas compostas condensáveis e uma resina composta microhíbrida em cavidades oclusais. Quintessence 2002; 36(1), 41-48.         [ Links ]

16. Gomes M. Lesões de cárie adjacentes a restuarações de resina composta em molares decíduos e a sua relação com a atividade cariosa da criança. [Dissertação]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2008.         [ Links ]

17. Russo EMA, Carvalho RCR, Matson E, Santos RS CS. Infiltração marginal em cavidades classe V restauradas com materiais estéticos, utilizando diferentes técnicas restauradoras. Pesqui Odontol Bras 2001; 15(2):145-150.         [ Links ]

18. Busato AL, Loguercio AD. Cllnical evaluatiin of posterior composite restorations - 6-years results. Am J Dent 2001, 14:304-308.         [ Links ]

19. Türkür LS, Aktener BO, Ates M. Clinical evaluation of different posterior resin composite material: a 7-year report. Quintessence Int 2003; 34: 418-426.         [ Links ]

 

 

Correspondência:
Claudio Heliomar Vicente da Silva
Rua Jorge Couceiro da Costa Eiras, 443
Apto 2403, Boa Viagem
Recife - PE - Brasil
CEP: 51021-300
e-mail: claudioheNomar@uol.com.br

Recebido em 18/05/2010
Aprovado em 08/11/2010
Apoio Financeiro: PIBIC/UFPE - CNPq