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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.10 no.2 Camaragibe Abr./Jun. 2010

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Manejo das fraturas nasais com manutenção das vias aéreas superiores

 

Management of nasal fractures with upper airway maintenance

 

 

Marcelo Silva MonnaziI; Henrique de Couto de OliveiraII; Luis Augusto PasseriII; Mário Francisco Real GabrielliIII

IDoutorando do Curso de Pós-graduação em Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp
IIResidente do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial da UNESP de Araraquara
IIIProfessor Titular de Cirurgia Buco-Maxilo-Facial, Área de Cirurgia Plástica, do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp
IVProfessor Titular do Departamento de Diagnóstico e Cirurgia Buco-Maxilo-Facial da UNESP de Araraquara

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

As fraturas nasais (FN) são as mais frequentes da face, sendo o terceiro osso o mais comumente fraturado no esqueleto humano. Tal fato ocorre devido à sua posição proeminente na face e ser formado por ossos de reduzida espessura. Nesse sentido, pequenas forças são suficientes para fraturar o osso nasal, enquanto forças maiores podem causar fraturas cominutivas. Geralmente, agressões, quedas e acidentes esportivos são os fatores etiológicos mais implicados no trauma nasal. O diagnóstico das FN é fundamentalmente clínico, e seu tratamento, geralmente realizado através da redução fechada. De uma forma geral, são bons resultados. Assim, o objetivo do artigo é o de relatar uma modificação na técnica de redução fechada para tratamento de tais fraturas.

Descritores: Fraturas Ósseas. Traumatismos Faciais. Ossos Faciais.


ABSTRACT

Nasal fractures are extremely frequent. The nasal bones are the third most frequently fractured bones in the human skeleton. This is due to their prominent position on the face and to the diminished bone thickness. As a result, weak forces can cause nasal fractures, while stronger forces can comminute the nasal bones. In general, assaults, falls and sports injuries are the etiologies most commonly involved in nasal trauma. The diagnosis of such fractures is basically clinical and their treatment is usually by closed reduction with good results reported in all the relevant literature. Thus, the aim of this paper is to report a modification of the closed reduction technique for the treatment of these fractures.

Keywords: Fractures. Bone. Facial Injuries. Facial Bones.


 

 

INTRODUÇÃO

As fraturas nasais (FN) são as fraturas faciais mais frequentes, sendo ainda o terceiro osso mais comumente fraturado do esqueleto humano1. Tal fato ocorre devido à sua posição proeminente na face e reduzida espessura dos seus ossos. Desse modo, pequenas forças são suficientes para fraturar o osso nasal, enquanto forças maiores podem causar fraturas cominutivas. Geralmente, agressões, quedas e acidentes esportivos são os fatores etiológicos mais implicados no trauma nasal2, 3.

Anatomicamente, dois ossos nasais unidos na linha média formam a porção óssea desta estrutura, sendo mais espessos superiormente e mais finos inferiormente. Os processos nasais do osso frontal e da maxila promovem suporte superior e lateral, respectivamente, aos ossos nasais. A porção cartilaginosa é composta por duas cartilagens laterais superiores contínuas com o osso nasal e duas cartilagens laterais inferiores. Pequenos fragmentos de cartilagem (cartilagens sesamoides) completam a estrutura nasal cartilaginosa externa. O septo nasal é composto pela placa perpendicular do osso palatino, crista septal da maxila, placa perpendicular do etmoide, vômer, cartilagem quadrangular e septo membranoso3,4.

O diagnóstico das FN é fundamentalmente clínico. Radiografias convencionais geralmente não são de grande valia na avaliação de fraturas nasais, e a tomografia computadorizada é um exame preciso, no entanto devido ao elevado custo, exposição à radiação e à falta de impacto no manejo do trauma, não deve ser rotineiramente empregada, a menos que se suspeite de fraturas associadas1-3.

O tratamento das FN é geralmente realizado através da redução fechada. Os resultados encontrados na literatura, de uma forma geral, são bons5,6. Nesse sentido, o objetivo deste artigo é o de relatar uma modificação na técnica fechada para tratamento de tais fraturas.

 

TÉCNICA

Para o tratamento das FN em nosso Serviço, o paciente é submetido, de rotina, à anestesia geral com entubação orotraqueal. A fratura é reduzida por meio de manipulação digital, pinças porta-agulha para fio de aço ou com o uso da pinça de Asch, elevando os ossos nasais, geralmente em direção súpero-lateral. A mão oposta estabiliza o osso em posição enquanto manipulado. Quando há necessidade de correção septal, é utilizado o fórceps de Walsham, sendo isso realizado, preferencialmente, após a redução inicial dos ossos nasais.

A estabilização da fratura é realizada por meio de tamponamento nasal com o uso de cadarços embebidos em pomada ou vaselina, que são inseridos superiormente, em direção à raiz do nariz, ficando localizados na porção anterior da cavidade nasal, dando, assim, suporte aos fragmentos ósseos fraturados. Externamente é utilizado gesso paris, apenas sobre a porção óssea, fixado com cola e tiras de fita hipoalergênica para manter o contorno e evitar o colapso das paredes ósseas recém-elevadas.

Após a redução da fratura, quer seja com pinças, quer seja digitalmente, a cavidade nasal, irrigada, lavada com solução fisiológica e prontamente aspirada. Dando sequência aos passos cirúrgicos, corta-se a ponta de uma sonda do tipo nasogástrica, para deixá-la aberta, e se insere esta pelas narinas, sempre em calibre compatível com o paciente, variando de 18 a 22 na maior parte dos casos, em direção posterior, de forma que esta percorra o soalho da cavidade nasal até o limite da porção posterior da rinofaringe, tomando-se o cuidado de não deixar a sonda encostar na parede posterior da cavidade nasal. Desta forma, mantém-se a patência das vias aéreas, proporcionando maior conforto ao paciente no período pós-operatório (Figuras 1 e 2). O tampão nasal é removido entre 5 e 7 dias, juntamente com a sonda, dependendo do grau de fragmentação óssea, e o gesso permanece no mesmo período. O acompanhamento pós-operatório é realizado com 2 semanas, 1 mês e 6 meses.

 

 

 

 

DISCUSSÃO

A avaliação inicial das FN é complicada, muitas vezes, devido ao edema que se forma com relativa rapidez, após o trauma. Alguns autores aguardam um período de cerca de 3 a 4 dias para a reavaliação, e, caso ainda haja algum edema residual, deve-se aguardar mais 3 ou 4 dias7. Perkins e Dayan, 20021, reavaliam a fratura nasal entre 5 a 10 dias, período anterior à formação de fibrose, que ocorre na segunda ou terceira semana pós-trauma. Pitcock e Bumsted, 19978, preferem reduzir a fratura após 5 a 10 dias devido a alguns fatores, como aguardar a redução do edema, oportunizando ao cirurgião tempo para estudar fotografias prévias, avaliar melhor a fratura nasal e lesões concomitantes em outras partes do corpo que possam ter passado despercebidas e criar uma relação de confiança entre profissional e paciente. O tempo máximo para se atingirem resultados satisfatórios no reposicionamento nasal é de 2 semanas9, 10. Já outros autores7, 6 acreditam que crianças devem ter sua fratura reduzida em um período máximo de 7 dias, enquanto, em adultos, o período de 10 dias não deve ser ultrapassado. As únicas lesões que devem receber obrigatoriamente tratamento imediato são as severas, como fraturas abertas com, deformidades externas grosseiras3.

A técnica anestésica a ser empregada varia de um profissional a outro, podendo a fratura ser tratada com anestesia local e sedação ou sob anestesia geral, com bons resultados em ambas as técnicas1, 2, 8, 11. Anestesia local isoladamente não deve ser utilizada devido ao enorme desconforto imposto ao paciente, tanto pelo processo de anestesia quanto pela redução dos ossos nasais em si. Sob anestesia geral, o cirurgião pode examinar internamente a cavidade nasal com maior facilidade, através do uso de espéculos nasais, tendo, ainda, a opção de realizar a redução aberta, caso haja necessidade, além de obter uma melhor avaliação trans-operatória do tratamento empregado. Para crianças, adultos jovens ou pacientes ansiosos, a anestesia geral deve ser utilizada de rotina7, 10.

Há uma variedade de instrumentos utilizados para o tratamento das FN, entre eles, as pinças de Asch e Walsham, elevadores de Boies, Freer ou Goldman12. Nossa preferência é pela pinça porta-agulha para fio de aço e pinça de Walsham, quando é necessária a manipulação septal. O tamponamento nasal (TP) é realizado por período variável. Na literatura, há autores que descartam seu uso de rotina8, 13. O tampão previne hemorragias pós-operatórias, ajuda a manter o contorno da pirâmide nasal e ajuda a evitar a formação de hematomas na porção anterior da cavidade nasal12, 14. No entanto, pode se tornar extremamente desconfortável por obliterar as narinas e impedir ou ao menos reduzir muito a função respiratória nasal.

A obstrução causada pelo TN pode promover hipóxia noturna com redução na PO2 e aumento na PCO2. Valores de saturação de O2 menores que 90% foram registrados em um estudo15, nas primeiras noites após o tamponamento. Ogretmenoglu et al16 verificaram aumento da PO2 e saturação de O2, com alterações insignificantes na PCO2. Yigit et al17 publicaram um estudo comparando as PO2 e PCO2 em pacientes com nariz tamponado, com ou sem manutenção da via aérea nasal e constataram uma redução da PO2 e aumento na PCO2 nos pacientes com TN sem dispositivos para respiração. Por outro lado, Kurtaram et al18 conduziram um estudo com 40 pacientes, demonstrando que a aplicação do TN com vias aéreas não causa disfunção respiratória ou hipóxia no pós-operatório.

Consideramos que a incorporação de tubos para manutenção das vias aéreas aos TN deve ser ainda mais incentivada. É frequente o uso de Merocel® com um tubo acoplado ao seu interior para manutenção das vias aéreas. Haug & Prather12 utilizaram dois tipos diferentes de TN com vias aéreas, um com splints de Doyle, e a outra com uma via aérea em forma de trompete, atingindo bons resultados quanto ao conforto referido pelo paciente. Rhee & Kim19 publicaram uma técnica para TN na qual separam uma esponja de Merocel® simples, introduzindo um cateter de sucção em seu interior que é estabilizado com suturas e mantém a via aérea nasal no pós-operatório.

Utilizamos como via aérea uma sonda nasogástrica, que é inserida após o TN com cadarços. Essa sonda tem como vantagens estar facilmente disponível, apresentar baixo custo, quando comparada a outros dispositivos e a sua consistência e maleabilidade não promovem muita irritação à mucosa nasal, além de poder ser facilmente presa ao septo nasal com sutura simples.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Grande parte da evolução no tratamento das FN buscou o destinado ao conforto do paciente no período pós-operatório. Desse modo, a associação de dispositivos para a manutenção da permeabilidade das vias aéreas deve ser considerada como mandatória no tratamento dessas fraturas.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para Correspondência
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Recebido em 10/12/2009
Aprovado em 29/01/2010