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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.10 no.3 Camaragibe Jul./Set. 2010

 

ARTIGOS DE ATUALIZAÇÃO E CLÍNICOS

 

Utilização do intensificador de imagem para remoção de agulha fraturada da região pterigomandibular

 

Application of the image intensifier for removal of broken needles from the pterygomandibular space

 

 

Rafaela Scariot de MoraesI; Rafael Vilson da SilvaII; Wanderley da Silva Félix JúniorII; Nelson Luís Barbosa RebelattoIII

IMestranda em Odontologia pela Universidade Federal do Paraná, Curitiba/PR, Brasil
IIGraduando do Curso de Odontologia da Universidade Federal do Paraná, Curitiba/PR, Brasil
IIIProfessor Adjunto III em Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial II da Universidade Federal do Paraná, Curitiba/PR, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Na região de cabeça e pescoço, frequentemente são encontrados corpos estranhos pelo cirurgião buco-maxilo-facial, tais como agulhas fraturadas, projéteis de arma de fogo e outros. Para sua remoção, é fundamental a avaliação correta de sua posição. As técnicas utilizadas para localizar um objeto em tecidos moles, nos dias de hoje, são as radiografias convencionais, as tomografias computadorizadas, as ressonâncias magnéticas, o ultrassom, os detectores do metal e os intensificadores de imagens. No caso de agulhas fraturadas, o uso do intensificador de imagens transoperatório vem apresentando vantagens, quando comparado aos outros métodos, pois oferece imagens dinâmicas transoperatórias rápidas e em ângulos variados. O objetivo deste trabalho é o de reportar nossa experiência, utilizando o intensificador de imagem para a remoção de agulha fraturada, baseada em caso clínico.

Descritores: Agulha; Fratura; Anestesia local; Imagem.


ABSTRACT

Oral and maxilla-facial surgeons often encounter foreign bodies, such as fractured needles, bullets from a firearm and others, in the head and neck region. An accurate assessment of their position is of fundamental importance for their removal. The techniques used nowadays to locate an object in soft tissues are conventional radiographs, computed tomography scans, magnetic resonance imaging, ultrasound, metal detectors and image intensifiers. In the case of fractured needles, the use of the image intensifier has been showing benefits compared with other methods, as it provides dynamic and rapid intraoperative images at various angles. The aim of this paper is to report our experience using the image intensifier for removal of fractured needles, based on a clinical case.

Descriptors: Needle; fracture; local anesthesia; image.


 

 

INTRODUÇÃO

Corpos estranhos são frequentemente encontrados na região de cabeça e pescoço pelo cirurgião buco-maxilo-facial. São, geralmente, o resultado de injúrias ou perfurações1. As fraturas de agulhas dentais são complicações raras durante a administração de anestesia local, mas, quando ocorrem, geram uma experiência traumática tanto para o profissional quanto para o paciente2.

A remoção de agulhas fraturadas deverá ser realizada com total segurança. Não é coerente correr riscos para a remoção de corpos estranhos que estejam próximos a estruturas nobres. Portanto, a avaliação mais correta de sua posição é fundamental para sua remoção3.

Há muitas técnicas para se localizar um objeto em tecidos moles. Estas incluem as radiografias convencionais, as tomografias computadorizadas, as ressonâncias magnéticas, o ultrassom, os detectores do metal e os intensificadores de imagens4-5.

O uso intraoperatório de intensificadores de imagens proporciona uma série de vantagens sobre as técnicas convencionais, pois fornece imagens transoperatórias rápidas e em ângulos variados, possibilitando confrontar a posição da agulha fraturada com a posição de outros instrumentos cirúrgicos6.

O objetivo deste trabalho é o de reportar nossa experiência, utilizando o intensificador de imagem para a remoção de agulha dental fraturada, baseada em caso clínico.

 

RELATO DE CASO

Paciente O.A.O., 20 anos, gênero masculino, leucoderma, foi encaminhado ao serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial da Universidade Federal do Paraná (UFPR) para remoção de agulha em mandíbula. Na anamnese, o paciente referiu fratura de agulha durante tentativa de bloqueio do nervo alveolar inferior, para tratamento endodôntico do 36, há aproximadamente 30 dias.

Ao exame clínico, não foram observados sinais de alterações nos tecidos moles adjacentes. O paciente não referia sintomatologia, contudo apresentava restrição de abertura bucal leve. Foram solicitadas radiografia panorâmica (Fig. 01), póstero-anterior (Fig. 02) e perfil de face que evidenciaram uma linha radiopaca em região pterigomandibular esquerda, de aproximadamente 30mm, compatível com a agulha fraturada. Vale a pena ressaltar que há uma amplificação da imagem, que varia de 10 a 35%, em objetos localizados na região posterior de radiografias panorâmicas.

 

 

 

 

Diante do posicionamento da agulha na região pterigomandibular e sabendo da dificuldade de localização desta durante o procedimento cirúrgico, o plano de tratamento para o paciente consistiu na remoção da agulha, sob anestesia geral, com auxílio transoperatório do intensificador de imagem. O paciente foi informado de todos os riscos e benefícios da remoção e autorizou, por escrito, a realização do procedimento.

Após avaliação médica, o paciente foi encaminhado ao Hospital do Trabalhador, Curitiba/PR, onde foi realizada a cirurgia para a remoção da agulha, sob anestesia geral. Foi realizada uma incisão em fundo de vestíbulo mandibular esquerdo, junto à borda anterior do ramo da mandíbula. Realizou-se o descolamento delicado de todo o tecido, perpendicular ao plano da agulha, principalmente na região lingual. Após o descolamento, não se visualizou a agulha. Com o intensificador de imagem, modelo EverView 7500-PRO (GE Healthcare®), foram realizadas imagens da região (Fig.03) e determinada, assim, a localização precisa da agulha. Esse intensificador de imagem apresenta um braço em "C" e um painel de controle com um monitor acoplado, no qual são apresentadas as imagens obtidas. Com o auxílio de uma pinça Halstead curva, a agulha foi localizada e pinçada, sendo removida, sem maiores intercorrências. Após uma semana, foi realizada a remoção de pontos e radiografias de controle (Fig.04). Complicações, como hemorragia, infecção ou parestesia permanente, não foram observadas. O paciente encontra-se atualmente, em controle pós-operatório de 03 anos, sem queixas funcionais.

 

 

 

 

DISCUSSÃO

O tratamento de fraturas de agulhas dentais durante o bloqueio anestésico é ainda bastante discutido. Sabe-se que a incidência dessa complicação tem diminuído significantemente, devido ao desenvolvimento de dispositivos descartáveis e mais flexíveis, além da utilização de materiais de aço inoxidável6. Avanços científicos na metalurgia bem como o treinamento dos profissionais que administram anestésicos locais têm reduzido o número de fraturas de agulhas2.

Muitos autores sugerem a remoção imediata de agulhas fraturadas, devido ao risco de seu deslocamento por meio da musculatura e formação de microlesões em nervos e vasos, o que poderia causar disestesias, focos hemorrágicos ou aneurismas2. Além disso, devem ser consideradas também as alterações psicológicas que isso gera ao paciente bem como as implicações legais7.

O espaço pterigomandibular possui uma anatomia bem delicada, composta pelos músculos pterigoide medial, temporal (fáscia superficial e profunda) e bucinador, além do nervo alveolar inferior e do nervo lingual. Devido a essa anatomia, faz-se necessária a correta localização do fragmento. As imagens pré-operatórias são extremamente importantes para decidir o plano de tratamento, contudo a dificuldade encontrada, quando se procuram pequenos objetos em uma grande área, com múltiplas estruturas anatômicas nobres, leva o cirurgião buco-maxilo-facial a precisar não só de imagens estáticas mas também de imagens dinâmicas transoperatórias. Com isso a utilização do intensificador de imagens tem-se mostrado eficiente.

No caso apresentado, optou-se pela utilização de um intensificador de imagem (fluoroscópio). A fluoroscopia é um método radiográfico nos quais as estruturas podem ser observadas em sua dinâmica. São divididos em fluoroscopia de écran ou convencional e fluoroscopia em TV7. Nesse método, sensores são sensibilizados por fluoroscopia para gerar uma imagem virtual numa tela de vídeo3. O termo fluoroscopia refere-se ao uso de baixa e contínua exposição à radiação5. Esse método tem-se mostrado de grande aplicação visto que registra imagens com qualidade satisfatória e com baixa exposição à radiação X. Além disso, o método permite que se análise as mesmas imagens várias vezes, através de operações simples e sem exposição adicional a radiação, nem do paciente nem do examinador8. O baixo custo efetivo e a diminuição do tempo operatório do cirurgião também são vantagens apresentadas9.

A utilização da fluoroscopia nesse caso mostrou-se extremamente eficiente, visto que representou um dano biológico desprezível (radiações), quando comparado com a divulsão às cegas, para se alcançar o objeto em questão.

Outro ponto a ser discutido é o que se refere à dimensão da agulha a ser utilizada nos bloqueios do nervo alveolar inferior. As agulhas existentes no mercado são as de 30-gauge (curta), com 23mm de comprimento e as de 27-gauge(longa), com 35mm de comprimento. Embora fraturas de agulhas sejam complicações raras, as agulhas curtas para bloqueios tronculares aumentam o risco de complicações, como já relatado10-11. Em um estudo em cadáveres12, com o objetivo de determinar a profundidade da penetração da agulha para o bloqueio do nervo alveolar inferior com sucesso, foi encontrada uma média de 21,96mm com um desvio-padrão de 1,81mm.Seaagulhacurtapossuiaproximadamente23mm, ela deverá ser inserida totalmente, o que aumenta consideravelmente a fratura dessas agulhas. No caso apresentado, foi utilizada agulha curta para o bloqueio, o que pode explicar parcialmente o causa da fratura.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Fraturas de agulhas raramente ocorrem nos dias atuais, mas, quando ocorre, a situação deve ser conduzida de forma adequada. O correto planejamento, incluindo a localização precisa da agulha, deve ser considerado. Para tanto, a possibilidade da utilização do intensificador de imagem pode ser uma alternativa viável, visto que minimiza o dano de estruturas anatômicas importantes e obtém imagens dinâmicas em ângulos variados.

 

REFERÊNCIAS

1. Eggers G, Haag C, Hassfeld S. Image-guided removal of foreign bodies. Br J Oral Maxillofac Surg . 2005;43(5):404-9.         [ Links ]

2. Bedrock RD, Skigen A, Dolwick MF. Retrieval of a broken needle in the pterygomandibular space. J Am Dent Assoc. 1999; 130(5):685-7.         [ Links ]

3. Azoubel E, Andrade MGS, Hoshi R, D'avila Junior EC. Utilização do intensificador de imagem na cirurgia bucomaxilofacial para remoção de corpos estranhos. RPG Rev Pós Grad. 2007;14(2):95-9.         [ Links ]

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9. Sri-Pathmanathan R. The mobile X-ray image intensifier unit in maxillofacial surgery. Br J Oral Maxillofac Surg. 1990;28(3): 203-6.         [ Links ]

10. Shah A, Mehta N, Von Arx DP. Fracture of a dental needle during administration of an inferior alveolar nerve block. Dent Update. 2009;36(1):20-2         [ Links ]

11. Chrcanovic BR, Menezes Junior DC, Custódio ALN. Complications of local dental anesthesia – a broken needle in the pterygomandibular space. Braz J Oral Sci. 2009;8(3):159-162.         [ Links ]

12. Kronmam JH, El-Bermani A, Wongtwatana S, Kumar A. Preferred needle lengths for inferior alveolar anaesthesia. Gen Dent. 1994; 42:74-6.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
Rafaela Scariot de Moraes
R. Dr. Brasílio Vicente de Castro, 320/Apto 403
Campo Comprido - Curitiba/PR CEP: 81200-340
Email: rafaela_scariot@yahoo.com.br

Recebido em 14/10/2009
Aprovado em 18/12/2009