SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.10 número3 índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.10 no.3 Camaragibe Jul./Set. 2010

 

ARTIGOS DE ATUALIZAÇÃO E CLÍNICOS

 

Granuloma periférico de células gigantes: relato de caso

 

Peripheral giant cell granuloma: a case report

 

 

Diurianne Caroline Campos FrançaI; Nícolas Vasconcellos AndréII; Murilo Augusto Alves LessiII; Gicelma ReisII; Sandra Maria Herondina Coelho Ávila de AguiarIII

IDoutoranda em Odontopediatria – Unesp/Araçatuba. Professora da Disciplina de Diagnóstico em Odontologia do Centro Universitário de Várzea Grande - UNIVAG, Estomatologista do CEOPE – Centro Estadual de Odontologia para Pacientes Especiais
IIAcadêmicos do curso de graduação em Odontologia do Centro Universitário de Várzea Grande – Univag
IIIProfessora Adjunto do Departamento de Clínica Infantil e Social, Universidade Paulista Júlio Mesquita Filho, Faculdade de Odontologia de Araçatuba – Unesp

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O granuloma periférico de células gigantes (GPCG) é definido como uma enfermidade benigna, de etiopatogênese incerta, proliferativa e reacional do tecido conjuntivo fibroso ou do periósteo, que se caracteriza histologicamente pela presença de células gigantes multinucleadas. O objetivo deste artigo é o de relatar um caso de GPCG em mulher branca, de 56 anos, apresentando nódulo sangrante ao toque, coloração vermelha com pequenas áreas esbranquiçadas e áreas ulceradas, limites definidos, consistência resiliente, base pediculada, com 2,0 cm diâmetro, assintomática, circundando o dente 38 que se apresentava com mobilidade. Radiograficamente observou-se perda óssea significativa em região do dente 38, cujo diagnóstico inicial foi de granuloma piogênico. O diagnóstico definitivo foi obtido após biópsia excisional em cuja análise microscópica se identificou presença de células gigantes multinucleadas. O acompanhamento clínico pós-operatório evidenciou favorável reparação cicatricial da área operada, sem recidiva após 9 meses de acompanhamento.

Descritores: Tumores de Células Gigantes; Granuloma de Células Gigantes; Mandíbula.


ABSTRACT

The peripheral giant cell granuloma (GPCG) is defined as a benign disorder of uncertain etiopathogenesis and proliferative reaction of the fibrous connective tissue or periosteum, which is characterized histologically by the presence of multinucleated giant cells. The purpose of this study is to report a case of GPCG in a 56-year-old white woman presenting a bleeding nodule on palpation, a red color with small whitish ulcerated areas, defined limits, resilient consistency, a pedicled base 2.0 cm in diameter, asymptomatic, involving the permanent lower left third molar, which presented mobility. Radiographically there was significant bone loss in this tooth region, whose initial diagnosis was pyogenic granuloma. The definitive diagnosis was obtained after excisional biopsy the microscopic examination of which identified the presence of multinucleated giant cells. The clinical postoperative follow-up revealed a favorable cicatricial repair of the operated area with no recurrence after 9 months of monitoring.

Descriptors: Giant Cell Granuloma. Giant Cell Tumors. Mandible.


 

 

INTRODUÇÃO

O granuloma periférico de células gigantes (GPCG) é definido como uma enfermidade benigna, de etiopatogênese incerta, proliferativa e reacional do tecido conjuntivo fibroso ou do periósteo, que acomete considerável parcela da população em geral, quando comparada às outras lesões proliferativas não-neoplásicas da boca1. Pertencem a este grupo a hiperplasia fibrosa inflamatória, as fibromatoses gengivais, o granuloma piogênico e o GPCG, este último definido pela presença de células gigantes no estroma de lesões gengivais2,3.

Algumas lesões benignas dos maxilares apresentam-se indistinguíveis à análise histopatológica, como no caso das "lesões de células gigantes", envolvendo o GPCG, o granuloma central de células gigantes (GCCG), cisto ósseo aneurismático, querubismo e o tumor marrom do hiperparatireoidismo e que, devido aos achados histopatológicos comuns destas, o diagnóstico definitivo deve estar associado aos aspectos clínico/radiográficos; localização periosteal em GPCG, ou endosteal no GCCG; história de trauma sugerindo cisto ósseo aneurismático e exames bioquímicos na pesquisa de alterações endócrinas confirmando ou não hiperparatireodismo4,3,5 .

O GPCG ocorre geralmente após um trauma ou irritação local, tendo como fatores predisponentes ao seu desenvolvimento a presença de raízes residuais, próteses e restaurações mal adaptadas, placa e cálculos dentais, periodontite e implantes4. São mais comuns em gengiva inserida e mucosa alveolar; caracterizam-se por crescimento gengival exofítico de coloração vermelho-escura, de base séssil ou pediculada, apresentando diferentes dimensões, podendo causar o deslocamento dos dentes adjacentes6,7.

Ocorre em todas as idades, sendo mais frequente entre a terceira e a sexta décadas de vida, principalmente em mulheres, com tamanho variando entre 0,5 e 1,5 cm8.

Radiograficamente não se observam áreas nítidas de envolvimento, restringindo-se à observação de discretas áreas de reabsorção óssea em forma de taça, provavelmente pela compressão exercida pela lesão9. O acentuado potencial de crescimento pode levar à erosão do osso subjacente, ou mesmo, a uma reabsorção do osso alveolar10. Essa característica pode dificultar a diferenciação entre granuloma periférico e central de células gigantes, principalmente quando do rompimento da tábua cortical e invasão dos tecidos moles gengivais2. Outra dificuldade diagnóstica ocorre entre granuloma piogênico e GPCG devido às similaridades da etiopatogenia e características clínico-radiográficas. O diagnóstico definitivo nesses casos é baseado no exame histopatológico, em que no GPCG constata-se a presença de um estroma de tecido conjuntivo, contendo numerosas células jovens ovóides ou fusiformes e células gigantes multinucleadas, focos de hemorragia e, mais frequentemente espículas neoformadas de osso ou tecido osteoide11, 9.

O tratamento indicado é a excisão cirúrgica e eliminação do fator irritante com consequente acompanhamento da área. Em casos de comprometimento do tecido ósseo subjacente, uma curetagem ampla se faz necessária, para que não haja recidivas1, 5.

É objetivo deste trabalho relatar um caso de GPCG, abordando suas características clínicas, radiográficas e histológicas, contribuindo com a literatura científica a fim de ampliar o conhecimento dos cirurgiões-dentistas a respeito desta patologia.

 

RELATO DO CASO CLÍNICO

Paciente sexo feminino, 56 anos de idade, raça branca, procurou atendimento odontológico em um centro de referência especializado em Cuiabá/MT, apresentando como queixa principal aumento tecidual em região retromolar esquerda, com evolução de 1 mês. Na história médica, relatou hipertensão arterial, fazendo uso de captopril 25mg, porém se apresentava descompensada no momento da consulta, com pressão arterial de 180 / 120 mmHg, mesmo em uso da medicação. Foram administrados Captopril 25mg e Enalapril 20mg, para compensação do quadro hipertensivo e encaminhamento ao cardiologista para reavaliação.

No exame físico extrabucal, observou-se assimetria facial em região de ramo mandibular esquerdo e intrabucalmente nódulo sangrante ao toque, de base pediculada, com 2,0 cm diâmetro, coloração avermelhada com pequenas áreas esbranquiçadas e ulceradas, limites definidos, de consistência resiliente, assintomática, circundando o dente 38 que se apresentava com mobilidade (Figura 1). A hipótese diagnóstica foi a de granuloma piogênico. Foram solicitados exames complementares, como hemograma completo, risco cirúrgico, radiografias panorâmica, oclusal e periapical. Na radiografia panorâmica observou-se áreas de reabsorção óssea na região do dente 38, provavelmente pela compressão exercida pela lesão e imagem radiopaca discreta envolvendo o elemento em questão sugerindo proliferação de tecido mole. (Figura 2).

 

 

 

 

A excisão cirúrgica da lesão e exodontia do dente 38, seguida de curetagem da loja óssea foram feitas sob monitoramento e sedação em ambiente cirúrgico, após 10 dias de acompanhamento e estabilização do quadro hipertensivo, por sugestão do médico cardiologista.

O exame histopatológico da peça revelou mucosa recoberta por epitélio estratificado pavimentoso paraqueratinizado com exocitose, acantose e ulceração. Na lâmina própria, observou-se intensa celuraridade; infiltrado inflamatório crônico inespecífico e células gigantes multinucleadas, estas últimas conclusivas para o diagnóstico de GPCG (Figura 3).

 

 

A paciente se encontra em acompanhamento de 9 meses, não apresentando recidiva da lesão.

 

DISCUSSÃO

O GPCG é uma lesão reacional de etiologia desconhecida, provavelmente associada a uma irritação local crônica provocada por cálculo subgengival, restaurações mal-adaptadas, entre outros4. Clinicamente, é difícil distinguir esta enfermidade de um granuloma piogênico, pois as diferenças são discretas, e o exame histopatológico é necessário para o diagnóstico conclusivo de GPCG, visto que não há características patognomônicas para diferenciá-las.

De acordo com a maioria dos autores referenciados, a predileção da lesão é pelo sexo feminino, região mandibular, sendo o fator idade mais variável, entre a terceira e sexta décadas de vida8,9,6,1,2, características essas confirmadas no caso relatado, porém, discordando do trabalho de Gomes et al.2 que mostrou maior ocorrência em maxila e o de Resende3 em que as lesões ocorreram mais em homens.

Fortes et al.7 analisando 117 casos de GPCG confirmaram que esta é uma lesão quase que exclusivamente de gengiva e rebordo alveolar, de base pediculada e cor predominante vermelho rosado, concordando com os nossos achados clínicos.

Os exames de imagem mostraram áreas de reabsorção óssea na região do dente 38, provavelmente pela compressão exercida pela lesão concordando com Castro et al.9 e Resende et al.10, que nos conduziram ao diagnóstico clínico de granuloma piogênico. As características clínico-radiográficas deste caso mostram a dificuldade na diferenciação entre granuloma piogênico e GPCG, que foi esclarecido com o resultado histopatológico.

Foi optado pela exodontia do dente 38 por apresentar-se com mobilidade e perda óssea horizontal significativa, além da enucleação da lesão e de seus bordos, seguida de curetagem da loja óssea, assim como sugerem os autores1,9,4,6. A técnica adequada de curetagem é importante para evitar recidivas em que as taxas variam entre 4,9% e 9,8% dos casos1 (De Carli et al. 2006).

As características comuns observadas na descrição microscópica dos espécimes corrobora a literatura, em que se observou proliferação de células gigantes multinucleadas em meio a células fusiformes de tecido conjuntivo12, confirmando diagnóstico de GPCG.

A paciente continua em acompanhamento, não apresentando recidiva da lesão.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O conhecimento dos cirurgiões-dentistas a respeito das características clínicas, radiográficas e histológicas dessa patologia é de fundamental importância visto que o correto diagnóstico é fator imprescindível para se obter sucesso no tratamento além da realização de reavaliação clínica e radiográfica no acompanhamento do caso, pois existe possibilidade de recidiva.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem o empenho e a dedicação dos professores Dr. Arlindo Tadeu Teixeira Aburad pela cedência das imagens do exame histopatológico utilizadas neste artigo e ao Dr. João Milanez Moreira Junior pela realização da cirurgia.

 

REFERÊNCIAS

1. De Carli JP, Silva SO, Paza A. Lesão de células gigantes periférica: revisão de literatura e relato de um caso recidivante. Rev Odontol Araçatuba. 2006; 27(1):19-24.         [ Links ]

2. Gomes ACA, Silva EDO, Avelar RL, Santos TS, Andrade ESS. Lesão de células gigantes: um estudo retrospectivo de 58 casos. Rev Cir Traumatol BucoMaxilo-fac. 2007; 7 (2):83-8.         [ Links ]

3. Resende CRS. Granuloma periférico de células gigantes: imunohistoquímica Anti-TNF-α [dissertação]. Duque de Caxias (RJ): Universidade do Grande Rio "Prof. José de Souza Herdy"; 2007.         [ Links ]

4. Nogueira RLM, Cavalcante RB, Carvalho ACGS, Costa FWG. Lesão de células gigantes: um estudo do diagnóstico diferencial em 04 casos clínicos. Rev Cir Traumatol Buco-Maxilo-fac. 2004; 4(2):81-9.         [ Links ]

5. Silva AG, Cardoso CC. Lesões ósseas maxilares contendo tecido de células gigantes. Rev Port Estomatol Cir Maxilo-fac. 2007; 48 (4):237-42.         [ Links ]

6. Capelozza ALA, Taveira LAA, Pagin O. Lesão periférica de células gigantes: relato de caso. Salusvita. 2007; 26 (1):99-104.         [ Links ]

7. Fortes TMV, Queiroz LMG, Piva MR, Silveira EJD. Estudo epidemiológico de lesões proliferativas não neoplásicas da mucosa oral – análise de 20 anos. Cienc Odontol Bras. 2002; 5 (3):54-61.         [ Links ]

8. Cavezzi Junior O, Sartori JHF, Aguiar ECG. Lesão periférica de células gigantes: relato de caso clínico. Odontol Clín.Cient. 2008; 7(3):257-60.         [ Links ]

9. Castro AL, Castro EVFL, Salzedas LMP, Giovanini EG. Lesão de células gigantes periférica: relato de caso. Rev Odontol Araçatuba. 2007; 28(2):51-4.         [ Links ]

10. Resende CRS, Falabella MEV, Valença SS, Teixeira HGC, Tinoco EMB. Granuloma periférico de células gigantes: imunohistoquímica anti-tnf-alfa. R. Periodontia. 2007; 17(3):104-11.         [ Links ]

11. Reyes A, Pedron IG, Utumi ER, Aburad A, Soares MS. Granuloma Piogênico: enfoque na doença periodontal como fator etiológico. Rev Clín Pesq Odontol. 2008; 4 (1):29-33.         [ Links ]

12. Fernandes MI, Diogo ACF, Ribeiro CG, Rados PV. Lesão de células gigantes periférica em paciente periodontal: relato de caso. Rev Facul Odontol Univ Passo Fundo. 2007; 12 (1):56-60.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
Diurianne Caroline Campos França
Ciências da Saúde – Odontologia - Univag
Av. Dom Orlando Chaves, 2.655
CEP 78118-900 Cristo Rei - Várzea Grande – MT
E-mail: diurianne.odonto@terra.com.br

Recebido em 21/10/2009
Aprovado em 23/02/2010