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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.10 no.4 Camaragibe Set./Dez. 2010

 

ARTIGOS DE ATUALIZAÇÃO E CLÍNICOS

 

Carcinoma adenoide cístico em uma localização incomun

 

Adenoid cystic carcinoma in an uncommon site

 

 

Frederico Sampaio NevesI; Frab Norberto BóscoloII; Solange Maria de AlmeidaII; Paulo Sérgio Flores CamposIII; Luís Antônio Nogueira dos SantosIV

IMestrando em Radiologia Odontológica pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba/ UNICAMP
IIProfessor associado da Disciplina de Radiologia Odontológica da Faculdade de Odontologia de Piracicaba/ UNICAMP
IIIProfessor associado da Disciplina de Radiologia Odontológica da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal da Bahia
IVDoutorando em Radiologia Odontológica pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba/ UNICAMP

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O carcinoma adenoide cístico é uma massa de crescimento lento e indolor, com propensão a invadir nervos periféricos e apresenta uma alta taxa de recorrência, com metástase em outros órgãos. A ocorrência do carcinoma adenoide cístico é relativamente rara, representando 10% a 15% das neoplasias de glândulas salivares maiores e cerca de 12.3% das neoplasias de glândulas salivares menores. A frequência relatada em língua é de 19.8%, sendo que, em 85% dos casos, a região afetada é a base da língua. Relatamos um caso de carcinoma adenoide cístico em paciente do gênero feminino, 66 anos de idade, localizado em dorso de língua e descrevemos os seus achados ultrassonográficos.

Descritores: Carcinoma adenoide cístico; Glândula salivar; Ultrassom.


ABSTRACT

The adenoid cystic carcinoma is a slow growing and painless mass, with a tendency to invade peripheral nerves and produce metastasis, and also presenting a high rate of recurrence. Adenoid cystic carcinoma is relatively rare condition, accounting for 10% to 15% of all major salivary gland neoplasms and approximately 12.3% of minor salivary glands neoplasms. The tongue is involved in 19.8% of the cases, and in 85% of these cases the affected region is the base of the tongue. We report a case of adenoid cystic carcinoma in a 66-year-olf female patient, located in the dorsum of the tongue, and describe its ultrasound characteristics.

Keywords: adenoid cystic carcinoma; salivary gland; ultrasound.


 

 

INTRODUÇÃO

Carcinoma adenoide cístico (CAC) é uma neoplasia maligna que se origina das glândulas salivares menores ou maiores, caracterizado por crescimento lento, invasão difusa e alto potencial para produzir metástases1. A condição apresenta curso clínico severo e usualmente leva a óbito. Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), o CAC é um tumor de células epiteliais e mioepiteliais que pode apresentar padrão morfológico tubular, cribiforme ou sólido.

Tipicamente, O CAC é uma neoplasia de crescimento lento, apresentando-se clinicamente como um aumento de volume ou nódulo de consistência endurecida, recoberto por mucosa íntegra. Embora rara nas lesões de glândulas salivares maiores e nas neoplasias de palato, ulceração pode ser observada, e radiograficamente pode-se perceber destruição óssea2.

A avaliação dos tumores de glândulas salivares tem sido realizada por diversas modalidades de imagem, mas a tomografia computadorizada multidetector e a ressonância magnética são particularmente úteis na determinação da extensão do tumor e da possibilidade de metástase nos linfonodos. Além disso, a tomografia computadorizada multidetector com contraste permite ao cirurgião determinar se a lesão é cística ou sólida3.

Adiante relataremos um caso de CAC localizado em dorso de língua e descreveremos os seus achados ultrassonográficos.

 

RELATO DE CASO

Paciente do gênero feminino, 66 anos de idade compareceu à Clínica de Estomatologia da Universidade de Montes Claros (Minas Gerais, Brasil) com queixa de aumento de volume, assintomático e localizado língua. Ao exame extrabucal, percebemos linfonodos cervicais com consistência e tamanho normais. Durante

o exame intrabucal, observamos aumento de volume recoberto por mucosa normal, localizado no lado direito do dorso, borda lateral e ventre da língua. À palpação, a lesão apresentou consistência firme e aparentemente fibrosa (Figura 1).

 

 

Diante do aspecto clínico da lesão, a paciente foi submetida a exame por ultrassonografia (US), para determinar a extensão do tumor e descartar a possibilidade de lesão vascular ou Linfoma não-Hodgkin. Foi realizada US bidimensional, com transdutor plano de alta frequência (7.5mHz), que revelou um aumento de volume na língua, com aspecto hipoecogênico e dimensões de, aproximadamente, 3,0cm x 6,0cm x 2,5cm (Figura 2a-b). No modo doppler, observou-se que a lesão possuía uma baixa vascularização, com fluxo sanguíneo anômalo (Figura 2c). Na mesma sessão foram também avaliados os linfonodos cervicais que não apresentaram alterações.

 

 

O exame anatomopatológico mostrou a presença de ilhas e cordões tumorais compostos por células hipercromáticas, pleomórficas, apresentando citoplasma eosinofílico, circundando e invadindo o feixe vásculonervoso (Figura 3a). Também pôde ser observado tecido epitelial pavimentoso estratificado paraceratinizado, revestindo tecido conjuntivo denso não-modelado apresentando, no seu interior, ilhas e cordões epiteliais hipercromáticos com padrão ora cribiforme, ora tubular (Figura 3b). O diagnóstico histopatológico foi de CAC. A paciente foi encaminhada ao serviço de oncologia, sendo foi submetida a tratamento cirúrgico com remoção completa da lesão.

 

 

DISCUSSÃO

Clinicamente, o CAC é caracterizado por uma massa de crescimento lento e indolor, com propensão a invadir nervos periféricos, apresentando alta taxa de recorrência, com metástase em outros órgãos4. Em nosso caso, a paciente encontra-se em proservação clínica, e três anos depois da remoção cirúrgica da lesão não se observaram sinais de recidiva da lesão.

A ocorrência de CAC é relativamente rara, representando 10% a 15% de todas as neoplasias de glândulas salivares maiores e cerca de 12.3% de glândulas salivares menores. A frequência relatada em língua é de 19.8%, sendo que, em 85% dos casos, a região afetada é a base da língua2.

Recentemente, Mucke et al.5 avaliaram 33 casos de CAC, originados de glândulas salivares menores e observaram que, em 45,5% dos casos, a ocorrência foi no palato, seguida da região bucal (27,3%). Não foi detectado nenhum caso de CAC em língua. Já Tian et al.6 avaliaram 6892 casos de neoplasias de glândulas salivares na população chinesa e registraram 68 casos de CAC acometendo glândulas salivares menores linguais.

A US possui uma ampla aceitação no auxílio diagnóstico para avaliação de lesões localizadas em tecidos moles da cabeça e pescoço, como linfonodos e glândulas salivares. Em nosso caso, a US não pôde apontar a neoplasia como maligna, principalmente porque não foram observadas alterações nos linfonodos cervicais, que apresentaram margens lisas. Porém, o diagnóstico de lesão vascular pôde ser excluído, devido a sua baixa vascularização.

O CAC possui três padrões histológicos: tubular, cribiforme e sólido (mais comum). Esses padrões refletem um maior (tubular) ou menor (sólido) grau de diferenciação tumoral. Casos de CAC com padrão sólido são mais agressivos que os outros7. Em nosso caso, pudemos observar uma associação entre os padrões cribiforme e tubular.

As modalidades de tratamento para o CAC incluem a ressecção cirúrgica, com ou sem a possibilidade de um esvaziamento cervical dos linfonodos, a depender da suspeita clínica ou radiográfica de metástases existentes nos linfonodos loco -regionais. A radioterapia pós-operatória também é um dos tratamentos utilizados8.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As indicações para realização do esvaziamento cervical dos linfonodos são baseadas nos achados clínicos e imaginológicos. Casos de suspeita de alargamento (maior que 1cm) ou necrose central dos linfonodos e invasão do osso adjacente, observados por meio da US, tomografia computadorizada multidetector ou ressonância magnética, conduzem ao esvaziamento cervical dos linfonodos4. Em nosso caso, tais aspectos imaginológicos não foram observados na US, não sendo, portanto, necessário o esvaziamento cervical dos linfonodos.

 

REFERÊNCIAS

1. Barnes L, Eveson JW, Reichart P, Sidransky D (editors). WHO classification head and neck tumours. Lyon: IARC; 2005. p. 270–2.         [ Links ]

2. Soares EC, Carreiro Filho FP, Costa FW, Vieira AC, Alves AP. Adenoid cystic carcinoma of the tongue: case report and literature review. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2008;13(8):475-8.         [ Links ]

3. Papadogeorgakis N, Kalfarentzos EF, Vourlakou C, Malta F, Exarhos D. Simultaneous pleomorphic adenoma of the left parotid gland and adenoid cystic carcinoma of the contralateral sublingual salivary gland: a case report. Oral Maxillofac Surg. 2009;13(4):221-4.         [ Links ]

4. Carrasco Ortiz D, Aldape Barrios B. Adenoid cystic carcinoma of the dorsum of the tongue: presentation of a case. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2006;11(5):417-20.         [ Links ]

5. Mücke T, Tannapfel A, Kesting MR, Wagenpfeil S, Robitzky LK, Wolff KD, Hölzle F. Adenoid cystic carcinomas of minor salivary glands. Auris Nasus Larynx. 2010;37(5):315-20.         [ Links ]

6. Tian Z, Li L, Wang L, Hu Y, Li J. Salivary gland neoplasms in oral and maxillofacial regions: a 23-year retrospective study of 6982 cases in an eastern Chinese population. Int J Oral Maxillofac Surg. 2010;39(3):235-42.         [ Links ]

7. Moles MA, Avila IR, Archilla AR. Dedifferentiation occurring in adenoid cystic carcinoma of the tongue. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 1999;88(2):177-80.         [ Links ]

8. Avery CM, Moody AB, McKinna FE, Taylor J, Henk JM, Langdon JD. Combined treatment of adenoid cystic carcinoma of the salivary glands. Int J Oral Maxillofac Surg. 2000;29(4):277-9.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
Frederico Sampaio Neves
Universidade Estadual de Campinas
Faculdade de Odontologia de Piracicaba
Departamento de Diagnóstico Bucal
Av. Limeira, 901, Areião
Caixa Postal 52, Piracicaba-SP CEP 13414-903

Recebido em 18/02/2010
Aprovado em 30/04/2010