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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.11 no.1 Camaragibe Jan./Mar. 2011

 

 

Cisto Dentígero Bilateral em Mandíbula: relato de caso

 

Bilateral Dentigerous Cyst in Mandible: case report

 

 

Hécio Henrique Araújo de MoraisI; Thiago Fernando de Araújo SilvaII; Rodrigo Maristony Medeiros DantasII; José Leonilson FeitosaII; Fábio Andrey da Costa AraújoIII

I Professor da Disciplina de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial do departamento de Odontologia da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
II Acadêmicos do Curso de Odontologia da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
III Cirurgião-Dentista , Residente em CTBMF do Hospital Universitário Oswaldo Cruz - UPE.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Define-se como cisto, uma cavidade patológica revestida por epitélio que encerra em seu interior material fluido ou semifluido. A separação do folículo da coroa de um dente incluso culmina com uma formação cística denominada, cisto dentígero. Dentre os cistos de desenvolvimento corresponde ao mais comum. Em sua maioria são assintomáticos, podendo atingir proporções maiores e causar movimentações dentárias e maloclusão. Em função do mesmo apresentar características radiográficas não específicas, sabe-se que o cisto dentígero pode fazer diagnóstico diferencial com o ameleblastoma unilocular e ceratocisto odontogênico. Os aspectos histológicos dos cistos dentígeros não são característicos e não podem ser utilizados com segurança para distingui-los de outros tipos de cistos odontogênicos. A remoção do dente associado e a enucleação cuidadosa do componente de tecido mole é o tratamento definitivo na maioria dos casos. Neste trabalho, relatamos um caso clínico de cisto dentígero bilateral em mandíbula, cuja ocorrência é incomum, o qual foi tratado e submetido ao controle pós-operatório.

Descritores: Cirurgia bucal, cisto dentígero, mandíbula.


ABSTRACT

It is defined as cyst, a pathological cavity lined by epithelium which contains in its interior fluid or semi-fluid. The separation of the follicle from the crown of an impacted tooth culminates with a cystic formation called, dentigerous cyst. Among the cysts of development corresponds to the most common. The majority are asymptomatic and can reach larger proportions and cause malocclusion and dental movements. In light of that present no specific radiographic features, it is known that the dentigerous cyst may make differential diagnosis and ameleblastoma unilocular odontogenic keratocyst. The histological aspects of dentigerous cysts are not characteristic and can not be safely used to distinguish them from other types of odontogenic cysts. The removal of the tooth associated with enucleation and careful soft tissue component is the definitive treatment in most cases. We report a case of bilateral dentigerous cyst in mandible, whose occurrence is uncommon, which was treated and subjected to postoperative control.

Keywords: surgery, oral, dentigerous cyst, mandible.


 

 

INTRODUÇÃO

Define-se como cisto, uma cavidade patológica revestida por epitélio que encerra em seu interior material fluido ou semifluido. Os cistos originam-se de restos epiteliais que frente a um estímulo de origem química, traumática ou infecciosa, passam a se proliferar. Como as células epiteliais se nutrem através da difusão do líquido tissular a partir do tecido conjuntivo adjacente, aquelas que se localizam centralmente, passam a sofrer deficiência de nutrição e terminam por degenerar-se1.

A separação do folículo da coroa de um dente incluso culmina com uma formação cística denominada, cisto dentígero. Dentre os cistos de desenvolvimento corresponde ao mais comum. Sua patogênese é desconhecida, mas, aparentemente desenvolve-se pelo acúmulo de líquido entre o epitélio reduzido do esmalte e a coroa do dente.

Esta lesão ocorre em qualquer região dos maxilares, sendo mais freqüente nas proximidades dos terceiros molares inferiores, relacionado com um dente ausente ou ainda com a degeneração do folículo de um germe supranumerário. Podem surgir entre a segunda e terceira década da vida, produzindo um aumento de volume local, sendo assintomático. Podem ocorrer numa faixa de 1,75 dos cistos odontogênicos e 5% dos foliculares2.

Outros locais relativamente freqüentes são os caninos superiores, terceiros molares superiores e segundos pré- molares inferiores, estando ocasionalmente associado ao odontoma.

Raramente aparecem na primeira dentição, entretanto isso não é generalizado3, uma vez que podem ser encontrados frequentemente, inclusive na primeira década de vida.

Clinicamente, os cistos dentígeros são, na maioria das vezes, assintomáticos. Entretanto, têm o potencial de se tornarem extremamente grandes e causarem expansão e erosão da cortical4. Dor e desconforto geralmente não estão presentes, salvo se o cisto estiver infectado secundariamente5. Estes cistos também podem provocar deslocamento dentário, maloclusão e assimetria facial. Normalmente, são descobertos em exames radiográficos de rotina6,7,8. O cisto dentígero manifesta-se geralmente de forma solitária. Cistos múltiplos ou bilaterais estão associados com algumas síndromes, destacando-se a síndrome de Maroteaux- Lamy e a displasia cleidocraniana5. Uma punção aspirativa da lesão, freqüentemente, fornece um líquido de coloração palha6.

Radiograficamente, o cisto dentígero apresenta- se como uma área radiolúcida bem circunscrita, unilocular e assimétrica, circundando a coroa de um dente não-erupcionado4. Características radiográficas adicionais incluem deslocamento do canal mandibular, reabsorção da parede deste canal, reabsorção radicular de dentes permanentes adjacentes e possibilidade de fratura patológica9,10. A distinção radiográfica entre um cisto dentígero pequeno e um folículo dilatado sobre a coroa de um dente incluso é difícil e pode ser um exercício acadêmico exaustivo. Para a lesão ser considerada um cisto dentígero, alguns investigadores acreditam que o espaço radiotransparente que circunda a coroa do dente deve ter pelo menos 3 a 4 mm de diâmetro11. Em função do mesmo apresentar características radiográficas não específicas, sabe-se que o cisto dentígero pode fazer diagnóstico diferencial com o ameleblastoma unilocular e ceratocisto odontogênico.

Os aspectos histológicos dos cistos dentígeros não são característicos e não podem ser utilizados com segurança para distingui-los de outros tipos de cistos odontogênicos. O exame histológico revela uma cápsula de tecido conjuntivo frouxo e delgado, com um revestimento epitelial composto por duas ou três camadas de células planas ou cuboidais. Este epitélio é nãoqueratinizado, e a formação de projeções epiteliais só está presente associada à infecção secundária. Números variáveis de ilhas de epitélio odontogênico podem ser encontrados dispersos no conjuntivo. Contudo, o significado destas ilhas é controverso, pois elas também estão presentes em folículos dentários normais12.

A remoção do dente associado e a enucleação cuidadosa do componente de tecido mole é o tratamento definitivo na maioria dos casos de cisto dentígero13.

O tratamento está geralmente, na dependência do tamanho da lesão. Aquelas consideradas pequenas podem ser removidas por cirurgia. As maiores, que envolvem grande perda óssea e adelgaçam perigosamente o osso, são, com freqüência, tratados por inserção de um dreno cirúrgico ou por marsupialização14. A marsupialização tem vantagens em preservar o dente associado ao cisto dentígero, e em promover a erupção espontânea do dente envolvido no interior da lesão15.

Neste trabalho, relatamos um caso clínico de cisto dentígero bilateral em mandíbula, cuja ocorrência é incomum, o qual foi tratado e submetido ao controle pós-operatório.

 

RELATO DE CASO

Paciente do sexo masculino, 15 anos de idade, leucoderma, foi encaminhado ao ambulatório de cirurgia pelo ortodontista com uma radiografia panorâmica para avaliação das regiões retro-molares mandibulares. Ao exame clínico intra-oral não havia qualquer aumento de volume ou alteração na cor da mucosa das áreas referidas. O exame radiográfico panorâmico revelou radiolucidez que circundava as coroas dos dentes 37 e 47, bem como inclusão horizontal dos dentes 38 e 48, que impediam a erupção dos dentes 37 e 47 (FOTO 1). Foi realizada biópsia incisional, sob anestesia local, de forma bilateral (FOTO 2). O diagnóstico histológico de cisto dentígero foi confirmado para ambos os lados.

 

 

 

 

 

Após confirmação da hipótese diagnóstica, foi realizada remoção dos dentes 38 e 48, descompressão na região do dente 48, com a ajuda de um dispositivo de plástico, bem como a enucleação da lesão na região do dente 38 (FOTO 3).

Após 1 mês o dreno foi removido e a enucleação da lesão na região dos dentes 47 e 48 foi realizada sem qualquer problema. A radiografia panorâmica de controle pós-operatório de 2 meses mostrou neoformação óssea, bem como a erupção dos dentes 37 e 47 (FOTO 4). O paciente segue em acompanhamento, sem outras queixas.

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

A presença de cistos dentígeros bilaterais em mandíbula não são achados comuns, mas quando presentes podem estar associados com algumas síndromes, o que não aconteceu nesse caso. O fator determinante na gênese dos dois cistos dentígeros mandibulares relatados aqui parece ser a influência dos terceiros molares inferiores com inclusão mésio-angular, o que não permitiu a erupção normal dos dentes 37 e 47, mais tarde envolvidos pelos cistos.

Optou-se pela marsupialização e descompressão da lesão na região do dente 47 pelo tamanho da radiolucidez no momento do diagnóstico. Uma intervenção mais agressiva naquele momento seria difícil de ser realizada sob anestesia local, resguardando-se assim o conforto do paciente, bem como geraria risco de lesão ao plexo vásculo-nervoso alveolar inferior. No segundo momento, com a diminuição da lesão, a enucleação foi feita sem maiores problemas e sem os riscos previamente citados. No lado esquerdo da mandíbula, na região do dente 37, a enucleação foi realizada após o resultado da biópsia incisional porque o tamanho menor dessa lesão assim permitiu.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

- Por apresentar características clínicas e radiográficas semelhantes ou idênticas a outras lesões císticas, admite-se ser o cisto dentígero uma lesão de difícil diagnóstico, entretanto, ainda que diante de tais dificuldades, o mesmo pode ser tratado de forma eficiente com prognóstico favorável e baixo índice de recidivas.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1-Marzola C. Fundamentos em Cirurgia Buco Maxilo Facial. CDR. Bauru: Ed. Independente, 2005.         [ Links ]

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10- Daley TD, Wysocki GP. New developments in selected cysts of the jaws. J Can Dent Assoc, Ottawa, 1997; 63(7): 526-32.

11- Neville BW et al. Patologia oral e maxilo facial. Rio de Janeiro : Editora Guanabara Koogan, 2004; 566-9.

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13 -Tuzum MS. Marsupialization of a cyst to allow tooth eruption: A case report. Quintessence International. 1997; 28 (4): 283-4.

14- Graziani M. Cirurgia dos Cistos Foliculares ou Dentígeros. In: Cirurgia Bucomaxilofacial. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1995; 19: 299-307.

15-Fujii R, Kawakami M, Hyomoto M, Ishida J, Kirita T. Panoramic findings for predicting eruption of mandibular premolars associated with dentigerous cyst after marsupialization. J Oral Maxillofac Surg. 2008; 66 (2): 272-6.

 

 

Endereço para correspondência:
Hécio Henrique Araújo de Morais
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