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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.11 no.3 Camaragibe Jul./Set. 2011

 

 

Uso de fluoroscopia e tomografia computadorizada para remoção de agulha fraturada

 

Use of fluoroscopy and computed tomography for removal of broken needle

 

 

Dr. Edevaldo Tadeu CamariniI; Dr. Ângelo José PavanII; Jorge Elias Kaluf TomehIII; Rafael Rodrigues DiasIII; Autran da Nóbrega AlvesIII; Gustavo Zanna FerreiraIII

I Doutor em Cirurgia - Professor adjunto de Cirurgia.
II Doutor em Patologia Oral - Professor adjunto de Cirurgia.
III Residente em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A anestesia local é fundamental no controle da dor em procedimentos odontológicos, porém a maioria das emergências ambulatoriais ocorrem durante ou imediatamente após a injeção do anestésico local. Dentre estes, podemos citar a fratura da agulha, que, apesar de incomum, pode ocorrer devido a uma técnica anestésica equivocada, ao uso de material de baixa qualidade ou à falta de colaboração do paciente. Após a fratura, o fragmento pode se mover através dos tecidos, necessitando de uma avaliação cuidadosa de um cirurgião buco-maxilo-facial antes da tentativa de recuperação desta. Várias técnicas de localização são descritas na literatura, como a tomografia computadorizada, panorâmica, detectores de metais, as radiografias convencionais e fluoroscopia transoperatória. O objetivo deste trabalho é apresentar uma breve revisão de literatura e relatar um caso de fratura de agulha em que a utilização da tomografia computadorizada de feixe cônico como um exame pré-operatório foi associada com fluoroscopia transoperatória para identificação e retirada de corpo estranho.

Descritores: Tomografia computadorizada por feixe cônico; Fluoroscopia; Fratura Agulha.


ABSTRACT

Local anesthesia is fundamental in pain control in dental procedures. Most emergencies in outpatient departments, however, occur during or immediately after the injection of local anesthetic. Among these we may mention needle fracture which, although uncommon, can occur because of an erroneous anesthetic technique, use of low-grade material or lack of cooperation on the part of the patient. After fracture, the fragment may move through the tissues, requiring careful evaluation by a maxillofacial surgeon before an attempt is made to recover it. Several location techniques are described in the literature, such as panoramic, computed tomography, metal detectors, conventional radiographs and intraoperative fluoroscopy. The aim of the present study is to review the literature and report a case of needle fracture in which the use of cone beam computed tomography as a preoperative examination was associated with fluoroscopy, perioperatively, for identification and removal of any foreign bodies.

Keywords: Cone Beam Computed Tomography; Fluoroscopy; Needle Fracture.


 

 

INTRODUÇÃO

Anestesia local é um passo fundamental no controle da dor em Odontologia. O armamentário básico para anestesia local (seringa, agulha e tubete anestésico) tem-se mantido praticamente o mesmo desde os tempos de Halsted, porém com algumas melhorias1. As agulhas vivenciaram mudanças consideráveis desde sua introdução. Antigamente, elas eram limpas após cada procedimento, afiadas e reesterelizadas. Agulhas de aço inoxidável foram introduzidas em Odontologia na década de 60 e assim permanecem.2

Aproximadamente 75% das emergências médicas relatadas em Odontologia estão relacionadas ao medo. Matsuura et al. afirmam que 54.9% das emergências que acontecem em consultório odontológico ocorrem durante ou imediatamente após injeção de anestésico local1,3. Denomina-se tripanofobia ao medo irracional a procedimentos que envolvam agulhas.

Relatos de agulhas fraturadas aparecem com pouca frequência na literatura. Pogrel fez uma estimativa com cirurgiões-dentistas da Califórnia e encontrou 1 incidente para cada 14 milhões de bloqueios de nervo alveolar inferior realizados.4

Alguns fatos são comuns aos relatos de fratura de agulhas. Dentre eles: uso inadequado de agulhas de calibre 30 curta ou extracurtas, inserção total até sua calota, dobra intencional no corpo da agulha e movimentos inesperados do paciente.

Embora incomum, o fragmento de agulha fraturado pode se movimentar dentro do tecido. O manejo de um acidente com fratura de agulha em cavidade bucal envolve encaminhamento ao especialista apropriado (cirurgião maxilo-facial) para avaliação e possível recuperação do fragmento. Diferentes técnicas têm sido descritas para auxiliar na localização: panorâmica convencional, tomografia computadorizada, detectores de metal, radiografias convencionais transoperatórias e o uso de fluoroscopia. Localizar e recuperar fragmentos de agulha são um desafio para o cirurgião buco-maxilo-facial. 5,6,7,8

O objetivo deste trabalho é apresentar uma breve revisão de literatura e relatar um caso de fratura de agulha em que a utilização da tomografia computadorizada de feixe cônico como um exame pré-operatório foi associada com fluoroscopia transoperatória para identificação e retirada de corpo estranho.

 

RELATO DE CASO

Gênero masculino, oito anos compareceu ao serviço de cirurgia buco-maxilo-facial para avaliação da localização da agulha e eventual necessidade de remoção. A fratura ocorreu durante técnica anestésica para bloqueio do nervo alveolar inferior direito.

O paciente não se queixou imediatamente após o acidente, porém evoluiu com dor e desconforto no local. Durante a consulta, foram fornecidas orientações aos familiares e foi solicitada tomografia computadorizada por feixe cônico (Figs. 1 e 2) para localização da agulha. Cortes de tomografia computadorizada mostraram um fragmento de aproximadamente 20mm, radiopaco e curvo em uma de suas extremidades, localizado no espaço pterigomandibular direito.

Devido ao desconforto persistente, optou-se pela remoção da agulha sob anestesia geral, com entubação nasotraqueal, e o paciente foi posicionado em decúbito dorsal horizontal.

Durante o procedimento, a abertura bucal foi mantida e estabilizada. Uma agulha 40x12 (calibre 18) foi inserida nos tecidos moles, e uma imagem foi obtida no plano lateral (Mobile Digital C-arm/ PHILLIPS BV Endura Koninklijke Philips Electronics N.V), uma segunda agulha foi, então, inserida, e outra imagem foi realizada para localização tridimensional (Fig. 3).

 

 

 

 

 

 

 

Após localização espacial do fragmento, foi realizada uma incisão de 4cm em mucosa bucal, na região retromolar e dissecção, seguindo o trajeto da agulha posicionada.

Após visualização direta, a agulha foi removida (Fig. 4 e 5). A área foi suturada com fio reabsorvível 4.0, após manobras hemostáticas e irrigação com solução salina. O paciente reagiu bem, com evolução satisfatória e alta hospitalar no dia seguinte.

Em retorno ambulatorial, após sete dias, apresentou-se em bom estado, sem queixas e abertura bucal mantida em 40mm.

 

 

 

DISCUSSÃO

Desde a introdução de agulhas descartáveis, as fraturas tornaram-se complicações extremamente raras durante a aplicação de injeções anestésicas em cavidade bucal2. Revisões de literatura mostram possíveis atitudes que minimizam esse acidente, como: não utilizar agulhas curtas para bloqueio alveolar inferior em adultos, não utilizar agulhas de calibre 30 para bloqueio alveolar inferior em adultos ou crianças, não curvar as agulhas antes de inseri-las no tecido, não inserir o corpo da agulha por completo até a calota no tecido mole, agir com muita cautela ao realizar injeções em crianças ou pacientes com fobia9,2,6,10,8,11. A fratura de agulha, nesse caso, ocorreu devido ao movimento inesperado da criança durante a injeção, associado à utilização de agulha curta de calibre 30, o que, segundo a literatura, aumenta os riscos de fratura.

Ainda existe controvérsia a respeito da remoção de agulha fraturada. Há autores que recomendam deixá-la no tecido ao invés de tentar sua remoção, já que encapsulam em tecido cicatricial, após algumas semanas1,2,12. Por outro lado, outros autores apoiam sua remoção, justificando a possibilidade de migração e comprometimento de estruturas vitais ou infecção. Recentemente, a remoção da agulha fraturada vem sendo indicada, primeiramente devido ao receio quanto à migração da agulha, somado às considerações legais. Além disso, a remoção da agulha alivia as preocupações psicológicas tanto do paciente quanto do profissional.9,7,8,12

Nesse caso, dor foi a principal indicação para remoção do fragmento. Tentativas de remover corpos estranhos na intimidade dos tecidos sem exata localização topográfica podem contribuir para o insucesso do procedimento. O exame por tomografia computadorizada por feixe cônico identifica, com precisão, a posição da agulha e sua relação com estruturas adjacentes, contribuindo, assim, para o planejamento operatório5. Para localização transoperatória, cita–se o uso de detectores de metal, radiografias convencionais e fluoroscopia. Detectores de metal tem como desvantagem a baixa disponibilidade para uso e o tamanho da sonda, que deve ser compatível com o campo cirúrgico. Radiografias convencionais trans-operatória são difíceis de obter e prolongam o procedimento. A Fluoroscopia permite uma rápida e imediata tomada de imagens de alta qualidade e em vários ângulos. Nesse caso, foi essencial para localização e remoção do fragmento13,14,7,15.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Recomendamos o uso de Tomografia Computadorizada por Feixe Cônico e, no transoperatório, fluoroscopia para identificação e localização topográfica do corpo estranho.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Malamed SF. Beyond the basics: emergency medicine in dentistry. J Am Dent Assoc 1997;128(7):843–54.

2. Malamed SF, Reed K, Poorsattar S. Needle breakage: incidence and prevention. Dent Clin N Am 2010:54:745-756.

3. Matsuura H. Analysis of systemic complications and deaths during dental treatment in Japan. Anesth Prog 1990;36:219–28.

4. Pogrel MA. Broken local anesthetic needles: a case series of 16 patients, with recommendations. J Am Dent Assoc 2009;140:1517–22.

5. Thompson M, Wright S, Cheng LH, et al. Locating broken dental needles. Int J Oral Maxillofac Surg 2003;32(6):642–4.

6. Dojcinovic I, Hugentobles M, Richter M. Bris d'aiguille: complication rare mais potentiellement dangeurese d'une anesthesia locale. Rev Stomatol Chir Maxillofac 2007;108:222-224.

7. Nefazati S, Shahi S. Removal of broken dental needle using mobile digital C-arm. Journal of Oral Science 2008; 50(3):351-353.

8- Augello M, Jackowski J, Gratz KW, et al. Needle breakage during local anesthesia in the oral cavity – a retrospective of the last 50 years with guidelines for treatment and prevention. Clin oral invest 2010.

9. Ethunandan M, Tran AL, Anand R, et al. Needle-breakage following inferior alveolar nerve block: implications and management. Br Dent J 2007;202(7):395–7.

10. Markakis DA. Regional anesthesia in pediatrics. Anesthesology clinics of north America 2000; 18(2) :355- 360.

11. Sakkinen J, Huppunen M, Suuronen R. Complications following local anaesthesia. Nor Tannlegeforen Tid 2005(115);48-52. 12. Malamed, S. F. Manual de Anestesia Local (5. ed.) – p. 287. Ed. Elsevier, 2005.

13. Cohen DM, Garcia CT, Dietrich AM, et al. Miniature C-arm imaging: an in vitro study of detecting foreign bodies in the emergency department. Pediatr Emerg Care 1997;13:247–9.

14. Ma CJ, Jan CM, Hsieh JS, et al. Successful localization and surgical removal of ingested sewing needles under mini C-arm fluoroscopy: a case report. Kaohsiung J Med Sci 2006;22:457-60.

15. Park SS, Carr MM. Removal of a bristle from a child's tongue base using intraoperative fluoroscopy. Int J of Ped Otor 2006 (1); 282-285.

 

 

Endereço para correspondência:
Prof. Dr. Edevaldo Tadeu Camarini
Departamento de Odontologia
Universidade Estadual de Maringá
Av. Mandacaru, 1550 - Cidade Universitária
Maringá - PR/Brasil

e-mail:
edevaldocamarini@wnet.com.br