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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.11 no.3 Camaragibe Jul./Set. 2011

 

 

Perfil epidemiológico dos pacientes submetidos à remoção dos terceiros molares na Universidade Federal do Paraná

 

Epidemiological profile of patients undergoing removal of third molars at the Federal University of Parana

 

 

Aline Monise SebastianaI; Giovana GabardoI; Juliane Slembarski MachadoI; Sara Regina Barancelli ToderoI; Rafaela Scariot de MoraesII; Delson João da CostaIII

I Graduandas do Curso de Odontologia da Universidade Federal do Paraná, Curitiba/PR, Brasil.
II Doutoranda em Estomatologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba/PR, Brasil. Mestre em Odontologia pela Universidade Federal do Paraná, Curitiba/PR, Brasil. Cirurgiã buco-maxilo-facial pela Universidade Federal do Paraná, Curitiba/PR, Brasil.
III Professor Adjunto III em Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-faciais II da Universidade Federal do Paraná, Curitiba/PR, Brasil.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Introdução: As informações contidas na anamnese do paciente associadas à análise do exame radiográfico pré-operatório são de fundamental importância no planejamento da remoção cirúrgica dos terceiros molares. Objetivo: Analisar o perfil epidemiológico dos pacientes que foram submetidos à cirurgia para a remoção dos terceiros molares na Disciplina de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Faciais II da Universidade Federal do Paraná. Metodologia: Foram analisados os prontuários de todos os pacientes atendidos pela Disciplina durante o primeiro semestre de 2010. Na ficha cirúrgica, foram avaliados o gênero, a idade, a presença de alterações sistêmicas e as alergias medicamentosas. Também foram avaliadas as radiografias panorâmicas, a fim de determinar o posicionamento radiográfico dos terceiros molares a serem removidos, seguindo as classificações de Pell e Gregory e de Winter. Resultados: O gênero predominante foi o feminino (68, 8%), na faixa etária dos 21-30 anos. Observou-se que 26% da população relatavam algum tipo de alteração sistêmica. As discrasias sanguíneas, principalmente as anemias, seguidas de alterações no sistema cardiovascular, em especial a hipertensão, foram as alterações mais prevalentes. Neste estudo a presença de alterações sistêmicas em mulheres foi 2,15 vezes maior que a prevalência dessas mesmas alterações em homens (p=0,018). Também houve uma predominância dessas alterações no grupo etário dos 21 aos 30 anos de idade (p=0,036). O medicamento mais relatado pelos pacientes como causador de alergia foi a penicilina, seguida dos diclofenacos e da sulfa. Com relação ao posicionamento radiográfico, tanto os terceiros molares superiores quanto os inferiores, apresentaram-se, em sua maioria, com angulação vertical e classe A. Quanto ao espaço no arco, os terceiros molares inferiores estiveram com maior frequência na classe II. Não houve associação estatística entre o gênero e a posição radiográfica dos terceiros molares, exceto paro os terceiros molares superiores do lado esquerdo no que se refere à angulação (p=0,002) e à profundidade no arco ( p=0,001). Conclusões: O gênero feminino foi predominante assim como o grupo dos 21 aos 30 anos. A prevalência das alterações sistêmicas na população estudada foi de 26%, destacando-se as anemias e a hipertensão. O principal medicamento causador de alergia foi a penicilina. A posição radiográfica mais prevalente foi angulação vertical, classe A para todos os terceiros molares e classe II, para o espaço no arco, nos terceiros molares inferiores.

Descritores: Cirurgia bucal; Terceiro molar; Epidemiologia; Radiografia; Anamnese.


ABSTRACT

Introduction: The Information obtained in the history taking of the patient, in association with the analysis of the preoperative radiographic examination, is essential in planning the surgical removal of third molars. Objective: To analyze the epidemiological profile of patients submitted to surgical removal of third molars in the Department of Oral and Maxillofacial Surgery at the Federal University of Paraná. Methods: The records of all patients attended in the Department during the first semester of 2010 were evaluated. Gender, age, presence or absence of systemic diseases and drug allergies were analyzed on the basis of the surgical record card. Panoramic radiographs were evaluated by determining the position of third molars in accordance with the classifications of Pell and Gregory and Winter. Results: The predominant gender was female (68.8%) in the 21 to 30-year age group. It was observed that 26% of the population reported some kind of systemic alteration. There was a higher prevalence of systemic alterations in the group of blood dyscrasias, particularly anemias, followed by alterations in the cardiovascular system, especially hypertension. The prevalence of systemic alterations in women in this study is 2.15 times greater than their prevalence in men (p=0.018). There was also a statistic predominance of these alterations in the 21 to 30-year age group (p=0.036). The drug most often reported by patients as a cause of allergy was penicillin, followed by diclofenacs and sulfa. With respect to radiographic positioning, both upper and lower third molars exhibited mostly vertical angulation, class A. As regards the space in the arc, third molars were most frequently in class II. There were no statistical associations between gender and the radiographic position of third molars, except for the left upper third molars in relation to angulation (p=0.002) and depth in the arc (p=0.001). Conclusions: The female gender was predominant, as was the 21 to 30-year age group. The prevalence of systemic alterations in the population studied was 26%, especially anemia and hypertension. The main cause of drug allergy was penicillin. The most common radiographic position was vertical angulation, class A, and class II for space in the arc, in the lower third molars.

Keywords: Oral surgery; third molar; epidemiology; radiography; medical history taking.


 

 

INTRODUÇÃO

A cirurgia para remoção de terceiros molares é um dos procedimentos mais realizados pelos cirurgões buco-maxilo-faciais. Em todos os procedimentos cirúrgicos, o planejamento pré-operatório associado à técnica adequada é de fundamental importância para diminuir a incidência de complicações1.

As informações contidas na anamnese do paciente são fundamentais. Dados, como gênero e idade, podem estar relacionados ao índice de complicações associados à cirurgia. Em 2009, Xavier e colaboradores 2 analisaram os prontuários de 2629 pacientes submetidos à remoção de terceiros molares. Os autores verificaram que o gênero mais prevalente foi o feminino (61,1%) devido à maior preocupação por parte das mulheres com relação à saúde. A idade é outro fator a ser considerado na decisão da remoção ou não dos terceiros molares. Com o envelhecimento, o osso torna-se mais calcificado e menos flexível, requerendo, assim, que uma maior quantidade de osso seja retirada para que o dente seja removido3. Almendros-Marqués e colaboradores4, em 2008, observaram que pacientes com idade inferior a 30 anos possuem um melhor prognóstico para o procedimento.

Sabe-se também que uma história médica acurada é a informação mais útil que o cirurgião pode ter para decidir se o paciente pode ser submetido com segurança a qualquer terapia planejada3. A ocorrência de alterações sistêmicas está relacionada ao aumento de complicações cirúrgicas, especialmente no trans-operatório5. Gaetti-Jardim e colaboradores6, em 2008, avaliaram a prevalência das alterações sistêmicas em 4330 prontuários de pacientes submetidos à remoção de terceiros molares. As alterações sistêmicas mostraram-se presentes em 44,13% dos pacientes, sendo que 11,44% da população apresentaram alterações cardiovasculares. A hipertensão arterial foi a grande responsável pelas alterações cardiovasculares com 85,08%.

Além dos fatores avaliados na ficha clínica do paciente, a análise da posição dos terceiros molares por meio de imagem radiográfica também é uma etapa fundamental do preparo pré-operatório, a fim de estimar o grau de dificuldade da remoção do dente bem como os riscos de complicações cirúrgicas. Existem duas classificações que nos permitem determinar a dificuldade do dente a ser removido: a classificação de Winter7 ,que relaciona a angulação do dente no arco dental, e a classificação de Pell e Gregory8, que mostra a profundidade do dente dentro do arco dental e a sua relação com o ramo ascendente da mandíbula. Segundo Medeiros e colaboradores9, baseados na classificação de Winter, nos terceiros molares inferiores, a posição mesioangulada é a que apresenta o menor grau de dificuldade de remoção, já os dentes posicionados distoangularmente e horizontalmente são os mais difíceis de serem removidos. Nos terceiros molares superiores, as angulações vertical e distoangular são as mais fáceis para a remoção do dente, enquanto a mesioangular é a mais difícil10. Quando se relaciona o terceiro molar com o ramo ascendente da mandíbula, a tendência é aumentar o grau de dificuldade, conforme aumenta seu número na classificação (I, II e III). Em relação a sua profundidade no arco, o grau de dificuldade aumenta na mesma sequência (A, B e C)9.

O objetivo do estudo foi analisar o perfil epidemiológico dos pacientes que foram submetidos à cirurgia de remoção dos terceiros molares na Disciplina de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Faciais II (CTBMF II) da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Seleção da amostra

Foram avaliados os prontuários de pacientes que procuraram voluntariamente os serviços da Disciplina de CTBMF II, na UFPR, durante o período de fevereiro a julho de 2010 e que tiveram, ao menos, um terceiro molar removido, sob anestesia local. Foram excluídos do estudo prontuários de pacientes que não apresentavam a ficha cirúrgica, radiografia panorâmica ou termo de autorização de cirurgia devidamente assinado.

O projeto foi aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa do Setor de Ciências da Saúde da UFPR (CAEE 0101.0.091.000-10).

Análise da ficha cirúrgica

Foram avaliados gênero (feminino e masculino), idade (12-20/21-30/acima de 30 anos) e presença de alterações sistêmicas de cada paciente no momento do exame clínico. Essas alterações foram subdivididas de acordo com os sistemas envolvidos (cardiovascular, respiratório, endócrino, sanguíneo, hepático, renal e outros). Também foram avaliados os relatos de alergia medicamentosa.

Análise radiográfica

Todas as radiografias panorâmicas analisadas foram realizadas no aparelho Siemens Orthophos 90 KV/ 12 mA, da disciplina de Radiologia Odontológica da UFPR, no momento da avaliação pré-operatória do paciente. As radiografias foram realizadas como protocolo da disciplina de CTBMF e não para a pesquisa em questão. A interpretação das imagens foi realizada pelo mesmo examinador, previamente calibrado, em ambiente escurecido e com negatoscópio apropriado. Foi determinado o posicionamento radiográfico de todos os terceiros molares removidos, seguindo as classificações Winter7 e de Pell e Gregory8. De acordo com Winter7, os terceiros molares podem encontrar-se na posição vertical, mesioangular, distoangular, invertida e ainda em lInguoversão ou vestibuloversão. Em relação à borda anterior do ramo mandibular (Pell e Gregory), o dente impactado pode estar totalmente anterior à borda (Classe I), pode estar metade coberto pela porção anterior do ramo (Classe II) e totalmente coberto pela borda anterior do ramo (Classe III). Ao avaliar a profundidade do dente impactado (Pell e Gregory), este pode estar no mesmo nível do plano oclusal do segundo molar (classe A), pode estar entre o plano oclusal e a linha cervical do segundo molar (classe B) e pode estar abaixo da linha cervical do segundo molar (classe C)8.

Análise Estatística

Os dados coletados do prontuário foram inseridos em uma planilha especialmente desenvolvida para o estudo, no Microsoft Office Excel® 2007 para Windows XP. A avaliação estatística foi realizada por meio de análise de frequência e de testes estatísticos específicos (Statistical Package for Social Science – SPSS; version 15.0; SPSS Inc. Chicago, IL, USA), com o intervalo de confiança de 95%.

 

RESULTADOS

Um total de 176 prontuários foram avaliados (Fluxograma 1). A mediana da idade no estudo foi de 23 anos (13 –64). A faixa etária dos pacientes foi subdividida em três grandes grupos: até 20 anos de idade (n= 51); de 21-30 anos (n= 94) e acima de 30 anos (n=31). O gênero feminino (n=121/68,8%) foi predominante no estudo. No gênero feminino, a mediana da idade foi de 22 anos, e, no gênero masculino, 24 anos. No que se refere à presença de alterações sistêmicas, observou-se que 26% (n=46) da população relatavam algum tipo de alteração. A maior prevalência das alterações foi relacionada ao grupo das discrasias sanguíneas, particularmente as anemias, seguidas pelas alterações no sistema cardiovascular, em especial, a hipertensão. Nenhum paciente referiu alteração no sistema renal. A presença de alterações sistêmicas foi associada estatisticamente com o gênero (Teste do Qui-quadrado – p=0,018). A partir dessa associação, foi calculada a razão de prevalência entre alterações sistêmicas e gênero [RP=2,15 (1,07-4,31)], indicando que a prevalência de alterações sistêmicas em mulheres, nesse estudo, é 2,15 vezes maior que a prevalência dessas mesmas alterações em homens.

 

 

 

Com relação à idade e à presença de alterações sistêmicas, também houve associação estatisticamente significante (Teste de Mann-Whitney – p=0,036). Houve uma predominância dessas alterações no grupo etário dos 21 aos 30 anos de idade. A presença das alterações sistêmicas distribuídas de acordo com a faixa etária pode ser observada na tabela 01.

As alergias medicamentosas relatadas pelos pacientes tiveram uma prevalência de 17,65 % no grupo dos pacientes até 20 anos de idade, 18,98% no grupo dos 21-30 anos e 12,9% no grupo acima de 30 anos. O medicamento mais relatado pelos pacientes como causador de alergia foi a penicilina, seguida dos diclofenacos e da sulfa. Em menor frequência, ainda foram relatadas alergias ao ácido acetil salicílico, à azitromicina, ao cetoprofeno, aos corticosteroides, aos compostos de morfina, à dipirona, à nimesulida e ao paracetamol. Não houve associação estatística significante entre os relatos de alergias e o gênero (Teste do Qui-quadrado - p=0,206) nem entre os relatos de alergias e a faixa etária (Teste de Mann-Whitney - p=0,845).

 

 

 

Para os 176 prontuários de pacientes analisados, foram removidos 608 terceiros molares, sendo 302 superiores e 306 inferiores, correspondendo a uma média de 3,45 dentes extraídos por paciente.

Quanto ao posicionamento radiográfico, de acordo com a classificação de Winter, os terceiros molares superiores apresentaram-se com maior frequência na posição vertical nos gêneros feminino (n=92) e masculino (n=66). A posição distoangular foi a segunda mais prevalente, seguida da posição mesial e horizontal, em ambos os gêneros. Não houve associação estatística entre o gênero e a angulação dos terceiros molares superiores do lado direito (Teste do Qui-quadrado - p=0,167). Entretanto nos terceiros molares superiores do lado esquerdo, houve essa associação estatística (Teste do Qui-quadrado - p=0,002). Observa-se uma predominância de pacientes do gênero feminino com os seus terceiros molares superiores do lado esquerdo em posição mesioangulada e distoangulada. Nos terceiros molares inferiores, a posição vertical também foi a mais prevalente em ambos os gêneros, seguida da posição mesioangular, distoangular e horizontal. Não houve associação estatística entre o gênero e a angulação dos terceiros molares inferiores, seja do lado direito ou esquerdo. Nenhum dente se apresentou nas posições invertida, línguoversão e vestíbuloversão, descritas por Winter7. O gráfico 01 mostra a angulação dos terceiros molares e sua relação com o gênero.

 

 

 

Em relação à classificação de Pell e Gregory, na variável profundidade, para o gênero feminino, os dentes superiores apresentaram-se com maior frequência na posição A seguida da posição C. O gênero masculino também teve na posição A sua maior prevalência, seguido da posição B, diferentemente do gênero feminino. Nos dentes inferiores, ambos os gêneros tiveram a prevalência semelhante tanto para a profundidade A quanto para a B e C, nessa ordem. Não houve diferença estatística entre a profundidade dos terceiros molares e o gênero, exceto pelos terceiros molares superiores do lado esquerdo (Teste do Qui-quadrado - p=0,001). Todos os dados citados podem ser visualizados no gráfico 02.

Quanto à variável espaço no arco mandibular, a classe II foi a mais frequente e a classe III, a menos frequente para ambos os gêneros. Não houve associação estatística entre o espaço no arco dos terceiros molares inferiores e o gênero. A distribuição dos terceiros molares inferiores de acordo com o espaço no arco pode ser visualizada no gráfico 03.

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

A remoção cirúrgica de terceiros molares é um dos procedimentos que causam maiores preocupações aos cirurgiões-dentistas devido ao fato de estar associada a um risco relativamente alto de complicações trans e pós-operatórias. Para se obter o melhor resultado no momento da cirurgia bem como no pós-operatório do paciente, alguns fatores devem ser avaliados em fases que antecedem o procedimento, como o gênero, a idade, a história médica do paciente e o posicionamento radiográfico do dente a ser removido.

Dos pacientes que procuraram o serviço de CTBMF II da UFPR para remoção dos terceiros molares, 68,8 % com do gênero feminino. Esse resultado corrobora com a grande maioria dos estudos encontrados na literatura2,13,14,15 e pode ser explicado pelo fato de que as mulheres possuem uma preocupação maior com sua saúde.

Os pacientes analisados em nosso estudo foram distribuídos em três grupos, de acordo com sua faixa etária. Houve uma prevalência no grupo dos 21 aos 30 anos, assim como no estudo de Xavier10, que observou a mesma prevalência nos pacientes atendidos na Clínica de Cirurgia da Faculdade de Odontologia de Bauru, da Universidade de São Paulo. Chuang e colaboradores11 realizaram um estudo para estimar a frequência de complicações após a cirurgia de remoção de terceiros molare, tendo a idade como fator de risco primário. Verificaram que os pacientes com idade acima de 25 anos foram associados com um risco aumentado de complicações. Já no estudo de Haug e colaboradores12, foram avaliados 3.760 pacientes, de 25 anos de idade ou mais, que foram submetidos à cirurgia de remoção de terceiros molares por cirurgiões buco-maxilo-faciais, a fim de verificar a frequência de complicações trans e pós-operatórias nesses pacientes. Encontraram que a osteíte alveolar foi o problema mais observado no pós-operatório (0,2% - 12,7%), seguida da parestesia do nervo alveolar inferior (1,1% - 1,7%). A parestesia do nervo lingual foi encontrada em 0,3 % da amostra. Todas as outras complicações ocorreram com uma frequência menor de 1%, o que levou os autores a concluírem que a cirurgia de terceiros molares em pacientes com 25 anos de idade ou mais está associada com morbidade mínima, baixa incidência de complicações pós-operatórias e impacto mínimo sobre a qualidade de vida do paciente.

A maior prevalência de alterações sistêmicas encontradas em nosso estudo foi relacionada ao grupo das discrasias sanguíneas, em especial as anemias, seguidas das alterações no sistema cardiovascular, particularmente as hipertensões. Esses resultados diferem dos encontrados no estudo de Gaetty-Jardim e colaboradores6, no qual as alterações cardiovasculares foram as mais prevalentes, seguidas das alterações gastrointestinais. Vale ressaltar que, nas fichas cirúrgicas analisadas para o estudo em questão, as perguntas da anamnese questionavam se o paciente é portador de alguma alteração sistêmica ou se já foi portador em algum momento de sua vida. Possivelmente isso gerou um viés, colocando as alterações relacionadas com o grupo das discrasias sanguíneas com maior prevalência que as alterações cardiovasculares, devido ao fato de as anemias serem geralmente de quadro reversível e temporário, diferente das alterações cardiovasculares que costumam acompanhar o paciente por toda a vida.

Xavier10, analisando os registros de aferição da pressão sanguínea dos pacientes durante o exame clínico, encontrou que 27,95 % dos pacientes possuíam alteração do nível de pressão sanguínea. Quando esses pacientes foram questionados sobre a presença de alguma alteração cardiovascular, 77,8% responderam não apresentar alterações. A hipertensão quando branda ou moderada (pressão sistólica igual menor que 200mmHg ou pressão diastólica menor que 110mmHg) não é usualmente um problema em cirurgia bucal ambulatorial. Os cuidados com pacientes hipertensivos incluem o uso do protocolo de redução da ansiedade e monitorização dos sinais vitais. A adrenalina contida nos anestésicos locais deve ser usada cautelosamente. Cirurgia bucal eletiva em pacientes com hipertensão grave (pressão sistólica igual ou superior a 200mmHg ou pressão diastólica igual ou superior a 110mmHg) deve ser adiada, até que a hipertensão seja controlada. Cirurgia bucal de emergência nesses pacientes com hipertensão grave deve ser realizada em ambiente hospitalar, para permitir que a pressão seja controlada adequadamente3.

Em nosso estudo, as mulheres apresentaram uma prevalência de alterações sistêmicas 2,15 vezes maior que os homens (p=0,018), o que pode ser explicado por uma tendência maior das mulheres em se sentirem doentes e ao mesmo tempo ir mais em busca de cuidados para a sua saúde, realizando exames e procurando atendimento médico especializado. Em um estudo de Grossi e colaboradores15, em 2007, que avaliaram os fatores de risco para o desconforto severo após cirurgia de terceiros molares inferiores, encontraram que as mulheres tiveram duas vezes mais chances que os homens de experimentar esse desconforto. Além disso, as mulheres apresentaram um risco seis vezes maior de se sentirem doentes do que o sexo masculino e um risco de 2-2,5 vezes maior de experimentar interferência nas atividades diárias, como problemas ao comer, falar e mudanças na aparência após o procedimento cirúrgico15.

Também houve uma predominância das alterações sistêmicas no grupo etário dos 21 aos 30 anos de idade (p=0,036), o que pode ser explicado pelo fato de esse grupo ser o mais representativo da amostra.

As reações alérgicas representam um terço das reações adversas dos medicamentos e são causa importante de morbidade e mortalidade, sendo considerado problema de saúde pública. Estima-se que reações anafiláticas por drogas ocorram em cerca de 0,95% da população em geral16. O medicamento mais relatado pelos pacientes como causador de alergia em nosso estudo foi a penicilina. Apesar de anafilaxia por penicilina ser um evento raro, esse medicamento é responsável por aproximadamente 75% dos casos fatais de anafilaxia nos Estados Unidos16. No estudo de Kurt e colaboradores17, em 2009, encontrou-se que os analgésicos foram os maiores causadores de reações alérgicas na população das Unidades de Saúde da Turquia (37,2%), seguidos dos antibióticos (24,2%) e outras drogas (20,1%). É importante ressaltar que esses resultados são baseados em relatos de pacientes e não, em exames bioquímicos do sangue, o que pode gerar alterações de resultados. A história familiar de alergia a medicamentos tem sido sugerida como fator de risco para pacientes com alergia à penicilina. Além disso, sabe-se que pacientes do gênero feminino bem como pacientes portadores de asma, rinite alérgica e hipertensão arterial estão associados a um risco aumentado de hipersensibilidade aos medicamentos17.

Quanto ao posicionamento radiográfico, de acordo com a classificação de Winter, os terceiros molares superiores apresentaram-se com maior frequência na posição vertical nos gêneros feminino e masculino, a segunda posição mais prevalente foi a distoangular, o que está de acordo com outros estudos2,13. Nos terceiros molares inferiores, a posição vertical também foi a mais prevalente em ambos os gêneros, seguida da posição mesioangular, corroborando outros trabalhos2,18. Entretanto, no estudo de Vasconcellos13, houve uma diferença entre os gêneros na angulação dos terceiros molares inferiores: no gênero masculino, a posição mais prevalente foi a vertical, e, no gênero feminino, a mesioangulada.

Em relação à classificação de Pell e Gregory, na variável profundidade, para o gênero feminino, os dentes superiores apresentaram-se com maior frequência na posição A seguindo-se da posição C. O gênero masculino também teve na posição A sua maior prevalência, seguido da posição B, diferentemente do gênero feminino. No estudo de Xavier2, a prevalência foi maior para A, seguida de C, sem distinguir os gêneros. Nos dentes inferiores, ambos os gêneros tiveram a prevalência semelhante tanto para a profundidade A quanto para a B e C, respectivamente. Entretanto, o estudo de Trento18 apresentou a ordem de prevalência nos dentes inferiores nessa ordem: A, C, B. Quanto à variável espaço no arco mandibular, a classe II foi a mais frequente e a classe III a menos frequente para ambos os gêneros, o que também foi encontrado nos estudos de Xavier2 e de Trento18.

Nos resultados de nosso estudo, foi encontrada uma associação estatística entre o gênero e os terceiros molares superiores do lado esquerdo no que se refere à angulação e à profundidade no arco. Essa associação não foi encontrada em outros estudos.

 

CONCLUSÕES

• O gênero feminino foi predominante. Também houve predominância do grupo dos 21 aos 30 anos;

• A prevalência das alterações sistêmicas na população estudada foi de 26%, destacando-se as anemias e a hipertensão;

• O medicamento mais relatado como causador de alergia foi a penicilina;

• A posição radiográfica mais prevalente foi angulação vertical, classe A, para todos os terceiros molares. Em relação ao espaço no arco, a classe II foi a mais frequente nos terceiros molares inferiores.

 

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Endereço para correspondência:
Aline Monise Sebastiani
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