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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.11 no.4 Camaragibe Out./Dez. 2011

 

 

Dispositivo ósseo-suportado para expansão maxilar: relatos de casos

 

With bone anchorage device for surgically assisted maxillary expansion: a case report

 

 

Aline Nery de LimaI; Elizabeth DetoniII; Basílio de Almeida MilaniIII; Fernando Simões MorandoIV; Waldyr Antônio JorgeV

I Aluna de especialização de cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial da FUNDECTO – USP.
II Residente do Hospital Municipal do Campo Limpo - SP.
III Professor da especialização de cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial da FUNDECTO – USP.
IV Professor da especialização de cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial da FUNDECTO – USP.
V Professor Titular do Departamento de Estomatologia da Faculdade de Odontologia da USP e coordenador da Especialização em cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial da FFO – USP.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A expansão maxilar cirurgicamente assistida é uma alternativa para a correção de deficiências transversais da maxila. Em pacientes em fase de crescimento, essa deficiência é corrigida com ortodontia ou com aparelhos ortopédicos. Entretanto, em pacientes adultos em que a sutura intermaxilar se encontra consolidada, lança-se mão dessa técnica cirúrgica. A quantidade de expansão varia de acordo com a necessidade individual de cada paciente e pode ser realizada com aparelhos distratores dento ou ósseo suportados. Esse artigo relata três casos clínicos de pacientes com deformidades dentofaciais corrigidas com o aparelho de Rotterdam. Esse tipo de aparelho é ósseo suportado e possui algumas vantagens em relação aos outros, podendo ser utilizado em pacientes com problemas periodontais e pacientes desdentados parcial ou total. Conclui-se que o aparelho distrator de Rotterdam é uma alternativa para pacientes com deficiência transversal de maxila, sendo de fácil manuseio, fácil instalação, e suas contraindicações e complicações são baixas.

Descritores: Expansão maxilar; Osteogênese por distração.


ABSTRACT

The surgically assisted maxillary expansion is an alternative for correction of transverse maxillary deficiencies. In patients undergoing this growth deficiency is corrected with orthodontic appliances or, as in adults, where the palate center is consolidated, it makes use of this surgical technique. The amount of expansion varies with the individual need of each patient, and can be performed with equipment distracter tooth borne or bone borne. In this article we report 3 cases of patients with dentofacial deformities corrected with The Rotterdam Palatal Distractor. This distractor is bone borne has several advantages over others, as it can be used in patients with periodontal problems, total edentulous patients or even patients with poor oral hygiene. After reporting these cases, we conclude that the distractor of Rotterdam will be a great alternative for patients with transverse maxillary deficiency, and easy to use, easy to install and its rate of contraindications and complications is low.

Keywords: Maxillary expansion, Osteogenesis, Distraction.


 

 

INTRODUÇÃO

A deficiência transversal da maxila é uma deformidade dentofacial que normalmente é corrigida em pacientes na fase de crescimento com ortodontia1. Entretanto, em pacientes adultos que apresentam a sutura intermaxilar consolidada e deficiências maiores do que 5mm, essa técnica nem sempre é possível. Nesses casos, uma das alternativas é a Expansão Maxilar Cirurgicamente Assistida (EMCA). Esse procedimento fornece espaço para alinhar os dentes, e causa um alargamento da base apical da maxila e abóbada palatina, providenciando espaço para a língua e uma correta deglutição, em adição há uma melhora na respiração7. Esse tratamento envolve uma osteotomia visando a uma diminuição da resistência óssea e a uma distração entre as duas maxilas7.

Com relação ao tipo de ancoragem, existem dois tipos de aparelhos, os dento suportados e os ósseo suportados2. Os dento suportados têm algumas contraindicações em relação aos ósseos suportados, como pacientes que não possuem um certo número de dentes, que vão servir de suporte para o aparelho; pacientes com doença periodontal; ou em pacientes desdentados totais, ficando impossível sua utilização. Os aparelhos ósseo suportados podem ser utilizados nessas situações, já que sua ancoragem será puramente em tecido ósseo. Toda expansão ocorrerá devido ao distanciamento das duas maxilas, não influenciando no tratamento o número de dentes ou a saúde periodontal do paciente2.

A escolha correta do aparelho expansor é de suma importância para o sucesso do tratamento, e, caso seja utilizado um incorreto, as consequências podem variar desde uma ausência de expansão até a perda de elementos dentários2.

Neste artigo, iremos relatar três casos clínicos de EMCA da maxila em que foram utilizados um dispositivo ósseo suportado, a Placa Distratora de Rotterdam, discutindo suas possíveis indicações, vantagens, contraindicações e complicações.

 

RELATO DE CASO

Caso clínico 1 – Paciente dentada total na maxila com doença periodontal

Paciente com 42 anos de idade, gênero feminino apresentava atresia transversal de maxila com indicação de EMCA para aumento de 5 mm no arco superior. A maxila da paciente apresentava-se dentada total com presença de doença periodontal .

A paciente foi submetida à anestesia geral; em seguida, foi realizada uma incisão em fundo de sulco para a realização da osteotomia Le Fort I subtotal, que envolveu osteotomias da parede lateral da maxila, estendendo-se da fossa pterigomaxilar até a abertura piriforme, osteotomia da sutura intermaxilar, do septo nasal e a separação do processo pterigoide do túber maxilar (Figura 1). Após as osteotomias, o dispositivo de Rotterdam foi instalado sem incisões na mucosa, acima dos ápices dos pré-molares e ativado até formar um diastema de 1 mm entre os incisivos centrais superiores. Após a instalação do dispositivo, houve abundante irrigação com soro fisiológico estéril, aspiração e, por fim, a sutura. O aparelho foi ativado novamente após cinco dias do ato cirúrgico, sendo ativado 1 mm por dia.

 

 

 

A medicação usada no pós-operatório nos primeiros cinco dias foi analgésico, anti-inflamatório e antibiótico. Durante o período de ativação (primeiros cinco dias após o ato cirúrgico), nós utilizamos codeína associada ao paracetamol para amenizar a dor provocada pela ativação do aparelho sobre a mucosa palatina.

Após a obtenção do diastema programado, foi realizada a fase de contenção, sendo essa feita com o próprio dispositivo de Rotterdam, que foi travado com um fio de aço e trefilado, mantido em posição por cinco meses sem ativação (Figura 2). A remoção do aparelho foi realizada após cinco meses do ato cirúrgico, sob anestesia local, depois da verificação de formação óssea na sutura intermaxilar através da radiografia oclusal.

 

 

 

Caso Clínico 2 – Paciente dentado total

Paciente com 33 anos de idade, gênero masculino, apresentava atresia transversal de maxila com a indicação de EMCA para aumento de 6 mm no arco superior, que se apresentava dentado total. Depois de o paciente ser submetido à anestesia geral, foram realizadas osteotomias da parede lateral da maxila até a abertura piriforme, da sutura intermaxilar, do septo nasal, e a separação do processo pterigoide do túber maxilar, finalizando a Le Fort I subtotal. Após as osteotomias, foi instalado no palato o dispositivo de Rotterdam (Figura 3), sem incisões na mucosa, e ativado, até formar um diastema de 1 mm entre os incisivos centrais superiores. E em seguida, houve irrigação da maxila com soro fisiológico estéril e sutura da mucosa.

Após cinco dias do ato cirúrgico, o dispositivo foi ativado 1 mm por dia, por um período de seis dias. Durante esse período, o paciente usou o protocolo no pós-cirúrgico de antibióticos, anti-inflamatórios, e analgésicos para controlar suas queixas álgicas.

Obtendo o diastema programado de 6 mm, o dispositivo de Rotterdam foi removido com anestesia local e, em seguida, foi colocado um splint palatino (Figura 4), feito de resina reforçado com metal, como contenção por um período de cinco meses, até se obter a imagem sugestiva de formação óssea na sutura intermaxilar através da radiografia oclusal.

 

 

 

 

 

Caso Clínico 3 – Paciente dentada parcial

Paciente com 27 anos de idade, gênero feminino apresentava atresia transversal de maxila com indicação de EMCA para aumento de 7 mm na arcada superior que se apresentava parcialmente dentada. A paciente foi submetida à anestesia geral para a realização de osteotomia Le Fort I subtotal, que envolveu a parede lateral da maxila da fossa pterigomandibular até a abertura piriforme, a sutura intermaxilar, o septo nasal e a separação do processo pterigoide do túber maxilar. Após o término das osteotomias, foi instalado, na mucosa palatina, o aparelho de Rotterdam, sem incisões na mucosa, e ativado para separar 1 mm os incisivos centrais superiores. Em seguida, foi feita irrigação com soro fisiológico estéril, aspiração e sutura.

O dispositivo foi ativado cinco dias após o ato cirúrgico, sendo ativado 1mm por dia. Depois de obtido o diastema programado na paciente, iniciou-se a fase de contenção, onde foi mantido o próprio aparelho (Figura 5), que foi travado com um fio de aço e trefilado pelos orifícios junto à haste do dispositivo, que foi usado por um período de cinco meses, até consolidação óssea da sutura intermaxilar, confirmada por uma radiografia oclusal.

 

 

 

DISCUSSÃO

A expansão maxilar cirurgicamente assistida é um procedimento indicado para corrigir deficiências maxilares transversais maiores que 5mm em pacientes com sutura palatina mediana já consolidada1. Um fator muito importante para o sucesso dessa terapêutica é utilizar um dispositivo adequado para fazer a expansão das maxilas. Existem dois tipos de aparelhos com relação ao tipo de ancoragem, um ancorado em dentes e outro no tecido ósseo. Os dispositivos dento suportados possuem algumas contraindicações, como nos casos de pacientes desdentados parciais, que não possuem um número suficiente de dentes para servir de suporte para o aparelho, em pacientes com a presença de doença periodontal nos dentes em que será fixado o aparelho e nos casos de pacientes desdentados superiores, ficando impossível sua utilização7. Mesmo em pacientes dentados totais sem a presença de doença periodontal, alguns trabalhos mostram que, durante a expansão com esses aparelhos, há uma expansão da arcada dentária devido à movimentação de dentes e não, da estrutura óssea e sugerem para compensar essa discrepância sobrecorrigir em até 30% o valor da expansão7, tornando o prognóstico do caso imprevisível, pois nem sempre temos condições de diagnosticar se a expansão ocorreu devido à inclinação dentária ou se foi um movimento puramente ósseo ou uma associação dos dois fatores.

A placa distratora de Rotterdam instalada nos casos clínicos apresentados é um aparelho usado na EMCA com ancoragem somente em tecido ósseo. Portanto, toda expansão que ocorrer será devido ao distanciamento entre as duas maxilas. O número de dentes e a saúde periodontal do paciente não influenciam no tratamento. No caso clínico 1, a paciente apresentava doença periodontal generalizada na maxila; no caso clínico 2, a escolha do distrator buscou evitar uma possível inclinação dentária durante a expansão, e, no caso clínico 3, a paciente apresentava ausência de alguns dentes na arcada superior esquerda, daí ser indicado o uso do Rotterdam. Apesar da versatilidade, existem algumas contraindicações, como, por exemplo, em pacientes classe II de Angle, pois, quando ocluem, podem tocar os incisivos inferiores no aparelho, o que pode desestabilizá-lo e até fraturá-lo, e em pacientes que possuem palatos com pouca concavidade (rasos) também são impeditivos do uso de Rotterdam14.

O aparelho é de fácil manuseio e pode ser facilmente instalado e ativado, o que é benéfico3. Nenhum parafuso é necessário para sua fixação óssea, o que permite um tratamento ortodôntico simultâneo com o aparelho fixo. Desse modo, o tratamento pode ser concluído em um período mais curto de tempo, e não há recidivas 3.

O aparelho de Rotterdam, quando totalmente desativado, possui duas medidas no seu menor eixo, 9mm e 13mm. Antes de programar as medidas para a distração, deve-se observar a largura do palato, pois, em alguns casos, como em palatos em que o rebordo alveolar encontra-se mais distante da sutura intermaxilar, o aparelho precisa ser ativado antes de seu encontro com a mucosa. Dessa forma, há um aumento do seu eixo em alguns milímetros, diminuindo sua capacidade de expansão. A instalação do aparelho começa pela escolha do tamanho mais adequado; o menor está indicado para palatos mais ogivais e o maior para os outros casos. Apesar de existirem duas medidas, quando os aparelhos são ativados, eles têm a mesma capacidade de expansão que é de 19 mm7.

Após a escolha do tamanho e da verificação de que não há contraindicações, a colocação do aparelho é feita após o término das osteotomias. Nos casos descritos, a osteotomia realizada foi a Le Fort I subtotal1, que tira toda a resistência óssea possível das maxilas. A placa distratora deve ser posicionada acima dos ápices dos dentes posteriores, geralmente acima dos pré-molares, mas, se for necessária uma expansão maior na região posterior, o aparelho pode ser posicionado acima dos ápices dos molares7. As hastes laterais têm que ser simetricamente apoiadas na maxila, tanto no sentido horizontal como vertical e ântero-posterior. Caso isso não ocorra durante a ativação, a haste do eixo principal do aparelho pode sofrer um desvio inclinando para as regiões de pré-molares e caninos, impossibilitando a continuação da ativação.

Essa dificuldade de posicionamento do aparelho nos levou à instalação sem realizar as incisões que M. J. Koudstaal et al. afirmam serem necessárias. A grande desvantagem disso é um pós-operatório um pouco mais dolorido, pois, durante a ativação do aparelho, as hastes laterais vão pressionando e necrosando a mucosa palatina, até encostar-se ao tecido ósseo. Nesse momento, não há mais dor na ativação. Para contornar esse problema álgico, temos o costume de manter medicações analgésicas durante o período de ativação. O ritmo de ativação nos casos descritos foi de 1 mm por dia. A dificuldade de higienização do aparelho também é uma desvantagem, pois a quantidade de resíduos que acumula entre suas hastes é grande e pode vir a atrapalhar o período de ativação. Seu custo é elevado em relação aos distratores dento suportados, o que pode influenciar na escolha no distrator.

No período de consolidação óssea, temos duas opções: uma é travar o aparelho passando um fio de aço e trefilando por dois orifícios que existem próximos à articulação do Rotterdam com a haste lateral (Casos 1 e 3), deixando esse aparelho presente por, no mínimo, cinco meses. Outra opção é substituir o aparelho por um splint palatino, feito em resina, reforçado com metal (Caso 2).

A remoção do aparelho é feita com anestesia local e uma pequena incisão linear na mucosa, e somente é realizada após a verificação da existência de formação óssea na sutura intermaxilar que pode ser vista em uma radiografia oclusal7.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Placa Distratora de Roterdam mostrou-se eficiente, de fácil instalação, fácil manuseio e com um baixo índice de complicações nos casos apresentados. Dessa forma, consideramos ser um dispositivo que pode ser usado para realizar a EMCA.

 

REFERÊNCIAS

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