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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.11 no.4 Camaragibe Out./Dez. 2011

 

 

Oleato de etanolamina 5% como opção ao tratamento cirúrgico dos hemangiomas orais: relato de caso

 

Ethanolamine oleate use as an alternative to surgical treatment of oral hemangiomas: a case report.

 

 

José Zenou Costa FilhoI; Carlos Alfredo Isidoro Sampaio dos SantosII; Mariana Cavalcante CostaIII; Pedro Jorge Cavalcante CostaIV; Stela Maris Wandreley NobreV

I Mestre em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial, Professor Assistente II da Disciplina de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial da Universidade Federal de Alagoas.
II Cirurgião-dentista, graduado pela Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Alagoas.
III Estudante de Graduação da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Alagoas.
IV Cirurgião-dentista, graduado pela Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Alagoas.
V Mestre em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial, Professora Assistente II da Disciplina de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial da Universidade Federal de Alagoas.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O hemangioma é uma proliferação benigna dos vasos sanguíneos, sendo considerado um hamartoma e não, um neoplasma verdadeiro. São lesões assintomáticas, que seu crescimento progressivo pode facilitar injúrias traumáticas locais, causando dor, ulcerações e sangramentos inesperados, que, dependendo da localização, torna-se de difícil controle, sobretudo quando de natureza arterial. A excisão cirúrgica convencional, eletrocauterização, laserterapia, embolização, crioterapia e escleroterapia química são opções terapêuticas para o tratamento dos hemangiomas orais. O presente trabalho tem como objetivo apresentar uma alternativa ao tratamento cirúrgico dos hemangiomas orais por meio do relato de um caso clínico de um hemangioma no palato, onde foi proposto como opção terapêutica infiltrações intralesionais de oleato etanolamina a 5%. O caso encontra-se proservado por um período de um ano.

Descritores: Hemangioma; Escleroterapia; Hamartoma.


ABSTRACT

The hemangioma is a benign proliferation of blood vessels and is considered a hamartoma and not a true neoplasm. The lesions are asymptomatic and his progressive growth can cause traumatic injuries causing pain, ulceration and bleeding that depending on the region may become difficult to control, especially when bleeding is arterial. Conventional surgical excision, eletrocautery, laser therapy, embolization, cryotherapy, administration of interferon and chemical sclerotherapy are options therapeutics for treatment of oral hemangiomas. This work provides a review of literature and show alternative to surgical treatment of oral hemangiomas through a clinical case of hemangioma on the palate that was treated with intralesional infiltrations with ethanolamine oleate 5%.This case is proserv for a year.

Keywords: Hemangioma; Sclerotherapy; Hamartoma.


 

 

INTRODUÇÃO

O hemangioma é uma proliferação benigna dos vasos sanguíneos, sendo considerado um hamartoma e não um, neoplasma verdadeiro. São lesões assintomáticas, que se apresentam clinicamente como um aumento de volume séssil, delimitado, de coloração violácea, com superfície lisa ou nodulada de consistência amolecida à palpação. Essas lesões ocorrem basicamente na infância, embora alguns casos se desenvolvam em adultos1, havendo uma predileção pelo sexo feminino. Os lábios, a língua, mucosa jugal e o palato são as regiões orais de maior incidência dessa malformação2.

O crescimento progressivo da lesão pode facilitar injúrias traumáticas locais, causando dor, ulcerações e sangramentos inesperados que, dependendo da localização, torna-se de difícil controle, sobretudo quando de natureza arterial.

É fundamental que se faça um correto diagnóstico clínico, enfocando o diferencial com outras lesões. Assim, a vitropressão (diascopia) e a punção constituem-se de manobras semiotécnicas eficazes para tal diferenciação.

A excisão cirúrgica convencional, eletrocauterização3,4, laserterapia5, embolização, crioterapia e escleroterapia química são opções terapêuticas encontradas na literatura para os hemangiomas orais.

O oleato de monoetanolamina a 5% (ETHAMOLIN®) é um derivado do ácido oleico, com propriedades hemostáticas comprovadas. O componente oleico provoca a coagulação local por meio da ativação do fator de Hagemman, e a etanolamina inibe a formação do coágulo de fibrina pela quelação do cálcio. A ação conjunta dessas substâncias permite um equilíbrio hemostático, evitando a hemorragia após sua administração nas lesões vasculares6,7,8. O Ethamolin® 5% atua primariamente por irritação da camada íntima endotelial da veia e produz uma resposta inflamatória estéril dose-relacionada. Isso resulta em fibrose da parede do vaso e possível oclusão da veia.

A escleroterapia com essa substância está contraindicada em situações de hipersensibilidade, infecções agudas, doenças sistêmicas graves, arteriopatias oclusivas, trombose venosa profunda, pacientes senis, gestação e aleitamento, úlcera de estase, flebite aguda e edema grave.

 

RELATO DE CASO

Paciente gênero feminino, leucoderma, 57 anos procurou o serviço de cirurgia e traumatologia buco-maxilo-facial da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Alagoas, queixando-se do aparecimento de um caroço roxo sem sintomatologia dolorosa no céu da boca, há aproximadamente 2 meses.

Ao exame físico intraoral, constatou-se um aumento de volume, de consistência amolecida, bem delimitado, não pulsátil, apresentando coloração violácea, medindo aproximadamente 15mm na região de transição entre o palato duro e o mole (Figura 1).

 

 

 

Foi realizada a vitropressão sobre a lesão no final se verificou isquemia sobre esta (Figura 2), denotando tratar-se de uma lesão vascular. Em seguida, foi feita a punção cuja aspiração apresentou conteúdo sanguinolento, confirmando mais uma vez que estávamos diante de uma lesão vascular. Após a realização de um aguçado exame clínico, acrescido das manobras semiotécnicas anteriormente citadas, chegou-se à conclusão de que a referida lesão era um hemangioma.

Durante a anamnese, verificou-se que a paciente não apresentava complicações e condições sistêmicas que contraindicassem a escleroterapia química como opção terapêutica para tal malformação.

 

 

 

A escleroterapia foi iniciada realizando-se infiltrações intralesionais de 0,3 ml de oleato de etanolamina a 5% (Figura 3). Após a infiltração a paciente relatou ardência local. Para tal sintomatologia, foi prescrito analgésico não opioide (dipirona sódica 500mg) e também analgésico opioide (tylex ®) com a instrução da utilização em casos extremos de dor e ardência no local. Após 7 dias, foi marcado o retorno da paciente quando foi observada uma discreta diminuição no volume lesional, quando comparando-se com seu aspecto inicial. Em seguida, foi realizada nova aplicação da substância com novo agendamento de retorno, até que, após a quarta semana de infiltração (28 dias após a infiltração inicial), observou-se a regressão total da lesão (Figura 4). A paciente encontra-se proservada por um período de 1 ano, e, até o presente momento, não se constatou recidiva de tal lesão, observando-se apenas uma fibrose cicatricial (Figura 5).

 

 

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

A maior incidência dos hemangiomas ocorre logo após o nascimento ou na primeira infância9,10. Porém alguns hemangiomas desenvolvem-se na fase adulta1, acometendo, com maior frequência, a região de cabeça e pescoço, com maior prevalência em lábios, língua, mucosa jugal, palato, com predileção pelo sexo feminino1,11, corroborando assim nosso relato no qual apresentamos um caso de hemangioma em adulto do sexo feminino, envolvendo a região de palato.

Em odontologia, diante de lesões de pequeno diâmetro, verificamos entre os autores consultados várias opções terapêuticas, entre elas: a excisão cirúrgica convencional, eletrocauterização, laserterapia, embolização, crioterapia e escleroterapia química. No presente trabalho, optou-se pela escleroterapia química com Oleato de etanolamina 5% na qual de acordo com Ávila12 (2003), Zanetinni et al.13 (2005), Nishikawa et al.14 (2006), entre outros que obtiveram resultados satisfatórios. Em nosso caso, observou-se a regressão total da lesão. Porem há relatos de necrose tecidual15, o que não foi observado na paciente.

A dose do medicamento deve ser proporcional ao tamanho da lesão. Mesmo em lesões maiores, a aplicação do agente esclerosante deve ser realizada em sessões intercaladas de, no mínimo, 7 dias, não ultrapassando 2 ml em cada infiltração16. Por apresentar diâmetro de aproximadamente 15 mm e por ser a fribromucosa palatina, o local da lesão bem como o risco da ocorrência de necrose tecidual local, optamos por infiltrações de 0,3 ml com intervalos de 7 dias durante 4 semanas.

A disseminação sistêmica de 5% do oleato de etanolamina frequentemente ocorre quando o medicamento atinge o interior dos vasos sanguíneos, principalmente artérias6,17. Essa complicação pode ser minimizada pela correta eleição do caso e aplicação somente nas lesões que não apresentarem pulsação evidente, conforme a apresentada em nosso caso.

O oleato de etanolamina a 5% pode causar intoxicação renal associada com hemólise e hemoglobinúria intravascular18. No intuito de prevenir prejuízos renais, pode-se fazer a administração de hepatoglobina por via intravenosa durante e após a injeção do agente esclerosante na lesão. Choi et al.19 (2002), Miyoshi e Oshiba20 (1989) sugerem que, se forem aplicadas doses menores que 9.6 ml, essas complicações não ocorrem. Matsumoto et al.21 (2003) preconizam infiltrações com menos de 1 ml de 5% de oleato de etanolamina no intuito de prevenir essa complicação. No presente caso, foram realizadas infiltrações de 0,3 ml do Ethamolin®, concordando, assim, com esses autores.

Durante a aplicação dessa técnica, pode ocorrer algum desconforto local, manifestado clinicamente por uma sensação de ardor. Em nosso caso, além da sensação de ardor causada pelo medicamento, o que está de acordo com Batista Rodrigues Johann et al.22 (2005), a distensão da mucosa palatina no momento da infiltração acentuou, ainda mais, esse desconforto.

Os hemangiomas normalmente não recidivam ou sofrem malignização quando a terapêutica correta é instituída23. O presente caso está proservado por um período de 12 meses em que, até o presente momento, não se observou a recidiva da lesão.

 

CONSIDERAÇÕES GERAIS

O oleato de etanolamina 5% se constitui como uma alternativa segura, de baixo custo, eficaz e de menor morbidade para pacientes com hemangiomas orais de diâmetro menor ou igual a 1,5 cm, além de proporcionar uma redução de possíveis complicações como a hemorragia, quando comparado com a excisão cirúrgica convencional. Trata-se de uma terapêutica de baixa complexidade e fácil realização, estando acessível ao cirurgião dentista clínico em unidades básicas de saúde.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência:
José Zenou Costa Filho

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zenoucosta@gmail.com